Arriscado apresentar, sem confirmação de
autoria, o soneto atribuído a Camões, segundo notícia que me foi enviada pelo Ricardo
e que me apressei a transcrever, lamentando a omissão do soneto. Na ânsia de
uma notícia que dele desse conta, consultei a Internet, mas apenas vi que a
notícia foi publicada “há 6 horas”, segundo o apontamento seguinte:
há 6 horas — O investigador também declarou à
Lusa, que, há uns anos, descobriu o poema "Leite
da Virgem", também atribuído ao
maior poeta épico da língua ...»
Eis o texto que me enviou o Ricardo, que
agradeço, o qual, a par de alguns dados sobre Camões, refere igualmente dados pessoais de Nuno Miguel Júdice, como
autor consagrado e premiado:
«Descoberto soneto inédito de Luís de
Camões
13 jul 2022 18:07 • Vida • MadreMedia / Lusa
O poeta, professor e investigador Nuno Júdice disse hoje à agência Lusa
ter descoberto um soneto de Luís de Camões, “Cristo Atado à Coluna”, num
manuscrito datado de 1666, editado por Manuel de Faria, no século XVIII.»
TIAGO
PETINGA/LUSA
«Nuno Júdice afirmou que o
poema é atribuído a Camões e a autoria não lhe suscita dúvidas, apesar de uma
possível edição implicar “o trabalho de especialistas”.
O manuscrito foi encontrado pelo investigador na Biblioteca Digital
Hispânica, onde se encontram vários outros poetas “do barroco, que merecem ser mais
bem estudados”.
Nuno Júdice salientou que esta sua descoberta demonstra “que há ainda
muito por revelar nas bibliotecas e por estudar e dar o devido valor”, na área
da literatura.
“É uma esperança para
os investigadores”, disse o também director da revista Colóquio Letras da
Fundação Calouste Gulbenkian, referindo que “não está tudo estudado ou
descoberto”, profetizando que há território literário por desvendar.
Referindo-se ao poema, Júdice disse que Manuel de Faria “foi o
primeiro editor a sério de Camões”, no século XVII, e não seria este soneto que
tornaria Camões um poeta maior e tão conhecido.
Esta poema, segundo Nuno
Júdice, “desenvolve uma ideia nada
ortodoxa”, com o catolicismo vigente na época, já que Camões argumenta que o
amor liberta.
Segundo o investigador, neste
soneto, Camões afirma que “Cristo é
torturado e chicoteado, mas liberta-se pelo amor à humanidade”.
Camões recupera a ideia do “cárcere por amor”, que tinha sido já
desenvolvida pelo poeta Diego San Pedro (1437-1498), autor de “Cárcel
de Amor”.
O soneto foi escrito em
língua portuguesa.
Refira-se que Camões escreveu
também em castelhano e, neste período, dois países ibéricos estavam unidos
sob a mesma coroa, o que facilitou a circulação de ideias.
A denominada “monarquia
dual” vigorou de 1581 até 1640.
Luís de Camões, de vida
incerta, terá nascido em Lisboa, em 1524, cidade onde morreu em 1579 ou 1580,
tendo recebido uma reduzida tença do Rei Sebastião pela escrita do poema épico
“Os Lusíadas”, publicado em 1572.
Camões é ainda autor de
vários poemas, como redondilhas, rimas e sonetos, e de teatro, como “Auto d’El
Rei Seleuco”, “Filodemo” e “Anfitriões”.
A sua poesia foi cantada por
Amália e José Afonso, entre outros.
O poeta encontra-se
sepultado no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, apesar de suscitar algumas
dúvidas aos académicos que seja o seu corpo que se encontra na urna de pedra.
Não é a primeira vez que Nuno Júdice
'se encontra' com Camões.
O investigador contou à Lusa, que, há uns anos, descobriu um poema
atribuído ao épico, “Leite da Virgem”, que entregou aos cuidados da
especialista camoniana Fiama Hasse Pais Brandão, que, entretanto morreu em
2007.
Poeta, ensaísta e ficcionista,
Nuno Júdice, 73 anos, foi, até 2015, professor na Faculdade de Ciências Sociais
e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
Júdice desempenhou o cargo de director da revista literária Tabacaria (1996-2009),
foi comissário para a área da Literatura da representação portuguesa na
49.ª Feira do Livro de Frankfurt.
Desempenhou funções como conselheiro cultural da Embaixada de
Portugal em França (1997-2004) e diretor do Instituto Camões em Paris.
Organizou a Semana Europeia da Poesia, no âmbito da Lisboa'94 - Capital
Europeia da Cultura.
Actualmente, dirige a Revista
Colóquio-Letras, da Fundação Calouste Gulbenkian.
Literariamente, estreou-se
em 1972 com o livro de poesia "A
Noção de Poema".
Ao longo da carreira literária, Nuno Júdice tem sido distinguido com
diversos prémios, os quais o Prémio Rainha Sofia de Poesia
Iberoamericana, em 2013, o Prémio Pen Clube, o Prémio D. Dinis da Casa de
Mateus.
Recebeu o Grande Prémio de Poesia da
Associação Portuguesa de Escritores, por "Meditação sobre Ruínas",
finalista do Prémio Europeu de Literatura.»
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Finalizo com um cheirinho de Camões, génio
literário, com um soneto de perfeição clássica, no qual considera, lapidarmente,
as manigâncias do destino humano, que eternamente são causa de espanto, pelo
contraste entre o mérito e a sorte de cada um, que levam à desistência de se
entender, e à adopção final da Fé, silenciando qualquer resquício de revolta, na
incompreensão do desconcerto – tema igualmente ironizado por um Pessoa, cujo
Cristo, contudo, “não percebia
nada de finanças, nem consta que tivesse biblioteca”.
“Verdade, Amor, Razão e Merecimento”
Verdade,
Amor, Razão, Merecimento,
qualquer
alma farão segura e forte;
porém,
Fortuna, Caso, Tempo e Sorte,
têm do
confuso mundo o regimento.
Efeitos
mil revolve o pensamento
e não
sabe a que causa se reporte;
mas
sabe que o que é mais que vida e morte,
que
não o alcança humano entendimento.
Doutos
varões darão razões subidas,
mas
são experiências mais provadas,
e por
isso é melhor ter muito visto.
Cousas
há i que passam sem ser cridas
e
cousas cridas há sem ser passadas,
mas o
melhor de tudo é crer em Cristo.
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