segunda-feira, 1 de julho de 2019

Nós não somos Ulisses


Dois textos demonstrativos da nossa eterna lorpice afadistada, que, conhecendo embora a farsa a que vamos assistindo de uma dupla que se interapoia em piruetas e malabarismos para seduzir um público dum modo geral passivo, se deixa seduzir pelo seu canto, tal Ulisses pelo canto das sereias. Mas Ulisses era esperto, mandou que o prendessem ao mastro, e passou incólume. Nós não vamos passar incólumes, “que a sereia canta bela”, como o provam o artigos de João Paulo Carvalho e de Helena Garrido, o primeiro sobre fardos de palha equidistantes do asno esfomeado, cujo livre arbítrio acaba por o paralisar na escolha, o segundo, antes sobre o cavalo do escossez unhas de fome, tema que o nosso Nicolau Tolentino também glosou, por conta própria:
VAI, MÍSERO CAVALO LAZARENTO
Vai, mísero cavalo lazarento,
Pastar longas campinas livremente;
Não percas tempo, enquanto to consente
De magros cães faminto ajuntamento.

Esta sela, teu único ornamento,
Para sinal da minha dor veemente,
De torto prego ficará pendente,
Despojo inútil do inconstante vento.

Morre em paz, que, em havendo algum dinheiro,
Hei-de mandar, em honra de teu nome,
Abrir em negra pedra este letreiro:

«Aqui piedoso entulho os ossos come
Do mais fiel, mais rápido sendeiro,
Que fora eterno, a não morrer de fome. NICOLAU TOLENTINO (1741-1811)

Um governo de mentira, tanto no que respeita a promessas que não conta cumprir, caso dos enfermeiros de “O ASNO DE BURIDAN”, como no que respeita às políticas de empobrecimento real do Governo, em alardes de falaciosas medidas eleitoralistas. 
Não, nós não somos Ulisses, que soube furtar-se ao canto das sereias. Nós somos os insectos imprevidentes que a luz atrai e queima, bem asnos, afinal, de uma pelintrice para sempre encardida.
I - ENFERMEIROS: O Asno de Buridan
JOÃO PAULO CARVALHO
OBSERVADOR, 29/6/2019
Este é um país onde os administradores hospitalares só administram de nome. São eunucos da função pública a quem pouco mais é permitido do que responsabilizarem-se pessoalmente se as coisas correm mal.
Jean Buridan, filósofo francês nascido no final do Séc. XIII, teorizou sobre a auto determinação e o livre arbítrio. Uma das teorias mais famosas e ainda hoje discutidas em círculos académicos é o paradoxo do asno que, tendo dois fardos equidistantes do ponto onde se encontra, não conseguiria decidir qual comer. O francês defendia que este tipo de escolhas deveriam ser adiadas até haver informação completa sobre a relação causa efeito de cada acção, logo, o burro morreria à fome.
A teoria de Buridan, apesar da comicidade aparente da situação, teleporta-nos para a realidade nacional. Mudam os intervenientes e os objectivos, mas mantém-se a dificuldade em traçar metas e definir objectivos concretos.
Assistimos a um governo equidistante de dois objectivos: entre a segurança da população e o trunfo eleitoral das contas públicas, que caminho deve escolher? O mais simples será escolher a inacção até perceber os efeitos das acções. É o que tem acontecido. Mas toda a accão gera reacção, a falta de vontade de decidir por uma apresentação de resultados com mais gastos e melhores condições laborais para profissionais com a consequente melhoria da segurança dos cuidados trouxe-nos onde estamos.
Vivemos num país onde os administradores hospitalares só administram de nome. São os eunucos da função pública, a quem pouco mais é permitido do que responsabilizarem-se pessoalmente se as coisas correrem mal.
As administrações mendigam mais profissionais e o Estado, lá longe, no triângulo Terreiro do Paço — João Crisóstomo — Palácio de São Bento, decide. Aquilo que podemos depreender desta atitude paternalista do Governo é que tem uma real noção do “pim-pam-pum” das nomeações que faz e, por não confiar nelas, ingere-se no trabalho que as incumbiu de fazer.
O Ministério da Saúde, é cego e surdo, reúne com as classes profissionais para as ouvir e para se poder orgulhar de não prestar atenção aos seus anseios. A nova carreira de enfermagem, publicada no dia seguinte às eleições europeias, é a prova do exercício autocrático de funções exercido por Marta Temido. Perderam-se centenas de horas em reuniões que, na prática, para pouco mais serviram do que dar expectativas aos profissionais e, de seguida, criar uma carreira que só permitirá aos enfermeiros chegar ao topo da carreira aos 100 anos. Não foi o que os sindicatos negociaram, não é o que os enfermeiros querem. É eleitoralismo para desacreditar a classe e maquilhagem de problemas.
Somos geridos por um calendário eleitoral, acontece o que aparenta ser favorável e nunca se toca no fundo dos problemas, um país que nos últimos anos teve de plantar tantas árvores, devia ter aprendido que sem raízes nunca haverá crescimento e de nada nos adianta cumprir as metas orçamentais impostas pela Europa se os Portugueses não beneficiarem do dinheiro que juntamos enquanto país.
Presidente da Secção Regional Norte da Ordem dos Enfermeiros
COMENTÁRIO:
J T: Que o governo é especialista em marketing político ninguém duvide. Mente e diz que faz e depois enrola e faz, mas com "pequenas" nuances, que adulteram/contradizem tudo o que disse que iria fazer. Ainda assim, apesar de mentir ser intrinsecamente mau e criar falsas expectativas, pior seria fazer mesmo coisas que iriam dar cabo das finanças públicas. E dito isto convém não esquecer que este artigo é escrito por um dos vários lobbies da área da saúde, que não defendem propriamente a saúde, mas antes o seu status.

II - EXECUÇÃO ORÇAMENTAL:   Um Estado em (quase) estado de coma /premium
OBSERVADOR, 1/7/2019
Um colapso financeiro resolve-se com dinheiro. Um colapso no funcionamento do Estado é um problema muito mais difícil de resolver e tem custos muito mais elevados.
Há uma famosa história, que ilustra os limites da disciplina financeira e que se ajusta bem à nossa política orçamental. Metáfora para a reputação – ao que parece injusta – de avareza dos escoceses, conta-se que quando o cavalo do escocês aprendeu a não comer, morreu. Os excessos que tivemos na política orçamental na era da troika, por via do corte de salários da função pública e aumento de impostos, assumem agora a faceta de excessos de cortes do lado da despesa de funcionamento do Estado.
Estamos a prosseguir, e bem, o caminho de rigor orçamental iniciado em 2008, ainda antes do pedido de apoio financeiro ao FMI e à União Europeia. A primeira fase dessa estratégia passou por violentas reduções dos salários da função pública e violentos aumentos de impostos, com o impacto conhecido de queda da actividade económica, tudo indica que para além do que seria necessário. Cada euro de corte ou aumento de impostos contribuiu menos para a redução do défice por via do mergulho que provocou na economia.
Esta segunda fase de política orçamental contraccionista apoiou-se mais na redução das despesas de funcionamento do Estado e no aumento de impostos que são menos visíveis – veja-se, por exemplo, as alterações que se fizeram à tributação dos recibos verdes. Do ponto de vista da política de gestão de expectativas e do apoio popular é uma estratégia mais eficaz.
Enquanto se diz que acabou a austeridade, revertendo os cortes salariais na função pública e os aumentos mais visíveis de impostos, como a sobretaxa de IRS, corta-se violentamente nas despesas de funcionamento e no investimento de reposição de equipamentos. Restringe-se violentamente as contratações, ao mesmo tempo que se anuncia a integração de todos quantos estão no Estado a recibos verdes e se reduz o horário semanal de trabalho. Limita-se violentamente a margem de manobra dos dirigentes do Estado, incluindo as empresas públicas, ao mesmo tempo que se exigem resultados. Adiam-se investimentos de reposição de equipamentos, como é bastante visível no caso dos transportes, ao mesmo tempo que se fazem descontos muito significativos no preço dos passes que são impossíveis de suportar pelo Estado, como o tempo o demonstrará.
Os alertas, que aqui foram feitos, para os riscos desta estratégia para o funcionamento do Estado foram sendo desvalorizados com as habituais acusações de se estar contra o Governo. Neste momento tornou-se praticamente impossível disfarçar que o Estado está em colapso operacional.
A estratégia seguida por Mário Centeno teria menos custos para os serviços públicos se, ao mesmo tempo, fossem concretizadas mudanças de organização e estrutura do Estado. É o caso da Saúde. O grave erro de reduzir o horário semanal de 40 para 35 horas teve efeitos especialmente nefastos no sector da Saúde e somou-se a problemas organizacionais e ausência de mudanças, sucessivamente adiadas. O caso das maternidades, que vão encerrar as urgências rotativamente este Verão, são um exemplo de falta de recursos mas também de adiamento de reformas. Era Correia de Campos ministro da Saúde quando se tentou racionalizar esta área e, só hoje, em colapso, se caminha para o encerramento das urgências da Maternidade Alfredo da Costa que, já na altura, os especialistas entendiam que devia fechar.
O caminho que o Governo fez é, até agora, um sucesso financeiro. O défice reduziu-se para valores historicamente baixos e estamos a conseguir baixar a dívida pública de forma a ficarmos mais abrigados de uma futura tempestade financeira. Mas a estratégia seguida está a afectar negativamente e seriamente os serviços públicos básicos, com especial relevo para a Saúde. Um custo que pode ser demasiado elevado. Um colapso financeiro resolve-se com dinheiro. Um colapso no funcionamento do Estado é um problema muito mais difícil de resolver e tem custos muito mais elevados. Podem ser invisíveis durante uns tempos, mas não são invisíveis todo o tempo.
Pode-se “aprender a não comer” por falta de dinheiro até a um determinado ponto e se formos livres para procurar comida podemos fazê-lo, individualmente. Como muitos de nós o fez no passado, procurando individualmente oportunidades quando perdeu o emprego ou viu o seu salário ser cortado. Mas o Estado, por si só, não consegue ir buscar dinheiro sem ser ao Tesouro. Podemos pagar caro esta estratégia popular de redução do défice público. Esperemos que ainda se vá a tempo de não matar o doente (ou o cavalo) com a dieta.
COMENTÁRIOS:
manel buiça: Kostacenteno é uma espécie de besouro socialista muito conhecida. Pretos, luzidios, balofos. Mas sorridentes de dissimulado falso optimismo. Armados com aquelas grandes tenazes e outras manipuladoras hastes de infindáveis mentiras, empurram diligentemente aquela gigante bola de sebo e merdha, enquanto convencem boa parte do atrasado e infantilizado país de cidadãos crianças, funcionários públicos, pensionistas e demais dependentes da teta pública de que aquilo é uma bola de algodão doce e que o Papai Noël se chama Estado Socialista. E não é que a malta até gosta!
PS - Um dos mais claros retratos e rigorosa caracterização, escrito pela HG, sobre a dimensão da colossal mentira, manipulação e falsidade que constitui o SOCIALISMO. Parabéns.! Muita gente a avisou sobre isto desde o início deste execrável desgoverno. Estava difícil de abrir os olhinhos, mas lá chegou.... !
André Ondine: Este texto é de uma enorme injustiça para com a gestão sublime e genial da dupla Chef Costa / Pateta Centeno. Como qualquer cidadão poderá facilmente comprovar, nunca foi tão fácil e rápido marcar uma consulta num hospital público, nunca foi tão fácil e simples tirar cartão de cidadão ou um passaporte, nunca o ensino nas escolas públicas foi dado por professores tão motivados, em escolas com condições a roçar o paraíso, nunca a segurança de armas e até de obras de arte foi tão eficaz, nunca uma viagem de autocarro ou de metro e comboio foi tão prazerosa e confortável, nunca os portugueses tiveram este prazer único de ter a honra de pagar impostos sem sequer perceber que o está a fazer. Enfim, o Portugal geringonço é um exemplo de um país gerido de forma magistral, um exemplo para o mundo. 
É pena que Helena Garrido tenha dificuldade em admitir que o paraíso de que nos falam Costa e Centeno está aqui, à nossa frente, para usarmos e abusarmos. 
Ruik Krull: Portugal é o 3º país do mundo onde menos se acredita no Governo (SUINICULTURA SÚCIA-LISTA) apenas liderado pelo Quénia e Nigéria. -Estudo da Fundação da Aliança das Democracias (Rasmussen Global)

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