Lembrar os nobres exemplos nacionais que
nos ajudam a elevar a auto estima, em meio de muito sentimento de espanto
pesaroso. Poderiam servir de ponte de passagem para outras margens… Mas para
ser herói a valer, Passos Coelho devia sacrificar-se e concorrer – já se sabe
que não por ambição pessoal, mas por heróico esforço de salvação da nação…
O
exemplo
Não há segredos, é isto. Mas com isto – a força da
vontade, a indispensabilidade do esforço, o motor da ambição – chega-se ao cume
da montanha. Seja ela qual for.
MARIA JOÂO AVILLEZ OBSERVADOR, 26 out 2022,
00:251
1Há muitos anos já, estava-se em 2005, após o ter
entrevistado na SIC Notícias escrevi a seguir no Expresso um artigo sobre ele,
“O melhor aluno de si próprio”. É verdade: António Horta Osório foi (sempre) o melhor aluno de si mesmo. Comecei por
dar por isso quando muito antes, no inverno de 2001, lhe fizera a primeira
entrevista na mesmíssima SICN, era ele um jovem de trinta e tal anos. Numa
inocente insegurança e por entre a timidez constrangida do seu primeiro dia
televisivo, havia porém já a impressão digital do trabalho e da determinação.
Começou a haver resultados e a seguir, eles deram nas vistas. O que é outra
forma de dizer que havia mérito, substantivo do qual pouco se gosta na língua –
e na vida! – portuguesa e ao qual defeituosamente ainda menos se atende. Contrariando
o costume, António Horta Osório aprendia consigo mesmo a refinar uma mistura
das palavras que mais gostou sempre de usar e praticar: “educação”,
“cultura de mérito,” “trabalho”, “responsabilidade”, “sociedade civil”. A mistura rendeu, os talentos dela saídos, também. Todos
privilegiavam os valores, nenhum o dinheiro.
Nesse
ano de 2005 fiquei com a certeza que o país tinha razão em levá-lo a sério: concretizara
uma rendilhada operação estratégica – onde o risco valsava com o desafio e este
com a responsabilidade – focada na transformação empresarial do
ex-Totta&Açores, Crédito Predial Português e o Santander Portugal, fundidos
numa só instituição bancária, o Santander Totta.
(É-me
irresistível não lembrar que no Programa de Responsabilidade Social e
Corporativa da nova instituição, a maior fatia era destinada ao desenvolvimento
do conhecimento e ao ensino universitário. Não por acaso.).
2Em 2010 o interesse e a
curiosidade eram grandes: como iria agir António Horta Osório, o português
escolhido pelo governo britânico, para a tão incerta e complexa empreitada de
salvar o Loyds Bank do precipício em que caíra o maior banco britânico? Foi uma
grande vitória profissional mas no verão de 2011, quando fui a Londres
entrevistá-lo á sede do próprio Loyds — desta feita para o Diário
Económico — ninguém a anteciparia, talvez nem ele. E no entanto, uma década
depois, e com um duro esgotamento pelo meio, Horta Osório devolveria aos
ingleses uma instituição já desintervencionado, com custo zero para os
contribuintes. Uma façanha. (Devolvia sobretudo à Grã-Bretanha o orgulho num
dos seus maiores e mais antigos ex-libris, agora ressuscitado e de saúde.)
Londres também notara a
qualidade do cidadão: entregaram-lhe a presidência de uma reputada instituição
cultural (Wallace Collection), premiaram-lhe o voluntariado que fazia – em
saúde mental, por exemplo – a Rainha agraciou-o: Sir António Horta Osório.
Saltando
no tempo (mas não ainda de protagonista): há dias na CNN, sentada à sua frente,
fiz perguntas mas desta vez já não a um gestor internacional da banca mas
entregue hoje, com 58 anos, a tarefas não executivas, dentro e fora de
Portugal. Tínhamos combinado esta entrevista em 2021 quando Horta Osório
foi para o Credit Suisse mas a saída prematura de Zurique um ano e tal depois,
deixou-me no limbo de um adiamento indefinido. Há dias, houve reencontro
televisivo. Fecundo como sempre. E nisto, do écran saiu um forte
desafio aos portugueses – a “todos” e não só aos “eles” dos governos – para que
fossem mais “ambiciosos”, o país também é com eles: porque não, cada um à sua
maneira mas com o mesmo empenho, participarem da “ ambição” de – por exemplo –
“duplicar o valor do PIB em dez anos”?
3Podia
ter aqui contado as “boas histórias” que Horta Osório colecciona, as pessoas
que conheceu, os seus anos londrinos, as conversas que aí teve com o então
Príncipe Carlos, hoje Rei, as vivências culturais, os antiquários, a própria
Londres. Preferi falar dele, mesmo que brevissimamente. É que no fundo, só uma
coisa interessa e não são honrarias, mesmo que douradas, o dinheiro mesmo que
muito, ou as “facilidades” mesmo que todas, mas o exemplo: trabalho,
responsabilidade, esforço, noção de serviço. Postos em marcha pelo combustível
da ambição.
Não
há segredos, é isto. Mas com isto chega-se ao cume da montanha. Seja ela qual
for.
4Pedro
Passos Coelho (e cá está o
outro protagonista desta crónica) estará certamente atónito de o terem
subitamente tirado de casa e atirado para o ar mediático; de – malgré lui – ser
“tido” como candidato presidencial; de – muito malgré lui – ser
chamado de D. Sebastião… Não é isso
porém o que o traz hoje a esta página. É uma vez mais a importância do
exemplo. No caso, o seu exemplo. Num país politicamente à míngua deles, não
é coisa pouca. Tal como o cavalheiro acima, Passos Coelho é de outro
campeonato. Falo de singularidade, decência, inteligência política.
5Começando
pelo princípio: Passos exemplifica a singularidade, porque tudo o distingue na
política portuguesa. Desde logo pelo que fez e não tenho outro remédio senão
recordá-lo – a narrativa oficial, sete anos depois, mantém aceso o lume da
falsidade. Em 2011, com uma banca rota à porta, Passos Coelho tomou o país em
mãos. Cinco anos de pesadas penas e pesadíssimos sacrifícios depois, ganhou de
novo as eleições. Pelo caminho dispensou a última tranche do empréstimo
internacional, evitou um segundo resgate, pôs o país a crescer (o crescimento
emitiu os seus primeiros sinais no final de 2013). Fabricando ainda uma
almofada financeira que viria a fazer um arranjão aos socialistas já sentados
em S. Bento, sobre a vitória do centro direita, expeditamente corrida dali.
Mas o ex-chefe do Governo da coligação PSD/CDS é também um exemplo de
singularidade pelo modo como enfrentou o cerco logo montado, país fora:
agindo sozinho – lembram-se? – contra tudo e todos: as oposições, a media, a
rua, o comentariado, as associações patronais que raramente deram a cara, as
“elites” que nunca deram, as reticências do próprio CDS, parceiro de coligação;
e é-o ainda pelo modo como indiscutivelmente recentrou Portugal na
credibilidade europeia.
Isto
por um lado. Por outro, há a decência.
Sempre houve, mas agora voltou a reparar-se nela no modo como tendo saído de
cena, disse a verdade: permanece fora de cena. Longe da praça pública, alheio
aos écrans, ao comentário, às manchetes. Nunca cedendo e menos alimentando a
telenovela diária da política nacional. Está aliás a anos-luz dela: não se lhe
arranca uma palavra, um desabafo, uma opinião, uma interferência. Não é de hoje
mas é impossível não o sublinhar. (De hoje, são os que
temendo-o, o armadilham, mas não há aí grande novidade, temem-no desde o
princípio.) E finalmente há a sua inteligência
política: se Pedro Passos Coelho tiver ambições de mais tarde regressar aos
palcos, é assim mesmo que se deve fazer, recato e silêncio; se tal não vier a
ocorrer, deu o exemplo. De uma singularidade inspiradora, de decência, de
inteligência.
Também
é assim que se atingem os cumes mais altos das montanhas.
SOCIEDADE PEDRO PASSOS
COELHO POLÍTICA BANCA ECONOMIA HORTA OSÓRIO
COMENTÁRIOS:
Fernando CE: Concordo com a apreciação que faz destes dois homens.
Conheço com maior propriedade o PPC por ter sido o PM do nosso país. Apesar de
ter sido prejudicado pelos cortes salariais, entendi que eram sacrifícios
necessários. Devo-lhe a coragem de não ter desistido. Nunca perdeu a cabeça nos
embates com os seus adversários políticos e sobretudo nunca perdeu a boa
educação. Obrigado, Pedro Passos Coelho. Alexandre
Barreira: Duvido. Duvido mesmo. Que o
Dr. Passos Coelho regresse à política. Da forma como o seu próprio partido o
tratou, duvido! L. Soll: Tivéssemos mais gente assim, ou dito doutro modo, não vivêssemos nós
entre interesses instituídos na política, na justiça, nos negócios e até na
comunicação social, que premeiam, valorizam, e tantas vezes escondem a
mediocridade, a incompetência, a desonestidade, o clientelismo e a falta de
qualquer ética, dizia eu, tivéssemos nós mais gente assim e Portugal caminharia
certamente para melhores patamares. Mas não temos! Não porque eles não existam
- porque existem certamente - mas porque os que quisessem e pudessem posicionar-se,
sabem bem que seriam trucidados à nascença. MGR Lisboa: PPC
é um homem extraordinário cuja dignidade não se compara à de mais nenhum
político no activo. Votarei nele, para PM ou PR, com a certeza de que não nos
envergonhará. Infelizmente não é coisa que actualmente possa dizer.
António Lamas: Dois bons -
excelentes - exemplos de honestidade, de capacidade, de inteligência e até de
humildade. Ficou por indicar dois bons exemplos do contrário disto tudo: Costa
e Marcelo
Nenhum comentário:
Postar um comentário