De Alberto Gonçalves, como sempre genial nas suas ilações, que nos convém,
de resto, aceitar, no passa-culpas do nosso comodismo e vitimização por
conveniência própria.
São os políticos, estúpido!
Para não beliscar ilusões, vamos
aprimorar a receita do desastre fingindo que o combatemos. Estacione o
automóvel, desligue o aquecedor, passe frio e fome. Em suma, obedeça aos
políticos e proteja-se.
ALBERTO GONÇALVES
OBSERVADOR, 29 out 2022, 00:196
Sinto-me
resfriado. Metade das pessoas que conheço também. Os leigos dizem que anda para
aí uma virose. Os médicos, pelo menos dois, dizem que isto é o resultado de
quase três anos de protecções, distanciamentos e clausuras: protegemo-nos
tanto que ficámos permeáveis a qualquer irrelevância.
Os
actos têm consequências, e o intróito acima pretende ser uma analogia. A fim de
enganar pategos, atribui-se a inflação vigente à Covid e à guerra na
Ucrânia. Os senhores que mandam no mundo culpam a Covid e a guerra. Os
senhores que mandam em Portugal culpam a Covid e a guerra. Os senhores que
cumprem as ordens dos senhores que mandam culpam a Covid e a guerra. E os pategos
repetem a cantilena que, com a eventual ressalva do sr. Putin, isenta toda a
gente de comprometimentos na profunda desgraça em que nos vemos enfiados: a
Covid e a guerra.
Pondo
de lado a toleima que já era anterior a 2020, do dinheiro barato às dívidas em
rédea solta, dos “investimentos” públicos à gordura dos estados, a parte da
guerra desmente-se com um simples gráfico, daqueles que exibem a curva
inflacionária lançada para o alto bem antes de Fevereiro de 2022. A parte da
Covid não é muito mais difícil de desmentir. Mesmo não sendo especialista, ao
contrário das incontáveis personagens que iam às televisões prever o
exacto oposto do que acabaria por acontecer,
acho esquisito que, sozinho, um vírus respiratório consiga fechar
fábricas e negócios, prender a população em casa com salário e conta na
Netflix, estrafegar a produção e as cadeias de distribuição e a oferta face à
procura, imprimir dinheiro com frenesim de modo a patrocinar a empreitada e,
por uns tempos, imaginar que a empreitada não teria custos.
Sucede que, logo em Março ou Abril de
2020, os custos eram óbvios. Lembro-me de, numa violação gravíssima das regras
então em vigor, dar um demorado passeio pela cidade com um amigo de infância.
Ele mostrava-se fascinado com a estética: as ruas vazias, as estradas sem
carros, os comércios fechados, o silêncio. Eu mostrava-me preocupado com a
ética, e informava-o de que o intrigante cenário de “Twilight Zone” custaria
caro, e seríamos nós a pagar. As cautelas, que decerto se justificavam nas
famosíssimas duas primeiras semanas, talvez não se justificassem, com maiores
ou menores “emergências” e “calamidades”, nas subsequentes 120. Por algum
motivo, em cem anos o Ocidente sofrera dois conflitos mundiais e três epidemias
similares ou maiores sem promover o colapso deliberado do sistema económico. À
época, perante o risco havia estadistas empenhados em preservar o possível.
Hoje, os “estadistas” que nos tocaram em sorte – leia-se que escolhemos –
apressaram-se a destruir o inimaginável. Foram eles, e não a Covid, que
arrasaram a economia.
E
foram eles, com um orfeão de tontinhos a reboque, a jurar que a economia não
merecia a perda de uma única vida. Suponho que os “estadistas” confundissem a
economia com um curso universitário ou uma série de colóquios aborrecidos, e se
esquecessem que, numa realidade alternativa à das pândegas financiadas pelos
contribuintes, os contribuintes têm de comer. Não há grande sentido em tentar
salvá-los da doença para os matar com a cura.
A chatice é o sentido não caber nesta
história. Nem a lógica. Nem o bom senso. Não
tivessem caído em desuso, tais minudências levariam a que os coveiros do buraco
em que apenas começámos a cair estivessem a aguardar julgamento por crimes
sortidos. Ou, no mínimo dos mínimos, pedissem desculpa e a demissão por motivos
de incompetência terminal. Nem pensar: lá fora e cá dentro, continuam nos
seus cargos, inchados de razão, a culpar a Covid por aquilo de que a Covid era
incapaz, a culpar uma guerra que pelos vistos possui efeitos retroactivos, e a
adicionar ao caldo a culpa das fatais “alterações climáticas”, que doravante
ajudam a perpetuar o medo e a legitimar a miséria de todos excepto dos
iluminados que se afligem com elas. Nos EUA, renovou-se há dias o estado
de emergência para a pandemia que o sr. Biden declarou acabada em Setembro. Na
Europa, a generalidade dos países mantém presente a ameaça dos “confinamentos”
e das loucuras que calhar sob os pretextos que calhar. E em
Portugal, coitadinhos de nós, “discutiu-se” um Orçamento que inaugura uma idade
das trevas sem que algum partido admitisse o elefante na sala.
O
elefante é enorme, tão grande quanto a cumplicidade dos partidos nas decisões
que nos deixaram de rastos, a agradecer a devolução de 125€ de um saque
desmesurado, e a tornar obsoleta, mediante cadeado, a abertura fácil das latas
de atum. Se nos encontramos em descida acentuada rumo a uma pobreza sem
nome devemo-lo, sobretudo, a políticos sem noção e políticas sem oposição,
que assim resolveram, subscreveram e, na maioria das vezes, aplaudiram. Com
entusiasmo, nos casos de PS, PSD e BE. Com receio de afugentar votos entre um
povo mascarado, nos casos de Chega, IL e PCP. Todos participaram na demência.
Salvo murmúrios erráticos, nenhum questionou a respectiva factura. Agora
que vivemos de facto uma calamidade, os partidos debatem a situação sem
beliscar a sua origem – como o BCE sobe juros não porque, cito uma frase com
dois dias, “faz o que tem a fazer”, mas porque durante anos fez o que não devia
ter feito, ou seja, sujeitar as impressoras a provas de esforço. As impressoras
passaram com distinção. Nós não.
Repito,
que as cabeças são duras e a amnésia galopante: por si, a
Covid não causou nada que um microorganismo dispensável não tenda a causar. O
resto, uma coisa aparentada com um suicídio colectivo, tem mão humana: é de
autoria dos governos que o decretaram, com o aval dos tristes que o toleraram e
dos zelotas, pagos ou voluntários, que o defenderam. Por cegueira ou desígnio,
chegamos aqui por escolha política. E esconder o que nos trouxe até aqui nunca
permitirá descobrirmos maneira de sair. Pior: para não beliscar ilusões, vamos
aprimorar a receita do desastre fingindo que o combatemos. Entretanto ponha a
máscara, estacione o automóvel, desligue o aquecedor, passe frio e passe fome.
Em suma, obedeça aos políticos e proteja-se. O Inverno será longo.
CRISE ECONÓMICA ECONOMIA CORONAVÍRUS SAÚDE PÚBLICA SAÚDE
COMENTÁRIOS: (de 6)
António Silva: O problema é que isto já tem muitos anos. Vem do tempo em que os países não
queriam trabalhar e achavam que transferindo todo o trabalho para os chineses
iriam viver as suas vidas no céu. Erro o deles. Os chineses começaram a fechar
cidades inteiras e as fábricas deixaram de produzir e entretanto no mundo dos
zelosos os bens começaram a faltar. Na Europa, políticos corruptos colocaram a
dependência energética na Rússia e o resto da indústria na China e agora dizem
que a culpa é do Covid. Tudo foi planeado com tempo e quando Trump veio à
Europa e avisou que não achava correcto a Europa estar a depender a sua energia
da Rússia e a estar a dar a essa mesma Rússia dinheiro para que esta depois
investisse em armamento, armamento esse que viria depois a ameaçar a própria
segurança da Europa e que, por fim, teriam que ser os EUA a gastar o dinheiro
dos seus contribuintes para defender a Europa da sua demência, há que dizer que
o homem é doido é que o melhor seria tirá-lo do caminho. Trump pode ter muitos
defeitos mas foi o único político que chamou os bois pelos nomes. Iniciou uma
política de afastamento da China e alertou a Europa do perigo em que estava
envolvida. Pelos vistos tinha razão.
Maria Silva: Excelente! Excelente descrição do guião da maior encenação
mundial das últimas décadas. Quanto a pedir desculpa ou demissão, já vimos comprovadamente
que não acontece. Aliás, só pede desculpa quem faz mal por engano ou distracção. O que não é o caso, já que foi
tudo planeado, encenado e posto em cena propositadamente para justificar um
"crash" financeiro que
estava eminente. Muito obrigada, AG.
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