segunda-feira, 11 de outubro de 2021

Ou seja, às aranhas


Neste inferno de obscuridades, com muitos “papers” a tentar aclarar.

Andamos todos aos papéis /premium

Quer saber a que velocidade seguia o carro do ministro Cabrita? Não pergunte mais ou acaba negacionista. Tem ADSE e já não pode ir ao seu médico? Ora, um paper por dia nem sabe o bem que lhe fazia!

HELENA MATOS, Colunista do OBSERVADOR    OBSERVADOR, 10 out 2021

Vá lá, vamos correr atrás dos ricos e dos poderosos. Veio aí mais um paper.

(Ai, é verdade, tinha ADSE e agora já não pode ir ao seu médico de sempre? Azar o seu que escolheu um médico que não obedece cegamente ao Estado. Agora nem no regime livre – aquele em que o utente paga para depois ser reembolsado – pode ir ao seu médico ou fazer os tratamentos que começou. Mas quem se vai preocupar com estas questões quando tem tanto paper para analisar? Corra atrás dos ricos que isso faz muito bem à saúde!)

Os últimos papers chamam-se Pandora. Bonito nome, não é? Sempre ficam mais apessoados com nome de mulher, para mais na versão mitológica, porque isto de ligar os papers a países pode lembrar-nos a nós, portugueses, que estamos à espera desde 2016, dos nomes dos políticos e jornalistas que recebiam pagamentos do saco azul do GES. Esses nomes constavam nos Panama Papers mas continuamos sem os conhecer. Afinal, isto dos papers também tem os seus limites e as suas deontologias: divulgam-se nomes a trouxe-mouxe mas só de alguns.

Seja como for, agora, em 2021, já não temos tempo a perder com essas minudências. Vêm aí os Pandora Papers!!! E mais uma vez lá vamos em corrida atrás dos ricos e poderosos. Correr atrás dos ricos é aliás o desporto mais praticado pelos povos que empobrecem. De Cuba à Venezuela, correr atrás dos ricos foi uma actividade de tal forma bem sucedida que no fim só sobraram pobres e, claro, um grupo muito restrito de ricos, a saber os líderes da corrida contra os ricos. Pôr o povo a correr contra os ricos é uma actividade de alta rentabilidade. Política e não só.

(A propósito de corridas, a que velocidade seguia o carro em que viajava o ministro Eduardo Cabrita quando a 18 de Junho atropelou mortalmente o operário Nuno Santos? Não haverá um paper que fale disto?)

A cada um destes papers tenho crescentes dúvidas sobre os bastidores deste tipo de jornalismo que vive de fugas de informação e experimento uma irritação crescente contra a amálgama populista entre quem enriqueceu com a sua actividade e quem roubou: basta ter dinheiro e procurar pagar menos impostos para se entrar na categoria de mediaticamente suspeito. Ora colocar no mesmo plano pessoas que sabemos como enriqueceram, como acontece com Julio Iglesias, que vendeu mais de 300 milhões de discos, ou Guardiola, que é treinador de futebol, com o de alguém que enriqueceu de forma ilícita não é aceitável. Ou só o será se o objectivo final de tudo isto for a criminalização da riqueza e da procura de pagar menos impostos, mesmo que dentro do que se entendeu ser legal. Como bem assinala Henrique Pereira dos Santos “Se eu for um assassino, a lei e a sociedade reconhecem-me o direito de não me incriminar, ninguém me pode obrigar a confessar o meu crime ou a dizer o que quer que seja que possa ser usado contra mim, o direito a estar calado é reconhecido de forma absoluta. Quando chegamos aos impostos, este direito a não me incriminar não é reconhecido, pelo contrário, a lei estabelece, de forma imoral, que eu tenho a obrigação legal de me denunciar ao fisco.

Como sabe qualquer português com rendimentos médios, boa parte da legislação e dos fantásticos procedimentos anunciados para controlar os muitos ricos e as fraudes acabam sim a complicar ainda mais a vida aos não ricos, quando não aos pobres: a fotografia de Joe Berardo devia estar afixada naquelas resmas de papéis que os bancos nos exigem para conseguirmos um empréstimo para uma empresa, pois se a Joe Berardo tivessem sido aplicados pelos bancos os critérios usados para os demais mortais não só não teria obtido crédito algum como duvido até que tivesse conseguido abrir uma simples conta bancária.

(Esta fixação nas offshorea da Madeira também conta?sucede à indignação com os lucros milionários das empresas. Jerónimo de Sousa alertava-nos com fervor contra esse flagelo. Valeu-nos o estado anémico das empresas portuguesas para que essa chaga dos lucros milionários tenha sido devidamente debelada).

Ao primeiro sinal de fraude, burla, crime… em Portugal não se procura perceber o que aconteceu ou como aconteceu. De imediato se decide que há que mudar a lei. Ora muito frequentemente a lei ou o procedimento adequado já existiam, simplesmente não foram aplicados. Veja-se o caso de João Rendeiro que usufruiu de um termo de identidade e residência em condições absolutamente insólitas, para não dizer mais. Não duvido de que se se mexer na lei, os cidadãos comuns que forem sujeitos a termo de identidade e residência terão a sua vida ainda mais complicada. Obviamente a severa legislação e os rigorosos procedimentos continuarão a não ser aplicados àqueles por causa de quem se mudou a legislação. (Uma dúvida profunda atormenta-me há dias: dado o unanimismo das redacções portuguesas na hora de apelidar Rui Fonseca e Castro como “juiz negacionista” vão passar a tratar como juiz ou juiza “xoné” quem aceitou que João Rendeiro desse a morada da embaixada portuguesa em Londres como local para ser contactado após viajar para Inglaterra?)

A voracidade fiscal de um poder político que esconde a compra de clientelas e de corporações através de um discurso de diabolização da riqueza levou à constituição de uma ditadura fiscal. O Estado português sabe o que compramos no supermercado, os restaurantes a que vamos e a que horas, os combustíveis que escolhemos. Nunca nenhuma polícia política teve tanta informação sobre os cidadãos – todos eles, note-se – quanto aquela que neste momento acumula a Autoridade Tributária. Pior, como aqui alertou António Gaspar Schwalbach, o NIF substituiu, pura e simplesmente, os nossos nomes e quaisquer outros números de identificação” funcionando já como um número nacional único, apesar de a Constituição o proibir expressamente. Como é óbvio tudo isto tem tornado os ricos muito mais cautelosos e reforçado a ditadura fiscal sobre as pessoas comuns. Mas se pudéssemos responder livremente o que diríamos quando confrontados com a seguinte pergunta: o que acha que devem fazer as pessoas que a partir do próximo OE podem ser sujeitas a uma taxa efectiva de imposto na ordem dos 50,5% a 53%?  Note-se que os megamilionários que em Portugal incorrem nessa taxa são pessoas que ganham mais de 80 mil euros por ano e consequentemente vão ser  objecto de englobamento obrigatório (o tal que era para não existir mas afinal vai acontecer) dos seus rendimentos classificados como “especulativos”.

Tenho três certezas: os verdadeiramente ricos devem rir com o nosso conceito de riqueza; o englobamento obrigatório vai ser alargado nos próximos orçamentos a outros escalões menos abonados, pois nunca haverá dinheiro qb para pagar o preço de o PS ser governo; “Portugal papers ou a história de como empobrecemos” é um belo título para aquilo que nos está a acontecer. Mas para tal não é necessário nenhuma fuga de informação nem nenhum consórcio internacional de jornalistas, basta olhar para Portugal.

OFFSHORES  ECONOMIA  GOVERNO  MAIORIA DE ESQUERDA

COMENTÁRIOS:

Mario Almeida: Os paraísos fiscais são como o aquecimento global. Acabam quando as elites quiserem… mas como não querem, de vez em quando lá vem a pobre criança ou o consórcio internacional de jornalistas do BE fazerem de bobos da corte.           Joaquim Moreira: Esta crónica de Helena Matos alerta-nos para uma realidade que escapa a um qualquer mortal. E que é o facto de nos obrigar a pensar, sobre a razão por que "andamos todos aos papéis" e não temos tempo para meditar. Primeiro este tipo de sociedades, foram criadas pelas diferentes autoridades! E não por muitos dos beneficiários dessas mesmas sociedades. Mesmo sabendo que muitas dessas autoridades, são interessados nessas realidades. Mas para muitas pessoas e empresas bem-intencionadas, são usadas para não serem de forma abusiva taxadas. Agravado, por muito desse dinheiro taxado, ser muito mal aplicado. Quando não é mesmo roubado! Por isso, e como defensor de um Estado bem organizado e com capacidade para evitar as injustiças que existem por todo o lado, não posso deixar de perceber muitos dos que utilizam estas sociedades para evitar que o Estado fique com o seu dinheiro para ser depois muito mal aplicado. Para não dizer mesmo, gasto sem critério, mas com um propósito bem pensado. Para manter no poder muitos dos que nunca o deveriam ter!            Maria Madeira: De acordo com este artigo.         José Ramos: "[In] tranquila e infalível como Bruce Lee", Helena Matos. Que todos os deuses a abençoem e o meu obrigado.               Luís Marques: Muito bem. Eis como estamos, à espera que a próxima bancarrota nos venha salvar dos socialistas. É triste.               Jorge Martins: Completamente de acordo. Assinava o Expresso quando foram revelados os "Panamá papers". Cancelei a assinatura e não consumo informação do Grupo até que revelem a lista. Também acho que não é uma investigação .... É uma fuga de informação, cuja divulgação é uma arma política.              Agnelo Furtado: Helena Matos! Um texto que deveria ser lido e debatido na televisão paga por todos Nós. Obrigado.             José Dias: O jose maria aparenta ignorar as classificações dadas pela mesma Moody's aos bancos de investimento que caíram em 2008 ... ou aos "papéis" que os levaram ao chão. Só interessa quando a notícia encaixa na narrativa ... hipocrisia em bom.          josé maria > José Dias: Três anos depois, Moody’s sobe rating de Portugal. A agência de notação financeira elevou a classificação da dívida soberana de Portugal, que fica agora igual à que é atribuída pela Fitch e pela S&P. "A economia portuguesa está a registar uma robusta recuperação da recessão pandémica, apesar dos desafios que se colocam no sector do turismo. Os níveis de emprego normalizaram, o que ajuda o consumo privado, e as fortes retomas em mercados chave de exportação estão a sustentar a recuperação na exportação de bens", destaca. Jornal de Negócios, 17/9/2021               A. Carnide: Do melhor!              Simões de Matos: Srª Helena Matos: É louvável a sua persistência e de tantos outros comentadores na divulgação das misérias que germinam neste país que passei a ver de fora. Louvável porque como constatamos, apenas contribuem para o crescente aumento da nossa impotente indignação. Os políticos e mais tarde os banqueiros portugueses de forma transversal e desde a implantação da república, como reza a história, sempre cometeram e permitiram que se cometessem todos os desvarios acrescidos de doses substanciais de incompetência, arrogância e desprezo pelos mais elementares direitos do cidadão comum. Resumindo, o estado desgraçado deste pobre país que se repercute no estado de pobreza dos seus cidadãos já é aceite como uma sina ou se quisermos, o nosso desgraçado destino. Veja-se a alegria que transparece nos olhos do Primeiro Ministro quando fala (e fala muitas vezes) do dinheiro que os países chamados ricos, também conhecidos por nossos parceiros comunitários, colocaram à nossa disposição. Comparo-o ao mendigo que acaba de receber uma esmola de um senhor rico e que o deixa feliz enquanto a esmola durar. Depois, volta à rua à espera que o senhor rico volte a ter piedade e repita o gesto. Pregar aos peixes sempre será mais reconfortante.               Da Costa: Mais uma vez surpreendido pela positiva, pela clareza de análise deste país concorrente a liga bolivariana 🥺               Maria Tubucci: Certíssimo. Para mim os Pandora papers são uma false flag. São utilizados pelos serviçais do governo na CS, para o governo lucrar, ou seja, para intensificar e justificar as  acções do fisco sobre a classe média. Aos ricos o fisco só tira se eles quiserem, aos pobres não há onde tirar, logo a classe média, como sempre, será a árvore das patacas do governo.   Anarquista Inconformado > Maria Tubucci: Pois é, a Classe média são os principais clientes dos papers e da fuga ao fisco, pois é a classe que em Portugal mais ajudas a fundo perdido recebe do governo e da UE. Lírico este discurso.            Miguel Eanes: Só um povo bovinizado se preocupa em saber a que velocidade conduzia o motorista de um ministro ou se o seguro dos funcionários públicos (pago unicamente por eles), tem acordos ou não com este ou aquele médico. Querer saber por que razão as petrolíferas continuam a aumentar todas as semanas os preços dos combustíveis, antes de impostos, num ano aumentaram mais de 300 euros por tonelada; Qual a razão de as empresas produtoras de energia eléctrica estarem a vender cada vez mais cara a electricidade às empresas distribuidoras. Isso não interessa.         Martelo de Belem ....: :Nunca é demais alertar para a ditadura que se está a implantar em Portugal. Costa vai ceder ao PCP e BE e isso quer dizer mais controlo, mais pobreza e menos liberdade.         Nuno W: Excelente artigo, a todos níveis, e mais um alerta para o nosso empobrecimento e para a mediocridade da nossa governação. É bom recordar aquela promessa do Expresso/SIC feita em 2016 de revelar o nome dos políticos e jornalistas que recebiam pagamentos do saco azul do GES. Esses nomes constavam nos Panama Papers.               Cipião Numantino: A nossa estimada HM praticando tiro ao alvo. E apontando os vários vícios e malefícios do regime. De permeio aponta a iniquidade de certas coisas e a inveja larvar que as suporta. Dando a minha modesta contribuição ao conceito, acrescentaria que um governo (todos os governos) se regem por uma lógica criminosa. Afinal onde reside a diferença entre a lógica predadora fiscal de um governo ou a contribuição exigida, por exemplo, pela N´Drangheta ou pela Camorra Napolitana? Estes últimos enviam-te uns capangas para, à força, te obrigarem à contribuição exigida e, o primeiro, manda-te uns indivíduos fardados que te sacam até ao último tostão e ainda te metem rapidamente na prisão (rima e é verdade). Mais, tenho para mim, que com as organizações criminosas ainda se pode dialogar ou até procrastinar um pouco. Bem conversadinha a coisa, ainda são bem capazes de te ajudar numa aflição momentânea. Já, no que concede ao governo, não existe desculpa que te valha nem vicissitude que os detenha. Pagas e não bufas. E, no caso específico português, primeiro pagas e só depois terás direito a reclamar!!! Ou seja, a lógica criminosa, no limite, terá até um substrato mais ético do que a lógica governamental. Alguns dos que me lêem, contraporão que é assim a lógica das coisas e que sem governo as sociedades não avançam. Seja assim ou não, o que eu pretendo explicitar é a questão dos excessos e não aquilo que se balizará dentro de um exemplo normal. Ouço por vezes pessoas que afirmam convictamente que o problema se situará que quem foge aos impostos vai implicar que outros paguem por eles. Ou seja se um não paga, todos os outros terão que pagar por ele. Tal presunção está absolutamente errada. E diz-nos a prática das coisas e a afirmação de vários estudiosos que um governo, seja ele qual for, rapina tudo o que lhe é possível rapinar. No limite, porque todos os governos tendem para o socialismo e têm a permanente punção de roubar a uns para dar a outros. A lógica é a do síndrome do Robin dos Bosques e o pagamento é a colecta e a compra de votos com que se animam. Para se aquilatar correctamente o conceito é relembrar as palavras da Mariana Mortágua que afirmou "que se deveria ir buscar dinheiro onde o há" que, sem escandalizar, foi submergida por infinitos aplausos numa plateia composta por socialistas. Pessoal, esta história dos Pandora papers, traz água no bico. De vez em quando soltam-se os cães para amedrontar o maralhal e para justificar os aumentos de impostos que por aí vêm (a obscenidade dos impostos sobre os combustíveis deveria servir de alerta). Por sua vez, sonegam-nos informações vitais como bem diz HM sobre os serventuários do saco azul do GES ou o financiamento de políticos e jornalistas. A propósito, junto a minha a outras vozes: a que velocidade vinha o carro do ministro Cabrita que vitimou um chefe de família e pai de duas filhas menores? Afloro, finalmente, o desaparecimento da comunada no parlamento checo. Essa gente sentiu na pele a perversidade desta gente. Lá, como cá, deveriam ter concluído que, por definição e ética, um comunista é um inimigo da sociedade. Vai, daí, mandaram dar-lhes corda aos sapatos e é isso que acabará por acontecer por aqui mais cedo ou mais tarde. É isto. Temos um país a saque sustentadamente tendo ainda menos liberdade do que antes da abrilada. Nunca gostei muito de Cavaco, mas ele sabe da poda. E deveríamos ouvir e interiorizar tudo aquilo que nos vai dizendo. No limite, comparar Cavaco com o actual inquilino de Belém é como tentar comparar um violino com uma pandeireta. Ambos fazem barulho, mas um toca música enquanto o outro domina tão só o estardalhaço. Temos um estado quase falhado. Onde o cangalheiro xuxa procede às últimas exéquias e o papagaio-mor do reino vai recitando as competentes ladainhas. O excelso Marquês de Pombal, avisado pelo embaixador de Espanha que poderíamos ter guerra, respondeu: "venham, venham, que mesmo para retirar um português morto de sua casa, são precisos quatro"! Onde reside mais esta coragem tipicamente portuguesa?...               João Floriano > Cipião Numantino: O Cipião hoje rebentou a escala. Uma verdadeira obra de arte do comentário. E mais não há para dizer.       Vitor Batista > Cipião Numantino: É um prazer ler os seus comentários, e há anos que eu andava arredado do observador, voltei porque não posso deixar de ler o Alberto Gonçalves e a Helena Matos, e os seus comentários também, que são crónicas dentro de outras crónicas, mas não partilho do seu optimismo em relação aos comunistas. Se na república Checa eles desapareceram, em Portugal vão ajudar a aprovar o orçamento com pompa e circunstância, lutar pelos direitos dos trabalhadores e contra o grande capital………………

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