Sem poesia. João de Deus não a
definiria assim, a vida, hoje, com os muitos Putins legislando à solta.
Quem matou a mãe de Tom?
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos alerta
para o imenso dano que a eutanásia inflige às pessoas em situação vulnerável,
às suas famílias e a toda a sociedade.
P. GONÇALO
PORTOCARRERO DE ALMADA
OBSERVADOR, 15
out 2022, 00:199
Na Actualidade
Religiosa do passado dia 6, o jornalista Filipe d’Avillez noticiou que o
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), a pedido de Tom Mortier, condenou a Bélgica,
por violação do direito à vida, no caso da eutanásia de sua mãe, Godlieva de
Troyer, de 64 anos, que sofria de depressão crónica.
Foram
flagrantes as irregularidades verificadas neste processo: a morte de Godlieva
de Troyer, que não tinha cancro e que era há mais de vinte anos seguida por um
psiquiatra, foi decidida por um oncologista, activista da eutanásia, que tinha
recebido um donativo da vítima. Por outro lado, a família da eutanasiada nunca
foi informada sobre o processo correspondente, embora fosse notória a
insuficiência do seu consentimento, dado o estado depressivo em que se
encontrava. Por último, quando a família, chocada com a inesperada morte de
Godlieva, exigiu uma investigação, o médico, que tinha recebido o donativo e
decidiu a eutanásia, fez parte da comissão de inquérito!
Embora
só agora, no passado dia 4 de Outubro, o TEDH tenha decidido a favor de Tom
Mortier, a morte da sua mãe aconteceu há já dez anos, em 2012, por injecção
letal, alegando-se a vítima sofrer de ‘depressão incurável’.
Não
obstante a eutanásia estar legalizada na Bélgica, onde é praticada em larga
escala – sete pessoas, por dia, são eutanasiadas no país que foi, com os Países
Baixos, pioneiro na sua legalização – o TEDH entendeu que a Bélgica infringiu,
neste caso, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos. O Tribunal considerou
que houve uma violação do artigo 2º da Convenção, segundo o qual o direito à
vida deve ser garantido. Neste caso, a acção não versou sobre a legitimidade da
lei que permite o homicídio a pedido, nem sobre as normas que, na Bélgica,
regulamentam a prática da eutanásia, mas sobre a forma como a Comissão Federal
belga para o Controlo e Avaliação da Eutanásia procedeu em relação a Troyer,
bem como sobre o processo de averiguações instaurado quanto à morte da mãe de
Tom Mortier.
O
TEDH, sem criticar o quadro legislativo belga, mas “tendo em conta o papel
crucial desempenhado pela Comissão no controlo a posteriori da
eutanásia”, considerou que “o sistema de controlo estabelecido no presente caso
não garantiu a sua independência”. Assim sendo, concluiu que a Bélgica não
cumpriu as suas obrigações em relação ao artigo 2º da Convenção, quer por falta
de independência da Comissão, quer ainda pela celeridade da posterior
investigação criminal.
A ADF
International representou Tom Mortier no TEDH. Robert Clarke,
vice-director da ADF, manifestou a sua satisfação em relação à constatação,
pelo TEDH, de que houve violação do princípio que obriga os Estados a proteger
a vida dos cidadãos. Esta decisão judicial, na opinião de Clarke, “contraria a
ideia de que existe o chamado ‘direito de morrer’ e manifesta os horrores que
inevitavelmente acontecem quando a eutanásia é legalizada”. Infelizmente,
embora o Tribunal tenha indicado que eram necessárias mais medidas de
‘salvaguarda’, para que, em casos análogos, se proteja a vida, a decisão do
TEDH deixou claro que, de facto, as leis e os protocolos existentes na Bélgica
foram insuficientes para proteger os direitos de Godlieva de Troyer, bem como
as legítimas expectativas da sua família.
Segundo
o vice-director da ADF International, “é lamentável que o Tribunal tenha
rejeitado a contestação do quadro jurídico belga; no entanto, a conclusão de
que as ‘salvaguardas’ apresentadas, como garantias da proteção dada às pessoas
vulneráveis, deveria suscitar uma atitude mais cautelosa em relação à
eutanásia, na Europa e no mundo. A realidade é que não há ‘salvaguardas’ que possam
mitigar os perigos da eutanásia, uma vez legalizada. Nada pode trazer de volta
a mãe de Tom, mas esperamos que esta decisão ofereça ao filho de Godlieva de
Troyer um pouco de justiça.”
Este
caso é paradigmático de quão enganosa é a promessa de uma ‘morte digna’, quando
a lei prevê a possibilidade do homicídio a pedido. Neste caso, por exemplo, a
mãe de Tom Mortier, embora doente psiquiátrica, conseguiu o necessário aval
médico de um oncologista, principal defensor da eutanásia na Bélgica, a quem
Godlieva de Troyer tinha dado um donativo para uma sua organização. Foi este
médico que encaminhou a mãe de Tom Mortier para outros médicos, também
partidários da eutanásia, e que igualmente faziam parte da instituição que
recebeu o donativo, não obstante a exigência legal de pareceres independentes,
no caso de doentes não terminais. Por último, o mesmo médico que lhe
administrou a injeção letal é também copresidente da Comissão Federal
encarregada de aprovar a prática da eutanásia.
Para
Tom Mortier, “o grande problema da nossa sociedade é que, aparentemente,
perdemos o sentido de cuidar uns dos outros.” Antes de a sua mãe ser legalmente
morta, o filho, nem nenhum outro membro da família, foram consultados ou
informados. A lei belga determina que a eutanásia só pode ser aplicada a quem
esteja numa situação médica “de sofrimento físico ou mental, constante e
intolerável, não susceptível de alívio e que é resultante de um distúrbio grave
e incurável, causado por doença ou acidente”. Godlieva de Troyer era fisicamente
saudável e o seu psiquiatra, que o foi durante mais de vinte anos, duvidava que
esta sua paciente preenchesse os requisitos que a lei belga exige para a
eutanásia. No entanto foi, legalmente, morta na Bélgica. Tanto o oncologista
que deu o seu parecer favorável, como o hospital em que foi praticada a
eutanásia, não informaram a família de que a mãe de Tom Mortier tinha pedido
para ser morta. Só no dia seguinte ao falecimento é que o filho foi informado.
Em
relação à sentença do TEDH, Tom Mortier disse: “embora nada possa aliviar a dor
pela perda da minha mãe, tenho a esperança de que a decisão do
Tribunal (Europeu dos Direitos Humanos) de que houve, de facto, uma
violação do direito à vida, coloque o mundo em alerta quanto ao imenso dano que
a eutanásia inflige, não apenas às pessoas em situação vulnerável (…), mas
também às suas famílias e a toda a sociedade”.
Quem
matou a mãe de Tom? Quem propôs, aprovou, promulgou e executou a lei da
eutanásia. Na realidade, foram todos eles, bem como os cidadãos que elegeram os
políticos que instauraram o homicídio a pedido, ou seja, quase toda a Bélgica
que, por isso, foi agora condenada pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
É isto que queremos para Portugal?!
COMENTÁRIOS (3 de 11)
Coronavirus corona; Infelizmente
é isto que vamos ter cá. Parecemos os cordeiros a ir para o matadouro: mesmo
que à nossa frente vejamos o nosso destino, caminhamos calmamente para ele, a
berregar uns com os outros. Os poucos que no meio não querem ir, têm de
continuar a caminhar por força do aperto dos restantes (é o tal contrato social
de Rousseau).
Lily Lx: Este mundo ocidental é um pesadelo do relativismo.
Escondido num princípio de liberdade está escondida a condenação dos mais
fracos, dos mais pobres, dos mais frágeis. Porque, claro, advoga-se a
eutanásia, mas não para o próprio nem para a sua mãe. Advoga-se o aborto, mas
não para os seus netos. Advoga-se o transgenderismo, mas não para os seus
filhos (leia-se as pessoas psicologicamente sãs não o querem para os seus
filhos). Se isto fosse uma sociedade civilizada, todas as mulheres seriam
apoiadas na decisão de ter um filho, todos os idosos e doentes seriam apoiados
para ter qualidade de vida sem dor, as pessoas transgéneros seriam acompanhadas
psiquiatricamente para tratar os problemas psiquiátricos subjacentes, antes de
- já adultos - poderem escolher fazer a transição de género. Mas não. O que é
“evoluído” é condenar as pessoas ao seu sofrimento e miséria.
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