quarta-feira, 1 de julho de 2020

Verdades do nosso consumo



São de vária espécie e a da coscuvilhice não deixa de ser uma delas. João Miguel Tavares deseja ser imparcial nesta questão das responsabilizações do sobe-e-desce pandémico, mas os comentadores criticam, na sua maioria, com argumentos sensatos.
OPINIÃO
Combater a pandemia sem ceder à histeria
É descabido andar a apontar o dedo ao governo só porque se avistou a barriga de António Costa numa praia. O grande pecado do governo não é o número de contaminações, mas as péssimas explicações.
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 27 de Junho de 2020
Há tantas boas razões para dizer mal do governo – para quê escolher as más? Há a mumificação do ministro da Educação, a descoordenação da Direcção-Geral de Saúde (os conselhos para a  noite de São João com 24 horas de atraso são um mimo de centralismo e incompetência), a politização progressiva das intervenções de Graça Freitas, a habitual propaganda governamental em contraponto com os sinais cada vez mais alarmantes da economia portuguesa; há até os maus exemplos do25 de Abril e do 1.º de Maio. Mas havendo tudo isto, já é perfeitamente descabido andar a apontar o dedo ao governo pelo número de contaminações que se registam neste momento, só porque o primeiro-ministro foi a um concerto ou se avistou a barriga de António Costa numa praia.
Convém sermos selectivos nas indignações, para não acabarmos como os maluquinhos das praças, a resmungar contra o mundo das oito da manhã às oito da noite. Convém também ter um mínimo de coerência, e acreditar nas palavras que nós próprios pronunciamos. Como estas: a covid-19 vai estar entre nós durante muito tempo e só será debelada com uma vacina ou com imunidade de grupo. Se acreditarmos nisto, e era bom que acreditássemos, então a curto e a médio prazo estaremos inevitavelmente envolvidos num jogo de tentativa-erro e num equilíbrio precário entre abertura e encerramento, conforme a pandemia for evoluindo.
O país fechou quando devia ter fechado, e quando reabriu (15 dias atrasado, na minha opinião) o governo esforçou-se por sublinhar a necessidade de retoma do consumo. Fez muito bem. A mensagem correu mal? Não me parece. Embora o número de novos casos continue elevado, a verdade é que os números que mais importam – os internamentos e a ocupação de camas nos cuidados intensivos – estão perfeitamente controlados e estabilizaram nas últimas semanas. O problema é outro: embora as pessoas saibam que a doença não vai ser erradicada tão depressa, depois agem como se ela devesse desaparecer até à hora do jantar. Lamento muito. Não vai acontecer. Já o disse mil vezes, mas posso sempre dizer mil e uma: temos de aprender a viver com a covid-19. O desafio é tentar alcançar o máximo de normalidade sem que as infecções se descontrolem e provoquem o colapso do SNS.
Não é só porque determinado indicador sobe que devemos logo apontar o dedo a António Costa. O governo tem controlo sobre muita coisa, mas não certamente sobre todas as formas de contaminação do vírus; e ninguém deseja ter em cima de si a pata de um Estado à chinesa, que se for preciso até nos entaipa dentro de casa. Aquilo que todos vemos nos mapas das novas contaminações não é um sinal (directo, pelo menos) do desleixo do governo – é um sinal da pobreza do país. Como seria de esperar, a pandemia europeia começou nas estâncias de ski finas de Itália e acabou nos bairros degradados das zonas metropolitanas.
O grande pecado do governo não é o número de contaminações, mas as péssimas explicações. Os surtos que supostamente nasciam nas festas de betinhos desgovernados, afinal pegaram de estaca nos bairros pobres, na construção civil, nos transportes suburbanos lotados; nos meios onde o gel desinfectante é um luxo e o distanciamento social uma miragem. O problema é estrutural, não é individual. Os mapas portugueses da covid-19 são hoje os mapas da pobreza, o que não é mais do que a evidência daquilo que sabemos há muito: a pandemia é profundamente desigual e o confinamento Netflix será sempre um privilégio burguês.
Jornalista
TÓPICOS
Gustavo Garcia MODERADOR: Pois, JMT... Aqui há uns meses o governo estava mal porque confinava e os números menos maus daí resultantes eram porque o vírus não era assim tão mau. Agora, que o governo desconfinou (e mal, como é mais que evidente) e as coisas estão a correr mal, o problema não é o desconfinamento, nem o víruis ser mau (como evidentemente é) mas as explicações não serem as que o JMT quer... Isto é muito simples, o confinamento ajuda a combater a pandemia, a histeria dos prejuízos económicos que levou ao desconfinamento tem este lindo resultado. Combater a pandemia Covid-19 nem é difícil, como se viu. Difícil é combater o vírus do dinheiro... 27.06.2020
art.moura.893787 INICIANTE: Ser cronista num diário é tramado. Porque o cronista é forçado a surfar a espuma dos dias e depois tem de mostrar que é imparcial. No entanto, todo o cronista tem o seu estado de alma e todo o cronista, quando os dias são monótonos e pouco inspiradores só tem uma saída: há governo? Sou contra. Pelo menos garante umas simpatias partidárias e a adesão de uns quantos desiludidos da vida, para além dos que adoram teorias da conspiração e se julgam destinados a grandes voos. No fundo, o cronista da imprensa escrita dos dias que correm vai estiolando com a queda de leitores e com falta de memória, a "presentificação" do mundo. O passado passou e o futuro é amanhã, o que se passa hoje é o mais importante. As regras são as que faço agora, o olhar é o que vejo agora. São raros leitores de 15 anos.
António Cunha MODERADOR:  Excelente. 28.06.2020
Paulo Jorge Soares Félix INICIANTE: Neste momento o que critico é, aparentemente, não termos instrumentos legais para obrigar Pedrosas e companhias afins a repor imediatamente 100% da oferta nas áreas onde a maior parte da população depende das empresas privadas de transportes públicos para se deslocar diariamente
FzD INFLUENTE Os transportes estatizados estão a 100%?
AAA_ INICIANTE: Esta crónica é bastante ingénua. Não me venha dizer que este recrudescimento dos casos não é culpa do governo porque nunca tinha lidado com uma pandemia destas. E os outros governos de outros países, já tinham lidado? Porque aparentemente estão a lidar melhor com a situação. Se não fosse assim, não estávamos apenas nós e a Suécia a ser barrados nas fronteiras, não é verdade? O governo nunca tem culpa de nada. Nos incêndios é a mesma coisa. A culpa é da floresta e do abandono rural. Os outros países também têm floresta mas só a nossa é que arde. Quem raio faz as leis? É tempo de exigir competência. É tempo de exigir acção. Acção que surpreenda, que vá à frente dos acontecimentos, não atrás do prejuízo. Ou servem só para cobrar impostos e prestar um serviço público cada vez pior? 27.06.2020
Luís Cunha.909630 INICIANTE: Isto não parece estar a correr bem, mas também quando estava a correr bem não pareceu ser por causa do Governo. No fundo andamos entre o 8 e o 80, uma das características nossas que é termos dificuldade em encontrar um meio termo realista e duradouro. Mas alguém acreditou que Portugal ia ser um exemplo no combate à Pandemia a longo prazo?
Anarquista Inconformado.904435 INICIANTE: Adoro ler as elucubrações, dos especialistas que sempre catalogaram este vírus de uma gripezinha. Tristes. 27.06.2020
Animação e descanso INICIANTE: JMT pena ainda alinhar na lengalenga da “pandemia” quando sabe perfeitamente que esta é um logro, completamente irrelevante do ponto de vista estatístico ou medicinal. Última novidade, o vírus já estava em Barcelona em março do ano passado, e como atentam estatísticas a mortalidade não mudou desse ano para cá, simplesmente há um hiper foco neste vírus “novo” usado para etiquetar todo o tipo de mortes
JDF EXPERIENTE: "Dizer mal do governo": expressão não fica bem. Mas concordo em abordarmos as devidas razões para a crítica, e não outras menos pertinentes para mostrar o mal do mundo.
Nestor Robalo INICIANTE_ Mais do mesmo... JMT é mesmo o rei da contradição!... O que diz há uns dias sobre este mesmo assunto desdiz na maior logo a seguir! O que este malabarista é capaz de fazer para ficar à tona e procurar protagonismo político!
Mario Coimbra EXPERIENTE: Olhe que não. Até tem sido bastante coerente mesmo quando não tem razão.
Nestor Robalo INICIANTE; Caro Coimbra, olhe que sim... O que até é normal quando se comenta tudo e mais alguma coisa, nomeadamente o que não se sabe, como é o caso deste “comentador”...
INICIANTE Seria importante que os jornalistas fossem avaliar a frequência e o número de comboios na linha de Sintra e Azambuja. Talvez esteja aí a explicação para a situação que se vive na zona de Sintra e Amadora. Quase 1 mês depois do desconfinamento (espero não irritar o Sr. primeiro ministro com a expressão), vai agora o metropolitano fazer o “controlo do volume de passageiros e reforçar a sensibilização para se manter o distanciamento social e a obrigatoriedade do uso de máscara”, mas a partir de 2ªf (5ª e 6ªf fizeram um acordo com o vírus…). Nada a ver com as fotos de carruagens lotadas que apareceram nas redes sociais!
Leclerc INICIANTE JMT, você é muito crédulo “os internamentos e a ocupação de camas nos cuidados intensivos – estão perfeitamente controlados e estabilizaram nas últimas semanas”. Eu comi um frango, o Manel fez jejum, em média comemos meio frango. Se a situação está mais ou menos controlada no país e mais ou menos descontrolada na região de Lisboa, é evidente que a ocupação de camas está controlada, em média… Mas se analisarmos a situação da ocupação das camas na região de Lisboa, a imagem não será tão equilibrada. Sabia que em Espanha, no pico da crise, estiveram mais de 2.000 camas de cuidados intensivos livres? Mas não eram em Madrid, País Basco nem na Catalunha!
Nuno Silva EXPERIENTE: Os verdadeiros heróis do combate ao vírus badalhoco Covid são aqueles que tiveram que trabalhar este tempo todo, para que não nos faltasse nada, e não me estou a referir aos heróis da saúde e autoridades, indústria alimentar ou transportes. Estou a referir-me a quem trabalha nas limpezas e higiene, eternamente esquecidas (os)...
Mario Coimbra EXPERIENTE Caro JMT, não concordo consigo neste caso. O problema é que os números são elevados. Repare noutros países similares, Bélgica, que está pior em valores totais mas onde o desconfinamento está bem mais controlado. Os nossos números deveriam hoje estar abaixo dos 100 casos, e estão nos 400+. O meu desconforto com isto está no facto de não se terem dado as condições para quem sempre precisou de trabalhar não fosse apanhado. Mais transportes públicos, mais máscaras e gel de borla para os locais mais necessitados etc. Nestes locais onde se pensava que estava tudo mais ou menos controlado...eis que não. Mesmo que tenhamos que viver com isto até existir uma vacina...devíamos estar melhor do que estamos. E culpar umas festas é importante para exemplo mas não é o problema de raiz.
cidadania 123 INICIANTE É verdade que o governo não consegue controlar a postura de cada um perante o necessário distanciamento social, medida essencial para vivermos com o vírus no médio prazo. E se efectivamente houve certos grupos na sociedade que, apesar de quererem, não tinham como cumprir as medidas, outros houve que simplesmente as ignoraram e não tiveram qualquer preocupação social , porque vivem no afrontar das regras, no boicotar, e não conhecem a civilidade ou o altruísmo. O governo tem culpa quando teme atacar o problema onde ele está. Prefere criar restrições a todo um concelho do que a um bairro ou prédio, mesmo que essa fosse a medida mais racional e com menor impacto. Só que não seria politicamente correto e pareceria discriminação....
A INICIANTE  JMT enfia a cabeça na areia como a avestruz. Procure na internet por "An interactive visualization of the exponential spread of COVID-19" e verificará que, quer em valores absolutos quer per capita, o desconfinamento português foi o mais desastroso da Europa; um mês adiantado, se quer pôr as coisas assim. Se, para JMT, ser coerente é não ter o pai ou a mãe num grupo de risco ou infectado, sim, JMT é coerente. Para quem tem, é uma caricatura de falta de empatia e de propagandista r(v)endido aos interesses dos centros comerciais. E continua a falar de imunidade de grupo quando já se sabe que a maioria dos recuperados perde anticorpos à covid-19 em dois meses...


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