terça-feira, 24 de setembro de 2019

Tudo tem um princípio



Um desejo de paz, de mistura com curiosidade, nos leva a esta pausa geológica, a sobrepor-se às notícias humanas – uma pausa de arrefecimento, com estes textos sobre o desconhecido, que a poeira dos tempos traz de volta, com a inteligência humana a dar que falar.

Poeira extraterrestre terá causado uma idade do gelo na Terra
A destruição de um asteróide há 466 milhões de anos originou uma nuvem de poeira que terá bloqueado parte da luz solar que chegava à Terra.
PÚBLICO, 23 de Setembro de 2019
FOTO: Ilustração da colisão do asteróide que deu origem à nuvem de poeira DON DAVIS
Uma nuvem de poeira resultante da destruição de um asteróide pode ter causado uma idade do gelo há 466 milhões de anos, conclui um estudo publicado na revista Science Advances. Após a colisão do asteróide, que ocorreu na zona entre Marte e Júpiter, a quantidade de poeira proveniente do espaço na atmosfera terrestre aumentou significativamente e bloqueou a luz solar.
A poeira invadiu a Terra durante pelo menos dois milhões de anos, causando um arrefecimento gradual. Os seres vivos tiveram, assim, tempo de se adaptar e alguns até beneficiaram da mudança. “Verificámos que a poeira proveniente de um asteróide não só coincidiu com o início do arrefecimento do planeta, mas também com um importante avanço na biodiversidade que mudou os ecossistemas marinhos para sempre”, afirma David Harper, um dos autores do artigo e cientista da Universidade de Durham, ao The Guardian. “Pela primeira vez demonstrou-se que a poeira resultante da destruição de um asteróide pode levar a um arrefecimento que desencadeia uma idade do gelo na Terra”, sublinha Birger Schmitz, primeiro autor do artigo e investigador da Universidade de Lund, Suécia, ao mesmo jornal.
A hipótese de uma idade do gelo há 466 milhões de anos já tinha sido avançada por outros cientistas. A quantidade de água nos oceanos influencia a forma como as rochas no leito marinho se formam e as rochas deste período apresentaram sinais de que os oceanos eram menos profundos nessa altura, o que sugere que parte da água estaria retida em glaciares.
A equipa analisou rochas de calcário com diferentes idades no sul da Suécia e perto de São Petersburgo, na Rússia. Decompuseram as rochas com recurso a um ácido e procuraram vestígios do asteróide que causou a nuvem de poeira. A abundância de grãos com a mesma composição química que o asteróide aumentou entre mil e dez mil vezes a seguir à destruição do asteróide, que media 150 km de diâmetro. Os níveis mantiveram-se elevados durante dois a quatro milhões de anos.
Philipp Heck, um dos autores do estudo e investigador da Universidade de Chicago, EUA, mostra cautela quanto à hipótese de resolver o aquecimento global actual replicando o efeito da nuvem de poeira. “As propostas de engenharia climática têm de ser avaliadas de forma muito crítica e cuidadosa. Porque, se algo correr mal, as coisas podem ficar piores do que estão.”
Texto editado por Andrea Cunha Freitas

II - Humanos já alteravam substancialmente ambiente há três mil anos
Publicada análise sobre o primeiro impacto global da domesticação intensiva de plantas e animais na revista Science.
LUSA
PÚBLICO, 30 de Agosto de 2019
Vale Torata, no Peru, já era uma paisagem agrícola no ano 600 d.C. RYAN WILLIAMS/MUSEU FIELD
Os humanos já transformavam substancialmente a ecologia da Terra há três mil anos, quando começou a fazer-se uma agricultura mais intensiva, indica um estudo divulgado esta sexta-feira na revista científica Science.
Através de uma avaliação arqueológica global do uso antigo da terra provou-se que a actividade humana na pré-história não era tão inócua e que os primeiros caçadores-recolectores, agricultores e pastores tiveram um efeito muito maior na paisagem da Terra e muito mais cedo e mais amplo do que inicialmente se pensava.
Esta informação contraria a ideia de que as mudanças ambientais em larga escala causadas pelos humanos são um fenómeno recente, uma ideia que facilmente se assume devido ao foco que hoje se dá às alterações climáticas, ao aquecimento global e às energias renováveis.
No entanto, segundo o estudo, os humanos começaram a modificar o ambiente há já dez mil anos e o primeiro impacto ambiental global tem pelo menos três mil anos, segundo Gary Feinman, curador de antropologia Museu Field em Chicago, Estados Unidos, e um dos 250 autores do estudo.
De acordo com o investigador, citado num comunicado do Museu Field, para se entender a actual crise climática é preciso entender também a história dos humanos a alterar os seus ambientes.
O estudo, liderado por Lucas Stephens, da Universidade da Pensilvânia, também nos Estados Unidos, faz parte de um projecto maior chamado ArchaeoGLOBE, que reúne informações online de especialistas regionais sobre como o uso da terra mudou ao longo do tempo em 146 diferentes áreas do mundo.
E essas informações mostram que a pegada ecológica não era assim tão pequena quanto se imaginava, disse Gary Feinman, segundo o qual há três mil anos os humanos faziam agricultura muito invasiva em diversas partes do mundo.
Segundo os autores do trabalho os seres humanos começaram a derrubar florestas para fazer agricultura e os pastores também desflorestaram para fazer criação intensiva de animais.
Embora a taxa em que o ambiente está a mudar seja muito mais drástica, vemos os efeitos que os impactos humanos tiveram na Terra há milhares de anos”, disse Ryan Williams, outro dos autores do estudo também do Museu Field.
Conhecer o início dos impactos ambientais pode ajudar a perceber, por exemplo, que soluções as civilizações antigas usaram para mitigar efeitos negativos do desmatamento ou da falta de água.


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