À análise teórica de Francisco Assis sobre o empobrecimento discursivo do
debate público, com a perda de intelectualidade ideológica, a subjectividade ou
o exibicionismo balofo substituto das ideias, responde o comentador Jose com expressivo texto de dados objectivos
preponderantes referentes aos tempos de Salazar e a condução mesquinhamente atrofiada
então, da economia nacional. Quanto à pobreza no debate de ideias, eu nunca pude
esquecer um confronto televisivo entre Mário Soares e Felipe González, pelos anos 80, em tempos da solidificação de democracias na
Península Ibérica, a inépcia palreira do nosso PM, orgulhoso do seu pioneirismo
socialista, e o discurso preciso do ministro espanhol, pleno de informação objectiva
e esclarecedora em várias frentes. É natural que tanto empobrecimento cultural,
aliado a diversos factores de instabilidade e penúria no ensino, reduzam paulatinamente
a qualidade desses nossos debates, feitos de ataque e defesa ou auto-elogio de
pouco rigor analítico. Francisco
Assis parece acreditar, todavia, em “crescimento económico” perpetrado pelo actual governo e isso
poderia trazer-nos esperança numa evolução positiva na questão da
intelectualidade nos debates. O texto de Jose
retira-nos a esperança de que poderemos mudar algum dia. Somos assim,
gente de arado, antigamente, hoje a gostar de bons espadas que o estrangeiro
fornece, gente que o Estado-Providência vai protegendo, até ver.
OPINIÃO: O perigo do
anti-intelectualismo
Mesmo que nos devamos regozijar pelo
facto de estarmos a crescer acima da média europeia não nos podemos resignar a
ver acentuar-se, ano após ano, a nossa divergência em relação a Espanha.
FRANCISCO ASSIS
PÚBLICO, 11 de Julho de 2019
1.
No final da semana passada participei num curso de Verão promovido pela
Fundação Yuste. Este curso decorreu no mosteiro com o mesmo nome, localizado
na província espanhola da Estremadura, e no qual Carlos V passou os últimos
meses da sua vida numa atitude de recolhimento interior. Agora acolhe a
sede de uma Fundação dedicada à promoção da reflexão, do estudo e da
discussão dos temas ligados à União Europeia e à América Latina. Num
ambiente de profunda liberdade foi possível debater as questões que
presentemente se colocam com maior acuidade nestes espaços geográficos e
políticos. Impressionou-me o espírito de abertura mental prevalecente. Houve,
porém, um momento de tensão, que terá passado quase despercebido à
generalidade dos participantes, mas que me despertou para a reflexão sobre uma
das mais inquietantes características do tempo que vivemos.
A dada
altura um interveniente numa mesa redonda lembrou-se de questionar o interesse
daquilo que designou como uma excessiva propensão académica para a
teorização da realidade, contrapondo a necessidade da obtenção de soluções
imediatas e concretas para os problemas em análise. Imagino os aplausos que tal imprecação não teria
deixado de suscitar numa reunião partidária ou num encontro de potenciais
regeneradores das nossas democracias. Ali mereceu uma veemente resposta dada
por uma socióloga argentina que enunciou com uma impressionante clareza os
perigos do anti-intelectualismo, hoje tão disseminado. A
desvalorização da reflexão crítica e a recusa da complexidade conduzem
directamente ao surgimento de fenómenos políticos como aqueles que o
sucesso de Trump ou de Bolsonaro configuram.
Infelizmente esse discurso anti-intelectualista não se confina a esse reduto
político e tem vindo a ser inesperadamente adoptado por representantes de quase
todas as correntes de opinião.
Contrariamente ao que se tornou vulgar dizer, nem todos os movimentos
etiquetados de populistas cultivam esta atitude. Será bom, a este
propósito, não esquecer que há uma tradição populista assente numa
elaboração teórica assinalável e que tem no pensamento de Ernesto
Laclau a sua manifestação contemporânea
mais sofisticada.
O anti-intelectualismo como atitude
ancorada na exaltação de um simplismo obreirista tem vindo a conquistar terreno
de modo muito preocupante. Um dos seus efeitos consiste na supressão de um
espaço público qualificado e aberto à troca de argumentos racionais. Na ausência desse espaço público proliferam as lógicas
tribais no plano da adesão doutrinária e a mentalidade de alcateia no domínio
da discussão social. Tudo isto tem tido
tradução visível no empobrecimento da linguagem, na polarização emocional da
retórica e na progressiva desvalorização do outro enquanto sujeito portador de
um pensamento e de um discurso respeitáveis. Basta seguir uma tarde de debate parlamentar para
perceber tudo isto de forma impressiva. Dispenso-me do penoso exercício da
apresentação de casos concretos. Só este inusitado avanço do
anti-intelectualismo pode explicar o grau de facilitismo mental que está a
atingir alguns sectores da chamada elite cultural portuguesa. Lêem-se e
ouvem-se coisas que até há pouco tempo um certo pudor da inteligência teria
condenado ao segredo de confabulações íntimas. Agora assiste-se a um
exibicionismo da asneira como se isso constituísse prova da robustez das
convicções.
2.
Na Assembleia da República decorreu ontem o debate sobre o
estado da Nação. Como o fim
da sessão legislativa coincide este ano com o término da legislatura este
debate, em concreto, assumiu uma importância maior do que é habitual. Deter-me-ei
exclusivamente num ponto específico que motivou acesa discussão e que é do
maior relevo: a comparação do ritmo do crescimento económico português com o
dos nossos parceiros europeus. O Governo apresentou como um dos seus
principais sucessos o facto de a nossa economia ter crescido nos últimos anos
acima da média europeia, algo que já não sucedia há bastante tempo. O PSD, não
podendo desmentir tal facto, optou por salientar a circunstância de estarmos a
crescer a um ritmo francamente inferior ao dos países que nos são mais próximos
do ponto de vista da produção de riqueza e do desenvolvimento.
Se
quisermos levar a cabo uma discussão pré-eleitoral séria este terá de ser um
dos temas centrais do debate público. Na verdade, o país continua
aparentemente condenado a um crescimento económico medíocre que não abre
perspectivas de melhoria dos salários, que são reconhecidamente baixos, e que
põe em causa a sustentação financeira de alguns sectores fundamentais do Estado
Providência. Depois de tantos investimentos na educação, nas infra-estruturas
físicas, na promoção das novas tecnologias, que factores continuam a impedir
uma maior expansão da economia portuguesa? Já não é possível alegar, como o
fazia grande da direita, que os principais factores de bloqueio residiam na
rigidez da legislação laboral ou na excessiva burocracia do Estado; também já
não é aceitável afirmar, como durante muito tempo o fez uma certa esquerda, que
o país se não preocupava devidamente com a qualificação dos seus recursos
humanos. Esta questão, para a qual não se espera uma resposta unívoca, deve
constituir-se como o grande tema de debate nacional nos próximos tempos. Mesmo
que nos devamos regozijar pelo facto de estarmos a crescer acima da média
europeia não nos podemos resignar a ver acentuar-se, ano após ano, a nossa
divergência em relação a Espanha.
COMENTÁRIOS
P Galvao, Lisboa: O problema português não é muito diferente do de tantos
outros países que não possuem massa crítica para se desenvolverem, e por isso prolifera
o corporativismo, a corrupção, mais as elites que não o são, e por fim o
racismo social, ideológico e étnico. Tudo isto remata - se com uma justiça
feita à medida dos interesses maiores apenas de alguns, como convém a esta
sociedade de brandos costumes. A comunicação social não está isenta de culpas
por este estado de coisas, como o Público recentemente veio provar.
Jose, 11.07.2019: Portugal
viveu uma ditadura doentia de elogio à pobreza de controlo das empresas
através do condicionamento industrial, de concentração da riqueza em 6
nomes que reuniam com o Ditador e eram eles próprios condicionados a não
crescer. O Franquismo não
foi tão tacanho. A economia portuguesa protegida abrindo apenas à UEFA e através dela
dispunha de um dispositivo produtivo de baixa competitividade, uma agricultura
que pouco mais evoluiu da do arado de pau para o de bico de ferro. Essa
economia foi exposta do dia para a noite, sem reservas, à CEE. Consequência:
faliu com salários em atraso e despedimentos. As empresas competitivas da CEE venderam para o mercado português
gerando "bem-estar". Com o
Euro a economia deixou de crescer e faliu em 2008 com empobrecimento,
precariedade, perda do EP.
EP, Estado Providência, como
lhe chamou é para ser o Estado a resolver o básico da vida das famílias que
trabalhando toda a vida morrerão prematuramente sem assistência médica, os seus
filhos não serão escolarizados, o final de vida será indigente por não lhe ser
pago o trabalho pela economia real e financeira. É essa economia que mata que
cresce pouco. Acresce que as empresas e negócios essenciais à
vida já não são portuguesas. São da China, Angola, Brasil... esses países
dessas civilizações diferentes da Ocidental não estão cá por causa dos
portugueses e sua história, mas por causas deles. Portugal tem os seus
capitalistas presos, acusados, indiciados, arguidos e gozados na praça pública.
O investimento privado cinge-se às verbas europeias elegíveis. Isto não pode
crescer, ao contrário.
A banca que opera em Portugal é
predominantemente espanhola e o resto, designadamente a CGD tem uma gestão
profissional cujos administradores são validados e controlados pelo BCE. As
pessoas capacitadas emigraram empurradas umas e fugidias outras. As pessoas em
idade fértil foram procriar para o estrangeiro. O povo português entrou em
extinção há dez anos. Quem quer que queira recorrer a crédito para investir em
Portugal tem de passar pelo crivo espanhol e ficar sujeito a ver o seu nome na praça
pública como os outros. A dívida pública gerada para pagar a especulação
financeira que o BCE não travou até essa dívida ser tal que o Estado meteu o
pescoço no laço do enforcado cuja corda tem a ponta no BCE. Isto obriga o
Estado fazer o empobrecimento, precariedade, degradação do Estado Social.
Bem sei que tem a esperança de que as
reformas estruturais resolvem tudo. E as reformas estruturais são o quê?
Seguros de saúde para quem tem dinheiro, cheques educação para pagar o ensino
privado, plafonamento das reformas para reduzir as receitas da SS e baixar as
reformas, acabar a reforma laboral eliminando os vínculos, liberalizado os
despedimentos. Podem fazer tudo isso e a economia portuguesa não crescerá mesmo
com mão de obra ao preço asiático, brasileiro ou africano. Não cresce por não
haver Capital e por terem asfixiado o Trabalho.
Margarida Paredes, Lisboa 11.07.2019: O governo podia ter a coragem política de acabar com o
vergonhoso Salário Minimo de 600 euros e seguir o exemplo da Espanha que o
aumentou para 900 euros.
Ventura Melo Sampaio, Pêra Silves 11.07.2019: Existe um grande deficit de compreensão sobre o fenómeno
do desenvolvimento, a começar pelos gestores das universidades e das
instituições de I&D&D e também das que fazem a avalição dos resultados!
Nenhum comentário:
Postar um comentário