Que a continuação deste tipo de exposições
críticas do Professor Jaime
Nogueira Pinto, servisse também de estímulo a uma mudança na
programação do ensino do Francês e sua Literatura, neste nosso país de desleixo
na panorâmica do ensino.
Quanto ao tema explorado hoje, li apenas o primeiro volume da “Recherche…”,
que comprei na “Galileu” de Cascais, em que a falta de dinheiro e a do total dos
volumes da obra, nesses idos de 80, impediram que comprasse mais. Apenas pude ler
excertos vários em manuais de literatura que os continham, e é esse Proust
enfermiço e menino da mamã e de si próprio que recordo, com a sua extrema
capacidade de análise, do seu “entourage” e das suas evocações. Fico grata ao Professor Jaime
Nogueira Pinto, que
nos traz de volta tanto do que vivemos, e que com tanta sabedoria o faz. Sartre e Simone de Beauvoir, mais tantos outros da plêiade francesa desses
anos do século XX, entre os quais alguns autores de peças de teatro, como Anouilh, Giraudoux, que retomaram também
os mitos gregos, além dos desconcertantes do teatro do absurdo e do nouveau
roman, com a sua originalidade pesada e tosca… Tantos desses autores que me
passaram pelos olhos, começando, na juventude, pelo Topaze, pelos “Thibault”
- estes, que comprei para o meu pai, em tradução, de tanto que a obra me encantara,
identificada que me sentia com as rebeldias do irmão de Antoine, Jacques, e dos
seus amores com Jenny, livro que, ainda há dias, a arrumar as estantes, descobri,
nos seus 4 volumes bem velhinhos, enfiados nos livros e outros trastes dos meus
pais, de que não penso desfazer-me, o que é tolice, sei-o bem, a caminho de
impor também os meus próprios trastes aos meus descendentes... Maravilhosa
ideia esta do Professor JNP de trazer à baila aqueles autores franceses que o marcaram, como a nós, e
que poderia servir, essa ideia, para reiniciar neste país a disciplina do
francês que incluísse a sua literatura, de tanta riqueza ideológica responsável
por tanta da movimentação política do século anterior, e não só. Triste
juventude a nossa, agarrada ao telemóvel tempos infinitos, embora a internet
possa fornecer-lhes muitos saberes importantes para as suas vidas. Mas era
tempo de se repensar a disciplina do francês.
Quanto ao paralelo com Sartre, apesar de tudo considero este de uma dimensão
superior, tanto na reflexão filosófica sobre a consciência do sentido da vida,
ante o seu ilusório, que tantas suas obras exploraram, a começar por “La Nausée”,
em que, todavia, aquele descreve com humor crítico tantas facetas humanas, como
o faz nas suas peças de teatro, de movimentação criativa e reflexão, a par da
argúcia crítica, da análise psicológica, do sentido de humor, e, é claro, toda
essa reflexão filosófica que mal conheço, que passou o “cogito” cartesiano primordial
na definição do homem racional, para segundo lugar, na definição do sentido da
existência, o “sum” sendo primordial para a criação do próprio movimento
existencialista.
Marcel Proust: a política e a escrita
Sartre definiu Proust como um
pederasta envergonhado, agente da “propaganda burguesa” e perpetuador do “mito
da natureza humana”. Mas será a continuidade da natureza humana um mito?
JAIME NOGUEIRA
PINTO, Colunista do Observador
OBSERVADOR, 17 dez. 2022, 24:1717
A 18 de Novembro completaram-se cem
anos sobre a morte de Marcel Proust, efeméride entre nós saudada por um silêncio quase total. Nada de mais natural e compreensível: em
Portugal, escrever sobre Proust seria sempre um sinal inequívoco de falta de
inteligência social, uma concentração em assuntos inúteis, fora da ordem do dia
e sem qualquer interesse objectivo; uma prática excêntrica e dependente de
hábitos penosos, morosos e caídos em desuso, como a leitura.
E
no entanto é difícil imaginar um escritor que tenha marcado tanto o nosso
século como este filho da boa burguesia francesa, íntimo da sociedade do seu
tempo; este narrador único de mundos interiores, fascinantes,
inconfessáveis, que, a partir de “uma vida sem interesse, sem aventuras nem
viagens”, conseguiu levar-nos – aos que tivemos a sorte de o encontrar – numa
interminável e extraordinária peregrinação de milhares de páginas através da
natureza humana.
O génio de Proust está aí, na viagem
que empreende e conta à procura do tempo perdido; uma viagem feita a partir do
seu quarto – começada no 1ºandar do nº 102 do Boulevard Haussmann, no 8ème, e terminada no 4º andar do nº 44 da Rue Hamelin, no 6ème –, escrevendo deitado, isolado, em silêncio
absoluto.
A cavalo entre dois séculos,
Proust é o último grande escritor do século XIX e o primeiro do século XX. À la recherche du temps perdu foi publicada
entre 1913 e 1927 – com a edição, em 1913, de Du coté de chez Swann (edição
da Grasset, paga pelo autor depois da rejeição da Gallimard) e a publicação
póstuma, em 1927, de Le
temps retrouvé.
Proust escreveu a palavra “Fim” na
Primavera de 1922. Entre a primeira palavra, em 1906, e a última, em 1922, com
a Grande Guerra e as revoluções comunista e fascista, desapareceria a sociedade
e o tempo que a obra também retratava, mas não os enredos humanos e a
intemporalidade da procura e do reencontro com os nossos tempos interiores.
Marcel
Proust insistia muito na diferença entre o homem e o autor, dizendo-nos
em Contre Sainte-Beuve (uma
colectânea de ensaios sobre Balzac, Flaubert, Nerval, Baudelaire e outros
publicada postumamente em 1954): “Um livro é o produto de um outro eu,
que não é o que revelamos nos nossos hábitos, em sociedade, nos nossos vícios”.
Charles Augustin Sainte-Beuve,
que, na crítica, ligava obcessivamente a obra à personalidade do autor, não
era, por isso, para ele, “um crítico profundo”. Para Proust, o escritor
de À la recherche, na pele do narrador, pouco teria a ver com Marcel
Proust, filho do Dr. Adrian Proust, médico reputado de uma família cristã de
província, e de Jeanne Clémence Weil, da família Weil, judia rica e civilizada,
bem à l’aise na Paris de Luis Bonaparte e de Haussmann, a capital da
insurreição da Comuna, depois da derrota na guerra franco-prussiana. Marcel
nascera aí, em Auteuil, a 10 de Julho de 1871.
A suspensão da inteligência
Determinante na cartilha proustiana
era também a relação entre a inteligência e a escrita: “Cada dia atribuo menos valor à inteligência. Cada dia
percebo melhor que é só fora dela que o escritor pode […] alcançar algo de si
mesmo e a matéria única da arte. O que a inteligência nos traz sobre o passado,
não é o passado”. Como tal, a Recherche não
era “uma obra de raciocínio”, mas uma obra “ditada pela sensibilidade”, cujos “elementos mínimos” Proust percebera
primeiramente no fundo de si mesmo, “sem os compreender e passando por
dificuldades ao convertê-los em algo de inteligível […], como se fossem tão
estranhos ao mundo da inteligência […] como um motivo musical”.
E
se o autor, numa primeira fase, devia suspender a inteligência para alcançar “a
matéria única da arte”, que só se alcançava fora dela, também em sociedade o
excesso de inteligência e erudição eram mal vistos. E Proust, que valorizava a “compreensão ou o
entendimento das coisas da vida e do mundo”, característica de uma geração
francesa que ia de Bergson a Valéry e Charles Maurras, não deixava de nos
transmitir a
necessidade de suspender a inteligência ou de a nivelar por baixo em nome da
“inteligência social” que a plena pertença à “sociedade” exigia. Assim, na Recherche, são muitos os passos em que
ironiza sobre essa necessária contenção da inteligência: Oriane de Guermantes, por exemplo, lamenta que o
sobrinho, Saint-Loup, não tenha a inteligência de se manter nos níveis
intelectuais da boa sociedade e leia Nietzsche e Proudhon; Madame de
Villeparisis, tia de Oriane e tia-avó de Saint-Loup, também destoa do seu mundo
pela inteligência e pela cultura, chegando até a parecer “de outra condição”; e
enquanto Jupien, o locatário dos Guermantes, transformado em gestor de um
prostíbulo masculino do seu amante e protector, visconde de Charlus, tem a
inteligência “d’un homme de lettres”, a princesa de Parma, a grande senhora de
Paris, ao ver que o narrador usa borrachas americanas para proteger as solas
dos sapatos nas intempéries, elogia-o com um “voilá un homme inteligent!”.
Além
de uma certa subversão criativa, obrigatória na linguagem dos escritores que,
de Joyce a Céline, marcam novos tempos, Proust mantém na narrativa uma ironia
e uma ambiguidade que diferenciam a sua viagem por um mundo e uma classe social
prestes a morrer com a Grande Guerra – a oligarquia francesa, mistura dos
sobreviventes da aristocracia dizimada pelo Terror e das elites bonapartista e
orleanista. Estes
sobreviventes da Revolução, juntamente com as burguesias contadas por Balzac e
Zola, acabariam por esmagar as revoluções do povo – em 1848 e na Comuna, no ano
em que Proust nascera.
Mas
fora as inevitáveis referências em À la recherche às políticas e às histórias da História, do caso Dreyfus à Grande Guerra,
como foi e qual foi a relação de Proust, do Proust-pessoa, com a política, as
ideias, as ideologias?
A política daquele a quem Sartre
chamou pederasta e burguês
Num
texto que já foi muito citado, mas que deixou de o ser, Sartre definiu Proust
como o pináculo do “espírito analítico”, um agente da “propaganda burguesa”
perpetuador dos privilégios de classe, e a sua obra como disseminadora do “mito
da natureza humana” e da existência de “paixões universais”. Pederasta e
burguês, Proust ter-se-ia valido da sua experiência homossexual para pintar o
amor de um homem rico e ocioso por uma mulher, protótipo do objecto de desejo
amoroso: “Proust s’est
choisi bourgeois, il s’est fait le complice de la propagande bourgeoise,
puisque son œuvre contribue à répandre le mythe de la nature humaine”.
Sartre ataca Proust, como ataca
Flaubert e Baudelaire, por serem escritores burgueses. A Proust acusa-o ainda de ser pederasta, mas não o
pederasta assumido, progressista, libertador; antes o pederasta hipócrita que
encarna “o drama do pederasta burguês”, na contradição do ser profundo e do
estar, mascarando com uma qualquer “Albertine” a sua paixão irregular por um
qualquer “Albert”. E
compara-o, em desfavor, com um outro escritor, Jean Genet, esse sim um progressista,
um “homossexual assumido e exemplar”.
Na
bipolarização da França quando do famoso Affaire
Dreyfus, Proust
foi, como o irmão Robert, um dreyfusard, tomando o partido que mais se
identificava com a Esquerda e encabeçando um “manifesto dos intelectuais” a
favor de Dreyfus. De qualquer
forma, e ainda que a divisão pró-Dreyfus / anti-Dreyfus não definisse em
absoluto Esquerda e Direita, Proust assumiria depois posições críticas da
Esquerda, do Republicanismo, da Revolução e do Terror (hoje, devido à
publicação da correspondência de Proust em 21 volumes, conhece-se muita coisa
sobre estas suas posições políticas).
Em
conversa recordada por Maurice Duplay, Proust faria as delícias de Sartre ao
condenar a Revolução “por ter perseguido sistematicamente tudo o que era gracioso
e amável”, com “uma legião de mulheres mandadas para o carrasco”, a começar
pela rainha Maria Antonieta. Para o autor de À la recherche, o Terror
tinha sido “um acesso de demência colectiva” e “os convencionais, ao
julgarem-se romanos, eram como doidos que se julgavam generais, arcebispos,
imperadores!”
De
qualquer modo, nos seus últimos anos, só podendo ler um jornal, Proust lia
todos os dias L’Action
Française, o diário do
movimento monárquico e conservador de Charles Maurras; porque ali podia ler o
próprio Maurras, “uma cura de elevação mental”, “a coluna luminosa”
sobre política internacional de Jacques Bainville e, claro, Léon Daudet. Era um
jornal fortemente anti-dreyfus, e Proust, ao louvá-lo, justificava o seu
dreyfusismo de juventude como ditado pela “fidelidade à Mãe” e por uma
“convicção pessoal sobre a inocência do capitão e um sentimento humanitário
para com um inocente”.
Isto
passava-se em 1920. Proust estava grato a Léon Daudet, que se batera para
que À l’ombre des jeunes filles en fleurs ganhasse o Goncourt. E escrevia, empolgado, no prefácio a Tendres
stocks,de Paul Morand: “À mes maîtres, MM. Léon Daudet et Charles Maurras, et à
leur délicieux émule M. Jacques Bainville”. Em 1896, Maurras assinara uma recensão
a Les
plaisirs et les jours, um texto
profético sobre as qualidades estilísticas do estreante; e, em Setembro de
1913, sabemos também pela correspondência que Proust se consideraria honrado
caso viesse a escrever para o L’Action Française.
Nos
últimos anos de vida do escritor, e já depois da atribuição do Goncourt, o diário monárquico continuava a acompanhar as
publicações de Proust atentamente, elogiando a sua “análise psicológica levada
até aos limites do possível.” E Daudet, o terrível polemista Léon Daudet, filho
de Alphonse Daudet, cujo salão Proust frequentara, o Léon Daudet reaccionário e
anti-semita, escreveria um editorial intitulado: “Um novo e poderoso
romancista: Marcel Proust.”
Para Daudet, Proust aparecia como pioneiro de uma “nova escola de romancistas”; e, em tempo de guerra, contrapunha a psicologia proustiana, “psicologia
francesa, herdeira da filosofia greco-latina, que sempre procura a luz e a
claridade na análise das operações do espírito” à “psicologia germânica” que
“confunde a obscuridade com a profundidade”.
Contudo,
havia limites: quando saiu Sodoma
e Gomorra, o quarto
volume dos sete de À la recherche du temps perdu, em que o narrador
descobre e descreve os mundos da inversão sexual, o L’Action Française não
referia o livro, com Daudet a escrever a Proust, explicando-lhe que, tendo em
conta os leitores do jornal, seria embaraçoso falar de uma obra com tal título
e tal conteúdo. Proust viria depois a queixar-se em carta a um amigo,
ridicularizando o embaraço púdico do L’Action Française: “un journal dont
la pudibonderie est comique”.
Uma polémica inútil
Como
não vale a pena usar e explorar a simpatia e o activismo pró-Dreyfus do jovem
Proust para o alinhar à esquerda, também não será de explorar e levar à letra
estas suas relações com a Action Française para o alinhar como um
entusiasta da direita nacionalista e reaccionária. A influência intelectual de
Maurras e da Action Française exerceu-se praticamente sobre toda a
intelectualidade francesa nas quatro primeiras décadas do século XX. Como
escreveu Robert Kopp na Revue des deux mondes, em Dezembro de 2016, “de Proust a Mauriac, de Gide a Malraux, a maior parte
dos escritores franceses, sofreram, num momento ou noutro, a atracção de
Maurras, […] e muitos deles foram, duramente marcados pelo seu pensamento; de
que outros tantos também se afastaram.”
No
fundo, as opções políticas do Proust-homem, o seu enquadramento social, a sua
sexualidade, as suas contradições, o seu tempo, o seu lugar e o seu modo,
acabam por ser relativamente irrelevantes – ou por só se tornarem relevantes
porque se eternizam e chegam até nós transfigurados na “matéria única
da arte”, consubstanciando o tal “mito da
natureza humana” que Sartre nele denunciava. É,
por isso, da escrita de Proust e não tanto do que o autor diz e faz fora do
texto, que poderá partir uma leitura política da obra, em termos de valores,
ideias e conceitos.
Talvez
seja um bom pretexto para o reler, mesmo incorrendo na incorrecção social de
ali encontrar, expandida, a natureza humana. Sempre nova e sempre a mesma.
A SEXTA
COLUNA CRÓNICA OBSERVADOR LITERATURA CULTURA
COMENTÁRIOS: Todos 17
José Leandro: Numa só palavra: grato. Américo Silva: Como autor o ente transcende o indivíduo,
por isso a arte fica por vezes mais perto de situações complexas do que a
ciência, e o valor da pessoa e do artista são aquém e além incompatíveis.
Recomendo o ballet, Proust ou les intermittences du coeur, pode ver-se no youtube
e vale bem a pena Duarte Correia: Ironia: Sartre, completamente datado, que
já ninguém lê, crítico feroz de Proust que se lê por prazer. Até Merleau-Ponty acabaria, pesaroso, por
se incompatibilizar com o seu antigo companheiro de L ´École. P Ferreiro: Há uns anos a Professora Maria Alzira
Seixo deu um curso de literatura francesa no CCB com várias sessões cobrindo os
mais importantes autores. Sobre Proust disse foi o maior de todos António Antunes: Excelente texto sobre este grande escritor. Sempre
considerei não ter lido "À la recherche..." a minha grande lacuna
literária. O facto é que nunca reuni a coragem e o ensejo de o encetar. Hei de
fazê-lo.
bento guerra: Embora o tema não seja a minha "praia" , julgo
que Damásio nos veio explicar que não há separação estanque entre a razão e
a emoção. Daí que o contabilista Fernando Pessoa nos possa ter deixado
pensamentos tão emocionalmente ricos. Artistas que não produzam para a emoção
dos outros, não servem(só subsidiados) José Vaz > bento guerra: Permita me que lhe diga que Damásio prova precisamente o contrário
se ler o livro dele "O Erro de Descartes" e mesmo no livro
" Sentimento de Si" ele foca que o conceito de alma ou o
"eu" está intimamente ligado ao biológico e ao corpo daí o erro de
Descartes que dizia que a alma e o corpo se separavam e da um exemplo concreto
e real no livro que é de um senhor que estava a fazer fogo com dinamite numa
pedreira e um ferro com alguns centímetros de comprimento e uns milímetros de
diâmetro atravessou lhe o cérebro deixando um buraco que via de um lado ao
outro o homem não perdeu os sentidos e continua mesmo a falar normal. O que
aconteceu foi que esse ferro lhe atingiu uma parte cerebral que estava
encarregue de sentir emoções (lá está ele conseguia raciocinar logo tinha a
razão) e isso fez com que ele deixasse de sentir amor pelos filhos pela mulher
e que não tivesse alguma emoção ao ver um filme ao ver um quadro etc. Espero
que tenha conseguido resumidamente explicar Cumprimentos Seknevasse: Ler
os franceses? Vou antes ver o Avatar! Merci. José Vaz: Adoro Sartre e Proust tendo lido as obras completas dos 2 na minha
juventude. Quando vivi há 8 anos uns anos em Paris pensei vai ser interessante
discutir os autores com pessoas parisiennes até que pra grande espanto meu em
relação a Sartre nem podem ouvir falar nele por causa das posições na guerra da
Algérie e de Proust a esquerda bem pensante detesta-o por ser um burguês. O
povo francês é estranho.
António Antunes > José Vaz: Nos anos 1960 o meu pai, em turismo no sul de França, estava
desejoso de conversar com franceses sobre o grande Blaise Pascal. Havia uma
praça com uma estátua dele no centro de Clermont-Ferrand, sua terra natal. Qual
não foi o espanto dele quando constatou que, de entre as pessoas com quem metia
conversa no café, na tabacaria ou onde calhasse, quase ninguém fazia ideia do
que tinha feito Pascal e, em alguns casos, de quem era. José Vaz > António Antunes: Eu o que me surpreendeu mais foi o ódio a Sartre e o mal-estar
mesmo que o nome dele criava pra mim era surreal pois sempre o achei
fenomenal depois um amigo meu é que me explicou as suas posições na guerra
da Argélia que é um trauma que os franceses nunca resolveram e depois pesquisei
um pouco e compreendi o afastamento dos franceses apesar de não concordar com
eles, Sartre nasceu mesmo na Argélia e na altura da guerra ele tomou parte
pelos independentistas. José Vaz > António Antunes: Em relação a Pascal, no fundo entendo em
todo o lado acontece não conhecerem grandes personagens da história. Em
Portugal acontece o mesmo com muitos escritores cientistas etc, se perguntar a muito português quem é António Damásio vão lhe
perguntar se joga no Vitória de Setúbal ehwheh. Hoje os ídolos infelizmente são
vazios e nada têm para oferecer a não ser o vazio quando vê influencers que
dizem e fazem barbaridades a ter milhões de seguidores. Veja onde chegámos. A
foto com mais likes da Internet a nível mundial é um Ovo e a segunda o Cu de
uma mulher que nada tem na cabeça. Admirável mundo novo meu caro A B: Bravo!
Obrigada por trazer Proust e a sua obra monumental feita de todas as minúcias
da universal natureza humana. (Sartre era, além do mais, um grosseiro) Li há
anos os 4 primeiros volumes. Graças a si, Jaime Nogueira Pinto, vou agora ler
os 3 que faltam.
António Antunes > A B: A mim ainda me faltam os sete. Mas hei de lê-los. José Vaz > A B: Olá AB, não vou estar a discutir gostos pois os mesmos não se
discutem e ainda bem se toda a gente só gostasse de maçãs íamos morrer de fome. Mas deixo lhe
só uma dica se me permite, quando quiser pode ler A Náusea de Sartre e verá que
ele não é assim tão grosseiro. José Vaz > António Antunes: Se não quiser gastar dinheiro e sei que
não se deve fazer mas pode descarregar os 7 volumes na Internet em pdf Rui Lima: Recordar grandes escritores como faz JNP é
um trabalho cívico até porque Proust não é lido em Portugal , conheci o
escritor devido a seu famoso duelo o jovem Marcel Proust não
suporta um artigo crítico ao seu 1.º remanche e quer lavar a honra
num duelo com o crítico literário ( também seria a honra de uma das
personagens femininas) . O duelo é realizado num bosque diante
de suas respectivas testemunhas, os dois homens separados por vinte e
cinco passos trocam dois tiros com uma pistola para nossa sorte e deles
sairão ilesos.
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