segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Provavelmente


Temos nós culpa, pascácios que somos, habituados à canga da subalternidade… Há sempre quem se aproveite e saiba gerir o seu sustento, a partir das côdeas do nosso. Hábitos antigos das nossas luzes baças.

As figuras do Estado

A primeira figura do Estado não sabe o que diz. A segunda figura do Estado manobra para vir a ser a primeira. Já a terceira figura do Estado faz de conta que não percebe o estado a que levou o Estado

HELENA MATOS, COLUNISTA DO OBSERVADOR

OBSERVADOR, 30 out 2022, 00:23103

Marcelo Rebelo de Sousa, Augusto Santos Silva e António Costa. Ou dito de outra forma: as três principais figuras do Estado. O primeiro é Chefe de Estado e o mais alto magistrado da Nação (seja isso o que for). O segundo é Presidente da Assembleia da República de Portugal. O terceiro é o Primeiro-Ministro. Marcelo Rebelo de Sousa, a primeira figura do Estado, não sabe o que diz. Augusto Santos Silva, a segunda figura do Estado, manobra para vir a ser a primeira ao mesmo tempo que recupera o silêncio do PS sobre José Sócrates. António Costa, a terceira figura do Estado, faz de conta que não percebe o estado a que levou o Estado.

Augusto Santos Silva, o desaludido. Porque um texto não tem de se arrumar como as cerimónias oficiais, comecemos pela segunda figura do Estado. Este atropelo no protocolo está mais que justificado com a frase proferida pela segunda figura do Estado a trabalhar para vir a ser primeira durante a entrevista à CNN: E quanto às questões a que quer aludir, elas estão em justiça. Deixemos a justiça tratar. Porque eu também sou uma das pessoas que gostará de saber o que é que realmente se passou.”

Esta frase faz parte da resposta de Santos Silva à pergunta: “Foi, de facto, um defensor muito forte de José Sócrates. E há quem diga que não fez autocrítica suficiente. Não se apercebeu de algumas das coisas de que depois José Sócrates foi acusado e que estariam a acontecer?” e é um condensado sobre a arte da desresponsabilização.

Santos Silva começa por não nomear o assunto por que estava a ser interrogado, são apenas as “questões a que quer aludir”. Em seguida recorre ao mantra desculpabilizante do “Deixemos a justiça tratar.” Por fim, rematou o assunto com uma afirmação que diz tudo sobre o que realmente pensa: “eu também sou uma das pessoas que gostará de saber o que é que realmente se passou.” Realmente? Porquê realmente? Aquilo que a investigação policial revelou e as palavras de Sócrates em sua defesa nos mostraram sobre a desrazoada vida do ex-primeiro-ministro não chegam para que Santos Silva saiba que, independentemente daquilo que a justiça vier a decidir, estamos realmente perante um escândalo político?

Na entrevista à CNN ficámos a saber também que a segunda figura do Estado faz sandes e lava louça (eu prefiro fazer máquinas com roupa seleccionada por cores mas aceito sugestões para sandes que resistam a umas horas de calor na praia). Mas a segunda figura do Estado, que para mais quer ser primeira, tem perceber que das sandes e da louça só fala se quiser. Já sobre a actuação de José Sócrates a opção não se coloca: deve-nos explicações não sobre Sócrates mas sobre si mesmo. Não viu? Não percebeu? Ou acha que não existe nada de criticável? E também temos de saber porque recusou que fosse mostrada no parlamento a exposição “Totalitarismos na Europa”, dedicada aos crimes cometidos por regimes fascistas e comunistas em diversos países europeus. Ou porque bloqueia a atribuição de uma vice-presidência ao Chega

 Marcelo Rebelo de Sousa, o estrafegado: “Aumentar juros a este ritmo não é para curar o doente, é estrafegá-lo“. Marcelo, a primeira figura do Estado, foi à Gulbenkian. Ouviu Vítor Constâncio e pouco depois aconteceu o momento “Marcelo Rebelo de Sousa a falar aos jornalistas”, sucessor do momento “Marcelo a descrispar”. Os momentos “Marcelo Rebelo de Sousa a falar aos jornalistas” sucedem-se a um ritmo avassalador. Em queda nas sondagens, o presidente reage perante os microfones como uma fada diante de uma varinha de condão partida: repete os gestos e os truques, interiormente esperando que o feitiço aconteça de novo e que a magia da popularidade regresse. Cada falhanço acentua o dramatismo da tentativa seguinte.

As declarações de Marcelo a propósito da subida das taxas de juro por parte do Banco Central Europeu (BCE) não são sobre a subida das taxas de juro nem sobre o BCE e muito menos sobre os impactos desta subida. O estrafegado que estrebucha nas palavras de Marcelo afinal é ele mesmo, pois é ele quem se sente a estrafegar. Durante anos as intervenções do BCE garantiram juros baixos e permitiram a Portugal manter a ilusão de que o crescimento resultava da conjugação entre o optimismo da primeira figura do Estado e o optimismo irritante da terceira figura do Estado: devidamentos adicionados e agitados em noticiários festivos, os dois óptimos geravam um país positivo, até o melhor do mundoA inflação veio pôr fim a esta auto-ilusão. E Marcelo estrafega porque não vislumbra saída. Ou melhor dizendo começou logo a vislumbrar quando teve aquele momento “falar aos jornalistas”: vai atacar a subida dos juros e também o BCE. A primeira figura do Estado entrou em auto-estrafegamento e não se vê como se libertará do nó que colocou à volta do seu próprio pescoço. Quanto a nós devemos dar graças por estarmos no euro pois alguém tem dúvidas sobre o que nos teria acontecido caso tivéssemos moeda própria? Venezuela da Europa seria a definição mais apropriada.

António Costa. O contrariado. A terceira figura do Estado procura uma forma de deixar de ser a terceira figura do Estado. A maioria absoluta tornou-se uma armadilha para António Costa. Em primeiro lugar, a maioria absoluta privou-o daquilo que gosta e sabe fazer: gerir equilíbrios até atingir aquele zénite que se basta a si mesmo ou, na mais excêntrica das situações, em que se faz alguma coisa para que tudo permaneça na mesma. Em segundo, a existência de uma maioria absoluta veio lembrar, sobretudo àqueles que não são figuras do Estado, que as figuras do Estado têm agora condições para fazer reformas. Ora a terceira figura do Estado não quer reformar nada. Que lhe lembrem que tem condições para o fazer causa-lhe uma irritação nevrálgica. Em terceiro, o fim da maioria absoluta deixou os seus antigos parceiros livres para serem oposição. E a terceira figura do Estado sem paciência para os ouvir.

Em resumo, a terceira figura do Estado quer continuar a ser figura mas de preferência fora deste Estado. A segunda quer ser primeira a vários custos e a primeira esquece-se do Estado.

MARCELO REBELO DE SOUSA   PRESIDENTE DA REPÚBLICA   POLÍTICA   AUGUSTO SANTOS SILVA   PAÍS   ANTÓNIO COSTA

COMENTÁRIOS:

bento guerra O censor foi ver se havia "respeitinho"...               António Lamas: Três Tristes que para mal dos portugueses coincidiram no tempo. Dá vontade de pedir um Filipe II. Se Marcelo sofre de infantilidade e vaidade, Costa de má educação e sonha com a aplicação do Princípio de Peter, o pior é o cerebral SS. Cínico, maldoso, intriguista, podia ser um ideólogo de uma qualquer ditadura. Está quase              Vitor Batista Fenomenal! já li grandes crónicas da Helena Matos mas esta é sublime, deveria ser mostrada nas escolas, e ser lida em voz alta perante todos os portugueses, sejam eles analfabetos, analfabrutos ou com outra "qualidade" qualquer . Esta trupe ter cometido tropelias no passado até se desculpa, agora o que não tem perdão é um povo que é chamado a gerir o seu próprio destino, não aceitar a verdade que lhe gritam de que o Rei vai nu, condenaram o país à indigência e à miséria, como se pode constatar com o aumento avassalador dos números de pobres, de indigentes e subsidio dependentes.  Continuem a dar-lhes corda que eles agradecem.            Tristão: Eu ainda me lembro da segunda figurinha de estado que quer ser primeira dizer o seguinte sobre um tal figurão chamado Sócrates: "Sócrates não merece essa nódoa no currículo". A nódoa era ser condecorado por Cavaco - coisa que este se recusou a fazer como é evidente. Acrescentava ainda “ que Cavaco não o deve fazer - haverá outro Presidente com essa "honra"”.  Enfim, ter memória dá um certo jeito..            Madalena Sa: Oh Helena Matos não pode ser melhor o seu artigo! Estas 3 figuras são o verdadeiro descalabro dum País em ruínas! não há salvação! Foi o povo que as elegeu! Porca miséria!              Carlos Quartel: Três no podium, a dificuldade é ordená-los. Mas faça-se um esforço e pode ser que se considere Marcelo o menos mau. Parece ser desastre, inadequação, ausência de sentido de Estado, mas não acinte nem  ódios recalcados.  Não é uma figura sinistra (aí Santos Silva é o maior) nem um arruaceiro agressivo, onde Costa é imbatível. Mas nem Marcelo consegue dar bom gosto à caldeirada .....                Maria Tubucci: Extremamente realista, HM. A divindade demoníaca tríplice, o filme, não precisa de sair de casa, sente-se no seu sofá e aprecie, a realidade supera qualquer ficção. O filme foi financiado por si, contribuintes, o enredo foi selecionado pelos votantes PS e   abstencionistas, a promoção ficou a cargo da sabuja comunicação social. As personagens principais são: o mafarrico do microfone e das banalidades que assina tudo de cruz, o mafarrico do embelezamento da corrupção da sua famiglia, por fim, o mafarrico do riso sádico que diz tudo e o seu contrário, ao mesmo tempo.  Estes 3 juram a “pés” juntos aos espectadores que os vão levar ao céu, mas na realidade, todas a suas ações conduzem o espectador ao inferno. Olha, da TV vem um intenso cheiro a enxofre!             Antonio Marques Mendes: A segunda figura bloqueia como qualquer porteiro de discoteca. Agora querer passar de porteiro a residente já parece de mais. Ou talvez não, se olharmos para o residente actual. Pobre Portugal.               João Eduardo Gata: Ou seja, Portugal merece os TRÊS IDIOTAS que governam este País Falhado.              manuel rodrigues: Os três da vida airada: Cocó, Ranheta e Facada. É só escolher              Rui Teixeira: E, além de tudo o que a H. M. bem diz, os 3 são, entre os seus pares da UE, os mais feios. São feios como escarros! O peru, a "hiena trotskista e o sapo!            Pontifex Maximus: Os três estarolas que governam o país mais patético da Europa, que aplaude uma instituição quando actua contra a evidência e a censura quando corrige a sua absurda conduta anterior. Ainda se lembram dos juros baratos porque a inflação era passageira e a FED já carregava nas tintas dos juros? É dessa gente que se trata, esquecendo que o BCE imprimiu toneladas de notas para os governos brincarem ao tio Patinhas, pagando para as pessoas ficarem em casa a ver a Netflix enquanto a Covid mudava as regras centenárias da economia… e agora tem que retirar esse dinheiro da economia pois não corresponde a riqueza criada nesse período!             Joaquim Almeida: Três admiradores do Lula... Estamos  em segurança...                José Miranda: Grande Helena! Descrição perfeita destas tristes figuras.          João Floriano: Excelente crónica. A entrevista de ASS é um puro exercício de hipocrisia destinado a endrominar os que ainda acreditam nas boas intenções e competência dos que fingem governar-nos. E infelizmente são ainda muitos. A metáfora de MRS brandindo a varinha de condão para sempre quebrada, repetindo o gesto cada vez que vê um microfone e uma câmara televisiva pelo menos a 500 metros (há aves necrófagas que detectam o repasto a longas distâncias), é magistral. Imaginemos MRS como a Sininho voando à volta do seu Peter Pan, António Costa. Uma Sininho grotesca a bem da verdade mas coadjuvante de um Peter Pan que recusa reformas, tal como o Peter Pan do conto infantil se recusa a crescer.  Penso que há uma pequena gralha no texto ou então sou eu que não consigo perceber o sentido: Em terceiro, o fim da maioria absoluta deixou os seus antigos parceiros livres para serem oposição. E a terceira figura do Estado sem paciência para os ouvir.  É mesmo o fim da maioria absoluta ou o  seu início?          Zé das Esquinas o Lisboeta: O professor, o aluno do professor e o amigo do aluno do professor... A minha mãe dizia: de tanto andares com um coxo acabas a coxear.               Francisco Marnoto: Isto, com este regime, já não tem conserto! A verdade é que o povo não tem de se queixar, pois elege estas figuras medonhas. Aos jovens e competentes só lhes resta partir, pois não se faz uma revolução numa "Democracia".          Alberico Lopes > ANTONIO MONTEIRO: Ainda duvida que o amigo do Ricardo Salgado é mesmo uma nódoa? Um puro ilusionista?!         Manuel Martins: Não podemos esquecer que tanto Costa como o Augusto foram os ministros principais do  Sócrates...           Joaquim Almeida > ANTONIO MONTEIRO: Para o alto nível de responsabilidade cívica e política que lhe cabe  MRS anda a dizer demasiadas tolices há demasiado tempo —  é facto  tão lamentável como inegável.            Ana Oliveira: os media na generalidade parece q estão focados na formatação do povo com a agenda esquerdista dominante.               Cisca Impllit: Augusto Santos Silva nem para presidente. da AR quanto mais do País.  Um trio dispensável; até, no meu entendimento, desprezível.            José Paulo C Castro > jose ricardo da cruz pereira: Os professores ensinaram-nos assim. Frequentaram universidades de esquerda para serem militantes na sua profissão. É a escola de jornalismo que temos: a do jornalista militante que nem sai da redação para fazer o trabalho. Não é informar sobre o mundo. É informar o mundo. A agenda vem logo no ponto um.           Geraldo Sem Pavor: excelente artigo. O humor é sibilino e seria engraçado se o lodo em que estamos não fosse tão deprimente.               Jorge Barbosa:  Helena Matos já não lhe dou parabéns porque todos os seus artigos são excelentes. Agradeço-o, a si e ao Observador. Sobre as tristes personagens nada de bom a esperar. O 1° e o 3° tratarão de escapar ilesos das suas indignas magistraturas enquanto o 2°, tudo fará para em proveito próprio, branqueando o seu passado, chegar a PR. Estes malefícios agradeçam-se aos cidadãos               paulo mariano: Reles democracia. Reles políticos. E depois admirem-se que o CHEGA seja a terceira força politica. CHEGA que não interessa a ninguém. Portugal adiado, com elites sem nível nenhum.            Maria Madeira: Mais um excelente artigo de Helena Matos.                Liberales Semper Erexitque > Manuel Martins: É tudo esterco fabricado na escola de formação a que eu chamo o gutterrismo. Esse indivíduo, o que voou para a ONU assumindo o estatuto de vampiro global, deixou toda uma escola em Portugal, que nunca saiu realmente do poder desde 1995.             Amigo do Camolas:  Os três no pascácio de Belém :   «ACosta - Olá meus queridos! São servidos?  Augusto Santos Silva - Chega sempre para mais um! Estão reunidos na mesa do orçamento para saber para onde vamos e de onde é que vimos?   ACosta - Não. Por acaso ainda não falamos para onde vamos a seguir... mas eu, depois desta almoçarada, para ser sincero, ia beber uma bica e mamar uma amêndoa amarga!         Augusto Santos Silva - Por isso é que ele ( o Marcelo) veio para podermos beber à vontade que é ele que conduz - e rápido.  Marcelo- Eu é que sou o presidente da república. ACosta - Exactamente. E que assuntos profundos é que vocês vão tratar?     ACosta - Assuntos profundos como?   Augusto Santos Silva - Isso é nas almoçaradas na nossa casa do povo, nas nossas não! Nós como as três figuras mais importantes do estado discutimos outras coisas.  ACosta - Mas também muito importantes, tais como, o que é o jantar amanhã!      Augusto Santos Silva - Ou onde vamos almoçar amanhã!    Marcelo - Não, não. ACosta - Não o quê?   Marcelo - Eu é que sou o presidente da república! ACosta - Já sabemos Marcelo!   Augusto Santos Silva - Nós ainda o trazemos connosco porque ele tem uma pontaria para feijoadas que nem lhe digo! Mas têm outras preocupações para além do orçamento?        ACosta - também nos preocupamos com a bebida...  Augusto Santos Silva - E lá está, também nos preocupamos com os pobrezinhos como toda a gente. ACosta - É um assunto que nos toca a todos, não é verdade? E se não fosse a maldita direita eu já tinha acabado com ela. Com a pobreza?      Augusto Santos Silva - Não. Com a direita. E isso afecta-vos?   ACosta - Afecta-nos por causa da esquerda. Como a esquerda vai e vem, nunca se sabe quando é a altura deles...  Marcelo - Eu... ACosta - Tu o quê? Tu sabes qual é a altura de te calares?      Marcelo - Não. Eu é que sou o presidente da república.  Augusto Santos Silva - Outra vez? Já sabemos, pá! Só estão aqui os três porque se acham uma espécie de troika?  ACosta - Não. Somos só os três porque por onde passamos levamos tudo à frente. Eu, foi o velhote, o Santos Silva é para malhar na direita, e existe o presidente que...  Augusto Santos Silva- Quem?  Marcelo - Eu.  ACosta - Tu?  Marcelo - Sim. Eu é que sou o presidente da república.  ACosta e Santos Silva - Já sabemos! Já sabemos! Chato do Car...  »

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