quarta-feira, 16 de setembro de 2020

Da voz aos actores - do nosso drama caseiro


Não só pelas excelentes lições como pelas excelentes réplicas, que não deixam de denunciar, por vezes, personagens de uma extensa farsa vivida nos meandros da nossa História. E da batuta de Jaime Nogueira Pinto sai a orquestração harmoniosa do que talvez pudesse ter sido, não fossem as contingências das políticas e as angulosidades dos seus comparsas, afinal em todos os tempos rasgando caminhos, ao sabor dos seus interesses… Uma História de que só conhecíamos, afinal, uma parte, a vencedora, como um dia os descendentes da revolução de Abril apenas lembrarão esta, na degradação progressiva de valores que JNP sempre preservou, último abencerragem de um status para sempre extinto, com alguns apoiantes de mérito a defendê-lo em vão.

Breve memória dos vencidos de 1820 / premium

O facto de, por coerência nos princípios, os miguelistas nunca se terem querido organizar num partido político acabou por não lhes permitir uma intervenção na vida política, sobretudo a partir de 1851

JAIME NOGUEIRA PINTO    OBSERVADOR, 11 SET 2020

No fim de semana passado estive no Porto num debate com Vital Moreira a propósito dos duzentos anos do 24 de Agosto de 1820, num ciclo de conferências promovido pela Câmara Municipal. No Porto, a equipa de Rui Moreira e Miguel Pereira Leite vem levando por diante uma experiência excelente e singular. Excelente a olhar os resultados, que estão à vista na cidade, e singular porque é independente partidariamente.

O facto de o Porto ser uma cidade única e encantadora, pelo menos para os indígenas que, como eu, se desenraizaram e a ela voltam; uma cidade muito europeia, com uma mistura, na Foz do Douro, de rio e mar, de muralhas medievais e pontes de ferro oitocentistas, de ruas românticas e de comércio, também ajuda. E a natural boa educação das pessoas, nas lojas, nos restaurantes, e o seu modo doce de dizer as coisas no agreste das vozes. Encontro tantas histórias, tantas memórias, de infância, de adolescência, de parentes e amigos, mortos e vivos, naquele enclave entre a transição Douro-Atlântico, entre a Foz Velha e os Arcos das Pontes Luís I e D. Maria, da Ribeira até à Praça da Liberdade, com os Clérigos de um lado e a Sé do outro, que andar por aquele dédalo de ruas de traça medieval (que o terramoto roubou à Baixa de Lisboa) é sempre uma viagem ao fim do dia e da noite.Mas não quero perder-me em divagações de nostalgia portuense, até porque o tema, aqui, é outro. É o tema do debate e, sobretudo, a resposta a uma pergunta da assistência sobre qual teria sido o futuro caso D. Miguel tivesse vencido a Guerra Civil. Referiu também o autor da pergunta o nome de José Acúrcio das Neves, um dos mais capazes defensores e doutrinadores do miguelismo.

Além de ter sido um historiador pioneiro da resistência aos franceses, foi José Acúrcio das Neves que, nas Cortes de 1828, impugnou a legitimidade de D. Pedro e de sua filha Dona Maria da Glória, invocando a lei tradicional dos fundadores das Cortes de Lamego e dos restauradores nas Cortes de 1641 de que “a coroa nunca passasse a príncipe estrangeiro, nem filhos seus, ainda que fossem os parentes mais chegados do último rei”. Ora, para Acúrcio das Neves, D. Pedro era “estrangeiro”; era brasileiro, porque fizera a independência do Brasil e ali vivera quase toda a vida. Excluíra-se por isso do trono de Portugal.

Acúrcio das Neves era uma personagem singular, um intelectual e letrado miguelista, um politicamente incorrecto que, “saneado” pela revolução de 1820 dos seus cargos e eleito para as Cortes de 1822, ali defenderia D. Carlota Joaquina, que se recusara a jurar a Constituição de 1822. A partir de 1823 foi reintegrado e em 1828 apareceu como um decidido defensor do miguelismo – e assim permaneceria até ao fim da vida em 1834, quando apareceu morto, presumivelmente assassinado por inimigos políticos, em Sarzedo, Arganil, no fim da Guerra Civil.

Foi um modernizador económico e o primeiro teórico defensor da industrialização em Portugal, escrevendo em 1820 páginas entusiásticas acerca do progresso técnico que se vivia “em uma grande parte da Europa e dos Estados Unidos da América” onde “já os rios e até os mares se navegavam pelo agente do fogo, sem mastros, sem velas e sem remos”; enquanto, entre nós, ainda não se achava “estabelecida uma só máquina de vapor nas nossas fábricas”. E se na Europa o tal “agente do fogo”, a máquina a vapor, fazia já quase tudo e a “força dos elementos quase dispensava as mãos do homem nos trabalhos mais pesados”, aumentando “prodigiosamente os frutos da indústria”, aqui ainda fazíamos “tudo à força dos braços e de animais”.

Acúrcio das Neves foi um industrialista na polémica Agricultura-Indústria que dividiu os teóricos do desenvolvimento nacional desde o Conde da Ericeira e Pombal. Mas foi, também, um tradicionalista, um miguelista. Havia alguns como ele, mas a verdade é que, embora o liberalismo fosse um fenómeno das elites urbanas do Porto, de Lisboa e de Coimbra e de parte da nobreza, e ainda que houvesse um “país profundo” religioso e tradicionalista, enquadrado por párocos e abades que tinham levantado e guiado o povo contra os franceses, e que o exército de D. Miguel tivesse cerca de 80 mil homens, os miguelistas tinham acumulado derrotas no terreno.

Não conseguiram conquistar o Porto, que lhes resistiu durante mais de um ano, de Julho de 1832 a Agosto de 1833; e, aparentemente, os generais miguelistas, Santa Marta e Póvoas, nunca se chegaram a entender: na ânsia de serem os protagonistas da conquista, falharam-na. Gaspar Teixeira não teve melhor sorte, nem o conde de São Lourenço. No final, é um legitimista francês, Louis de Bourmont, o conquistador de Argel, que vem tomar o comando dos exércitos de D. Miguel. Também sem sucesso.

D. Pedro coordenou bem os seus: Palmela veio de Londres com Charles Napier e com dinheiro, muito dinheiro. A conjuntura europeia mudara: em França, Carlos X, o rei “ultra”, tinha caído em Julho de 1830, substituído pelo primo liberal, Louis-Filipe de Orleães, o “rei cidadão”. Em Inglaterra, em Novembro de 1830, caíra o gabinete do duque de Wellington, perante a pressão radical da rua e a dissidência de George Canning nos Tories.      Depois foi a operação do ataque a Lisboa por mar, gizada por Napier, um grande estratega que, com a esquadra liberal, cujos navios eram todos comandados por ingleses e tinham as tais máquinas a vapor de que falava Acúrcio das Neves, derrotou a esquadra miguelista ao largo do Cabo de S. Vicente. Depois de ter conquistado o mar, o duque da Terceira, um experiente general da guerra contra os franceses, desembarcou no Algarve com 1.500 homens e avançou sobre Lisboa. O duque de Cadaval defendia a capital com 10.000 homens, mas, insolitamente, retirou-se sem dar batalha. Em 1834, houve dois recontros, Almoster e Asseiceira, com os liberais sempre a ganhar. Seguiu-se a rendição em Évora-Monte.

É um mistério, que o professor Ron B. Thomson abordou no seu Miguelistas e Liberais, também ele perplexo, como todos, perante as campanhas da guerra civil e o seu resultado. Como foi possível tanta incompetência? Os liberais eram uma minoria, convicta e esclarecida, se se quiser, mas tinham uma pequena força militar (menos de 10.000 homens), com cerca de 1.000 mercenários estrangeiros (que no Porto se revoltaram e causaram confusão com os vencimentos em atraso); e, no entanto, resistiram e ganharam as batalhas – e a guerra. D. Pedro exilou “o mano Miguel”, mas deu uma amnistia geral aos seus partidários, embora, as vinganças ideológicas locais para “retribuir” a repressão miguelista de 1828 se tivessem prolongado. Há um livro, Os Assassinos da Beira, de Joaquim Martins de Carvalho, que conta alguns desses crimes protagonizados pelo famoso João Brandão.

A ideia de vencidos não convencidos vê-nos mais por fontes paralelas, alheias à História oficial, que como é normal, é feita pelos vencedores (mesmo em regimes liberais e até democráticos): além de uma resistência que oscila entre a guerrilha (o Remexido no Algarve, o António da Costa nas Beiras) e o “banditismo social” (lembro aqui os “primitive rebels”, de Hobsbawm), há a permanência de uma nostalgia miguelista entre as famílias “de bem” de entre Minho e Mondego e, na novela camiliana também entre as classes populares, rurais, religiosas. O próprio Camilo, que teria andado na guerrilha miguelista de Ronald MacDonell, deixou desse “miguelismo popular” um retrato altamente satírico e demolidor em “A Brasileira de Prazins”.

Assim, ao contrário da tradição contra-revolucionária ou legitimista francesa, que encontrou a par de uma linhagem teórica, que sobreviveu a várias Repúblicas e chegou até à Action Française, e de uma linhagem literária, que veio até aos meados do século XX, nos romances de Jean de La Varende e no teatro de Jean Anouilh, a tradição contra-revolucionária portuguesa não persistiu. E se há teóricos e intelectuais miguelistas além de Acúrcio das Neves, de D. Francisco Alexandre Lobo, de José da Gama e Castro, de António Gouveia Pinto, do visconde de Santarém e até do fundibulário padre Agostinho de Macedo, de um modo geral, além da argumentação dinástica da ilegitimidade e estrangeirismo de D. Pedro, a maioria da polémica prendeu-se com a contestação dos princípios da Revolução Francesa, do seu anticristianismo ou anticatolicismo e da substituição de uma oligarquia tradicional de grandes titulares e do clero, pela oligarquia liberal dos “devoristas”. Estes tinham usado as amortizações e a nacionalização dos bens do clero e a expropriação aos partidários de D. Miguel, para enriquecer.

O facto de, por coerência nos princípios, os miguelistas nunca se terem querido organizar num partido político, embora tivessem, desde 1847 e até 1917, mantido um jornal – A Nação – e de contarem com militantes e simpatizantes, acabou por não lhes permitir uma intervenção na vida política, sobretudo a partir de 1851 e da Regeneração.

Curiosamente, a grande reabilitação do miguelismo viria, de modo indirecto, através do Portugal Contemporâneo de Oliveira Martins (1881), que faria uma história do século XIX português extremamente crítica do liberalismo, transmitindo um juízo pessimista que iria inspirar a historiografia do período.

Quanto à intervenção miguelista na política nacional, dadas as Leis do Banimento, tornar-se-ia mais visível a partir da República, com as incursões, onde os miguelistas teriam, sobretudo na Segunda Incursão, um papel relevante. Nesta acção distinguiu-se a infanta D. Aldegundes de Jesus Maria, filha de D. Miguel I, condessa de Bardi, animadora e financiadora da operação. Mais tarde é também ela que intervém em representação do seu sobrinho menor, D. Duarte Nuno, na negociação do chamado Pacto de Paris, pelo qual se reconciliam os dois ramos da Casa de Bragança, tendo os legitimistas reconhecido o rei exilado D. Manuel II e este transmitido os seus direitos para D. Duarte Nuno.

Já o salazarismo é uma construção moderna, assente no poder militar revolucionário de 1926 e nos princípios da soberania nacional e do nacionalismo autoritário republicano, embora nas raízes do catolicismo social e do anti-liberalismo possam ainda encontrar-se alguns elementos doutrinários do legitimismo histórico. Mas serão puras reminiscências e coincidências.           A SEXTA COLUNA  HISTÓRIA  CULTURA

COMENTÁRIOS:

António Marques Mendes: O declínio começou em 1640 com a Casa de Bragança que até hoje teve sempre descendentes pobres de espírito. Depois das invasões francesas e da perda do Brasil, o liberalismo falhou por ter sido importado por um país sem indústria e com comércio incipiente. Por isso transformou-se numa guerra civil sucessória e fratricida entre afrancesados e inglesados. Depois do interregno corporativo de Salazar, continua a saga com os socialistas afrancesados, agora “comunizados”, e os saudosistas do regime anterior e do estatismo. Enfim, um país tacanho com pobres de espírito a correr atrás de qualquer moda importada como o recente episódio do Luís Filipe Vieira bem ilustra.      Joao Menesez: Se os miguelistas tivessem ganho não tínhamos que levar com a ideologia de género com a corrupção de estado nem com a festa do avante. O caso BES seria resolvido rapidamente e os primeiros ministros não podiam viver de amigos. Querem mais?!

Joaquim Moreira: Mais uma lição de História, que tem tanto de pequena como de grande e serena, de um Grande Senhor. Que é também da História de Portugal um grande conhecedor. E, desta lição, atrevo-me a tirar uma conclusão, muita diferente, na verdade, da que fala “nos primeiros passos”, da “construção da democracia em liberdade”. A referência a Acúrcio das Neves, “um modernizador económico e o primeiro teórico defensor da industrialização em Portugal, escrevendo em 1820 páginas entusiásticas acerca do progresso técnico que se vivia”, e as comparações, levou-me ao livro que estou a ler sobre, “Porque Falham as Nações”. O que me leva a concluir que, talvez tenha começado aqui muito do nosso atraso, ou, pelo menos, seja uma das razões. O não termos acompanhado o progresso técnico de uma grande parte da Europa dos Estados Unidos da América e outras mais desenvolvidas nações. Por ter sido vencido um tradicionalista, e também um miguelista.

Ahmed Gany: E tudo o vento levou...      Monarchy isBetter: Em 1820 começou o declínio de Portugal.

Amandio Teixeira-Pinto >Monarchy isBetter: Exactamente, quando os Portugueses começaram a discutir e a contestar tudo e mais alguma coisa, nunca mais acabaram...e o processo, negativo em extremo, dura até hoje. O liberalismo, à luz de princípios com alguma relevância e atracção (alguns, não todos, nem sequer a maioria) acabou por instalar no poder oligarquias burguesas, endinheiradas e mal preparadas, que fizeram desvanecer mais ou menos rapidamente os valores que caracterizavam a Monarquia e nos fez manter como País independente e sólido, durante 767 anos, governando mesmo uma boa parte do mundo conhecido. Passámos a ser um pequeno país sempre em confusão, instável politicamente, e paupérrimo em termos económicos. Só Salazar conseguiu recuperar financeira e economicamente Portugal, para voltarmos, depois da abrilada a sermos um país degradado, pobre, vivendo de expedientes e de espertezas. Ninguém, em boa verdade nos leva a sério. E há um défice enorme de auto-estima, pois foram esses os efeitos perniciosos da maçonaria, que conspirou sempre contra Portugal, recusando que tivéssemos cultura, que fôssemos um país com valores, no mundo das Ciências ou das Letras, denegrindo sempre o papel da Igreja e da missão civilizacional que prestou no Extremo Oriente, em África e na América do Sul. É gente que não tem orgulho próprio, certamente porque não tem razões para isso. Não estima os seus nem o seu passado, pois possivelmente não o tiveram. São fruto dos oportunismos, das golpadas que o liberalismo e depois a republica favoreceram, em detrimento do valor pessoal, do mérito, da honra e do bem servir. Sempre houve gente com dinheiro e poder em Portugal, mas nunca com a desfaçatez, a soberba e o mau emprego que fizeram (fazem) dele, como desde que há republica. As pessoas distinguem-se hoje pelo dinheiro que têm, não pelos valores que praticam. Nem a Cultura, transformada em exclusivo em atributos de palco e bastidores de cena, desmerecendo em completo dos que são verdadeiramente cultos, nem ela ajuda a identificar as pessoas, que se categorizam por baixo e a preços de saldo. Estranhamos depois a enormíssima falta de qualidade das chamadas "figuras públicas" e a incapacidade de nos conduzirem por melhores caminhos. É este o saldo que temos de liberais, republicanos e maçons, com bancas rotas em série. Mesmo na última fase da Monarquia a houve, mas por culpa das convulsões sociais do reviralho, conspirador, negativo e rasteiro.  

J Sm: Em 1820 passámos do 'obscurantismo' dos valores que formaram a nossa identidade para a 'clareza' dos valores da maçonaria e outras sociedades secretas. Até hoje. E de facto os miguelistas por razões de integridade nunca aceitaram fazer parte de uma monarquia sem rei ou de uma república coroada. Até hoje. Quem estava certo?! Quem está certo?!    Manuel Albuquerque: O Pacto de Paris, assinado pelos representantes de D. Manuel II e de D. Duarte Nuno em 17 de Abril 1922, foi denunciado pela Infanta D. Maria Aldegundes, condessa de Bardi - tutora de D. Duarte Nuno -, em carta enviada a D. Manuel II, datada de 6 de Setembro do mesmo ano. 

Ana Ferreira: Diz-se que a História é feita pelos vencedores, também por quem a escreve, como prova este texto. Depois há os factos que mostram, como acontecera décadas antes noutros países europeus, a derrota do obscurantismo, e Portugal a dar os primeiros passos rumo ao que viria a ser a sofrida e demorada construção da democracia em liberdade!   José Paulo C Castro >Ana Ferreira: Mera mudança de opressores, com menor clareza de regras. O obscurantismo dos palácios e das paróquias, que se mostrava a todos, foi substituído pelo obscurantismo das caves das ordem secretas que ainda anda por aí a coordenar os bastidores da "liberdade". Você sabe disso. Suspeito que frequenta uma.           J Sm >Ana Ferreira: Mas que confusão! Quer dizer que passámos do 'obscurantismo' dos valores que formaram a nossa identidade para a 'clareza' do obscurantismo da maçonaria e da carbonária?! É isso?! Não penses muito senão ficas com dores de cabeça.      De Grammaticon > Ana Ferreira: Portanto, o Império Áustro-Húngaro e o II Reich Alemão, epítomes dos regimes absolutistas europeus que sobreviveram à tendência liberal do século XIX, eram obscurantistas? As monarquias ibéricas e as repúblicas sul-americanas é que eram progressistas e livres? O primeiro estado social do mundo, a Prússia de Bismark (e por inerência os restantes 25 estados federados do Reich) era absolutista, ou neo-absolutista como era referido, era, segundo a Dra. Ferreira, um estado obscurantista? Só que tinha férias pagas, uma dinâmica industrial de ponta, as maiores conquistas científicas, técnicas, culturais e artísticas da Europa (tirando, claro, as monarquias liberais ibéricas...).   Gens Ramos: Após um elogio ao Porto do meu coração, uma útil leitura, ao sol, numa esplanada da praça Francisco Sá Carneiro. Estou contente por ter “Contágios” para ler no Inverno.

Rui Roque: A Áustria-Hungria, com o seu exército dos primeiros prémios Nobel até ao início do século XX, com a sua classe média consumista, com as suas capitais (Viena, Budapeste e Praga) cheias dos mais vanguardistas e (ainda hoje) influentes artistas e cientistas sociais de todo o mundo, era também um estado absolutista, o parlamento nem sequer podia interpelar o chanceler, portanto, uns pobres coitados quando comparados com brilho cultural, social e económico de Portugal da Monarquia Liberal e dos primeiros anos da I República. Extraordinário o que esta fantochada de ensino faz às aninhas deste país... e o pior é que elas estão (não é este o caso, felizmente) a ocupar os locais de poder neste país esclarecido...      Ana Ferreira > De Grammaticon: A Revolução Francesa foi mais determinante que tudo isso e o dr. nem a refere! Por que será?     De Grammaticon > Ana Ferreira: "do que tudo isso", não "que tudo isso", a Dra. está a tentar fazer uma comparação, precisa de uma preposição. Adiante... A Peste Negra também foi determinante, ora bolas. O facto de um evento, ou conjuntura, ser determinante, significa apenas que teve um impacto profundo nos eventos sucedentes, não, significa que esse impacto é positivo ou negativo. A Revolução Francesa, o Terror, o jacobinismo, as invasões napoleónicas e o seu genocídio consequente, determinaram a desgraça de países como Portugal, e o sucesso de países como o Reino Unido, que, avisadamente, não só não embarcaram na onda de ódio e rancor revolucionária, como o combateram e triunfaram. Do mesmo modo que os Estados da Europa Central se conseguiram libertar da opressão francesa e recuperar o sucesso (e a dignidade) que lhes permitiu, em menos de meio-século, chegarem à vanguarda da Revolução Industrial e do desenvolvimento. Só nas colónias americanas e na Península Ibérica é que o deslumbramento pelo opressor francês se tornou chique... É o que dá termos gente que gosta mais de ouvir encantamentos e fábulas do que (está a ver como se compara?) fazer coisas e ser bem sucedido.      Ana Ferreira > De Grammaticon: Liberdade, igualdade, fraternidade para "as urtigas"! O sr é um belo exemplo de narcisismo. Bom proveito.     De Grammaticon < Ana Ferreira. Minha senhora, quem mandou o tríptico da liberdade para os urtigas foram logo os revolucionários. Mais uma vez, não olhe para o que as pessoas dizem, olhe para o que elas fazem. E isso aplica-se a tudo, desde os salvadores mais moralistas, às senhoras censoras da internet.      José Paulo C Castro > Ana Ferreira: As três ideias do tríptico da revolução francesa combatem-se entre si. A sobreposição de cada uma delas às outras cria um regime desequilibrado e opressor. A da liberdade leva ao capitalismo libertário puro. A da igualdade leva ao socialismo opressor comunista. A da fraternidade leva ao surgimento do nacionalismo fascista. Apesar de tudo, prefiro a da liberdade. Foi a que funcionou melhor, mas apenas quando em equilíbrio de poderes constitucional. No entanto, aquele slogan leva a acreditar que se pode ter as três ao mesmo tempo sem limites. Acaba-se a cortar cabeças ou a produzir ditaduras pouco esclarecidas. Ou a frequentar caves secretas para tentar mandar nesse caos. Rejeita-se todo o conhecimento antigo para ocupar o lugar do outro, apenas. Ana Ferreira > De Grammaticon: Deixaram uma semente que germina até hoje! E, já agora, tenha a humildade de aceitar opiniões diferentes da sua!         José Paulo C Castro: Você descreve o essencial ao descrever os devoristas. Pela guerra veio o saque e a ruptura. Acabariam naturalmente por abrir caminho aos "progressistas" que sistematicamente regrediram o País, as suas finanças e o seu futuro. Sim, Salazar já é um "anti-progressismo", mais do que um conservadorismo tradicionalista. Curiosamente, criou um dos raros momentos em que o País progrediu face aos outros... O "progressismo" é uma mentira.   De Grammaticon > José Paulo C Castro: Sem tirar nem pôr. Basta ver o exemplo de Costa Cabral (o homem até com o Convento de Cristo ficou), o grande irmão, que mesmo depois de ter sido taxativamente posto a andar pelas forças populares e cívicas (tanto na Maria da Fonte, como na Patuleia) continuou a ser um bibelô do regime. Morreu muito velhinho a acumular reformas do Estado e cargos diplomáticos. Com um quinto do que ele recebia (já bem depois da Regeneração, bem entendido), D. Carlos foi lançado às feras... Em 92, o Oliveira Martins, quando chegou à Fazenda, ficou chocado em saber que os salários ministeriais de 1892 eram os mesmos de 1836, pior, salários que, em 1836, davam para comprar mensalmente um palácio. Um rombo que se arrastava. O homem quis actualizar os salários descendo-os! Parar a sangria dos devoristas que se mantinham (ainda por cima em tempos de bancarrota). Mas não foi possível, ao pobre Oliveira Martins só não o mataram porque acabou por morrer inesperada e precocemente logo a seguir. Foi preciso um João Franco para retomar a questão, 15 anos depois... também só não o mataram porque não conseguiram, preferiram matar o rei. Enfim, os triunfos liberais foram, resumidamente, um saque ao Estado e um bálsamo para as cabeças moles dos iludidos. Apenas este texto vale a subscrição paga ao Observador.  Maria Nunes: Excelente lição de História. 

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