De facto, parece que quanto mais se mexe
na lama mais ela se avoluma e fede. Os casos brotam, cada vez mais
desconcertantes, tapete de tortulhos no chão passivo da nossa habituação.
Admiro João Miguel Tavares, pela sua coragem denunciante.
Entretanto, descubro os textos do “A BEM
DA NAÇÃO”, enviados por Henrique Salles da Fonseca, que servem de complemento
ao de JMT, juntamente com um comentário, como sempre pertinente de Carlos Traguelho.
E por isso os coloco. Sem riso, apesar
do tom humorístico do 3º texto, ai de nós.
OPINIÃO
O absoluto escândalo do caso Rui Rangel
Porque é que os jornalistas não
perguntam aos líderes partidários se acham normal viverem num país onde um juiz
suspeito de corrupção continua a julgar casos de corrupção?
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 12 de Setembro de 2019
Deixem-me
recordar-vos algumas manchetes e títulos de jornais entre Janeiro e Maio de
2018: “Juiz Rui Rangel suspeito de ter vendido decisões judiciais”; “Rangel devolve 80 milhões a banqueiro
[Álvaro Sobrinho]”; “Sobrinho
alvo de busca por suborno a Rangel”; “Juiz suspeito de corrupção, fraude fiscal
e tráfico de influências”; “Escutas revelam pacto secreto [entre Rui Rangel e Fátima Galante]”; “[Luís Filipe] Vieira
paga cunha [a Rangel] com tachos no
Benfica”; “[José] Veiga paga corrida [de Rangel] ao Benfica”; “Casa e jipe de luxo pagos à vez por
corruptores”; “Depósitos em notas na conta do juiz”; “Suspeita de burla pagava
contas do juiz Rui Rangel”; “Testa de ferro paga o parto de filha do juiz”.
A
lista não é exaustiva, mas penso que dá para ficar com uma noção da gravidade
da chamada Operação Lex e
das suspeitas que recaem sobre os juízes Rui Rangel e Fátima Galante. Ambos
são fortemente suspeitos de escreverem acórdãos judiciais a troco de dinheiro,
e de utilizarem um esquema que envolvia advogados para receber subornos, mais
um oficial de justiça na Relação de Lisboa capaz de viciar sorteios, para que
determinados processos fossem parar às suas mãos. Fátima Galante, ex-mulher de
Rangel e também juíza desembargadora na Relação de Lisboa, teria a seu cargo a
escrita de acórdãos em nome do ex-marido, de acordo com as suas indicações.
Não há nada mais trágico para a justiça
portuguesa do que a suspeita de que possam existir juízes corruptos. Por isso mesmo, Rangel e Galante foram impedidos,
em 2018, de continuarem em funções. O despacho que os impedia de exercer
justificava-se, e bem, com os indícios de “uma muito grave, dolosa e reiterada
violação dos deveres profissionais”, que era “susceptível de se repercutir na
sua vida pública de forma incompatível com a credibilidade, prestígio e
dignidade indispensáveis” ao exercício das funções.
Só
que, entretanto, passou-se ano e meio. Os indícios continuam os mesmos, continuam
igualmente graves e dolosos, só que se esgotou o prazo máximo de suspensão
preventiva no âmbito do processo disciplinar instaurado aos juízes, tal como
prevê o Estatuto dos Magistrados. Como Rui Rangel ainda não foi acusado, o
que é que aconteceu? Pois bem: o senhor juiz regressou ao trabalho, como se nada fosse, com o Conselho Superior de
Magistratura a dizer que não pode fazer nada. Rangel tem de entrar no modelo
normal de distribuição de processos aos desembargadores da Relação de Lisboa.
Manchete
do Correio de Manhã desta terça-feira: “Máfia do Sangue nas mãos de Rangel”.
Rui Rangel, suspeito de corrupção, que até hoje foi o único juiz a dar razão
a José Sócrates num dos seus recursos, vai agora tomar uma decisão sobre a
Octapharma, em tempos presidida por Paulo Lalanda e Castro, ex-patrão de
Sócrates, num caso
que envolve suspeitas de corrupção. Se isto fosse um filme sobre a máfia, nós
diríamos que o argumentista tinha exagerado no enredo. Mas Portugal desafia qualquer argumento.
Pergunto:
onde está a onda de indignação nacional? Porque é que isto só é manchete no Correio
da Manhã? Porque é que não é notícia de abertura dos telejornais? Porque é que
os jornalistas não perguntam aos líderes partidários se acham normal viverem
num país onde um juiz suspeito de corrupção continua a julgar casos de
corrupção? Porque é que não vasculham os programas eleitorais à procura de
solução para isto? Um país que aceita sem pestanejar tamanha vergonha é um país
sem moral e sem perdão.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 19.09.19
DIZ O “BANCO DE PORTUGAL” QUE
Até Julho de 2019, o saldo conjunto das
balanças corrente e de capital se fixou em -1633 milhões de euros, o que
compara com -616 milhões de euros em igual período de 2018.
E DIGO EU QUE
Este é o caminho que conduz
directamente à absorção de mais bancos portugueses (ainda os há?) pelos seus
credores estrangeiros;
Numa economia aberta e pouco
produtiva, o consumo não só não é motor do desenvolvimento como, pelo
contrário, conduz ao descalabro das contas externas;
Só a pobreza da economia
produtiva pode justificar que a banca se refugie despudoradamente no crédito ao
consumo e à habitação (não tardará muito para que surja nova bolha
imobiliária);
A crise portuguesa de 2011 foi
há muito pouco tempo pelo que não se admite não haver dela memória viva.
Henrique Salles da Fonseca
COMENTÁRIO
Anónimo, 19.09.2019:Aproveitando o teu título, Henrique,
acrescento que o pivot da RTP 1, ao dar esta notícia no telejornal das 20h00,
de ontem, dia 18, disse que Portugal estava mais dependente do exterior. Para benefício dos teus leitores invoco que o Banco de
Portugal, segundo a imprensa, referiu que a balança de bens (que integra,
conjuntamente com a balança de serviços, a balança corrente) passou de
deficitária nos sete primeiros meses de 2018 de 7,6 mil milhões (bi) de euros
para 9,6 bi, no ano corrente. Acresce que a balança de serviços, que é
excedentária, tem ajudado a compensar o défice da de bens, mas desta vez também
ela encolheu o seu superavit em 137 milhões de euros.
Importa ainda realçar que, segundo aquela Instituição, nos sete primeiros meses, as exportações de bens e serviços cresceram 3% (2,2% nos bens e 4,6% nos serviços) e as importações aumentaram 7,4% (6,75% nos bens e 10,8% nos serviços). Não querendo transcrever mais números que foram divulgados, permito-me realçar algo que praticamente não se ouve – perante a dependência externa, o PIB, que é muito citado, está a crescer a um ritmo superior ao do Rendimento Nacional (ou Produto Nacional Bruto). Em linguagem simplificada, o PIB reflecte a riqueza do País independentemente da nacionalidade (portuguesa ou estrangeira) das entidades que a gerem, enquanto o PNB é a riqueza que fica para as entidades nacionais, independentemente da sua localização geográfica (no país ou no estrangeiro). Ora as entidades nacionais pagam mais às entidades não nacionais do que recebem destas, daí esse efeito negativo. Permito-me recordar, sem citar de novo, o que escrevi a propósito da balança corrente, como comentário ao teu artigo “Apirexia 1” de 28.8.2019. Agora, Henrique, levantas várias questões importantes no teu artigo. Vou “pegar” no penúltimo item e abordá-lo com pinças, tendo sempre presente as minhas obrigações deontológicas. Há muito tempo, mas também depois de a expressão “A Bem da Nação” ter caído em desuso, havia instituições especializadas de crédito que analisavam os projectos de investimento dos seus clientes, e uma vez aprovado o seu financiamento, a taxa de juro era definida em função do custo do dinheiro para os Bancos, do risco (e garantias) e do prazo da operação, assim como do impacto do projeto no emprego e na balança corrente do país, isto é, se incrementava exportações e/ou reduzia importações. Havia casos e momentos, inclusive para PME´s, em que os projectos de investimento eram financiados ou co-financiados a taxas bonificadas, por Organizações ou Fundos Internacionais, como o Banco Mundial, o Banco Europeu de Investimentos ou o Fundo EFTA, tendo em conta aqueles parâmetros. Todo esse paradigma se perdeu, com o decurso do tempo. Para além disso, o negócio bancário deixou de ser atractivo (acredita!), ou, pelo menos, a sua atractividade reduziu-se bastante e as exigências de capital aos accionistas aumentaram significativamente. A fim de minimizar estas, os bancos tendem a conceder créditos cuja natureza, por exemplo, crédito hipotecário, “consuma” menos capital próprio dos Bancos. Isto é, o modelo de negócio dos bancos passou a ser muito em função das exigências de capital. É certo que o crédito ao consumo é penalizado, nesta óptica, mas possivelmente os grandes responsáveis deste serão as sociedades especializadas neste tipo de crédito e não os bancos. Também é certo que o crédito a PME´s tem alguns benefícios para os Bancos em termos de consumo de capital, mas, tanto quanto me lembro, não há beneficio adicional por se tratar de financiamento a projectos de investimento que conduzam a aumento de exportações e/ou redução de importações. Receio que os bancos tendam a financiar, em globo, a actividade empresarial, através das clássicas contas correntes e, nem sempre, autonomizem crédito aos projectos de investimento. Abraço. Carlos Traguelho
Importa ainda realçar que, segundo aquela Instituição, nos sete primeiros meses, as exportações de bens e serviços cresceram 3% (2,2% nos bens e 4,6% nos serviços) e as importações aumentaram 7,4% (6,75% nos bens e 10,8% nos serviços). Não querendo transcrever mais números que foram divulgados, permito-me realçar algo que praticamente não se ouve – perante a dependência externa, o PIB, que é muito citado, está a crescer a um ritmo superior ao do Rendimento Nacional (ou Produto Nacional Bruto). Em linguagem simplificada, o PIB reflecte a riqueza do País independentemente da nacionalidade (portuguesa ou estrangeira) das entidades que a gerem, enquanto o PNB é a riqueza que fica para as entidades nacionais, independentemente da sua localização geográfica (no país ou no estrangeiro). Ora as entidades nacionais pagam mais às entidades não nacionais do que recebem destas, daí esse efeito negativo. Permito-me recordar, sem citar de novo, o que escrevi a propósito da balança corrente, como comentário ao teu artigo “Apirexia 1” de 28.8.2019. Agora, Henrique, levantas várias questões importantes no teu artigo. Vou “pegar” no penúltimo item e abordá-lo com pinças, tendo sempre presente as minhas obrigações deontológicas. Há muito tempo, mas também depois de a expressão “A Bem da Nação” ter caído em desuso, havia instituições especializadas de crédito que analisavam os projectos de investimento dos seus clientes, e uma vez aprovado o seu financiamento, a taxa de juro era definida em função do custo do dinheiro para os Bancos, do risco (e garantias) e do prazo da operação, assim como do impacto do projeto no emprego e na balança corrente do país, isto é, se incrementava exportações e/ou reduzia importações. Havia casos e momentos, inclusive para PME´s, em que os projectos de investimento eram financiados ou co-financiados a taxas bonificadas, por Organizações ou Fundos Internacionais, como o Banco Mundial, o Banco Europeu de Investimentos ou o Fundo EFTA, tendo em conta aqueles parâmetros. Todo esse paradigma se perdeu, com o decurso do tempo. Para além disso, o negócio bancário deixou de ser atractivo (acredita!), ou, pelo menos, a sua atractividade reduziu-se bastante e as exigências de capital aos accionistas aumentaram significativamente. A fim de minimizar estas, os bancos tendem a conceder créditos cuja natureza, por exemplo, crédito hipotecário, “consuma” menos capital próprio dos Bancos. Isto é, o modelo de negócio dos bancos passou a ser muito em função das exigências de capital. É certo que o crédito ao consumo é penalizado, nesta óptica, mas possivelmente os grandes responsáveis deste serão as sociedades especializadas neste tipo de crédito e não os bancos. Também é certo que o crédito a PME´s tem alguns benefícios para os Bancos em termos de consumo de capital, mas, tanto quanto me lembro, não há beneficio adicional por se tratar de financiamento a projectos de investimento que conduzam a aumento de exportações e/ou redução de importações. Receio que os bancos tendam a financiar, em globo, a actividade empresarial, através das clássicas contas correntes e, nem sempre, autonomizem crédito aos projectos de investimento. Abraço. Carlos Traguelho
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 20.09.19
NOBLESSE OBLIGE
A
cena passa-se no interior nortenho, zona rural abandonada pela sorte desde o
tempo dos suevos e dos alanos…
- Olá, bom dia, Senhora! – diz o
novo mestre escola da aldeia vizinha.
- Bom dia, meu Senhor! –
respondeu a velhota com um molho de carqueja à cabeça.
- A Senhora sabe quem eu sou?
- Não sei, não Senhor, mas se é para me roubar,
fique sabendo que não tenho nada que preste e só lhe posso dar esta carqueja
que fui buscar aos montes antes que lhe botem fogo.
- Oh! Senhora de Deus! Não pense nisso; eu não
faço mal a ninguém! Eu sou o novo mestre da escola da aldeia e ando a dizer às
pessoas que já podem voltar à escola.
- Mas eu nunca fui à escola e agora já sou velha
para ir aprender isso que o Senhor lá ensina.
- Então, quantos anos é que a Senhora tem?
- Oh meu Senhor: eu casei aos 20, estive casada
50 até que o meu home morreu vai para 15.
- Então, tem 85.
- Seja! Se o Senhor o diz…
- E tem muita família?
- Tenho, mas está quase toda na
França. Só cá me deixaram um neto mas esse também abalou para o Porto.
- E que faz ele no Porto,
trabalha?
- Não, Senhor, anda na
escola. – diz a velhota toda ufana.
- BRAVO! E em que escola anda ele?
- Na escola dos gatunos.
Cai o pano
* * *
Foi durante uma visita oficial a Trás os Montes no início da
década de 80 do século XX que esta história me foi contada como absolutamente
verdadeira por quem eu considerava merecedor de todo o crédito, o então
Director Regional de Agricultura de Trás os Montes e Alto Douro, Eng. José
Herculano Brito de Carvalho.
Setembro de 2019
Henrique Salles da Fonseca
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