Uma página de História recente, contada com entusiasmo por Salles da Fonseca, com sugestões de visão económica e política que parecem bem pertinentes, complementadas com o excelente comentário de Carlos Traguelho. Mas, por falta de sabedoria, respondo, apenas, à última observação, com a mensagem pessoana a respeito de D. Sebastião que por lá se finou também, por esse mesmo continente das suas áridas ambições:
«…Sem a loucura que é o homem
Mais que a besta sadia,
Cadáver adiado que procria?»
NASSER E O
SAARÁ
HENRIQUE SALLES DA
FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 03.09.20
O Saará é um absurdo
Quando
o Professor Joaquim Laginha Serafim (Loulé, 1921-Lisboa, 1994) fez 60 anos, os
amigos e colegas apresentaram-l mais emblemáticos[i].
Gamal Abdel Nasser (1918-1970), Homem de Estado egípcio, teve muitas qualidades e
alguns defeitos, o pior dos quais foi ter morrido cedo[ii].
Uma das qualidades que teve foi a de fazer construir a
barragem de Assuão com a qual com stituiu uma enorme reserva de água doce assim
regularizando o caudal do Nilo permitindo o regadio onde historicamente
imperava o deserto.
A enorme barragem foi um marco
fundamental no combate ao deserto e serve de exemplo ao que poderia ser o norte
de África se os dirigentes políticos do Magreb e do Makresh tivessem hoje a
visão de Nasser.
Quem
hoje navegue no Mar Vermelho ao longo das costas egípcias e percorra o Canal de
Suez, verificará que ao longo de toda essa enorme extensão, existe uma linha
verde para alguma contenção das investidas do deserto e para mostrar que, mesmo
ali, em zonas inóspitas, a água doce faz maravilhas.
Entretanto,
a ciência e a tecnologia avançaram enormemente e muitos casos haverá em que,
perante a inexistência de linhas de água doce, a irrigação se possa fazer sem
recurso a lençóis subterrâneos de «águas fósseis» como fez Kadhafi, mas apenas
pela dessalinização da água do mar.
Sem desmerecer todas as experiências
já realizadas com a dessalinização da água, convenhamos que, aplicando a
energia solar (ou eólica) ao processo da evaporação-condensação, o Saará deixou
de ter legitimidade para continuar a ser uma realidade geográfica limitadora da
vida e poderá ser transformado numa região, se não aprazível, pelo menos com
aceitáveis níveis de humanização.
E
que poderá acontecer uma vez «domado» o Saará?
Redução da pressão sobre o
«aquecimento global»;
Criação de condições de
habitabilidade hoje inexistentes;
Criação de riqueza agrícola em
áreas actualmente estéreis;
Fixação de populações que
actualmente assediam a Europa;
Ocupação produtiva de populações
actualmente ociosas se não mesmo esmoleres que assim deixam de depender do
Zakat[iii] e consequente perda de influência dos pregadores
radicais.
Eis algumas das razões pelas quais me
parece que a Europa tem todo o interesse em promover a irrigação do Saará. S
Contudo,
se Portugal lançar a ideia, certo será que os «gulosos» e nada solidários
parceiros europeus nos passarão a plano terciário apenas nos deixando algumas
migalhas. Ou seja, a ideia deverá ser avançada por nós nas reuniões bilaterais
que ocorram com os Governos do Magreb (Marrocos, Tunísia e Argélia – e
Mauritânia?) e do Makresh (Egipto, Líbia-Trípoli e Líbia-Tobruk).
À consideração
do Ministério dos Negócios Estrangeiros e de algum empresário que por aqui passe
e seja tão ou mais sonhador do que eu.
Setembro de 2020
Henrique Salles da
Fonseca
[i]- Por
incrível que pareça, a Wikipédia não refere esse projecto em https://pt.wikipedia.org/wiki/Laginha_Serafim
[ii]- Para
recordar mais, ver https://pt.wikipedia.org/wiki/Gamal_Abdel_Nasser
[iii] - Esmola
muçulmana obrigatória destinada ao amparo dos desvalidos e ao financiamento do
clero
Tags: "economia
portuguesa"
1 COMENTÁRIO
Anónimo 03.09.2020: Estou de
acordo contigo, Henrique, que Nasser tinha qualidades e alguns defeitos. Foi
“Bom” quando decidiu construir a barragem
de Assuão e quando, perante a recusa inopinada dos EUA e da Grão Bretanha em a
financiar, nacionalizou o canal de Suez para obter os meios financeiros
necessários para aquela construção. Foi “Bom” quando fez frente, em 1956, à invasão franco-britânica
(accionistas da sociedade do Canal) e de Israel. Foi “Bom” quando
contribuiu para a retirada daquelas tropas, mediante a pressão dos EUA,
passando a certidão de óbito à Grã-Bretanha e à França como potências imperiais
e ajudando a acabar definitivamente com o momento da Grã-Bretanha no Médio
Oriente, o qual se iniciara em 1918. Com a invasão, embora abortada, a França e
a Grã-Bretanha empurraram o Egipto para a URSS.
(O biógrafo de Churchill, Martin Gilbert, conta que questionado o Estadista se invadiria o Egipto,
caso ainda fosse PM, Churchill respondeu: “Nunca teria ousado, e se tivesse
ousado, nunca teria ousado parar”).
Nasser foi “Mau” quando
criou, juntamente com os demais terceiro-mundistas, dificuldades ao então
governo português. Embora eu fosse oposicionista, não era agradável ver
a situação, até porque não perfilho o ditado, ao que parece de origem árabe,
embora me pareça mais um “pensamento” constante do livrinho vermelho de Mao,
que “inimigo do meu inimigo, meu amigo é”.
Foi “Vilão”, quando 11
anos depois da crise do Suez, precisamente em 26/5/1967, declarou que o seu
“objectivo fundamental era destruir Israel”. O tiro saiu-lhe pela culatra e
sobreviveu três anos à derrota humilhante. Realmente morreu cedo, mas já estava
morto.
A barragem do Assuão foi um marco
notável, a todos os títulos, quer, como dizes, pela visão estratégia de quem a
concebeu, quer pelo conflito internacional que promoveu, quer pela dimensão,
quer pelos benefícios esperados, quer ainda pelo tempo de construção – 10 anos,
apenas (1960-70). Recordo, a título de curiosidade, que a decisão de construir
o Alqueva foi em 1975 e a inauguração da barragem ocorreu em 2013.
A
ideia que avanças no teu post é uma “boa malha”, como dizíamos quando éramos
miúdos. Por diversas razões, eu elegeria Marrocos, para o diálogo. A migração clandestina que chega a Portugal é, penso, predominantemente
marroquina. Marrocos já tem, quanto julgo saber, um estatuto especial junto
da UE, havendo reuniões regulares do Conselho de Associação EU-Marrocos. Este
país é um dos principais beneficiários da ajuda europeia, se não estou
equivocado. Sendo isto em relação à EU, acrescento os seguintes aspectos no
que concerne a Portugal: Rabat é
a capital mais próxima, em linha recta, de Lisboa (salvo quando se tem de ir
apanhar o avião a Madrid); Marrocos é (ou era, posso já estar desactualizado)
um dos quatro países com que Portugal tinha cimeiras regulares (os outros são,
ou eram, Espanha, França e Brasil); o final do século passado e o início deste
ficaram marcados com significativos investimentos portugueses, nos sectores
cimenteiro (Cimpor, daí eu ter conhecido razoavelmente bem Marrocos),
telecomunicações (PT), adubos (Mello), para além da exploração da concessão de
fornecimento de água a Rabat.
Henrique, e se Portugal conseguisse o
início da concretização de algo, na linha que apontas, quando presidir ao
Conselho da EU, no 1º semestre de 2021? Abraço. Carlos Traguelho
NOTAS:
Laginha Serafim
Origem:
Wikipédia, a enciclopédia livre.
Joaquim Laginha Serafim, (Loulé, 21 de Janeiro de 1921 — Lisboa, 28 de
Novembro de 1994),
foi um engenheiro civil português.
Formação académica[
Laginha
Serafim licenciou-se em Engenharia
Civil pelo Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa em 1944.
Actividade como engenheiro civil[
Laginha
Serafim desenvolveu uma vasta actividade profissional no campo da engenharia
civil, onde se destaca:
Engenheiro
da Direcção Geral dos Recursos Hidráulicos (Portugal) em 1946
Engenheiro
na Hidroeléctrica do Zêzere (Portugal), de Agosto de 1946 a Outubro de 1947
Chefe
da Secção de Barragens
de 1947 a 1963 do Laboratório Nacional de Engenharia
Civil, em Lisboa
Membro
da Comissão Internacional das Grandes Barragens, desde 1948, de que foi
Vice-Presidente entre 1988 e 1991
Membro
de Comissões Técnicas do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes,
nomeadamente da Sub-Comissão do Regulamento de Segurança de Barragens
Fundador
da empresa COBA — Consultores de Engenharia e Ambiente, em 1962[1]
Fundador,
em 1963, e Presidente, até 1972, da empresa CONSULPRESA — Consultores de Presas
y Aprovechamientos, Madrid, Espanha
Fundador
da empresa ERN — Engenharia de Recursos Naturais, SA, no Rio de Janeiro, Brasil, em 1968
Barragens em que actuou como projectista ou consultor
Como
projectista:
Espanha: Sela, Belesar, Santa Eulália, Susqueda, Almendra, El
Vellon, El Atazar, La Baells; Angola: Lomaum;
Malobas, Capanda; Moçambique: Massingir; Brasil: Salto do Funil; Costa Rica: Cachi;
Grécia: Sfikia, Assomata, Platanovrissy, Thesavros; Irão: Tang-e-Soleyman;
Venezuela: La Corcovada, Yacambu, Taguacita
Gamal Abdel Nasser
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Gamal Abdel Alexandria,
15
de janeiro0 de 1918—Cairo, 28 de Setembro de 1970) foi um militar e
político egípcio,
presidente de seu país de 1954 até sua morte.
Depois de ter frequentado o ensino liceal
entrou na Real Academia Militar, na qual se formou em 1938, onde terá reunido
os membros do Movimento dos Oficiais Livres. A sua sociedade
revolucionária planejava mudar o rumo dos acontecimentos. Para tal
pretendia afastar o rei Faruque I,
aproveitando o insucesso da campanha egípcia contra Israel em 1948 e
conduziu a uma radical alteração das políticas governamentais. No ano
seguinte 1953 a monarquia foi abolida, implantada uma república onde
ele passou a presidente, e os partidos banidos.
Notabilizou-se,
ao lado de Jawaharlal Nehru e outros, como um dos líderes
carismáticos do movimento terceiro-mundista, o que lhe rendeu grande fama em
todos os países do dito "Terceiro Mundo". Nasser promoveu, durante seus quase vinte anos no
poder, forte política nacionalista, fomentando o movimento pan-arabista, e
acabou por levar o Egipto a uma efémera associação com a Síria (a República
Árabe Unida). Um marco importante de sua liderança foi a nacionalização do Canal
de Suez, que resultou na Guerra
de Suez (1956), em função da
resposta militar de França e Inglaterra. As duas potências coloniais do século
XIX, contudo, viriam a descobrir que o mundo do pós-Segunda Guerra Mundial já não mais lhes
pertencia. Sem o apoio norte-americano ou soviético, os exércitos francês e
britânico foram obrigados a retirar-se do Egipto.
Sua maior derrota política e militar foi
na guerra dos seis dias em 1967 onde
perdeu boa parte do seu poderio militar (aeronáutico), atacado pelos israelenses, quando estava preparado para retomar as colinas
de Golan na Síria,
invadidas por Israel. Perdeu
igualmente parte do Sinai também para Israel.
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