«Mas que raio de artigo»
Foi precisamente a designação que me
ocorreu ao ler o texto de Luís
Ribeiro, que, não sendo peixe nem carne, expõe com brandura choramingas sobre
a rebelião independentista catalã, alinhavando citações e referências que
mostram o seu nervosismo de apoio triste e pacífico, em defesa dos catalães
traidores à sua pátria.. A expressão do meu título pertence a um comentador
certeiro – Manuel Guimarães – mas todos
os comentadores são praticamente contrários ao insonso das lamechices de Luís Ribeiro. Eu apenas constato, repugnada.
A democracia espanhola no banco
dos réus
Os catalães viveram a ilusão de que
teriam o reconhecimento de uma individualidade pela qual anseiam há séculos.
Enganaram-se no país. A democracia espanhola ainda teme a voz das suas
autonomias.
Está
a decorrer um julgamento em Madrid que é fulcral para o futuro das relações
peninsulares, que ocupa as primeiras páginas de todos os jornais espanhóis e
que praticamente ninguém reporta em Portugal. Que eu saiba, também não há
nenhum observador português.
Em
causa estão os acontecimentos de 1 de outubro de 2017 (1-O) na Catalunha,
relativamente aos quais a acusação pede o máximo de 25 anos de prisão para
Oriol Junqueras e pesadas penas aos restantes acusados pelo delito de
“rebelião” que consta do art. 472º do Código Penal espanhol: “São réus do
delito de rebelião os que se levantarem violenta e publicamente com qualquer
dos seguintes objectivos: … 5.º Declarar a independência de uma parte do território
nacional.” Recordo que um assassinato é punível em Espanha com 15 a 20 anos de
prisão.
A jurisprudência do Tribunal constitucional espanhol definiu o termo “violência”, exigida
por aquele artigo para que possa haver rebelião: “Por definição, a rebelião realiza-se por um grupo que
tem o propósito de uso ilegítimo de armas de guerra ou explosivos, com a
finalidade de produzir a destruição ou devastação da ordem constitucional”.
No
entanto, os líderes independentistas catalães sempre apregoaram a não
violência, não se registou um único tiro ou explosão no 1-O, as suas acções
foram meramente defensivas das urnas eleitorais, o governo central não decretou
o estado de emergência, excepção, ou de sítio, e não foi instaurado qualquer
recolher obrigatório. As forças policiais regionais – os “Mossos
d’Esquadra” – cooperaram inclusivamente com a Guarda Civil na execução das
ordens de Madrid.
Como
refere um jornalista espanhol – castelhano e co-autor de um livro sobre a
história de Castela — “se,
após a aprovação da declaração de independência, o governo catalão tivesse dado
ordens aos Mossos para controlar os aeroportos e estações de comboios,
assegurarem-se das fronteiras, e expulsarem a Guarda Civil da nova república
catalã pela força das armas, hoje os líderes independentistas enfrentariam exactamente
a mesma acusação: rebelião”.
Porquê a acusação de rebelião?
Se
a acusação se tivesse limitado aos crimes que foram efectivamente observados,
acrescidos dos que há indícios — desobediência grave à autoridade, prevaricação
e defraudação de fundos públicos – o julgamento teria de decorrer na Catalunha.
Ainda
assim, a acusação de rebelião não basta para que o julgamento decorra em
Madrid, porque os réus são catalães e, como tal, estão sob a jurisdição do
Tribunal Superior de Justiça da Catalunha. Para justificar o julgamento pelo
Supremo o juiz instrutor tinha de invocar delitos cometidos fora do território
catalão, e por isso argumentou com a compra de urnas fora de Espanha e
escondidas em França, a criação de websites fora do território nacional, e a
convocação de observadores internacionais.
Certamente
não se apercebeu da posição em que se colocava ao invocar rebelião violenta
através da compra de urnas, criação de websites, e convocação de observadores.
Mais
de 300 catedráticos, professores de direito e juristas espanhóis rejeitaram a
acusação de “rebelião” e também a de sedição num apelo público em
que apresentaram o julgamento como uma ameaça à própria democracia espanhola,
na medida em que essas acusações “abrem a porta à banalização de figuras
praticamente inéditas em democracia e com um passado de triste memória, razão
pela qual o legislador de 1995 as restringiu a casos de uma materialidade
lesiva claramente superior à atual”.
O
catedrático de Direito Penal em Jaén, Guillermo Portilla Contreras, promotor do
texto, comentou que a diferença entre insurreição e rebelião reside em ser
esta última “um acto de força contra a integridade territorial ou a ordem
constitucional que não possa resolver-se com outros meios que não sejam o
recurso às Forças Armadas”. No caso do 1-O foi plenamente suficiente o
recurso à Guarda Civil, pelo que o enquadramento deveria ter sido apenas de
insurreição.
O
carácter pacifico dos protestos de 1-0 foi reconhecido pela Amnistia Internacional, que
acusou Madrid de restringir desproporcionadamente os direitos de liberdade de
expressão e de manifestação pacífica dos apoiantes da independência catalã,
para além de emprego excessivo de força pelas forças de segurança contra os
manifestantes, e apelou à libertação imediata de dois dos réus. Também a Human Rights Watchcondenou
o excessivo uso de violência pelas forças policiais na Catalunha que provocou
893 feridos, segundo essa organização.
No
julgamento em Madrid, todos os acusados — que se entregaram de livre vontade —
consideram-se presos políticos por delito de opinião: o de serem favoráveis à
independência da Catalunha.
Irão
certamente receber fortes penas neste processo. Está em causa a primeira tentativa de
independência da Catalunha desde que há democracia em Espanha e o governo
central quer impor um exemplo que
seja absolutamente dissuasor de novas aventuras independentistas, seja na Catalunha
ou noutras regiões do país. Recorre à mesma estratégia de Filipe V – o primeiro
rei Bourbon da Espanha — nas instruções que enviou ao Duque de Berwick,
comandante das tropas que sitiavam Barcelona em 1714: “merecem ser sujeitos ao
máximo rigor segundo as leis da guerra, para que sirvam de exemplo a todos os
meus outros súbditos”. O atual rei Filipe VI foi igualmente contundente no
discurso sobre a situação na Catalunha de 3 de outubro de 2017, acusando os
independentistas de “deslealdade inadmissível”, “quebra dos princípios
democráticos”, e de perpetrarem uma “inaceitável tentativa de apropriação das
instituições históricas da Catalunha”.
Por
sua vez os acusados têm consciência de que, através da sua estratégia de não
violência, conseguiram ir mais longe e estar mais próximos da independência do
que qualquer outra região espanhola, incluindo o País Basco quando enveredou
pela via do terrorismo. Quanto maior a condenação, maior e mais arreigado será
o fervor de independência e maior a fama de mártires terão. Continuarão a
desenvolver a estratégia cultural e educacional de separação em relação a
Espanha e aguardarão por um momento de maior fraqueza do governo central que
lhes permita actuar decisivamente. Tudo indica que não irão desistir.
O
governo central escolheu a via da força e da imposição para lidar com a
questão. Instrumentalizou o direito e a justiça à sua vontade de punição
exemplar, de forma a enviar uma forte mensagem às autonomias de que a unidade
do Estado é superior à vontade democrática.
Em
Madrid, experimenta-se um momento de exaltação daqueles que só os espanhóis
sabem viver. Todos os dias, as principais páginas dos jornais situacionistas
apresentam os êxitos das interpelações dos juízes contra os humilhados réus
catalães. A maior acusação é a de terem aviltado aquilo que se esperava dos
principais dirigentes autonómicos: que fossem os primeiros a defender a unidade
da Espanha. Não se lhes perdoa a traição, nem há a menor compreensão para com
os sentimentos de metade da população da Catalunha.
Os
catalães viveram a ilusão de que o séc. XXI lhes traria o reconhecimento de uma
individualidade pela qual anseiam há séculos. Enganaram-se no país. Ao
contrário do Reino Unido, que aprendeu que a melhor maneira de lidar com as
dissensões internas é ouvir a voz da população, a Espanha continua a usar a
metodologia da união pela força. A democracia espanhola ainda teme a voz das
suas próprias Autonomias.
Alguma
coisa evoluiu, no entanto. Se estivéssemos no sec. XVIII, em vez de 893 feridos
teríamos provavelmente centenas de mortos.
A
questão é a de saber por quanto mais tempo será viável manter a unidade de um
país pela força.
COMENTÁRIOS
Manuel Magalhães: Mas que raio
de artigo, será que o autor não entende que o que está em questão é o
desmembramento de um país, a Espanha, o que nunca poderá ser admitido por um
governo central minimamente credível! Também não percebo porquê a referência a
um observador português, será que seria para depois tentarmos a independência
do Algarve ou da região Norte... valha-nos
José Montargil: É preciso ter uma lata do caraças para escrever um
artigo destes onde mistura factos reais com opiniões de A, B e C, com citações
da Constituição fora do contexto, comparações absurdas, com opiniões de
organismos internacionais que nos habituaram a estudos e opiniões completamente
orientados segundo interesses inconfessáveis. Sobretudo
o que mais me faz confusão e só demonstra uma total ignorância do assunto de
Catalunha é afirmações que desculpabilizam todos os que são contra a implosão
de Espanha . Pois é disto que se trata. Espanha tem um equilíbrio entre as
forças de autonomia regional e o governo central. é isso que se pretende manter
e que os independentistas catalães com políticas racistas, xenófobas e
oportunistas pretendem uma mirífica independência.
João João: Espanha, uma democracia aparente. Para muitos espanhóis a guerra civil nunca acabou.
Mosava Ickx: Os independentistas nunca esconderam, e reclamaram separação pelas armas
quando necessário, e o Puigdemont nem aceitava participar às reuniões
inter-regionais... Quer mais? Bases de activistas em solo estrangeiro,
simpático, não? Quanto à via de não-violência,
pede aos mais de 50% de habitantes da Catalunha, anti-independentistas, se não
sentem violência dia após dia... Até a intromissão da Amnesty Coisa e a Humans Rights,
por si só justifica as dúvidas legais: onde há essas corjas, há gato.
Lembram-se que os Catalães estão a tentar negar e subverter uma constituição
que aprovaram em eleições livres não há tanto tempo como isso.
victor guerra: Completa distorção dos factos . Metade dos catalães decidiram pressionar os
outros, que querem continuar espanhóis, exercendo métodos fascistas, no âmbito
cultural, de acesso a empregos e na convivência social. Para isso, inventaram
um referendo, que viola a Constituição. Tal pretensão viola ainda as
condicionantes da União Europeia.
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