domingo, 9 de outubro de 2022

Para chorar


Mais do que para rir, o texto de ALBERTO GONÇALVES, de uma lucidez inenarrável, no seu impecável sentido de humor, a que aponho o comentário de  observador censurado, frisando as palavras proféticas de Marcelo Caetano :

"... A Federação do futebol encontra-se empolgada. O governo “vê com muito bons olhos” a coisa. O dr. Costa já a baptizou: o “‘Mundial’ da paz”. E, naturalmente, o prof. Marcelo aplaude tudo. O que nos vale é haver tantos visionários à solta, embora alguns merecessem estar na cadeia." Brilhante. Parabéns Alberto. O rumo de Portugal está na Federação Portuguesa de Futebol. O governo PS consegue "ver" esse rumo porque tem "bons olhos" e Marcelo, o inteligente, além de "ver", aplaude a "visão". Portador de deficiência era o padrinho de Marcelo que, há cerca de 45 anos, não conseguia "ver" nem "aplaudir": "Sem o Ultramar estamos reduzidos à indigência, ou seja, à caridade das nações ricas, pelo que é ridículo continuar a falar de independência nacional. Para uma nação que estava em vésperas de se transformar numa pequena Suíça, a revolução foi o princípio do fim. Restam-nos o Sol, o Turismo, a pobreza crónica e as divisas da emigração, mas só enquanto durarem.  As matérias-primas vamos agora adquiri-las às potências que delas se apossaram, ao preço que os lautos vendedores houverem por bem fixar."              

O Mundial 2030 era o desígnio nacional que faltava

A Federação do futebol encontra-se empolgada. O governo “vê com muito bons olhos” a coisa. O dr. Costa já a baptizou: o “‘Mundial’ da paz”. E, naturalmente, o prof. Marcelo aplaude tudo.

ALBERTO GONÇALVES Colunista do Observador

OBSERVADOR, 08 out 2022, 00:2153

Quando o assunto são as sedes dos campeonatos do mundo, a FIFA não escolhe ao acaso. Em 2010, decerto seduzida pela ausência de corrupção local, escolheu a África do Sul, o que permitiu salvar inúmeros indigentes das ruas e enfiá-los em barracos distantes do olhar turístico. Em 2014, optou pelo Brasil da dona Dilma, outro regime avesso a falcatruas, que, além de salvar os sem-abrigo, ainda expropriou milhares de famílias para demolir casas e construir “infra-estruturas” bem bonitas. Em 2018, o campeonato foi na Rússia, sobre a qual são escusados comentários: provavelmente, tratou-se de um prémio pela anexação magnânima da Crimeia, quatro anos antes. Em 2022, leia-se daqui a um mês, teremos o “Mundial” do Qatar, com instalações moderníssimas, imprescindíveis restrições religiosas, mão-de-obra escrava mas dedicada e poucas dezenas (ou centenas) de trabalhadores mortos no processo.

Sendo uma instituição prevenida, a FIFA já prepara o torneio de 2030. Se for uma instituição coerente, a FIFA entregará a respectiva organização à imbatível candidatura de Portugal, Espanha e Ucrânia. Descontada a picuinhice da geografia, não é difícil encontrar critérios comuns. Os três são países sob ajuda de oligarquias marxistas, dois a partir de dentro, um a partir de fora. Os três resistem valentemente ao avanço do nazi-fascismo. Os três respiram saúde económica. Os três não têm mais com o que se preocupar. Os três existem, e é plausível que pelo menos um ou dois continuem a existir nos próximos oito anos.

Enquanto português, estou a fazer figas, as figas que os funcionários da saúde fizeram para ter em Lisboa a final da “Champions” de 2020. Por diversas razões. Desde logo, há a questão do estímulo das massas, um bocadito apreensivas ante a incapacidade de pagarem casa, comida e minúcias assim. Na semana passada, elogiei o empenho do governo em presentear-nos com sucessivos e maravilhosos e crescentemente ambiciosos projectos: o novo aeroporto fora de Lisboa, o comboio de alta velocidade, o programa espacial indígena. Até sugeri que, a esse ritmo, estaríamos agora a festejar o anúncio da colonização de Marte, a iniciar por 2045 ou 3048. Enganei-me. Felizmente. O “Mundial” de 2030 é um sonho de dimensão superior ao marciano e, quiçá, ao da “Champions”. Desta vez, não será só a rapaziada do SNS a celebrar nas ruas o prestígio e o progresso da nossa pátria.

Segue-se a questão da ousadia. Por hábito, aliás recente, as candidaturas conjuntas à recepção de torneios da bola limitam-se a duas nações contíguas ou quase (bocejo). É fantástica a decisão de Portugal e Espanha em concorrerem agregados à Ucrânia, situada a três mil e tal quilómetros da meseta ibérica. Eu teria sugerido o Afeganistão, mas adiante. O dinamismo que isto provocará na movimentação dos adeptos é simples de imaginar. Por mim, imagino as multidões de bolivianos que, no final de uma empolgante jogatana com a Eslovénia, saem com urgência do estádio de Castelo Branco rumo ao TGV no Carregado de modo a apanhar em Santarém o avião para Kiev, a tempo de acompanhar a sua selecção nos oitavos-de-final contra o surpreendente Burundi. No total, serão largos milhares e milhares de pessoas, viagens, voos, hospedagens e cervejas a demonstrar que, de Lisboa a Odessa, a Europa está pujante, que a crise energética tem dias e que a “emergência climática” é conversa para vender bicicletas e enregelar a ralé.

Depois, há a questão do investimento. Se descontarmos o prejuízo decorrente destes eventos, que costuma rondar as centenas de milhões (subornos aos decisores incluídos), os “mundiais” dão aos organizadores um lucro incalculável – no sentido de que ninguém é capaz de o calcular. Sobretudo dão um pretexto e deixam um legado. É preciso que a memória não seja curta. Não fora o Euro-2004 e cidades como Aveiro, Coimbra, Leiria, Braga e Loulé não beneficiariam hoje de belos estádios a troco de meros 4 milhões gastos por ano em manutenção, que os munícipes patrocinam com orgulho. E quem diz estádios diz rotundas, hotéis, apeadeiros, rotundas, viadutos, derrapagens, rotundas, aeroportos, rotundas, compadrios, mamarrachos, rotundas, etc. Houve um Portugal antes do “Europeu” e um Portugal após o “Europeu”, como haverá um Portugal antes do “Mundial” e, se tivermos muita sorte, um Portugal após o “Mundial”.

Por fim, resta a coragem. Falo da coragem em assumir a co-responsabilidade de um acontecimento tão vital por parte de uma nação que as más-línguas declaram ameaçada, encurralada, falida, desnorteada, arrasada, vencida, dependente e a viver de esmolas. Sei que a Ucrânia também não anda famosa. Mas o que me interessa é Portugal. É preciso que a pátria esteja à altura da sua História. É preciso acreditar que somos os melhores dos melhores. É preciso responder aos desafios do futuro. É preciso repetir clichés. É preciso, em suma, não cedermos ao “bota-abaixismo”, expressão feliz do destemido eng. Sócrates. A Federação do futebol encontra-se empolgada. O governo “vê com muito bons olhos” a coisa. O dr. Costa já a baptizou: o “‘Mundial’ da paz”. E, naturalmente, o prof. Marcelo aplaude tudo. O que nos vale é haver tantos visionários à solta, embora alguns merecessem estar na cadeia.

ESTÁDIOS   DESPORTO   FUTEBOL   MUNDIAL 2022

COMENTÁRIOS:

Alexandre Barreira: E vai ser lindo. Maravilhoso. Ver o CR7 a jogar de "andarilho" ! 

observador censurado: "... A Federação do futebol encontra-se empolgada. O governo “vê com muito bons olhos” a coisa. O dr. Costa já a baptizou: o “‘Mundial’ da paz”. E, naturalmente, o prof. Marcelo aplaude tudo. O que nos vale é haver tantos visionários à solta, embora alguns merecessem estar na cadeia." Brilhante. Parabéns Alberto. O rumo de Portugal está na Federação Portuguesa de Futebol. O governo PS consegue "ver" esse rumo porque tem "bons olhos" e Marcelo, o inteligente, além de "ver", aplaude a "visão". Portador de deficiência era o padrinho de Marcelo que, há cerca de 45 anos, não conseguia "ver" nem "aplaudir": "Sem o Ultramar estamos reduzidos à indigência, ou seja, à caridade das nações ricas, pelo que é ridículo continuar a falar de independência nacional. Para uma nação que estava em vésperas de se transformar numa pequena Suíça, a revolução foi o princípio do fim. Restam-nos o Sol, o Turismo, a pobreza crónica e as divisas da emigração, mas só enquanto durarem.  As matérias-primas vamos agora adquiri-las às potências que delas se apossaram, ao preço que os lautos vendedores houverem por bem fixar."

Maria Silva: Sublime!  adorei... :) Revelando profunda sensibilidade, inteligência e "boa memória" retrata a nossa triste realidade fazendo-nos soltar - pelo menos a mim - saborosas gargalhadas. Obrigada, AG!             Helder Machado: Confesso, até os meus olhos se humedecem só de pensar em tamanho desígnio. Obrigado, obrigado. Nas épocas difíceis é que as almas voam bem alto. Sejamos gratos a quem só nos deseja venturas e alegrias.             Vitor Batista: "O que nos vale é haver tantos visionários à solta, embora alguns merecessem estar na cadeia ". Curto e grosso caro Alberto, esta gente não se enxerga mesmo, quando uma grávida não tem a certeza onde irá dar à luz, estes tipos brincam aos mundiais, sabemos porquê, porque lhes engorda a conta bancária, e eles são uma famiglia de xuxas muito extensa, e cada "iletrado"que votou nesta máfia deveria responder por eles e elas.            Eduardo Cunha: "sei que a Ucrânia também não anda famosa". sublime.            Manuel Martins: O nosso governo sabe que o futebol é um excelente  placebo para os problemas de Portugal.  A inclusão da Ucrânia na candidatura é ridícula.            Maria Clotilde Osório: Este país é um colosso. Tá tudo grosso! Tá tudo grosso!                  Maria Tubucci; Muito bom, AG, ironicamente realista. Recorrendo às suas palavras, é preciso que a pátria socialista mostre a sua negritude e baixeza na História. É preciso que todos acreditem, que eles são os piores dos piores. É preciso ver, e ter realmente visto que, vai-se a um hospital, sobrevive-se a um AVC, mas não se sobrevive a uma bactéria hospitalar, hospital socialista. É preciso, em suma, concluir que a estratosférica carga fiscal socialista só serve para nos destruir, sustentando o polvo, o seu único desígnio.  O que não lhes interessa é Portugal, os 4F de antigamente passaram a ser: (Fátima), futebol, fisco, fado triste e lamentável e fiquem na penúria, os Portugueses, claro.                Maria Emília Ranhada Santos: São precisas coisas, ou acontecimentos para disfarçar a situação catastrófica para onde caminhamos a passos de gigante, e muitos vão na carruagem muito bem formatados! Estão prontos para dizer a tudo que sim!              Meio Vazio > manuel soares Martins: Boa ironia! De facto, mais do que "sentido de oportunidade" (conceito de conotação positiva, revelador de opção louvável), estamos ante "oportunismo", golpe cínico, próprio de quem se aproveita da desvantagem de outrem (...coisa banalíssima nesta "maravilhosa república" onde, aliás, é identificada com "inteligência" desde 2014). Henrique Guedes: obrigado, Alberto Gonçalves, por mais uma contribuição irónica realista e inteligente!! Lidia Santos: Excelente! Brilhante!               Luis Santos: Será uma oportunidade para a Ucrânia agora destruída, vir a ter montes de rotundas.              bento guerra: Mundial Ibérico (como o presunto) com ajuda à Reconstrução ucraniana. Não faltarão aficionados a viajar Lisboa-Madrid-Kiev.Recuperação definitiva da TAP                 Lily Lx: Lá vamos estourar dinheiro que não temos em coisas que não interessam.             Liberales Semper Erexitque: A pátria da chuteira volta a atacar... Paga Zé!             Meio Vazio: Que nunca se lhe quebre a pena, excelente AG!               Eduardo L: Brilhante e com um sentido de humor apurado! Foi só rir durante a leitura.          S Belo: Só  nos faltava mais esta !!!

 

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