Um desejo de paz, de mistura com
curiosidade, nos leva a esta pausa geológica, a sobrepor-se às notícias humanas
– uma pausa de arrefecimento, com estes textos sobre o desconhecido, que a
poeira dos tempos traz de volta, com a inteligência humana a dar que falar.
Poeira extraterrestre terá causado uma
idade do gelo na Terra
A destruição de um asteróide há 466
milhões de anos originou uma nuvem de poeira que terá bloqueado parte da luz
solar que chegava à Terra.
PÚBLICO, 23 de Setembro de 2019
FOTO: Ilustração da colisão do asteróide
que deu origem à nuvem de poeira DON DAVIS
Uma nuvem de poeira resultante da
destruição de um asteróide pode ter causado uma idade do gelo há 466 milhões de
anos, conclui um estudo publicado na revista Science Advances. Após a
colisão do asteróide, que ocorreu na zona entre Marte e Júpiter, a quantidade
de poeira proveniente do espaço na atmosfera terrestre aumentou
significativamente e bloqueou a luz solar.
A poeira invadiu a Terra durante pelo
menos dois milhões de anos, causando um arrefecimento gradual. Os seres vivos
tiveram, assim, tempo de se adaptar e alguns até beneficiaram da mudança.
“Verificámos que a poeira proveniente de um asteróide não só coincidiu com o
início do arrefecimento do planeta, mas também com um importante avanço na
biodiversidade que mudou os ecossistemas marinhos para sempre”, afirma David
Harper, um dos autores do artigo e cientista da Universidade de
Durham, ao The Guardian. “Pela primeira vez demonstrou-se que a poeira
resultante da destruição de um asteróide pode levar a um arrefecimento que
desencadeia uma idade do gelo na Terra”, sublinha Birger
Schmitz, primeiro autor do artigo e investigador da Universidade de Lund,
Suécia, ao mesmo jornal.
A hipótese de uma idade do gelo há
466 milhões de anos já tinha sido avançada por outros cientistas. A quantidade
de água nos oceanos influencia a forma como as rochas no leito marinho se
formam e as rochas deste período apresentaram sinais de que os oceanos eram menos
profundos nessa altura, o que sugere que parte da água estaria retida em
glaciares.
A equipa analisou rochas de calcário com
diferentes idades no sul da Suécia e perto de São Petersburgo, na Rússia.
Decompuseram as rochas com recurso a um ácido e procuraram vestígios do asteróide
que causou a nuvem de poeira. A abundância de grãos com a mesma composição
química que o asteróide aumentou entre mil e dez mil vezes a seguir à
destruição do asteróide, que media 150 km de diâmetro. Os níveis mantiveram-se
elevados durante dois a quatro milhões de anos.
Philipp Heck, um dos autores do
estudo e investigador da Universidade de Chicago, EUA, mostra cautela quanto à
hipótese de resolver o aquecimento global actual replicando o efeito da nuvem
de poeira. “As propostas de engenharia climática têm de ser
avaliadas de forma muito crítica e cuidadosa. Porque, se algo correr mal, as
coisas podem ficar piores do que estão.”
Texto editado por Andrea Cunha Freitas
II - Humanos já alteravam substancialmente ambiente há
três mil anos
Publicada
análise sobre o primeiro impacto global da domesticação intensiva de plantas e
animais na revista Science.
LUSA
PÚBLICO, 30 de Agosto
de 2019
Vale Torata,
no Peru, já era uma paisagem agrícola no ano 600 d.C. RYAN WILLIAMS/MUSEU FIELD
Os
humanos já transformavam substancialmente a ecologia da Terra há três mil anos,
quando começou a fazer-se uma agricultura mais intensiva, indica um estudo
divulgado esta sexta-feira na revista científica Science.
Através
de uma avaliação arqueológica global do uso antigo da terra provou-se que a
actividade humana na pré-história não era tão inócua e que os primeiros
caçadores-recolectores, agricultores e pastores tiveram um efeito muito maior
na paisagem da Terra e muito mais cedo e mais amplo do que inicialmente se
pensava.
Esta
informação contraria a ideia de que as mudanças ambientais em larga escala
causadas pelos humanos são um fenómeno recente, uma ideia que facilmente se
assume devido ao foco que hoje se dá às alterações climáticas, ao aquecimento
global e às energias renováveis.
No entanto, segundo o estudo, os humanos começaram
a modificar o ambiente há já dez mil anos e o primeiro impacto ambiental global
tem pelo menos três mil anos, segundo Gary Feinman, curador de antropologia
Museu Field em Chicago, Estados Unidos, e um dos 250 autores do estudo.
De acordo com o investigador, citado num comunicado do
Museu Field, para se entender a actual crise climática é preciso entender
também a história dos humanos a alterar os seus ambientes.
O estudo, liderado por Lucas Stephens, da Universidade
da Pensilvânia, também nos Estados Unidos, faz parte de um projecto maior
chamado ArchaeoGLOBE, que reúne informações online de especialistas regionais sobre como o uso da
terra mudou ao longo do tempo em 146 diferentes áreas do mundo.
E essas informações mostram que a pegada ecológica
não era assim tão pequena quanto se imaginava, disse Gary Feinman, segundo o
qual há três mil anos os humanos faziam agricultura muito invasiva em diversas
partes do mundo.
Segundo os autores do trabalho os seres humanos
começaram a derrubar florestas para fazer agricultura e os pastores também
desflorestaram para fazer criação intensiva de animais.
“Embora a taxa em que o ambiente está a mudar seja
muito mais drástica, vemos os efeitos que os impactos humanos tiveram na Terra
há milhares de anos”, disse Ryan Williams, outro dos autores do estudo
também do Museu Field.
Conhecer o
início dos impactos ambientais pode ajudar a perceber, por exemplo, que
soluções as civilizações antigas usaram para mitigar efeitos negativos do
desmatamento ou da falta de água.
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