sábado, 18 de março de 2023

À bom entendeur


Quanto a mim, nunca entenderei, nem com meia palavra nem com profusão delas. Limito-me a transcrever o que o economista Dr. Salles nos transmite, com a ancestral autoridade de patrício romano.

A GUERRA E OS JUROS

HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO, 17.03.23

Nota préviaa informação relevante respeitante às causas da falência dos dois bancos regionais americanos e dos problemas verificados no «Crédit Suisse» foi-me fornecida pelo meu amigo Carlos Traguelho; os floreados e as especulações são da minha exclusiva responsabilidade.

* * *

A política de juros nulos e negativos levou aforradores e investidores a aplicarem os seus capitais em obrigações privadas e públicas. Com a passagem à política de juros positivos, perfilaram-se nos mercados de capitais aplicações alternativas com melhores perspectivas de remuneração o que provocou uma séria baixa nas cotações dos títulos de remuneração fixa. Quem se antecipou na mudança, salvou-se; quem se atrasou, faliu.

Para além das causas descritas e que, para simplificação de linguagem denomino «americanas», ao caso suíço juntaram-se mais dois tipos de causas a gerarem desconfiança: as dúvidas relativas às origens dos capitais à guarda do Banco em causa e a fiabilidade da informação disponibilizada no Relatório e nas Contas relativas ao exercício de 2022. Tudo visto e ponderado, o resultado não podia ser risonho.

* * *

Seguem-se os processos de liquidação dos dois bancos (regionais) americanos e um empréstimo grandioso do banco central suíço ao aflito «Crédit Suisse» para evitar que vá à glória – esperemos que com nova gerência.

* * *

Curiosa coincidência a declaração do maior accionista individual do «CS» )9,9% dos direitos de voto), o Fundo Soberano Saudita, no sentido de que não enviaria mais dinheiro para o dito Banco e a reunião de apaziguamento bilateral Irão-Arábia Saudita por intermediação da RPChina. O que terá o Príncipe herdeiro saudita (Rei de facto) a dizer do Petrodólar? Sadam Hussein poderia dizer-lhe qualquer coisinha se ainda por cá andasse. É que há «coisas» que os americanos não gostam de ver mexidas…

Desconheço o peso relativo do banco suíço nos activos do Fundo Soberano Saudita mas, para todos os efeitos, a tal declaração foi obviamente um «tiro no pé» mesmo que se trate de um chumbinho de uma «Flaubert» pressão de ar num dedo mindinho. Porquê, é relativamente fácil de especular. O problema está em saber para quê.

* * *

Como na valsa, realço três tempos:

Substituição da política de juros negativos (Draghi) pela de juros positivos (Lagarde) e consequentes efeitos sobre a remuneração dos capitais (frugais) e o custo de vida do cidadão comum (mais ou menos consumista e mais ou menos perdulário);

Guerra na Ucrânia e majoração da tensão inflacionista e especulativa;

Realinhamentos e/ou reforço de alianças internacionais dando precaridade especulativa ao cenário mundial.

CONCLUSÃO

Os juros antecederam a guerra e esta nada tem claramente a ver com os problemas bancários.

Salvo melhores opiniões.

Março de 2023

Henrique Salles da Fonseca

Tags: economia

COMENTÁRIOS:

Henrique Salles da Fonseca 18.03.2023  12:09: Meu caro Henrique, muito boa esta tua crónica sobre a crise bancária. Um abraço (e também para o Traguelho, de quem não tinha notícias há muito tempo).👍👍.Manuel Gurdes Vieirra

COMENTÁRIOS:

Henrique Salles da Fonseca 18.03.2023  12:09: Meu caro Henrique, muito boa esta tua crónica sobre a crise bancária. Um abraço (e também para o Traguelho, de quem não tinha notícias há muito tempo).👍👍.Manuel Gurdes Vieirra

Anónimo 18.03.2023 13:20: O Silicon Valley Bank, segundo informação obtida, tinha uma Departamento de Risco algo deficiente e depósitos muito significativos de grandes investidores, de pouca fidelização e que buscavam permanentemente as melhores remunerações (“shopping around”). Tendo o Banco uma política de investimento em obrigações de taxa de juro inferior às que vieram a prevalecer no mercado, com a consequente desvalorização daquelas, viram-se na necessidade de as vender com prejuízo para fazer face aos levantamentos de importantes depósitos, com a consequente falta de liquidez. O tema que preocupa é a eventual repercussão dos casos americano e suíço na restante Banca. Nestas matérias, sem criar alarido e alarme injustificáveis, deve ser-se prudente e deixar falar quem tem autoridade e legitimidade para tal. Desde há 2500 anos que sabemos, por Heráclito, que nenhum homem pode banhar-se duas vezes nas mesmas águas do rio, pelo que será conveniente que não se repita o cenário de afirmações de há apenas uma dezena de anos.
Fazes
bem em te referires aos petrodólares. O Iraque, de Hussein, o Irão, dos aiatolas, a Venezuela, de Chaves, a Líbia de Kadhafi foram Países que ameaçaram abandonar o dólar dos EUA como moeda de pagamento do petróleo. Sabemos o resultado das medidas para manter o status quo. Quanto ao 1º tempo da valsa, o normal é que os juros sejam positivos, e não próximos de zero ou mesmo negativos. Recordo-me de haver contratos de crédito firmados antes da crise da década passada, em que taxa de juro para o cliente (soma da Euribor e do spread) passou a negativa, pela descida acentuada da Euribor, o que significava que o cliente em vez de pagar juros recebia-os!...
Estamos atualmente perante uma
realidade penalizadora: inflação relevante, em termos europeus, e taxas de juro a crescerem significativamente
. Nós, Henrique, que atravessámos cenários confrangedores, nas décadas 70 e 80, sabemos dar o devido valor à situação actual. Infelizmente, não prevejo que a situação melhore substancialmente nos próximos tempos, pois as Autoridades competentes subestimaram a situação e não actuaram com a prontidão e profundidade necessárias. Recordas-te de ouvir dizer que a inflação era ligeira e passageira, para depois passar a ser não tão ligeira nem tão passageira, para, finalmente, ser problema? Não querendo entrar em coisas concretas nem fazer qualquer apreciação suscetível de controversa, mas não resisto a acrescentar o seguinte sobre taxa de juro fixa. Quando os Bancos oferecem este tipo de taxa são conduzidos, eles próprios, a obter cobertura para esse risco, pois sendo o seu passivo (depósitos) de taxa de juro variável, se não o fizerem correm o chamado risco de taxa de juro. Então, ao fazerem essa cobertura (“swap”) suportam um custo adicional que passam para os clientes, obviamente. A experiência mostra que a adesão por parte destes existe quando a taxa fixa está abaixo da taxa variável. Logo que há inversão da situação, procuram passar para a taxa variável. Mas aí surge o problema, pois os contratos de taxa fixa são acompanhados por um período em que essa alteração não é possível ou, então, é-o com o pagamento de uma penalização significativa. Daí, ser discutível a utilidade deste tipo de empréstimos. Sobre a tua conclusão, eu matizaria mais as afirmações: Sem dúvida, e isso já por diversas vezes o dissemos nos teus posts e nos meus comentários, que o início da inflação precedeu a guerra, mas foi agravada por esta. A subida das taxas de juro tenta combater a inflação e concorreu, a par com outros problemas, para que os Bancos em causa quebrassem ou entrassem em crise. Porém, é preciso ter em atenção que é mais arriscado gerir a Banca em cenário de taxas de juro mínimas ou negativas do que em cenário de taxa de juro com o nível actual. Grande abraço. Carlos Traguelho P.S. Agradeço e retribuo o abraço do Manuel Guedes Vieira


Nenhum comentário: