sexta-feira, 20 de setembro de 2019

Nada feito

De facto, parece que quanto mais se mexe na lama mais ela se avoluma e fede. Os casos brotam, cada vez mais desconcertantes, tapete de tortulhos no chão passivo da nossa habituação. Admiro João Miguel Tavares, pela sua coragem denunciante.
Entretanto, descubro os textos do “A BEM DA NAÇÃO”, enviados por Henrique Salles da Fonseca, que servem de complemento ao de JMT, juntamente com um comentário, como sempre pertinente de Carlos Traguelho.
E por isso os coloco. Sem riso, apesar do tom humorístico do 3º texto, ai de nós.
OPINIÃO
O absoluto escândalo do caso Rui Rangel
Porque é que os jornalistas não perguntam aos líderes partidários se acham normal viverem num país onde um juiz suspeito de corrupção continua a julgar casos de corrupção?
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 12 de Setembro de 2019
Deixem-me recordar-vos algumas manchetes e títulos de jornais entre Janeiro e Maio de 2018: “Juiz Rui Rangel suspeito de ter vendido decisões judiciais”; “Rangel devolve 80 milhões a banqueiro [Álvaro Sobrinho]”; “Sobrinho alvo de busca por suborno a Rangel”; “Juiz suspeito de corrupção, fraude fiscal e tráfico de influências”; “Escutas revelam pacto secreto [entre Rui Rangel e Fátima Galante]”; “[Luís Filipe] Vieira paga cunha [a Rangel] com tachos no Benfica”; “[José] Veiga paga corrida [de Rangel] ao Benfica”;Casa e jipe de luxo pagos à vez por corruptores”; “Depósitos em notas na conta do juiz”; “Suspeita de burla pagava contas do juiz Rui Rangel”; “Testa de ferro paga o parto de filha do juiz”.
A lista não é exaustiva, mas penso que dá para ficar com uma noção da gravidade da chamada Operação Lex e das suspeitas que recaem sobre os juízes Rui Rangel e Fátima Galante. Ambos são fortemente suspeitos de escreverem acórdãos judiciais a troco de dinheiro, e de utilizarem um esquema que envolvia advogados para receber subornos, mais um oficial de justiça na Relação de Lisboa capaz de viciar sorteios, para que determinados processos fossem parar às suas mãos. Fátima Galante, ex-mulher de Rangel e também juíza desembargadora na Relação de Lisboa, teria a seu cargo a escrita de acórdãos em nome do ex-marido, de acordo com as suas indicações.
Não há nada mais trágico para a justiça portuguesa do que a suspeita de que possam existir juízes corruptos. Por isso mesmo, Rangel e Galante foram impedidos, em 2018, de continuarem em funções. O despacho que os impedia de exercer justificava-se, e bem, com os indícios de “uma muito grave, dolosa e reiterada violação dos deveres profissionais”, que era “susceptível de se repercutir na sua vida pública de forma incompatível com a credibilidade, prestígio e dignidade indispensáveis” ao exercício das funções.
Só que, entretanto, passou-se ano e meio. Os indícios continuam os mesmos, continuam igualmente graves e dolosos, só que se esgotou o prazo máximo de suspensão preventiva no âmbito do processo disciplinar instaurado aos juízes, tal como prevê o Estatuto dos Magistrados. Como Rui Rangel ainda não foi acusado, o que é que aconteceu? Pois bem: o senhor juiz regressou ao trabalho, como se nada fosse, com o Conselho Superior de Magistratura a dizer que não pode fazer nada. Rangel tem de entrar no modelo normal de distribuição de processos aos desembargadores da Relação de Lisboa.
Manchete do Correio de Manhã desta terça-feira: “Máfia do Sangue nas mãos de Rangel”. Rui Rangel, suspeito de corrupção, que até hoje foi o único juiz a dar razão a José Sócrates num dos seus recursos, vai agora tomar uma decisão sobre a Octapharma, em tempos presidida por Paulo Lalanda e Castro, ex-patrão de Sócrates, num caso que envolve suspeitas de corrupção. Se isto fosse um filme sobre a máfia, nós diríamos que o argumentista tinha exagerado no enredo. Mas Portugal desafia qualquer argumento.
Pergunto: onde está a onda de indignação nacional? Porque é que isto só é manchete no Correio da Manhã? Porque é que não é notícia de abertura dos telejornais? Porque é que os jornalistas não perguntam aos líderes partidários se acham normal viverem num país onde um juiz suspeito de corrupção continua a julgar casos de corrupção? Porque é que não vasculham os programas eleitorais à procura de solução para isto? Um país que aceita sem pestanejar tamanha vergonha é um país sem moral e sem perdão.

HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 19.09.19
DIZ O “BANCO DE PORTUGAL” QUE
Até Julho de 2019, o saldo conjunto das balanças corrente e de capital se fixou em -1633 milhões de euros, o que compara com -616 milhões de euros em igual período de 2018.
E DIGO EU QUE
Este é o caminho que conduz directamente à absorção de mais bancos portugueses (ainda os há?) pelos seus credores estrangeiros;
Numa economia aberta e pouco produtiva, o consumo não só não é motor do desenvolvimento como, pelo contrário, conduz ao descalabro das contas externas;
Só a pobreza da economia produtiva pode justificar que a banca se refugie despudoradamente no crédito ao consumo e à habitação (não tardará muito para que surja nova bolha imobiliária);
A crise portuguesa de 2011 foi há muito pouco tempo pelo que não se admite não haver dela memória viva.
Henrique Salles da Fonseca
COMENTÁRIO
Anónimo, 19.09.2019:Aproveitando o teu título, Henrique, acrescento que o pivot da RTP 1, ao dar esta notícia no telejornal das 20h00, de ontem, dia 18, disse que Portugal estava mais dependente do exterior. Para benefício dos teus leitores invoco que o Banco de Portugal, segundo a imprensa, referiu que a balança de bens (que integra, conjuntamente com a balança de serviços, a balança corrente) passou de deficitária nos sete primeiros meses de 2018 de 7,6 mil milhões (bi) de euros para 9,6 bi, no ano corrente. Acresce que a balança de serviços, que é excedentária, tem ajudado a compensar o défice da de bens, mas desta vez também ela encolheu o seu superavit em 137 milhões de euros.
Importa ainda realçar que, segundo aquela Instituição, nos sete primeiros meses, as exportações de bens e serviços cresceram 3% (2,2% nos bens e 4,6% nos serviços) e as importações aumentaram 7,4% (6,75% nos bens e 10,8% nos serviços). Não querendo transcrever mais números que foram divulgados, permito-me realçar algo que praticamente não se ouve – perante a dependência externa, o PIB, que é muito citado, está a crescer a um ritmo superior ao do Rendimento Nacional (ou Produto Nacional Bruto). Em linguagem simplificada, o PIB reflecte a riqueza do País independentemente da nacionalidade (portuguesa ou estrangeira) das entidades que a gerem, enquanto o PNB é a riqueza que fica para as entidades nacionais, independentemente da sua localização geográfica (no país ou no estrangeiro). Ora as entidades nacionais pagam mais às entidades não nacionais do que recebem destas, daí esse efeito negativo. Permito-me recordar, sem citar de novo, o que escrevi a propósito da balança corrente, como comentário ao teu artigo “Apirexia 1” de 28.8.2019. Agora, Henrique, levantas várias questões importantes no teu artigo. Vou “pegar” no penúltimo item e abordá-lo com pinças, tendo sempre presente as minhas obrigações deontológicas. Há muito tempo, mas também depois de a expressão “A Bem da Nação” ter caído em desuso, havia instituições especializadas de crédito que analisavam os projectos de investimento dos seus clientes, e uma vez aprovado o seu financiamento, a taxa de juro era definida em função do custo do dinheiro para os Bancos, do risco (e garantias) e do prazo da operação, assim como do impacto do projeto no emprego e na balança corrente do país, isto é, se incrementava exportações e/ou reduzia importações. Havia casos e momentos, inclusive para PME´s, em que os projectos de investimento eram financiados ou co-financiados a taxas bonificadas, por Organizações ou Fundos Internacionais, como o Banco Mundial, o Banco Europeu de Investimentos ou o Fundo EFTA, tendo em conta aqueles parâmetros. Todo esse paradigma se perdeu, com o decurso do tempo. Para além disso, o negócio bancário deixou de ser atractivo (acredita!), ou, pelo menos, a sua atractividade reduziu-se bastante e as exigências de capital aos accionistas aumentaram significativamente. A fim de minimizar estas, os bancos tendem a conceder créditos cuja natureza, por exemplo, crédito hipotecário, “consuma” menos capital próprio dos Bancos. Isto é, o modelo de negócio dos bancos passou a ser muito em função das exigências de capital. É certo que o crédito ao consumo é penalizado, nesta óptica, mas possivelmente os grandes responsáveis deste serão as sociedades especializadas neste tipo de crédito e não os bancos. Também é certo que o crédito a PME´s tem alguns benefícios para os Bancos em termos de consumo de capital, mas, tanto quanto me lembro, não há beneficio adicional por se tratar de financiamento a projectos de investimento que conduzam a aumento de exportações e/ou redução de importações. Receio que os bancos tendam a financiar, em globo, a actividade empresarial, através das clássicas contas correntes e, nem sempre, autonomizem crédito aos projectos de investimento. Abraço.
Carlos Traguelho

HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 20.09.19
NOBLESSE OBLIGE
A cena passa-se no interior nortenho, zona rural abandonada pela sorte desde o tempo dos suevos e dos alanos…
Olá, bom dia, Senhora! – diz o novo mestre escola da aldeia vizinha.
Bom dia, meu Senhor! – respondeu a velhota com um molho de carqueja à cabeça.
- A Senhora sabe quem eu sou?
Não sei, não Senhor, mas se é para me roubar, fique sabendo que não tenho nada que preste e só lhe posso dar esta carqueja que fui buscar aos montes antes que lhe botem fogo.
Oh! Senhora de Deus! Não pense nisso; eu não faço mal a ninguém! Eu sou o novo mestre da escola da aldeia e ando a dizer às pessoas que já podem voltar à escola.
Mas eu nunca fui à escola e agora já sou velha para ir aprender isso que o Senhor lá ensina.
Então, quantos anos é que a Senhora tem?
Oh meu Senhor: eu casei aos 20, estive casada 50 até que o meu home morreu vai para 15.
- Então, tem 85.
- Seja! Se o Senhor o diz…
- E tem muita família?
- Tenho, mas está quase toda na França. Só cá me deixaram um neto mas esse também abalou para o Porto.
- E que faz ele no Porto, trabalha?
- Não, Senhor, anda na escola. – diz a velhota toda ufana.
BRAVO! E em que escola anda ele?
- Na escola dos gatunos.
Cai o pano
* * *
Foi durante uma visita oficial a Trás os Montes no início da década de 80 do século XX que esta história me foi contada como absolutamente verdadeira por quem eu considerava merecedor de todo o crédito, o então Director Regional de Agricultura de Trás os Montes e Alto Douro, Eng. José Herculano Brito de Carvalho.
Setembro de 2019
Henrique Salles da Fonseca


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