Um artigo de Helena Garrido que mal se entende, numa aparência de isenção,
apontando os erros da política governamental enganosa, e por outro lado
aceitando de coração, parece, a “gestão
politicamente muito inteligente” do dito governo. Os próprios comentadores parecem mal compreender
tal discurso, que deseja agradar a gregos e troianos e se fica, de facto, pelo
cavalo de pau dos gregos finórios, que arrasaram Tróia. Eu também acredito no
cavalo de pau, acredito na destruição de Tróia que este governo vai perpetrando,
sem calcanhar de Aquiles a tolher, Príamo e Hécuba e Heitor definitivamente
arrumados. Costa, Aquiles lusitano, sem calcanhar vulnerável à vista, que ele o
transformou gloriosamente em ponto forte, arrumando Heitor na prateleira
fúnebre, uma nova Tróia a parecer ressurgir, em mãos de gregos…
Quatro anos de austeridade disfarçada /premium
Está
a acabar uma legislatura surpreendente. Caíram os muros que separavam o PS
do PCP. Mas a política económica seguida dá sinais de ter adiado custos e
iludido as escolhas que, de facto, se fizeram.
Esta semana marca-se simbolicamente o
fim da legislatura, com o debate do Estado da Nação. Quatro anos que ficam já definitivamente na história da democracia
portuguesa, por terem rompido o muro que existia entre o PS e o PCP, alargando
as alternativas de governação do país. Quatro anos que precisam ainda de
esperar por algum tempo para se perceber exactamente os custos dessa aliança à
esquerda que, quer se queira quer não, condicionou a combinação de política
económicas. Um governo apenas do PS teria tido uma política mais próxima de um
executivo do PSD com o CDS, ter-se-ia concentrado menos nos resultados de curto
prazo e colocado mais recursos em medidas com efeitos a médio e longo prazo.
A degradação dos serviços públicos,
com relevo muito especial para o sector da Saúde, é a face mais visível dos
custos destes quatro anos de governação. Os efeitos, a prazo, destes custos são
ainda difíceis de medir. Neste momento já se traduziram em mais despesa pública
na saúde e compromissos de mais investimento em sectores como os transportes
públicos.
A
pergunta que se impõe é: até
que ponto esta espécie de “défice público” escondido se traduzirá a prazo numa
escolha mais dramática entre maior degradação ou agravamento efectivo do défice
público? O que
poderá condicionar a política orçamental dos próximos anos, designadamente o
objectivo de reduzir impostos, que faz parte do programa eleitoral já revelado
pelo PSD. Não será por acaso que o PS criticou o programa do PSD, dizendo que
abre um buraco orçamental – pode admitir-se que sabe a margem que não deixou
para a redução de impostos no futuro por causa do “défice público” oculto.
A gestão destes quatro anos foi politicamente muito inteligente. Caracterizado
por um pragmatismo, o Governo concretizou medidas que maximizavam a receita ou minimizavam a despesa pública mas eram
percebidas como não tendo qualquer efeito nos bolsos ou na qualidade de vida
dos cidadãos. Foram quatro anos de ilusão de almoços grátis que se
traduziram obviamente na popularidade do Governo e em especial do ministro das
Finanças – o mais popular desde o tempo de Sousa Franco.
A
viragem da página da austeridade traduziu-se basicamente no aumento do poder de
compra dos grupos organizados e mais ruidosos, num processo facilitado pelo
apoio do PCP do BE. Os grupos sem voz ou tudo aquilo que não se vê acabou por
experimentar, nestes quatro anos, uma austeridade ainda mais apertada do que
nos quatro anos anteriores. A que se juntou uma capacidade política
extraordinária de neutralizar todas as críticas.
Vejamos o caso do investimento público. Alguns
projectos megalómanos e irracionais da era de José Sócrates foram alvo de crítica
e apontados como uma das razões do colapso financeiro. Críticas, que são focadas em projectos que não são
rentáveis nem financeiramente nem economicamente nem socialmente, rapidamente
são transformadas em criticas a todo e qualquer investimento público. É com
este sofisma – “és contra investimentos públicos irracionais, logo és
contra o investimento público” – que o PS se
defende da falta de investimento público. Esta mensagem tem obviamente muito
mais força do que passar a explicar que estamos, em grande parte, a falar de
investimento público de reposição, que vai desde máquinas para diagnóstico, nos
hospitais, até barcos e locomotivas para os transportes públicos.
Um outro exemplo é o dos impostos. O
Governo desafia os opositores a identificarem impostos que tenham sido
aumentados, mostrando em contrapartida que baixou a sobretaxa de IRS e, com
menos orgulho, que reduziu o IVA da restauração. O aumento da receita
fiscal, argumenta, está relacionado com o crescimento da economia e
designadamente com a criação de emprego e o aumento do consumo – especialmente
por via do turismo.
Tudo isto é verdade e poderá, de facto, explicar boa parte do aumento da
receita fiscal que ocorreu acima do PIB nominal. Mas é meia verdade.
Desde 2018 que as mudanças nas regras dos recibos verdes, primeiro no IRS e este ano na Segurança Social,
têm um impacto que é difícil de avaliar, de imediato, mas que com uma elevada
probabilidade significa pagar mais impostos e contribuições.
Há um outro exercício que mostra até que ponto se mascarou uma política orçamental
contraccionista e que é a análise dos decretos de execução orçamental. Com
a aprovação do primeiro-ministro e apesar de nada se dizer sobre o assunto, nunca como nesta legislatura o Ministério
das Finanças teve tanto poder. É interessante como no passado se debateu
tanto a necessidade de dar ao ministro das Finanças super-poderes, sem que
realmente os tenha tido, e como nesta legislatura, sem nunca se ter debatido o
tema, Centeno foi mesmo um ministro
poderoso.
Claro
que não há política económica sem política. E a política económica é mais fácil
de se concretizar com mensagens políticas eficazes, que convençam (ou iludam)
as pessoas. Do ponto de vista político este Governo foi um sucesso que
ultrapassa os primeiros mandatos de Cavaco Silva e de José Sócrates. O sucesso
político é reforçado quer pelas baixas expectativas com que se estreou quer
pelos muros que fez cair à esquerda, dando ao país mais alternativas de
governabilidade.
Já é mais discutível se estes quatro anos se traduziram numa sociedade mais transparente e
tolerante. Há
sinais preocupantes de radicalismo, intolerância com quem pensa de forma
diferente, catalogações extremas entre esquerda e direita e perigosas permissividades
para uns enquanto a outros quase nada é permitido. A assimetria na
avaliação de actos e opiniões agravou-se e ampliou-se. E isto resulta numa
sociedade que se pode tornar opaca e permeável
a movimentos inesperados de extremismo. Nada pior do que não percebermos
exactamente o que pensam as pessoas.
Quanto aos efeitos económicos
e sobretudo financeiros destes quatro anos vamos percebê-los melhor depois das
eleições de Outubro. Os indicadores, que já temos, permitem dizer que estamos
longe de ter resolvido o nosso problema de dívida pública e privada. Continuamos muito frágeis e expostos a uma
tempestade financeira. Podia ter sido diferente? Podia, infantilizando
menos as pessoas e tornando-as conscientes do problema de endividamento que
temos. A austeridade continuará, mais ou
menos disfarçada, com escolhas mais ou menos mascaradas. Nestes quatro anos
escolhemos dar mais dinheiro às pessoas que trabalham no sector público e
degradar os serviços públicos.
COMENTÁRIOS
Alf Silva: Helena Garrido é definitivamente
tonta. Diz que: "Do ponto de vista político este Governo foi um
sucesso que ultrapassa os primeiros mandatos de Cavaco Silva e ...". Não
tem memória nem sabe procurar arquivos. O ambiente internacional no tempo de
Cavaco Silva era completamente adverso e Portugal era, de longe, o país com
maior sucesso económico-financeiro da Europa em termos de análise estática e de
taxas de desenvolvimento. Incluindo a do desemprego que se ficava pelos 2,6%.
Eu sou testemunha e tenho provas que Cavaco Silva foi considerado o melhor
governante do mundo, desde o Japão até à Alemanha de Helmut Khol. Helena
Garrido diz ainda neste artigo que, nesta legislatura de 4 anos, as diferenças
principais entre PS e PCP desapareceram - isto significa que o PS passou a ser
estalinista, ou seja, passou a defender o extermínio das populações como método
de governo, como disse ser o PCP em Out2017 no Coliseu em Lisboa, e no Porto.
Helena Garrido diz, implicitamente neste seu artigo, que o PS defende o
extermínio das populações. Não sou eu que o digo.
Antonio Fonseca > Alf Silva: O SOCIALISMO é "O fim da
propriedade privada e a sociedade sem classes". Se o PS conseguir cumprir
a sua ideologia no final vai passar por uma fase "VENEZUELA" e no fim
tornar-se ESTALINISTA, se isso for preciso para se eternizar no poder.
ALBERICO LOPES: Análise brilhante! Mas, Helena, não vale a pena
chover no molhado! Como diz o costa, a "austeridade" acabou e as
vacas até já voam! Tudo feliz, sobretudo para o César dos Açores e a sua
famiglia!
A. Carnide: Ferida oculta bem denunciada.
Já o curativo a aplicar é complicado de encontrar. Oxalá a direita se resolva,
renove e organize, senão teremos pouca longevidade como nação independente...
Maria Emília Santos Santos: Mas o pior de tudo neste
agravamento de austeridade camuflado, é que o povo português, dorme-lhe
em cima como se nada se passasse! O povo
varre para debaixo do tapete
Adelino Lopes: Mais um excelente artigo da H.
G. Mas eu gostava de saber concretamente (com números) quanto mais recebem os
funcionários públicos agora relativamente a 2015. Nos casos dos escalões acima
do salário médio chega sequer para cobrir a inflação? O problema é mesmo esse; a
população tem fé. A máquina de propaganda bem o sabe. Défice público
escondido? Por estas e por outras é que eu acho que deve ser o PS a ganhar
as eleições. Será que teremos um novo ministro das finanças a criticar o
anterior governo? E o verdadeiro investimento? Sim aquele que demora ~5
(às vezes ~10) anos a implementar-se e é fundamental para o país? Bem, desse é
melhor nem falar. Como temos vindo a constatar, Portugal está cada vez mais na
cauda da Europa em termos de PibPerCapita. É a vida.
Joaquim Moreira: Quatro anos de austeridade disfarçada, para muitos de nós, já não é nada. O mais grave, e pior, é o
que esconde por não poder ser visualizada. Embora alguma já não consiga ser
disfarçada, ainda há muita que está ainda completamente guardada. Desde logo, a
que resulta da necessidade de renovação de equipamento, que está a ser usado
até que já não tenha nada dentro. E este é mesmo um problema que o futuro
vai trazer, e que vamos ter que resolver. E que o próprio Programa de Governo
do PSD não consegue prever. Programa esse que teve o cuidado de se basear, em
dados do CFP, usando dados mais conservadores, para não enganar os eleitores. Mas
convém dizer, que mais do que a austeridade disfarçada, é o facto desta
“solução de governo” não servir para resolver nada. Entendido o “resolver” como
os problemas que continuamos a ter.
Pérolas a porcos: Esta legislatura é de facto
SURPREENDENTE, mas antes de mais por ter MANTIDO, e em alguns casos AGRAVADO a
AUSTERIDADE, quando este 1º Ministro e os partidos da "geringonça" se
tinham unido, precisamente CONTRA A AUSTERIDADE!!!
E O MAIS GRAVE É QUE FOI A AUSTERIDADE PROVOCADA PELOS PRÓPRIOS
SOCIALISTAS, QUE CONDUZIRAM O PAÍS À 3ª BANCARROTA EM 2011, E NOS LEVAM AGORA A
CAMINHO DA 4ª!!!
Manuel Magalhães: Aceitar o que o governo diz que não houve subida de impostos é esquecer
a subida enorme dos impostos indirectos (combustíveis, etc...) e quanto à
dívida também é bom não esquecer as dívidas a fornecedores por parte do Estado,
dívida essa que prejudica altamente a economia (por incrível que pareça, não
paga juros), se esta dívida fosse correctamente contabilizada, onde é que
estaria o déficit...
Maria Carmo: Politicamente "inteligente" quer dizer farsante? Falta de funcionários nas
Conservatórias, no IMT, nos Tribunais, na Saúde, nas Lojas do Cidadãos, nas
Repartições de Finanças, nos transportes urbanos, nas ferrovias, o caos no
serviços públicos sem material nem meios técnicos. Pena o povinho gostar de
sofrer e viver em Marrocos...
Helena Garrido - Versão 18/1/2018: Temos todas as
razões para estar satisfeitos com a evolução das contas públicas. Hoje estamos
a atingir recordes positivos – o mais baixo défice da democracia, o maior
crescimento desde a adesão ao euro. As contas públicas registaram um défice
historicamente baixo (0,3% do PIB), com um saldo excedentário historicamente
elevado quando se retiram as despesas com juros (mais 3,6% do PIB) e ainda com
a vantagem destes resultados estarem a ser atingidos com um peso muito reduzido
de medidas temporárias. Como é que estes resultados estão a ser obtidos? Graças
fundamentalmente à receita. A receita total das administrações públicas
aumentou 5,5% e a despesa caiu 0,4%.Tendo como referência este retrato,
percebemos que os bons resultados das contas públicas são basicamente
alimentados pelo bom desempenho da economia. Mais emprego, mais rendimento,
mais impostos. Mais emprego, mais rendimento, mais consumo, mais impostos sobre
o consumo. Mais emprego, menos despesas com subsídio de desemprego Helena Garrido, Observador,
18/1/2018
Ruik Krull: Helena
Garrido, Quatro anos de farsa ou austeridade disfarçada Quod
erat demostrandum
Adolfo Vitorino: ESTE ARTIGO da Helena Garrido coloca em cima da mesa, tudo aquilo que é e
foi importante na actuação deste Governo. Analisa, obriga a pensar e a estudar,
todos aqueles que se interessam por economia e política em Portugal.
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