Porque será que o actual Governo se
recusa sequer a tentar reduzir despesas públicas inúteis, tornando possível um
maior nível de investimento e consequentemente um maior crescimento económico?
ALEXANDRE PATRÍCIO GOUVEIA, Economista
OBSERVADOR, 04
out 2022, 00:154
Desde
que subiu ao poder em 2015, o Governo de António Costa nunca assumiu como
prioridade o crescimento económico. Adoptou antes uma orientação de
agradar ao eleitorado, privilegiando sobretudo o aumento das despesas públicas
e uma total ausência de reformas que pudessem aumentar o nível de vida dos
portugueses. A despesa
pública aumentou assim, entre 2014 e 2022, em 19,5 mil milhões de euros,
sobretudo devido ao aumento das “despesas com o pessoal” e ao aumento
das “prestações sociais”, que cresceram respectivamente em 4 e em 7 mil milhões
de euros. A única forma de compatibilizar este aumento com o objectivo da
redução do déficit orçamental, foi o de aumentar, neste período, ainda mais os
impostos. Foi o que sucedeu tendo a receita fiscal aumentado em 22,4 mil
milhões de euros.
Esta
forma de governar revela a insistência numa política económica que tem como
pressuposto que o Estado é mais eficiente e sabe gastar melhor o dinheiro que
os particulares e as empresas, razão pela qual se justifica cobrar cada vez
mais impostos, para poder gastar cada vez mais dinheiro. Por esta razão a carga
fiscal tem aumentado significativamente em Portugal, tendo passado de 33% do
PIB em 2000 para 37.5% em 2022, como se vê no gráfico seguinte.
Estamos,
portanto, num círculo vicioso, onde a opção por mais despesa implica a
cobrança de mais impostos. Se este círculo vicioso não for interrompido,
através da redução das despesas públicas, esta evolução leva apenas ao
“asfixiamento financeiro” dos particulares e das empresas, que vão ficando cada
vez com menos dinheiro para poupar ou para investir, devido ao volume de
impostos que pagam. E com menos poupança e com menos investimento, o
resultado é inevitavelmente um menor crescimento económico, em prejuízo de
todos os portugueses.
Esta política de aumento
permanente das despesas públicas, foi também o principal motivo por que
Portugal sofreu a intervenção da Troika em 2011, quando uma combinação do
déficit orçamental com a ausência de crescimento económico, tornou a dívida
pública portuguesa impossível de vender.
Apesar das medidas de redução das despesas públicas que se verificaram entre
2011 e 2013, que se reflectiram também na redução da carga fiscal, os
responsáveis da Troika consideraram, em 2014, que as despesas públicas se
deviam ainda reduzir em 4 mil milhões de euros. Esta redução não se
chegou, contudo, a concretizar, pois apesar da proposta do então presidente
Cavaco Silva, o Partido Socialista não aceitou essa redução. Podemos
assim concluir que em 2015 Portugal mantinha, em comparação com os países
europeus que mais cresciam, um excesso de despesas públicas e da carga fiscal.
Existindo um excesso de
despesa pública em 2015, um Governo responsável e apostado em aumentar o
crescimento económico teria reformado o sector público, procurando aumentar a
eficiência dos serviços públicos e reduzindo o montante das despesas públicas. Como vimos anteriormente, o Governo de António
Costa fez exactamente o contrário, aumentando ainda mais as despesas públicas,
sem ter, simultaneamente, procurado introduzir qualquer reforma no sector
público. Todas as despesas públicas que vinham de trás se mantiveram, mas novas
despesas foram entretanto introduzidas. O resultado foi que o povo português
tem hoje a 5ª carga fiscal mais elevada da Europa, como mostra o gráfico
seguinte:
Com
esta situação, os impostos directos, indirectos e descontos para a segurança
social representam hoje mais que 50% do que os portugueses ganham. Existindo em Portugal um déficit orçamental elevado e
simultaneamente um excesso de despesas públicas e de receitas fiscais, torna-se
evidente que a redução do déficit orçamental deveria ter sido obtida através da
redução das despesas públicas, e não pelo aumento dos impostos. É a este respeito
relevante referir que nos EUA a carga fiscal é cerca de 18%, em comparação com
uma média de 41% nos 27 países da União Europeia, o que prova não ser o elevado
nível de carga fiscal ou de despesas públicas, que promove o crescimento
económico ou o aumento do nível de vida dos cidadãos.
O Governo socialista tem afirmado não
ser desejável reduzir as despesas públicas, não tendo sequer esboçado qualquer
tentativa de reforma do sector público. Pode-se, assim, afirmar que o Governo
nunca teve esse objectivo, o que lhe permite não questionar nenhuma despesa
existente no sector público, apesar da clara falta de eficiência com que os
cidadãos são atendidos ou da fraca qualidade dos serviços prestados,
nomeadamente na saúde, na educação, na justiça, ou nas compras de bens e
serviços por parte do Estado. Podemos, assim, dizer que a política económica do
Governo se reduz a uma espiral de despesas / impostos, que nos conduz ao
empobrecimento.
Sem
pretender ser exaustivo, podemos apenas referir três áreas onde as despesas públicas poderiam ser
reduzidas:
Uma
reforma do sistema de pensões de reforma,
uma vez que em 2022 o déficit entre pensões em pagamento e contribuições para a
segurança social de empresas e de trabalhadores atinge um saldo negativo de 9
mil milhões de euros, equivalente a 4% do PIB. Este déficit é pago
anualmente com os impostos dos portugueses. É certo que esta reforma demoraria
vários anos a ser implementada, mas deve ser desde já iniciada. Países como a
Suécia, a Irlanda, a Itália, a Inglaterra, ou a Letónia realizaram já esta
reforma, o que lhes permitiu terem hoje as contas da segurança social
equilibradas, sem se ter procedido a quaisquer cortes no valor das pensões.
Esta melhoria ficou a dever-se á criação de um sistema de contas individuais de
capitalização virtual, onde a pensão de um cidadão será tanto maior quanto
maiores forem os seus descontos ao longo da vida para a segurança social, o que
por si só constitui um estímulo para que o número de anos de trabalho seja tão
elevado quanto possível. Não é essa a situação actualmente existente em
Portugal;
Uma
reforma nos gastos com o pessoal, no sentido de tornar mais produtivos os
funcionários públicos, com
passagem à reforma do pessoal não necessário, de forma a que este custo se
reduza de 11.8% para 10,6% do PIB, como sucede nos países europeus que mais
crescem como Malta, Eslováquia, Polónia, Irlanda, Roménia, Bulgária, Lituânia
ou a Rep. Checa;
Uma reforma e uma maior fiscalização
no sistema de subsídios de desemprego e de baixa por doença, que atingiram, em
2021, respectivamente 2.7 e 2.9 mil milhões de euros. Actualmente, o Estado
está muitas vezes a pagar para que os trabalhadores não trabalhem, que abusam
do subsídio de desemprego, o que origina graves dificuldades no recrutamento de
pessoal; O subsídio de desemprego deveria, pelo contrário, estimular o regresso
ao trabalho. No subsídio por doença, estima-se que 30% dos subsídios sejam
atribuídos com declarações falsas ou fraudulentas. São dois claros exemplos de
como a ausência de reformas, está a manter uma situação que prejudica a
economia e a ser, desnecessariamente, suportada pelos contribuintes.
A implementação destas medidas
pode poupar ao Estado 12.5 mil milhões por ano, o equivalente a 6% do PIB, sem
qualquer prejuízo para a economia portuguesa.
Com esta poupança, o déficit orçamental desapareceria e seria possível uma
redução significativa da carga fiscal, nomeadamente no IRS e no IRC. Pode-se
assim perguntar porquê que o actual Governo se recusa sequer a tentar reduzir
despesas públicas inúteis como estas, tornando possível um maior nível de
investimento e consequentemente um maior crescimento económico? Com maior
crescimento seriam também possíveis salários mais altos para todos os
portugueses.
Esta
política deve-se certamente a princípios ideológicas, pois aparentemente para
os partidos de esquerda quanto mais o Estado gastar melhor! Não terá contudo
chegado o momento do Governo pensar menos em ideologia e mais no aumento das
condições de vida e nos salários dos portugueses?
A
alternativa é continuarmos a caminhar no sentido de sermos o país mais pobre da
Europa dentro de cinco anos. Essa não é certamente a forma de defender o povo,
como o actual Governo apregoa.
CRESCIMENTO
ECONÓMICO ECONOMIA
COMENTÁRIOS:
Daniel José: é enviar o artigo para Belém e
adicionar ao plano leitura obrigatória no 12
António Lamas: Um excelente artigo que devia ser de leitura
obrigatória no Terreiro do Paço pelo ex-presidente da Câmara de Lisboa. Porque é que que tantos comentadores, tantos
jornalistas e sobretudo as oposições à direita não fazem da redução da despesa
gorda do Estado, uma prioridade. observador
censurado: Este artigo
devia ser de leitura obrigatória. "... torna-se
evidente que a redução do déficit orçamental deveria ter sido obtida através da
redução das despesas públicas, e não pelo aumento dos impostos." Porque é que
Portugal tem tido o "cancro" de ter Ministros das Finanças e
Ministros da Economia que nunca tiveram a responsabilidade de gerir uma
empresa? "... não questionar
nenhuma despesa existente no sector público, apesar da clara falta de
eficiência com que os cidadãos são atendidos ou da fraca qualidade dos serviços
prestados..." Em Portugal, há pessoas a
passar fome para terem dinheiro para pagar um seguro de saúde
porque o Estado, com o maior número de funcionários públicos de sempre e a
maior carga fiscal de sempre, não presta esse serviço. Assim, não deveriam os Orçamentos do Estado serem
chumbados por serem, salvo melhor opinião, inconstitucionais? De
facto, o Estado confisca o dinheiro dos cidadãos de forma desproporcionada para
os serviços que presta. Finalmente, o governo está a ir
em contramão à racionalidade preconizada pelo autor pois, por exemplo,
recentemente, criou o Ministério da Saúde nº 2.
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