Ficamos contentes, sim, com elogios ao
nosso país, vindos do exterior competente, ainda que sob a forma de um jornal
inglês. Julgo que os programas que a RTP tem proporcionado, sobre o nosso país,
com a actuação eficiente e simpática dos jovens animadores televisivos, a
acrescentar aos discursos vivos dos entrevistados, sobre as terras ou os
produtos delas e dos seus habitantes, e até a actuação dos músicos e cantores
intervenientes, têm contribuído para criar uma amorável imagem do nosso país.
Deus nos ajude, também, pese embora o pessimismo esclarecido e indignado de M. J.
Avillez.
POLÍTICA: E é isto /premium
Nenhuma democracia resiste a funcionar só
pela metade. Mas cerzir o profundíssimo rasgão no tecido político e partidário
da outra metade irá demorar anos.
1 - Um
optimista por muito irritante que seja não pode deixar de se regozijar com os
retratos que a imprensa internacional mais confiável tem actualmente tirado ao
país: já se sabe que os portugueses sempre se comoveram por figurar nos jornais
estrangeiros mesmo que por feitos inverificáveis e que quanto mais consolo
externo recebem mais se auto-iludem: confundindo um país modesto, simpático,
sem ambição conhecida, nem marca própria, com uma substantiva pátria europeia.
(Não fora sobretudo o turismo e a imobiliária e onde
estaríamos?) A verdade é
que o olhar do Financial Times, para falar da última foto tirada, não é falso,
é apenas incompleto: o “brilho” enlevado que ele aponta está embaciado e a
foto, desfocada. Mas não sou eu que vou demover optimistas nem brigar com
militantes do copo meio cheio, estragando-lhes a festa, com copos meios vazios.
Mais
semestre, menos semestre, a Europa entorna-se, a economia esmorece e a conta
chegará, mas entretanto até lá o país, não é verdade? está na moda. Viva a moda que ama Portugal mesmo que – é só um
exemplo – os salários sejam inconcebivelmente baixos para tanto “sucesso” ou os
filhos da classe média menos abonada da Europa não possam casar ou sair de casa
dos pais por nunca ganharem o suficiente para tão trivial ambição. Se
somarmos a trivialidade aos crónicos males que parecem inscritos no ADN
português — crescimento anémico, importações a crescer, exportações a diminuir
(o que logo resulta no tique irremovível do endividamento), o vagar exasperante
do sector produtivo, o parco uso da iniciativa pessoal para competir… estamos
quase conversados. E quem se admira? Não é o Estado a grande escolha? O Estado,
grande imperador, com os seus funcionários, os eleitos quase exclusivos da
governação?
Não
sei se o Financial Times tirou algum retrato a esta parte da realidade mas
qualquer “retrato” português digno desse nome também é feito destas ancestrais
fragilidades tão mais frágeis quanto mais expostas a qualquer abanão vindo de
fora. E se acrescentarmos que o chão que temos vindo a pisar desde que o país
existe alterna a festa com a ruína e a ruína com a festa, eis a foto em tamanho
natural. (pequeno entre-parêntesis não despiciendo: o texto do jornal britânico
refere igualmente – como não podia deixar de ser – o trabalho político e a
acção governativa de Passos Coelho na recuperação da credibilidade da nossa
economia, mas para a grande plateia da esquerda essas linhas foram ignoradas –
como não podia deixar de ser)
2. Apesar
porém de meio vazios, os copos dos pessimistas como eu, já beberam muito.
Nisso, estamos servidos. Foram quatro anos e peras, sempre abençoados —
ignorando-se o critério — pelo sr. Presidente da República que nunca sabemos
como pensa (e sobre o qual começa a haver gente séria sem saber o que pensar).
Quatro
anos de “ocupação” governamental mas esta, sim, criteriosa: António Costa ocupou o poder usando-o
absolutamente; depois ocupou o Estado, fazendo dele uma propriedade privada;
depois tratou dos funcionários públicos como filhos pródigos; e ao sexto dia,
olhando para o espaço á sua direita e vendo-o vazio, ocupou o centro,
ocupando-se dele a sério: as “contas certas” (mérito de Centeno) não podiam
senão agradar à plateia mais conservadora do país; o fim da “austeridade”
propagado à exaustão conseguiu a colossal proeza de iludir toda a gente. Na
voragem dessa fé, o centro e a direita, achando-se libertos de chatices
passadas, também aplaudiram e, pior, acreditaram; e o “rigor” – vem nos livros
– veio securizar a metade não “costista” do país. Essa mesmíssima metade hoje
travestizada num conjunto de sem-abrigo políticos, à mercê de quem lhes passe a
mão pelo já escasso pêlo. E last but
not least, numa encenação digna de antologia, António Costa, com a solenidade
emprestada das grandes ocasiões, permitiu-se a estocada final da “autoridade” e
da “ordem.” Como a direita
gosta. E não importa que o Governo tenha interferido num conflito laboral e
aberto irreversíveis precedentes: não estava ali o zelador-mor da
“estabilidade” da pátria? Tanto bastou para que centro e direita – bem mais que
a esquerda – se rendessem por antecipação à nefasta certeza (mas eles não
percebem que é nefasta) da “maioria absoluta socialista”. É ouvi-los. Haverá
maior auto-declaração de impotência? Maior demissão política, mais
confrangedora vergonha?
O
governo que recolha os louros. Sucede porém que cerzir este profundíssimo
rasgão no tecido democrático irá demorar anos. Anos. Nenhuma democracia resiste
a funcionar apenas só pela metade. E ainda menos que o combate político que
deve alimentá-la se situe hoje apenas à esquerda de uma dessas metades. Temos
visto muito, sim. Mais certamente do que aquilo que terá visto o Financial
Times. Episódios fartos. Abuso: um Estado propriedade privada do poder, circuitos
fechados entre favores político-partidários, negócios obscuros, alguma
corrupção. Arrogância:
famílias de sangue no topo do Executivo, nas lideranças parlamentares, nos
organismos públicos. Injustiça: o maior arraso fiscal de que me lembro sem sombra de
contrapartida por parte do Estado (recebido porém pelo país com aparente
gentileza e silenciosas boas maneiras como podemos ver no espelho das
sondagens). Seja como for é fácil imaginar como tudo isto se
transformará em algo disforme – como naqueles espelhos das feiras populares —
se os votos socialistas forem absolutos.
3. E já que
aqui estamos: também não sei se a media internacional sabe ou não mas Portugal
não pode ser descascado. De cada vez que as circunstancias o descascam, o
resultado embaraça qualquer ser normalmente constituído. Assim
avulso: afinal não
foi só uma cratera que abriu, elas são imensas e em imensos lados,
aparentemente prontas a engolir-nos; afinal umas golas distribuídas
pelo Estado para proteger os “populares”(?) das chamas são elas próprias
inflamáveis (enquanto o lucro da inédita encomenda já deve ir a caminho do
bolso de um boy socialista)
; afinal, quando se descascou o pós-Pedrógão ainda não havia quase nada
do prometido dois anos antes por autoridades com lágrimas nos olhos: nem a
totalidade das casas reconstruídas, nem a totalidade das compensações
financeiras, nem corruptos castigados; afinal os seguranças – públicos e
privados – parece que não seguram: foi facílimo entrar num hotel de luxo do
sul onde se hospedava a principal figura do Estado (mesmo que o PR se tenha
permitido dispensar a GNR – com que critério? – teria sempre de haver “alguém”
a tomar conta do sítio: não havia); afinal os departamentos do Estado supostos
zelar pela integridade física, psicológica, afectiva de crianças em risco não
foi capaz de salvar do inferno duas irmãs ainda por cima já “referenciadas”
(pior é impossível); o caos, a inoperância, o desmazelo (não, não é só falta
de dinheiro), dos hospitais; afinal as Forças Armadas, uma “instância” vital de
protecção do país que se quer respeitável e respeitada, foram capazes, ao mais
alto, médio e baixo nível da sua hierarquia, de produzir uma telenovela
inominável chamada “Tancos”.
Vai aqui um misto de desmazelo, desorganização e desrespeito que também define
o país e por isso aflige e envergonha. Parece que não a todos.
4. E é isto. (Ou não é isto?)
COMENTÁRIOS
José Martins: O grande
ideólogo do PSD foi Sá Carneiro. O grande programa político de Sá Carneiro
visava a "libertação da sociedade civil", sufocada por um Estado
omnipresente e dominado por uma oligarquia sentada à mesa do Orçamento à conta
dos contribuintes, tendo como pano de fundo a social-democracia do ponto vista
social e o liberalismo do ponto de vista económico. Esse programa continua cada
vez mais urgente! A grande maioria dos eleitores do PS foi traída pelo COSTA,
está a ser enganada pelo Catavento Marcelo (que tem, tal como você, como único
objectivo, destruir Rui Rio, para manter os privilégios da OLIGARQUIA) e vai
manter-se na ilusão de que tudo parece estar bem, enquanto perdurar a memória
do único “objectivo programático que uniu a GERINGONÇA”: as REVERSÕES. Este
êxito momentâneo da política das REVERSÕES só se verifica porque houve falta de
trabalho político da PAF na EXPLICAÇÃO das medidas de austeridade que o Passos
Coelho foi obrigado a tomar. Rui Rio, paulatinamente, está a mostrar ao povo
português que é um homem de Estado, está genuinamente nesta luta para servir o
País e não para servir as clientelas partidárias. Esperemos que RUI RIO seja
capaz de segurar a bandeira de Sá Carneiro para bem do País e dos portugueses! Melhorar
as condições de competitividade internacional das empresas exportadoras e
reduzir a carga fiscal sobre empresas e famílias vai ao encontro daqueles
desígnios. ESSE É O ÚNICO CAMINHO QUE PODE SALVAR PORTUGAL. E É ISTO.
Lucindo Monteiro: “Mais semestre, menos semestre, a Europa
entorna-se, a economia esmorece e a conta chegará, mas entretanto até lá o
país, não é verdade? está na moda" (Maria João Avillez).
Fazer
futurologia de cariz sensacionalista pode impressionar, mas duvido que seja a
melhor forma de analisar a realidade. Em economia, o que hoje parece evidente,
amanhã poderá deixar de o ser. E se for daqui a um semestre, a situação
complexifica-se ainda mais. Por razões de natureza ideológica, alguns analistas
– entre os quais se inclui a Maria João Avillez – são acometidos de urticária,
perante qualquer notícia encomiástica referente a Portugal, sobretudo quando
tais notícias são oriundas do estrangeiro. Fica uma dúvida: se o PSD estivesse
no poder, esta cronista seria tão célere e demolidora, a tentar esvaziar este
artigo do Financial Times, referente a Portugal?
Manuel Magalhães: É isto mesmo,
Maria João, eu só acrescentaria em relação às “contas certas” de Centeno,
estarão mesmo certas??? “Olhe que não, olhe que não”... E será também não
esquecer a fraca atitude dos chamados partidos de direita PSD e CDS que a final
não passam de complexados pelo Centro (para não dizer pela esquerda) e que já
provaram à exaustão serem incapazes de mobilizar a direita (a tal outra
metade...). Óptimo e necessário artigo como de costume!!!
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