Com os leigos gratos pelas luzes, que
não adiantam, rotundamente. “Pobres e
arrumadinhos”, como refere Demétrio
Alves, é como seremos sempre, com certo optimismo, contudo, pois o “arrumadinhos”
parece ser desígnio ultrapassado.
OPINIÃO
AML: uma locomotiva sem potência de tracção
O país vai ficando mais pobre em
relação à Europa mas mais igualitário no plano interno, porque a AML vai
perdendo terreno em relação a outras regiões nacionais e europeias. Parece
tratar-se de uma fórmula de desenvolvimento repescada do regime anterior:
pobrezinhos e arrumadinhos!
DEMÉTRIO ALVES
PÚBLICO, 18 de Setembro de 2020
Portugal perdeu, durante os três/quatro últimos QFP (1)
europeus, quase 3% no PIB/hab em relação à média europeia.
Nesse contexto, a região
de Lisboa/AML (2) tem evoluído, em termos de coesão socioeconómica e
territorial, em sentido contrário ao de grandes metrópoles dos países europeus
com processos de convergência global positiva em relação à Europa.
Nesses
países, a evolução das regiões metropolitanas capitais é no sentido de aumento
tendencial do seu PIB/hab face às outras regiões que, no respectivo país,
também crescem.
A região de Lisboa é das
regiões capitais europeias que apresentavam um menor afastamento em relação à
média nacional no PIB per capita inter-regional.
Os esforços para a coesão têm
priorizado, em Portugal, processos de redistribuição entre a sua região mais
desenvolvida e o resto do país, o que sendo politicamente correcto, não tem
tido consequências positivas no plano da convergência do país no contexto europeu.
Ou seja, o país vai ficando mais pobre em relação à Europa mas mais
igualitário no plano interno, porque a AML vai perdendo terreno em relação a
outras regiões nacionais e europeias. Parece
tratar-se de uma fórmula de desenvolvimento repescada do regime anterior: pobrezinhos
e arrumadinhos!
Há
razões para que isto aconteça que radicam na (in)volução qualitativa e quantitativa
dos FEEI (3), mas deverá questionar-se se não haverá, também,
opções de política interna que contribuam para a situação.
A perda de dinamismo da região de
Lisboa em comparação com outras metrópoles europeias é factor negativo
relevantíssimo para o atraso do todo nacional, dado o efeito que se espera da AML enquanto motor do desenvolvimento económico nacional.
Depois
de décadas de discursos, e algumas tentativas, no sentido da maior coesão entre
as duas sub-regiões metropolitanas, prevalecem notórias
debilidades de integração, apesar do maior ritmo de crescimento socioeconómico da Península de Setúbal nas últimas décadas. Assim, a AML é
uma locomotiva com poder de tracção limitado, também porque a potência está
assimetricamente distribuída às rodas motrizes de um e outro lado do Tejo.
Os fundos retornados pela UE, além de insuficientes, têm vindo
a ser crescentemente conformados
por prioridades viradas para o mercado, para os investimentos empresariais
privados, em detrimento
da coesão e da sustentabilidade. Há cada vez mais instrumentos financeiros e
menos subvenções não reembolsáveis.
Estas
limitações avolumam as fragilidades socioeconómicas da Península de Setúbal, muito atingida por sucessivas disrupções no
sistema produtivo, a que se adicionaram fenómenos comuns às duas partes
metropolitanas, como a insustentabilidade do modelo de ocupação
territorial da habitação face ao emprego e, ainda, as crises do sistema
económico-financeiro global.
Nesta moldura, os mecanismos
institucionais previstos pela política de coesão europeia não conseguem
contribuir para o reequilíbrio, e, com isso, perde a AML, e, como
se tem visto, o país.
Há
significativas partes territoriais do todo metropolitano com indicadores
socioeconómicos abaixo da média nacional, compagináveis com os de concelhos de
um interior menos desenvolvido, situação que se agrava porque se repercutem
nestes territórios todas as dificuldades características das aglomerações
metropolitanas.
Com o actual modelo de governação
metropolitana, no quadro das disponibilidades e das regras comunitárias e
perante algumas opções que o poder central vem evidenciando, não se vislumbra
potencial regenerador. Num
contexto europeu profundamente abalado pela pandemia, não se afigura muito promissor o anunciado
experimentalismo correlacionado com transições voluntaristas, que irá absorver
milhares de milhões de euros para alavancar negócios com baixo grau de
maturidade tecnológica e económica. Sem retirar recursos às restantes
regiões do país, através de um diferente desenho político administrativo com
repercussão nas NUTS 2 e 3 (4) que interessam à região, com outro tipo de governação
metropolitana e com reivindicação fundamentada junto da Comissão Europeia para
atendimento às especiais características da AML, seria possível melhorar a
situação.
Contudo,
quando se lê a Estratégia Regional de Lisboa/AML 2030, recheada é certo por palavras e
conceitos muito em voga, não se encontra, embora o diagnóstico seja
interessante, uma proposta clara e com potência para alterar a situação
negativa.
Investigador FCSH/UNL
TÓPICOS
ÁREA
METROPOLITANA DE LISBOA DESENVOLVIMENTO REGIONAL FUNDOS COMUNITÁRIOS UNIÃO EUROPEIA PORTUGAL ESTADO OPINIÃO
Notas
(1) – QFP: QUADRO
FINANCEIRO PLURIANUAL
(2).-.AML: ÁREA
METROPOLITANA DE LISBOA
(3) – FEEI: FUNDOS
EUROPEUS ESTRUTURAIS E DE INVESTIMENTO
(4) – NUTS: NOMENCLATURA DAS UNIDADES TERRITORIAIS PARA FINS
ESTATÍSTICOS
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