Elegância expositiva, aliada a uma
natural aliança moral, “venham mais cinco”,
mais dez, mais … de igual calibre, a encher-nos a alma de expectativa e gosto,
na ternura e afeição que nos merece este cantinho antigo, tão necessitado
desses, tão necessitados disso…
Super Costa
Entre a classe política e os restantes
cidadãos há uma clivagem que se acentua. Acomodámo-nos ao são todos iguais, a
um do mal o menos, a um rouba mas faz, e a uma série de outros clichés.
SOFIA MADUREIRA, Psicóloga Clínica, Neuropsicóloga, Investigadora IMM/FML, Professora
Convidada ISCTE-IUL e NOVA Medical School.
OBSERVADOR, 18 set
2020,
A “impunidade
intoxica”, escreveu sobre António Costa e o “seu clube de amigos”, Bernardo
Ferrão, em 2017, no semanário Expresso. Três anos
depois, ainda andamos nisto. Na altura,
a indignação deveu-se a um dos amigos do primeiro-ministro ter sido chamado a
negociar pelo Estado sem qualquer vínculo contratual. A indignação não foi
consequência da escolha de pessoa a ou b mas do modo como esta se
operacionalizou. E da leveza com que se passou à prática o que se decidiu, sem
crivo nem confronto, com a certeza de que “não há mal nenhum”: quero, posso,
mando. Três anos depois…
A
impunidade, associada ao poder, é a combinação perfeita para potenciar a
inflação do ego mais uma vez sem crivo nem confronto na hora de decidir. Depois da indignação pública, ouvir António Costa
justificar a atitude de integrar a comissão de honra da candidatura de Luís
Filipe Vieira como uma escolha sua enquanto cidadão e não de primeiro-ministro,
vem na sequência de “não há mal nenhum”. Mas há.
Em
cargos públicos não é possível detonar a ponte entre a função e o comportamento
individual. Até porque o cidadão Costa ocupa de livre vontade um dos lugares
mais visíveis da nação, é a terceira figura do Estado. No dia em que
assumiu o cargo comprometeu-se com a função, e implicitamente, com os
princípios éticos exigidos pelo cargo. Comprometeu-se a escolher o bem comum.
Ainda que desacreditemos desses compromissos implícitos, há o bom senso que se
espera de um adulto. Não houve.
Esta
recorrente ausência de bom senso foi amplamente manifestada na Auto-Europa,
quando apresentou Marcelo Rebelo de Sousa como presidente futuro antes da
recandidatura ser anunciada pelo próprio.
E reforçada agora quando deixa cair a candidatura de Ana Gomes no silêncio
socialista – porque Ana Gomes é crivo e confronto? A
maturidade democrática exige diferenciação. É o oposto da aglutinação de
espelhos onde nos reflectimos e multiplicamos.
Entre
a classe política e os restantes cidadãos há uma clivagem que se acentua. Acomodámo-nos
ao são todos iguais, a um do mal o menos, a um rouba mas faz, e a uma série de
outros clichés que usamos para dividir o mundo entre nós e eles. Estas
expectativas que progressivamente rebaixamos, e nos deflaccionam em valor e poder,
não serão facilitadoras desse modo de fazer política?
Sabemos como vemos a classe política. Ou a sua caricatura. E nós, como
somos vistos? Passivos? Tolerantes? Submissos? Os tolos, os sem fé na carruagem
do comboio do poema de Walt Whitman, ou os que com ele dizem: “Para ti tudo isto da minha parte, ó
democracia, para te servir ma femme! Para ti, para ti, eu entoo estas canções.”
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