terça-feira, 4 de outubro de 2022

Parece tudo tão óbvio!


O que afirma ALEXANDRE PATRÍCIO GOUVEIA, Economista, e que os seus comentadores corroboram, isso que há tanto tempo vem a peito em tantas conversas… Mas de tudo isso que se discute, só ressalta a expectativa impaciente da chegada do “bolo” lá de fora, sentida e interrogada, por quem tem o direito de ser esclarecido em primeira mão…

  Com esta política os portugueses nunca terão aumento do nível de vida

Porque será que o actual Governo se recusa sequer a tentar reduzir despesas públicas inúteis, tornando possível um maior nível de investimento e consequentemente um maior crescimento económico?

ALEXANDRE PATRÍCIO GOUVEIA, Economista

OBSERVADOR, 04 out 2022, 00:154

Desde que subiu ao poder em 2015, o Governo de António Costa nunca assumiu como prioridade o crescimento económico. Adoptou antes uma orientação de agradar ao eleitorado, privilegiando sobretudo o aumento das despesas públicas e uma total ausência de reformas que pudessem aumentar o nível de vida dos portugueses. A despesa pública aumentou assim, entre 2014 e 2022, em 19,5 mil milhões de euros, sobretudo devido ao aumento das “despesas com o pessoal” e ao aumento das “prestações sociais”, que cresceram respectivamente em 4 e em 7 mil milhões de euros. A única forma de compatibilizar este aumento com o objectivo da redução do déficit orçamental, foi o de aumentar, neste período, ainda mais os impostos. Foi o que sucedeu tendo a receita fiscal aumentado em 22,4 mil milhões de euros.

Esta forma de governar revela a insistência numa política económica que tem como pressuposto que o Estado é mais eficiente e sabe gastar melhor o dinheiro que os particulares e as empresas, razão pela qual se justifica cobrar cada vez mais impostos, para poder gastar cada vez mais dinheiro. Por esta razão a carga fiscal tem aumentado significativamente em Portugal, tendo passado de 33% do PIB em 2000 para 37.5% em 2022, como se vê no gráfico seguinte.

Estamos, portanto, num círculo vicioso, onde a opção por mais despesa implica a cobrança de mais impostos. Se este círculo vicioso não for interrompido, através da redução das despesas públicas, esta evolução leva apenas ao “asfixiamento financeiro” dos particulares e das empresas, que vão ficando cada vez com menos dinheiro para poupar ou para investir, devido ao volume de impostos que pagam. E com menos poupança e com menos investimento, o resultado é inevitavelmente um menor crescimento económico, em prejuízo de todos os portugueses.

Esta política de aumento permanente das despesas públicas, foi também o principal motivo por que Portugal sofreu a intervenção da Troika em 2011, quando uma combinação do déficit orçamental com a ausência de crescimento económico, tornou a dívida pública portuguesa impossível de vender. Apesar das medidas de redução das despesas públicas que se verificaram entre 2011 e 2013, que se reflectiram também na redução da carga fiscal, os responsáveis da Troika consideraram, em 2014, que as despesas públicas se deviam ainda reduzir em 4 mil milhões de euros. Esta redução não se chegou, contudo, a concretizar, pois apesar da proposta do então presidente Cavaco Silva, o Partido Socialista não aceitou essa redução. Podemos assim concluir que em 2015 Portugal mantinha, em comparação com os países europeus que mais cresciam, um excesso de despesas públicas e da carga fiscal.

Existindo um excesso de despesa pública em 2015, um Governo responsável e apostado em aumentar o crescimento económico teria reformado o sector público, procurando aumentar a eficiência dos serviços públicos e reduzindo o montante das despesas públicas. Como vimos anteriormente, o Governo de António Costa fez exactamente o contrário, aumentando ainda mais as despesas públicas, sem ter, simultaneamente, procurado introduzir qualquer reforma no sector público. Todas as despesas públicas que vinham de trás se mantiveram, mas novas despesas foram entretanto introduzidas. O resultado foi que o povo português tem hoje a 5ª carga fiscal mais elevada da Europa, como mostra o gráfico seguinte:

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Com esta situação, os impostos directos, indirectos e descontos para a segurança social representam hoje mais que 50% do que os portugueses ganham. Existindo em Portugal um déficit orçamental elevado e simultaneamente um excesso de despesas públicas e de receitas fiscais, torna-se evidente que a redução do déficit orçamental deveria ter sido obtida através da redução das despesas públicas, e não pelo aumento dos impostos. É a este respeito relevante referir que nos EUA a carga fiscal é cerca de 18%, em comparação com uma média de 41% nos 27 países da União Europeia, o que prova não ser o elevado nível de carga fiscal ou de despesas públicas, que promove o crescimento económico ou o aumento do nível de vida dos cidadãos.

O Governo socialista tem afirmado não ser desejável reduzir as despesas públicas, não tendo sequer esboçado qualquer tentativa de reforma do sector público. Pode-se, assim, afirmar que o Governo nunca teve esse objectivo, o que lhe permite não questionar nenhuma despesa existente no sector público, apesar da clara falta de eficiência com que os cidadãos são atendidos ou da fraca qualidade dos serviços prestados, nomeadamente na saúde, na educação, na justiça, ou nas compras de bens e serviços por parte do Estado. Podemos, assim, dizer que a política económica do Governo se reduz a uma espiral de despesas / impostos, que nos conduz ao empobrecimento.

Sem pretender ser exaustivo, podemos apenas referir três áreas onde as despesas públicas poderiam ser reduzidas:

Uma reforma do sistema de pensões de reforma, uma vez que em 2022 o déficit entre pensões em pagamento e contribuições para a segurança social de empresas e de trabalhadores atinge um saldo negativo de 9 mil milhões de euros, equivalente a 4% do PIB. Este déficit é pago anualmente com os impostos dos portugueses. É certo que esta reforma demoraria vários anos a ser implementada, mas deve ser desde já iniciada. Países como a Suécia, a Irlanda, a Itália, a Inglaterra, ou a Letónia realizaram já esta reforma, o que lhes permitiu terem hoje as contas da segurança social equilibradas, sem se ter procedido a quaisquer cortes no valor das pensões. Esta melhoria ficou a dever-se á criação de um sistema de contas individuais de capitalização virtual, onde a pensão de um cidadão será tanto maior quanto maiores forem os seus descontos ao longo da vida para a segurança social, o que por si só constitui um estímulo para que o número de anos de trabalho seja tão elevado quanto possível. Não é essa a situação actualmente existente em Portugal;

Uma reforma nos gastos com o pessoal, no sentido de tornar mais produtivos os funcionários públicos, com passagem à reforma do pessoal não necessário, de forma a que este custo se reduza de 11.8% para 10,6% do PIB, como sucede nos países europeus que mais crescem como Malta, Eslováquia, Polónia, Irlanda, Roménia, Bulgária, Lituânia ou a Rep. Checa;

Uma reforma e uma maior fiscalização no sistema de subsídios de desemprego e de baixa por doença, que atingiram, em 2021, respectivamente 2.7 e 2.9 mil milhões de euros. Actualmente, o Estado está muitas vezes a pagar para que os trabalhadores não trabalhem, que abusam do subsídio de desemprego, o que origina graves dificuldades no recrutamento de pessoal; O subsídio de desemprego deveria, pelo contrário, estimular o regresso ao trabalho. No subsídio por doença, estima-se que 30% dos subsídios sejam atribuídos com declarações falsas ou fraudulentas. São dois claros exemplos de como a ausência de reformas, está a manter uma situação que prejudica a economia e a ser, desnecessariamente, suportada pelos contribuintes.

A implementação destas medidas pode poupar ao Estado 12.5 mil milhões por ano, o equivalente a 6% do PIB, sem qualquer prejuízo para a economia portuguesa. Com esta poupança, o déficit orçamental desapareceria e seria possível uma redução significativa da carga fiscal, nomeadamente no IRS e no IRC. Pode-se assim perguntar porquê que o actual Governo se recusa sequer a tentar reduzir despesas públicas inúteis como estas, tornando possível um maior nível de investimento e consequentemente um maior crescimento económico? Com maior crescimento seriam também possíveis salários mais altos para todos os portugueses.

Esta política deve-se certamente a princípios ideológicas, pois aparentemente para os partidos de esquerda quanto mais o Estado gastar melhor! Não terá contudo chegado o momento do Governo pensar menos em ideologia e mais no aumento das condições de vida e nos salários dos portugueses?

A alternativa é continuarmos a caminhar no sentido de sermos o país mais pobre da Europa dentro de cinco anos. Essa não é certamente a forma de defender o povo, como o actual Governo apregoa.

CRESCIMENTO ECONÓMICO   ECONOMIA

COMENTÁRIOS:

Daniel José:  é enviar o artigo para Belém e adicionar ao plano leitura obrigatória no 12

António Lamas: Um excelente artigo que devia ser de leitura obrigatória no Terreiro do Paço pelo ex-presidente da Câmara de Lisboa.  Porque é que que tantos comentadores, tantos jornalistas e sobretudo as oposições à direita não fazem da redução da despesa gorda do Estado, uma prioridade.                      observador censurado: Este artigo devia ser de leitura obrigatória. "...  torna-se evidente que a redução do déficit orçamental deveria ter sido obtida através da redução das despesas públicas, e não pelo aumento dos impostos. Porque é  que Portugal tem tido o "cancro" de ter Ministros das Finanças e Ministros da Economia que nunca tiveram a responsabilidade de gerir uma empresa? "... não questionar nenhuma despesa existente no sector público, apesar da clara falta de eficiência com que os cidadãos são atendidos ou da fraca qualidade dos serviços prestados..." Em Portugal, há pessoas a passar fome para terem dinheiro para pagar um seguro de saúde porque o Estado, com o maior número de funcionários públicos de sempre e a maior carga fiscal de sempre, não presta esse serviço. Assim, não deveriam os Orçamentos do Estado serem chumbados por serem, salvo melhor opinião, inconstitucionais? De facto, o Estado confisca o dinheiro dos cidadãos de forma desproporcionada para os serviços que presta. Finalmente, o governo está a ir em contramão à racionalidade preconizada pelo autor pois, por exemplo, recentemente, criou o Ministério da Saúde nº 2.

 

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