domingo, 3 de julho de 2022

Não é fábula, esta


O certo é que há muitos galarós que cantam por conta dos seus anseios de posse e por desprezo pelos anseios de posse dos galarós alheios. E nisto se escoam os tempos por cá. O resto da capoeira cacareja ou pia, conforme a idade, todos exigindo apoios… que geralmente chegam de capoeiras externas Não, não é fábula, esta. É uma história real de muita humilhação épica cacarejante, que acontece hoje, para ser reconhecida um dia, se tal dia chegar.

NA PRAIA DOS CÃES - 1

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA

 A BEM DA NAÇÃO, 02.07.22

Hoje cheguei à duna antes do Sol e os cães já «falavam» entre eles sem que os galos do velho pescador ousassem cantar. Discretamente, chamei um dos da algazarra para junto de mim e foi o suficiente para todos se calarem e me virem cumprimentar. E foi então que um dos galos cantou.

Pese embora a analogia lafontainiana, também na nossa «praia política» há muito quem faça barulho e poucos que digam do que se aproveite; muitos, os que se comportam como pugilistas e poucos os que se revelam estadistas.

E que bom seria se a maioria se comportasse com elevação, desprezando lobbies mais ou menos ocultos, seguisse uma linha doutrinária inequívoca e propusesse soluções conformes ao seu revelado conceito de bem-comum.

E foi nestas divagações meditativas que duas gaivotas poisaram no topo da duna e me fizeram regressar à realidade.

Bonjour, Maitre La Fon Taine!

Praia dos cães, 2 de Julho de 2022

Henrique Salles da Fonseca

COMENTÁRIOS:

 Anónimo  02.07.2022  13:14: What a beautiful text,,,the environment. the wishes. the analogies,,,!!!!!!
Ely Ossy Anónimo  02.07.2022 :
A tua Praia dos Cães fez-me lembrar de imediato a respectiva Balada, do Cardoso Pires, e o entusiasmo com que segui, no início dos anos 60, em tempo real, a história que a censura salazarista filtrava sobre a descoberta do cadáver do militar antirregime. A desilusão que tive quando se soube que os assassinos não tinham sido os polícias da António Maria Cardoso, mas sim os companheiros de esconderijo do major… Nem sempre existe harmonia nas capoeiras, especialmente quando em vez de existir um galo há mais do que um, como é o caso do teu velho pescador. Nestas circunstâncias, por vezes guerreiam-se entre eles, bicada aqui, bicada acolá, perdendo a noção dos respectivos deveres, e os ovos ficam por chocar com nítido prejuízo para o dono dos galináceos, que não vê estes a reproduzirem-se. Enfim, desperdício, perda de oportunidade e, algumas vezes, espectáculo indecoroso. É claro que não podemos exigir às aves de capoeira que se revelem estadistas (isso só nos mundos orwelliano e lafontainiano), mas certamente que o teu velho pescador não deixará de ter em atenção esses comportamentos aquando da selecção de novas aves. Continuação de bons banhos. Abraço. Carlos Traguelho

Adriano Miranda Lima  02.07.2022: O problema é grave e exige atenção. A qualidade da classe política tem vindo a diminuir consideravelmente. Muitos dos que são eleitos não honram o seu compromisso com o eleitorado e considero que a sua primeira transgressão é näo se darem ao respeito. Como granjear o respeito da naçäo o político que faz do Parlamento um ringue de boxe ou um palco de insultos, dichotes e provocações rasteiras? E como resolver o problema?

 Anónimo  03.07.2022  12:23: Bonito texto! Infelizmente o abaixamento de nível civilizacional passou de políticos para cidadãos. Previsível desde que Sócrates, o Midas, destruiu a escola pública...

 

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