«Aquarela do
Brasil», Canção de João
Gilberto.
"Brasil,
meu Brasil brasileiro
Mulato inzoneiro
Vou cantar-te nos meus versos
Brasil, samba que dá
Bamboleio que faz gingar
O Brasil do meu amor
Terra de nosso senhor
´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´´"
Que seja sempre “Terra de nosso senhor”…
A revolução em curso no Brasil
Ganhe Lula ou Bolsonaro, esta eleição
presidencial será a última de um ciclo politico que começou com a queda da
ditadura militar mas está a chegar ao fim. É essa transformação que interessa
analisar.
JOÃO MARQUES DE ALMEIDA, Colunista do Observador
OBSERVADOR, 12
out 2022, 00:1713
Completamente
vidrados (para usar uma palavra bem brasileira) em Bolsonaro, muitos
comentadores não notam o que de mais interessante está a acontecer no Brasil.
Mas antes de tratar desse tema, vamos brevemente a Bolsonaro e a Lula. Para
mim, é incompreensível que o Brasil tenha que escolher entre Bolsonaro e Lula.
Mas não quero julgar os brasileiros. Estive uma semana no Brasil em trabalho, e
falei com muitos brasileiros, de esquerda e de direita. Há uma minoria que
também não entende a escolha entre Bolsonaro e Lula. Mas a maioria ama ou
odeia Bolsonaro e Lula. Não é fácil entender devidamente as razões dessa
polarização. Mas, de certo modo, Lula e Bolsonaro são as duas faces da
mesma (má) moeda. Bolsonaro só foi eleito em 2018 por causa da corrupção
e do abuso de poder do PT. E, apesar de erros desastrosos durante o seu
mandato, só está na segunda volta porque o outro candidato é Lula. De um modo
semelhante, apesar do passado do PT e do desprezo que muito brasileiros
sentem pelo partido, Lula só pode ganhar porque o seu adversário é Bolsonaro.
Mas Lula é maior do que o PT. E Bolsonaro é mais pequeno do que o centro, o
centro direita e a direita. Por isso, Lula é o favorito. Ganhe Lula
ou Bolsonaro, esta eleição presidencial será a última de um ciclo politico, que
começou com a queda da ditadura militar, mas que está a chegar ao fim. É essa
transformação que interessa analisar. Convém, aliás, recordar que já houve umas
eleições: as eleições para o Congresso. O resultado dessas eleições diz-nos
muita coisa.
Antes
de mais, o sistema partidário brasileiro está a passar por uma profunda
mudança. É verdade que sempre houve um número exagerado de partidos, que se
juntam, acabam e renascem frequentemente. Mas o PT, o PSDB e o PMDB
dominaram a política brasileira desde o regresso da democracia. Entre 1994
e 2015, os presidentes vieram do PT e do PSDB: Fernando
Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff. O
PMDB fez sempre parte das coligações de governo, com o PSDB e com o PT, durante
todo esse tempo, e continuou no governo até 2018, com Temer na
Presidência. Entre
1994 e 2018, todas as eleições presidenciais foram decididas entre candidatos
do PSDB e do PT (em 1994 e em 1998, FHC ganhou na primeira volta a Lula, de
2002 a 2014, os candidatos do PT, Lula e Dilma, ganharam na segunda volta a
candidatos do PSDB – Serra, duas vezes, Alckmin e Aécio). Em 2018, já
não houve candidato do PSDB na segunda volta. Agora, nem sequer houve
candidato presidencial do PSDB. Nas eleições para o Congresso, o PSDB sofreu o
pior resultado da sua história desde 1994. Mais grave, pela primeira vez desde
1994, o Governador do Estado de São Paulo não será do PSDB. O velho partido
fundado por FHC pode estar perto do fim.
O
PMDB, agora MDB de novo, vai resistindo. Mas deixou de ser um grande partido,
indispensável a uma maioria governamental. Não passa agora de um partido médio.
Nas eleições para o Congresso, do passado dia 2, ficou no quinto lugar ao lado
do PSDB. Dos tradicionais três grandes partidos, o PT é o que melhor resiste.
Ficou em segundo lugar nas eleições para o Congresso, domina na esquerda,
mas foi incapaz de se renovar. A incapacidade de arranjar uma
alternativa a Lula mostra a sua falta de renovação. E a sua segunda
figura, Haddad, é um verdadeiro derrotado. Exibe no seu currículo derrotas
nas eleições para a Perfeitura de São Paulo, para o Estado de São Paulo e para
a Presidência da República. O mais provável será perder de novo na segunda
volta da eleição para Governador do Estado de São Paulo. Provavelmente, o
candidato presidencial da esquerda brasileira no pós-Lula não será do PT.
A afirmação da direita brasileira
constitui a segunda grande mudança da política brasileira. As duas Casas do Congresso têm, a partir de 2 de
Outubro, uma maioria de direita. Ainda nos lembramos dos tempos em que se
dizia que no Brasil não havia direita, mas apenas esquerda (PT) e centro (PSDB
e PMDB). Esse tempo acabou. No Brasil há agora uma direita política com força,
o que em grande medida explica a implosão do PSDB. Se as coisas correrem
bem, o período dominado por Bolsonaro corresponderá ao radicalismo de quem saiu
do armário com fúria. E o pós-Bolsonaro terá uma direita desenvergonhada,
afirmativa, conservadora, mas moderada. Neste sentido, valerá a pena
acompanhar o percurso político do Governador de Minas Gerais, Romeu Zema (do
Novo), reeleito na primeira volta, e do provável futuro Governador de São
Paulo, Tarcísio de Freitas.
Finalmente,
há uma transição fundamental no sistema político brasileiro. O
presidencialismo deu o lugar a um regime mais parlamentarista. Essa transição
começou com a impugnação de Dilma Rousseff, em 2015. Desde aí, os Congressistas
não permitiram que lhe retirassem o poder conquistado. Pelo contrário, o
Congresso até reforçou o seu poder durante a presidência de Bolsonaro, o que
aqueles que apenas viam o “fascismo” à frente nunca entenderam.
Seja
qual for o resultado da eleição presidencial, o predomínio do Congresso irá
manter-se. As
maiorias políticas formam-se agora no Congresso, e são lideradas pelos
Presidentes da Câmara e do Senado. Deixaram de ser formadas e lideradas
pelo Presidente Federal, como Bolsonaro bem sabe. Se Lula
for eleito, o primeiro ano será dominado pela disputa entre o Presidente e o
Congresso pelo domínio da política brasileira. Haverá concessões de ambos os
lados, mas Lula nunca mais será o Presidente poderoso como foi entre 2002 e
2010. Será a consequência de um Presidente que divide mais do que une. Se
Bolsonaro ganhar, o Congresso também não deixará o Presidente retirar-lhe
poder.
Nos
últimos anos, o regime político brasileiro tornou-se mais parlamentar e menos
presidencialista. Nos finais dos anos de 1980 e no início dos anos de 1990, as
forças mais democráticas, como o PSDB, queriam um regime parlamentar, para
fazer uma ruptura absoluta com o presidencialismo da ditadura militar (ao
contrário do PT que, educado em Cuba, também desejava um presidencialismo
centralizador). Não deixa de ser duplamente irónico que o parlamentarismo
está a triunfar quando o PSDB está a morrer, e que isso aconteceu durante a
presidência de um capitão que gosta de elogiar a ditadura militar. No Brasil,
tal como em qualquer outro país, a realidade tem mais força do que as palavras.
ELEIÇÕES NO
BRASIL BRASIL MUNDO
COMENTÁRIOS:
Fernando Cascais: Assuntos sempre muito bem explicados pelo João Marques de Almeida, mas,
fazendo um "contra-corrente", será que podemos considerar esta
disputa eleitoral no Brasil como um confronto entre a esquerda e direita?
Talvez não. O classicismo democrático nas disputas eleitorais entre a esquerda
e direita tendo como referência os países da UE, baseia-se na interferência do
estado na economia. Mais estado ou menos estado não colocando em questão a
força e determinação do estado. A esquerda quer o estado a interferir em
todas as áreas económicas, designadamente no que respeita à criação da riqueza,
já a direita é menos tolerante com a interferência do estado em todas as áreas
da economia, e quer o estado com um papel mais de supervisor. Também
podemos incluir as políticas neoliberais como um ramo da direita europeia que
rasga a tolerância da social-democracia na interferência do estado em
determinadas áreas da economia. No Brasil não
é isso que temos. Ambas as facções; a considerada esquerda comandada por Lula e a direita
encabeçada por Bolsonaro, pretendem um estado mais interveniente na economia e
na sociedade. Lula quer um estado mais comparticipativo (economia) nos apoios
aos mais necessitados e a todos os que apoiam o PT e menos interventivo na
sociedade designadamente por parte das forças de segurança, enquanto Bolsonaro
quer um estado mais presente através das forças policiais na sociedade e
supostamente menos interventivo na economia, mas ambos querem um estado forte,
grande e pesado. Não esquecer que Bolsonaro é oriundo da área militar
que governou o país durante muitos anos, e um país com uma ditadura militar
representa sempre um estado forte.
O que temos no
Brasil é uma disputa entre quem quer mais subsídios e os que querem mais
segurança. A segurança é um problema estrutural no Brasil, porque, existe muita
criminalidade. É um facto. Ser roubado com o uso de violência é uma
possibilidade forte no Brasil. Muitos brasileiros que fogem para Portugal,
ficam felizes por poderem andar na rua de relógio e com um iPhone último
modelo, por exemplo. Diria que a disputa nestas eleições no Brasil,
corresponde a um enorme arrastão numa praia de Copacabana, com os policiais a
correrem atrás dos larápios, confundindo banhistas e ladrões. É uma grande
confusão, e o meio-termo, se é que tem espaço para existir, é arrastado por
um dos lados. Na minha opinião, estas eleições não retratam uma disputa
entre a direita e a esquerda, é algo diferente. Fernando Gonçalves: Curiosa é a posição de alguma
imprensa portuguesa em relação às eleições brasileiras, nomeadamente a RTP e
SIC. Lula que se diz admirador do regime cubano e chinês é o Lula da Silva.
Bolsonaro, que segundo diz o autor até permitiu o reforço do parlamentarismo no
Brasil é sempre designado como o "candidato da extrema-direita". joaquim zacarias: Caro João M Almeida, foi
Bolsonaro que levou a direita a ser maioria no congresso. Os brasileiros
deixaram-se de complexos de esquerda, seguiram o presidente, e é por isso que a
politica no Brasil nunca mais será a mesma. Compreendeu? bento guerra:
Os
"lulistas" conseguiram partir a sociedade ao meio, avançando com um
espertalhão de 76 anos, que já esteve preso por corrupção e montou à sua volta
,uma corte de oportunistas, quando foi poder.Bem, mas como é de
"esquerda" essa metade defende a "justiça", são os bons
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