Sinal de que uma revoada de esperança num final feliz parece acompanhar já os comentadores, bem como o próprio Paulo Tunhas, em razoados gloriosos de uma virilidade empenhada, disposta a projectos ousados, nada comedidos em termos de ambição luxuriosa, coisa de que talvez Putin também não prescinda, mas dificilmente se pode averiguar esses pormenores que PT faz questão em revelar, em termos da sua própria intimidade. Por mim, com muita admiração pelos portugueses ledores dos clássicos gregos, historiadores das guerras do Peloponeso, para o paralelo da negatividade com as ambições putinescas, e outras mais, sinto, a par desse regozijo, o encanto das experiências vivenciais de P. Tunhas, embora sonhadas, agora que ando a escutar a voz bem timbrada de Linda de Susa, que também conquistou o seu cantinho de felicidade, não na Grécia mas na França, com uma simples mala de cartão, que podemos sempre recuperar no youtube, vista a exiguidade da "aurea felicitas" no lastro radioso concedido, por vezes, às vidas humanas.
Caim matou Abel
Na distante e gélida Moscóvia, Putin é exibido à
vindicta popular na Praça Vermelha. A Ucrânia é livre. Miguel Sousa Tavares,
Boaventura Sousa Santos e Jerónimo de Sousa duvidam de tudo.
PAULO TUNHAS
OBSERVADOR, 06 out
2022, 00:2036
“Se pudesse, anexava as estrelas”,
dizia Cecil Rhodes, na idade do ouro do império britânico, que, naturalmente,
passou a incluir a Rodésia. Não quero
entrar na vexata quaestio dos males e bens do imperialismo britânico.
Acontece apenas que, para Cecil Rhodes, era possível anexar imensas
regiões de África, o que, de facto, se passou. As
estrelas eram o impossível limite. Em
contrapartida, parece singularmente difícil a Vladimir Putin anexar realmente
alguns oblasts da Ucrânia, como os de Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporíjia. Putin fica muito abaixo do céu
estrelado. As populações não o parecem querer e o exército ucraniano recupera,
dia após dia, novas zonas das regiões. As tropas invasoras russas fogem, depois
de aterrorizarem os habitantes. O fracasso é inevitável.
Há,
como se sabe, sonhos que entram em choque com a realidade. Eu, por exemplo,
tenho um típico sonho de velhote: anexar Scarlett Johansonn e uma ilha
grega, de um só golpe. Parece-vos impossível? A mim, confesso, também se me
afigura difícil, até porque tenho alguma experiência de falhanços no capítulo.
Mas também guardo com prazer a memória de alguns sucessos inesperados e,
sobretudo, a tarefa parece-me muito mais viável do que a de Putin. Ter
Scarlett Johansonn (e uma ilha grega) é uma brincadeira de menino de coro
comparada com a ambição de Putin. E, se pudesse organizar um referendo à
minha maneira, as pedrinhas todas da ilha deserta votavam por mim e a bela
Scarlett esquecia num ápice a pura e simples existência do pobre Colin Jost
(tive de ir ver o nome à Wikipédia, coitado dele), movida por um acordo
irreprimível com a ordem secreta da natureza e com a mais profunda vocação
espiritual da espécie humana. O Observador perderia sem dúvida um
colunista das quintas – a felicidade ininterrupta não interessa a ninguém
–, mas há sacrifícios inescapáveis. Pensem que também um dia Marcelo deixará de
ser Presidente. Há egoísmos que só podem honrar a nossa espécie e é bela a satisfação
vicária com a felicidade alheia – sobretudo a minha.
De
qualquer maneira, o verdadeiro assunto da coluna de hoje é – tenho mais pena do
que posso dizer – mais prosaico. Desde 24 de Fevereiro que se ouvem um pouco
por todo o lado vozes (sem o grave veludo adamascado protector da intimidade da
alma da minha companheira de ilha) que proclamam insistentemente que a guerra
da Ucrânia se iniciou por um ataque insidioso do Ocidente à Federação Russa, em
flagrante violação da ordem natural das coisas. O Ocidente teria mobilizado
todas as suas forças para destruir os restos de civilização que se lhe opõem.
Putin ter-se-ia limitado a reagir. Ora, segundo todas as aparências, tudo
isto parece uma inversão caracterizada das relações causais efectivas,
patentes aos olhos de todos. Como é isto possível?
Nestes
casos, não há nada como ir às fontes. E a fonte principal na matéria é, é
claro, o quarto capítulo do livro do Génesis, onde se conta o
assassinato de Abel por Caim. Li algumas
traduções (a de Robert Alter, de quem já tinha começado a ler um livro sobre a
narrativa bíblica, pareceu-me particularmente boa) e comentários (como o de
Bill T. Arnold). Particularmente útil foi um livro, que se pode ler
integralmente na net, da autoria de John Byron, Cain and Abel in
Text and Tradition. Jewish and Christian Interpretations of the First
Sibling Rivalry, Brill, 2011. John Byron não utiliza apenas os textos
canónicos, mas igualmente os chamados pseudepígrafos, textos falsamente
atribuídos a autores estabelecidos, e os apócrifos. O que se ganha no
conhecimento da exegese dos originais é fascinante.
Por exemplo, se lermos os comentários
canónicos, centramo-nos numa questão fundamental: porque preferiu Deus as
ofertas de Abel, o pastor, às de Caim, o cultivador do solo? A questão é de monta, porque é da expressão
dessa preferência que resulta, na aparência, o assassinato de Abel por Caim. E
as respostas, como é óbvio, oferecem uma extraordinária subtileza e
complexidade. Mas se acompanharmos a nossa leitura pela dos pseudepígrafos, há
um novo universo de questões e respostas que se nos abre.
Assim,
nota-se que Caim poderá não ter sido filho de Adão mas
do demónio, o que explicaria a sua inveja e os tristes resultados desta. O
“conhecer” bíblico ganha, nesta leitura, uma outra ressonância: Adão sabia
aquilo de que Eva era capaz. E não ficamos por aqui. A mulher com que Caim se
veio a casar, Labuda de seu nome, era, pela força das circunstâncias, uma sua
irmã. Mas as coisas complicam-se. Tanto Caim como Abel tinham irmãs gémeas.
Acontece que Caim julgava de maior beleza a irmã que havia sido destinada a
Abel do que aquela que lhe fora atribuída. A raiva pelo facto seria a
verdadeira causa do assassinato. Cherchez
la femme, com efeito.
Por
acaso, não sou coscuvilheiro. Nunca fui muito e, com a idade, atingi mínimos
históricos. Mas acho a história desta família originária apaixonante e
prometi-me, no futuro, saber mais dela do que sei. Porque, de facto, a única
coisa que sei de certeza certa e não se encontra contestada por nenhum autor é
que foi mesmo Caim que matou Abel e não o contrário. O que, parecendo
que não, não é pouco. À sua maneira, confirma o que o nosso espírito e os
nossos sentidos testemunharam quanto à guerra da Ucrânia: foi a
Rússia que a iniciou. A diferença é que Putin não conseguiu matar a
Ucrânia. Mesmo vivendo todos a leste do Paraíso, há lugares mais recomendáveis
do que outros e os habitantes desses lugares até se têm portado bem, pese aos
muitos peritos da geoestratégia do Éden.
Entretanto,
o mar azul não mexe, excepto para mostrar que está vivo e que participa da
nossa existência. Ao longe, mas não longe demais, saltam os golfinhos. A
recentemente anexada Scarlett barra-me as costas com protector solar. Na
distante e gélida Moscóvia, Putin é exibido à vindicta popular na Praça
Vermelha. A Ucrânia é livre. Miguel Sousa Tavares, Boaventura Sousa Santos e
Jerónimo de Sousa duvidam de tudo. Na nossa ilha, escondemo-nos dos
helicópteros dos produtores de Hollywood, que buscam desesperadamente Scarlett,
com a ajuda dos golfinhos que sabem como nos guiar para lugares secretos. Somos
heróis, e não apenas por um dia – pela eternidade toda, sem uma só horinha a
faltar, sob um sol irrepreensível.
GUERRA NA
UCRÂNIA UCRÂNIA EUROPA MUNDO
COMENTÁRIOS:
Carlos Quartel: Uma moderada ironia ao que se passa em Moscovo. Putin conseguiu pôr a Rússia ao nível da pura anedota, anexando territórios, a golpe de decreto, sem necessidade de tropa. E, convenhamos, foi modesto. Porque não Berlin ou a sua Dresden?? É só decretar, que as parlamentares russos ratificam, solenemente, em sentido e com ar circunspecto. Nunca uma fantasia foi tão longe, não me lembro de nada parecido no descrédito de uma nação. Tão profundo ridículo, que levará décadas a esquecer toda aquela palhaçada, todo aquele teatro bufo, toda uma nação transformada num circo. bento guerra: A Ucrânia será, para os próximos anos ,um dos países mais pobres da Europa e a viver da caridade internacional. O que é completamente injusto, dado o seu potencial."Coragem é fazer a paz" escreveu Sousa Tavares, em 13 de Março. Desde então, é o que se vê. Como vai acabar, Tunhas? João Eduardo Gata > bento guerra: Não creio. Com 300 mil milhões de dólares em activos russos para começar a sua recuperação, em 15 anos a Ucrânia na UE pode bem ser mais rica que Portugal em PIB per capita. E a guerra vai acabar com a derrota total e completa da Rússia e com o Colapso do Regime Russo. O que muito enfurecerá os tontos Miguel Sousa Tavares, Boaventura Sousa Santos e Jerónimo de Sousa. João Eduardo Gata: Miguel Sousa Tavares, Boaventura Sousa Santos e Jerónimo de Sousa: três grandes tontos, profundamente anti-liberais e anti-democráticos. Cipião Numantino: Belo o bucolismo hoje por aqui versado pelo nosso estimado PT. Só contraporia as Berlengas em substituição da ilha grega. Ou no limite as desertas se a inefável Scarlet não se importar de conviver com as cagarras. No resto tudo na paz do Senhor. E se os jogos de poder e ambição de Abel e Caim deram para o torto, nada nos garante que o rufia Putin não possa levar uma lição que o devolva aos meandros terrestres quando se autoconvenceu que habitava entre os deuses do Olimpo. Pode o manjerico aplicar o raio de Zeus e fulminar todos os mortais? Claro que pode! Mas em última instância ver-se-á convencido por antecipação que defeca e urina como todos os demais. E ninguém nos garantirá que, himself, não poderá ficar esparramado feito estátua de sal perante a destruição das novas Sodoma e Gomorra. Isto está a ficar bonito! E se o Cecil Rhodes ainda manducava numa espécie de terra de ninguém, agora por agora, aos Putins desta vida, cresceu-lhes o olho e vão diretamente ao "filet mignon".
Surgiram vários manjericos destes através da História.
Um deles, Pirro (esse mesmo da vitória de
Pirro) tratou de implicar com tudo e com todos. Auto propalado descendente da
família de Olímpia, mãe de Alexandre-o-Grande, depois de várias vitórias
pírricas encontrou, finalmente, uma morte à sua altura. Ao que reza a história
atacando a cidade-estado de Argos, foi atirado do cavalo abaixo por uma telha
lançada por uma velha de um telhado próximo e acabado de matar à lançada por um
soldado argivo.
Prevejo uma situação do género para Putin. À telhada,
ou esganado pela própria trampa, vai acabar por encontrar a morte adequada à
sua pequenez física e mental. Tão certo como, muitos dos que me lêem estarem
lembrados que eu desde o primeiro momento da guerra previ o que iria acontecer.
Mais esperto que os demais? Nem tanto assim já que me baseei na História e dos
fiascos russos nesta contidos para chegar a semelhante conclusão! Se se ler,
entre outros, Heródoto,
Pausânias e Tucídides encontrar-se-á algum paralelismo entre a velha e relha Esparta e a actual Rússia. Ambas com regimes odiosos e
ambas mestres da propaganda.
Sabe-se como a prosápia e arrogância de Esparta
terminou, nas planícies de Leuctra, perante a investida da sua antiga aliada
cidade-estado de Tebas, depois da derrota de Atenas na guerra do Peloponeso. Tebas tinha pouco mais de
metade do exército de Esparta. E nem assim, Esparta, se livrou de uma derrota estrondosa,
um dos seus reis Cleômbroto II foi igualmente morto, e nunca mais Esparta
levantou cabeça até à sua completa irrelevância de que hoje só restam umas
insignificantes pedras na Lacónia junto à margem do rio Eurotas. Tal como os
russos, os espartanos eram autênticos mestres da propaganda, chegando mesmo a
arregimentar pessoas ilustres tal como o ateniense Xenofonte (genial o seu livro Anábase, que narra a magistral retirada
de 10.000 guerreiros da Pérsia em convulsão). Nem de propósito estive
recentemente no local onde se travou a célebre batalha das Termópilas (a dos 300 espartanos). Uma
tanga do caraças! E do exagero com que a propaganda espartana sobreviveu até
aos nossos dias. Observei a vereda por onde o traidor Efialtes (o corcunda,
lembram-se do filme?) guiou os persas para atacarem os espartanos pela
retaguarda. De resto nunca se tratou tão só de 300 espartanos, mas sim de mais
de 7.000 guerreiros de outras cidades-estado gregas, com destaque para os
téscios. Pensei ir encontrar um desfiladeiro e com uma ravina alta para o mar. O
que encontrei foi um pequeno vale com umas centenas de metros com uma montanha
do estilo da Arrábida. O mar que chegava até esse pequeno vale encontra-se hoje
bem distanciado por assoreamento do local. Mas pode observar-se perfeitamente
onde o mar chegava, por existir um pequeno declive onde se encontra hoje a
estátua dedicada a Leónidas. De extraordinário só observei a grande cascata
de água quente que jorra da montanha que deu o nome ao local e, "termopilae"
significa exacta e apropriadamente "portões quentes". No resto
intuí que o exército persa poderia perfeitamente ter flanqueado os 300
espartanos, pois a montanha que o poderia impedir é justamente igual a muitas
outras montanhas e nada comparável, por exemplo, à odisseia do cartaginês
Aníbal no atravessamento dos Alpes. Rússia e Esparta, mestres da
propaganda. A de Esparta durou quase três milénios e, a russa, dá-me a
impressão que começou em Outubro de 1917 e vai sobreviver infinitamente menos. Aquando
da derrota espartana na batalha de Leuctra, os comandantes de Tebas,
Epaminondas e Pelópidas, deram ordem para não serem enterrados os milhares de
espartanos que pereceram nesta batalha. É que segundo os comandantes
tebanos sabiam, os espartanos eram tão vig aristas e mentirosos que iriam
alegar que era mentira terem sido derrotados. Assim não o puderam nunca negar e
os seus corpos ficaram a apodrecer à vista de todos. Não vos faz lembrar nada
do que se está a passar na Ucrânia? É isso. A nova Esparta que se chama
Rússia vai pelo mesmo caminho. A propaganda funciona até um dia e, até a
meio-comunista Argentina, cancelou a encomenda de aviões de combate que havia
feito à Rússia. Avizinham-se tempos difíceis para Putin e a mãe Rússia. E a
total fragmentação está mesmo ali ao virar da esquina!... Vitor Batista: Putin tem agora a oportunidade de criar uma Eurásia de
Lisboa a Vladivostok, é só assinar um decreto. Carreguem putinholas! João Floriano: Não se preocupe caro filósofo
que esse «heat» todo vai passar. Para quem acredita em signos, é o resultado
normal da passagem do signo Touro (o seu) pela casa de Escorpião (a Scarlett).
Sendo o Touro um signo da Terra, o outono com o cheiro das uvas e das
plantas secas e em decomposição põe a uivar qualquer um que pertença a
este signo. Use a imaginação e «faça-se» feliz .
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