É certo que ainda há quem cante “O que faz falta é animar a malta, o que faz
falta…” E, entre esses que cantam, estão aqueles, que Alberto Gonçalves descreve como definitivamente ruinosos para o
país…
Mas o que faz falta é, definitivamente, ensinar a malta,
para que a malta tome, definitivamente, consciência do que lhes/nos falta.
Mas Alberto
Gonçalves não crê nisso, ai de nós. A invernia está instalada e tudo não passa de bluff...
Por morrer uma geringonça não acaba o Inverno
Se é compreensível celebrar durante
cinco minutos a queda de Costa e seus acólitos, seria tonto ignorar que a queda
é simulada, e que essa gente nunca abdicará do poder com civilidade.
ALBERTO GONÇALVES, Colunista do Observador
OBSERVADOR, 30
out 2021
A
certa altura do debate do Orçamento, o ministro da Economia impacientou-se: “Desde
2015 o salário mínimo em Portugal aumentou um terço: 32%. A Alemanha já não
aumenta o salário mínimo há anos!” A Alemanha
apenas tem salário mínimo desde 2015. De então para cá, aumentou-o ligeiramente
cinco vezes, para o montante actual de 1.585 €. Claro que a Alemanha é a
Alemanha e Portugal, coitados de nós, é Portugal. E a Venezuela, que no mesmo
período aumentou o salário mínimo uns 800%, para os 3 euros em vigor (compram
um queijo e um litro de leite), é a Venezuela. Não é esse o
ponto.
O ponto é o seguinte: no debate de quarta-feira, o PS e o governo, que
habitualmente mentem imenso, aproveitaram para mentir com redobrado empenho. Um
espectáculo, não necessariamente digno. Pintou-se, com rolo de trolha, o retrato
de um país à beirinha do Paraíso. Para atingir o Paraíso bastava meramente
corrigir alguns pormenores herdados da Idade das Trevas, leia-se o Tempo do
Passos. Por acaso e talento, as correcções chegariam com o novo Orçamento, que
ergueria de vez a nação a uma plenitude virtuosa. Por maldade e azar, o
Orçamento acabou rejeitado.
O dr. Costa não queria outro desfecho. Lendas à
parte, a criatura percebe que reduziu isto a cinzas. O caldo de compadrios e
ideologia amanhado pela frente de esquerda pegou num país combalido pela
bancarrota anterior (a de Sócrates, lembram-se?) e atirou-lhe uma bigorna à
cabeça. É particularmente engraçado que PS e governo tentassem vender o
Orçamento como o “mais à esquerda de sempre”, portanto o “melhor de sempre”. Conhecem
aquela empresa de revestimentos que publicita com orgulho o reforço da
percentagem de amianto? Não conhecem porque não existe. Inacreditavelmente, os
socialistas existem.
Ao invés do que se pensava, o “bluff”
orçamental não veio de qualquer dos partidos comunistas: veio do PS e do
governo, que enquanto fingiam vender o Orçamento rezavam para que ninguém o
comprasse. Perante a desgraceira que se instalou e a desgraceira maior que não
tarda a instalar-se, a intenção do dr. Costa consistiu em despachar a culpa
para os ingratos que, além de não agradecerem devidamente as prodigiosas
conquistas anteriores, recusaram as conquistas futuras.
Apesar das dificuldades linguísticas,
o homem tem uma ideia do buraco em que nos enfiou, agravado pelas brincadeiras
nacionais e internacionais alusivas à Covid. Nos
próximos meses, que não serão bonitos, o Orçamento enjeitado justificará tudo.
Tudo o que corra mal será responsabilidade dos bandalhos que ignoraram o
interesse nacional em prol de – nojo profundo – estratégias partidárias. Ou
seja, a única
especialidade do dr. Costa. Entretanto,
o dr. Costa ou vai à maioria absoluta, para se libertar de dependências e
torrar a “bazuca” em paz, ou vai para o cargo “estrangeiro” e de “prestígio”
para que se julga habilitado. Ou não vai a lado nenhum e depois logo se vê. Não
sendo um plano brilhante, demonstra confiança na, digamos, candura do seu
eleitorado potencial. E na fidelidade dos “media” sustentados pelo Estado e
engajados pela crendice.
A
imprensa amiga não demorou. Na quinta-feira, a manchete do JN berrava, assustadíssima: “Chumbo do Orçamento trava ganhos
de mil milhões para as famílias” (chiça, por um triz). No “Público”, o
pavor e a manchete não cabiam na página: “Portugal forçado a ir a votos” (e assim minar a democracia). De brinde,
o interior deste diário enumera as medidas progressistas e estupendas ameaçadas
pelo “chumbo” (ó inclemência, ó martírio). Televisão não vejo, mas as “redes
sociais” fervilhavam de alegados eleitores do BE e do PCP (principalmente do
BE) que juravam conversão ao PS. Eis uma amostra do que está para vir.
Caso
eu conseguisse ter pena de fanáticos, teria pena de ambos os partidos
comunistas, o original e a seita. Se
continuassem a aliança com o PS, continuariam a encolher por redundância. Ao desfazer a aliança, arriscam-se a ser desfeitos
pela propaganda de quem possui meios quase ilimitados. Quando o dr. Costa “derrubou o muro”, a
extrema-esquerda não passou para o lado de cá: o PS passou para o lado de lá
por conveniência e convicção. E ocupou sem hesitações o espaço dos inimigos da
democracia. Com uma
excepção: a “Europa”, que PCP e BE desprezam e de que o PS necessita por
razões, vamos lá ver, financeiras. Foi a “Europa”, e as respectivas imposições,
que serviu de pretexto à ruptura. A ruptura, palpita-me, servirá melhor o PS do
que os ex-companheiros de estrada.
Não precisávamos do debate do OE para
descobrir a desmesurada ausência de escrúpulos do dr. Costa e dos seus acólitos. E se é compreensível celebrar durante cinco minutos a
queda dessa gente, seria tonto ignorar que a queda é simulada, e que essa
gente, dona de um apetite voraz, nunca abdicará do poder com civilidade. O passo atrás
visa dar muitos passos à frente, cada um a esmagar-nos no caminho. Essa gente é boçal, falsa, inapta, prepotente,
ignorante e desonesta? Sim, sim, sim, sim, sim. E sim. Infelizmente, sobra-lhes
em ganância o que lhes falta no resto.
Também
falta ao PS concorrência. Até aqui, não falei na “direita”. Para dizer o quê?
Não imagino aquilo que, hoje, a “direita” é ou pretende ser. Há por aí uns
suspiros e uns desabafos e umas intrigas. Não há, que se veja, o esboço de um
“projecto” (desculpem). A oportunidade caiu-lhe no colo: ou a “direita” arranja
rapidamente juízo, e um milagre, ou o abençoado fim da “geringonça” pode
tornar-se o início de coisa igual ou pior. Eu sei que pior parece impossível,
mas, à semelhança de quatro quintos das palavras, “impossível” não consta do
dicionário do dr. Costa. Antes
de festejar, convém à “direita” ganhar a guerra. E antes ainda convém entrar na
guerra.
CRISE POLÍTICA POLÍTICA PS ORÇAMENTO DO ESTADO ECONOMIA
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