Sobre uma figura bem estratificada. A
pedra e cal. E com grande orgulho de si, como tão bem traduz Paulo Tunhas.
António Costa não sabe o que é “estrutural”, nem
quer saber
Costa é useiro e vezeiro em utilizar as palavras sem
relação directa com o seu significado. É a versão portuguesa do Humpty-Dumpty
da Alice: as palavras significam o que eu quero.
PAULO TUNHAS
OBSERVADOR, 22
dez. 2022, 24:1926
Confesso que hesitei em escrever este
artigo. Primeiro, porque compreensivelmente receava a dura prova de ler nada
menos do que as 11 páginas da entrevista de António Costa à Visão. Um
confronto assim com a temível máquina de palavras que é António Costa ameaçava
deixar-me derreado. Em segundo lugar, porque já tanta gente escreveu ou falou
da entrevista em questão que a probabilidade de notar algo que tivesse passado
previamente despercebido era remota.
E é verdade que os traços mais salientes
da entrevista foram quase todos notados. Por exemplo, o seu desprezo
manifesto pela oposição, expresso numa linguagem grosseira e primitiva.
Assim, a IL é constituída por “queques” que “guincham”, o que os torna
“ridículos”, sem conseguirem alçar-se ao “vozeirão popular que o Ventura
consegue fazer”. O PSD, pelo seu lado, em estado de desespero, “faz números”.
“Guinchos” e “números” são, naturalmente, amplificados pela “bolha mediática”,
aliada à “central de produção de soundbites da direita”. Toda esta
gente ignora por inteiro os verdadeiros problemas dos portugueses, que
intimamente a desprezam e amam Costa. O único problema do Governo que não se reduz
a “casos e casinhos” puramente imaginários foi o de Pedro Nuno Santos com o
aeroporto, e esse foi resolvido em 24 horas.
Não é que Costa negue a necessidade de
uma verdadeira oposição. Nobremente,
reconhece que “não há nenhum bom governo que não precise de uma boa oposição”,
acrescentando com uma generosidade única: “É muito útil para a democracia”.
Grande verdade, grande sabedoria, grande lição. Infelizmente, a oposição, que
tanto o deveria saber, ajudada pela “bolha mediática”, ignora-o abissalmente.
E com essa atitude, Costa não tem paciência. Mas mesmo nenhuma. Enumera as suas
profundas preocupações de estadista e desabafa: “se agora andasse a distrair-me com essas coisas que entretêm os
comentadores, meu Deus!”. Tal a sua irritação que menciona o incómodo que a insistência nos “casos e casinhos”
causa junto dos seus assessores de imprensa, “que podiam concentrar-se noutros
trabalhos e são ocupados a distrair-se com esses assuntos”. Não está
bem, de facto. Os assessores de imprensa a preocuparem-se com as histórias de
Miguel Alves! Não é justo!
Mas o que o irrita verdadeiramente e
provoca a sua indomável cólera é outra coisa: são as “mentiras vis” – “velhacarias”, diria o seu mestre Sócrates – de Carlos Costa no livro de Luís Rosa.
Isso põe-no fora de si. E lembra o exemplo do pai e da mãe. Face à turpitude de
“criaturas” que revelam em público conversas, “mantenho-me nas regras da
educação que os meus pais me deram” – que comportam, sem dúvida, os imperativos
de não “guinchar” nem “fazer números”. A
família, de resto, ocupa uma elevada presença no pensamento de António Costa.
Respondendo a uma pergunta sobre os novos dois irmãos no Governo, que
aparentemente violariam a regra imposta desde o tempo do célebre caso das
famílias no conselho de ministros, Costa responde (vale a pena citar a resposta
por inteiro): “Disse tudo: são duas
personalidades com competências reconhecidas. Tenho uma grande vantagem: vejo,
pela minha própria família, que não é pelo facto de eu ser o primeiro-ministro
e de o meu irmão ser quem é [Ricardo Costa, director de informação da SIC] que
deixo de cumprir as minhas funções, e ele também”. Os entrevistadores, Mafalda Anjos e Filipe Luís,
aparentemente não levaram a mal que Costa não lhes respondesse à questão que
tinham colocado – a colisão com um princípio por ele próprio estabelecido –, já
que não insistiram na pergunta, talvez embevecidos com tão notáveis exemplos
familiares.
Tudo isto tem a sua importância, embora
uma importância relativa. O que, pelo contrário, é verdadeiramente preocupante
num primeiro-ministro é outra coisa: a sua manifesta
ignorância do que significa “estrutural”. Em três colunas da
entrevista, Costa usa a palavra pelo menos 11 vezes. O que significa, sem
dúvida, que a aprecia – ou, pelo menos, que ela lhe lembra alguma coisa.
Infelizmente, lembra-lhe qualquer
coisa de errado, atendendo ao modo como a utiliza.
Senão, vejamos. António Costa começa por
distinguir as reformas estruturais que a direita quer das que ele defende. As da direita, presume-se, são vãs e
malignas (e, no que têm de bom, como as que permitiriam a melhoria da
competitividade da nossa economia, ele fá-las melhor). As dele, pelo contrário,
são magníficas e prosseguem, indomáveis, à velocidade da luz.
São elas: “ter reduzido
para menos de metade o abandono escolar precoce no nosso País”, “a mudança mais
estrutural do País, porque muda tudo”; a mudança estrutural – aliás, uma
“revolução estrutural” – obtida, no seguimento “da paixão do engenheiro
Guterres pela Educação” e “do programa tecnológico do engenheiro Sócrates”, nos
níveis de qualificação do País; a mudança estrutural na “forma como temos
finanças públicas sustentáveis e ao mesmo tempo conseguimos aumentar o
investimento público”; a “mudança estrutural em curso” na redução da pobreza; o
encerramento das centrais de carvão; o aumento de dotação para a Saúde; e a
aprovação do estatuto do SNS. “Se isto não são mudanças estruturais, o que são
mudanças estruturais?”, pergunta-se.
Ora, se entendermos por “estrutural”
aquilo que normalmente se entende, isto é, no mínimo, problemático. “Estrutura”
significa uma rede interconectada que serve de base a uma série de operações
que a partir delas podem ser operadas. É, portanto, algo de que possui uma
forte estabilidade que contrasta com a variabilidade relativa daquilo que a
partir dela pode ser produzido através de um número indefinido de combinações.
É uma versão simplificadora das coisas, é verdade, mas é aqui suficiente. A
natureza, as sociedades, as línguas e um sem-número de outras realidades
possuem estruturas: definem-se a partir delas. As mutações estruturais,
possíveis em algumas dessas realidades – e as sociedades pertencem a esta
categoria –, são transformações nessa base, a partir de reformas ou de
revoluções, que modificam, em graus variáveis, as combinações possíveis na
superfície da estrutura. Não são modificações na superfície: são modificações
na base que determinam, mais ou menos univocamente, modificações na superfície.
Como é bom de ver, as “reformas
estruturais”, ou “revoluções estruturais”, mencionadas por Costa não são,
com a possível excepção do encerramento das centrais de carvão, nada
de estrutural. São rearranjos,
mais ou menos felizes, mais ou menos credíveis, da superfície. Não quero
estar aqui a discutir a felicidade ou infelicidade desses arranjos, a sua
credibilidade ou inverosimilhança. Apenas quero dizer que nada têm de
estrutural.
Seria pretensioso da minha parte estar
aqui a discutir a pertinência do vocabulário de Costa neste ponto particular,
não fosse ele revelar a natureza – estrutural, de facto, essa – do modo de
relação de António Costa com a linguagem. Como boa e bem rolada máquina de
palavras que é, ele é useiro e vezeiro em utilizar as palavras sem
relação directa (às vezes, nem sequer indirecta) com o seu significado. É a
versão portuguesa do Humpty-Dumpty da Alice: as palavras significam o que eu
quero. E não há nada a fazer: ele é assim. Para que deixasse
de o ser, seria preciso uma verdadeira revolução estrutural. Suponho que com
meras reformas ele não ia lá.
PS. Excelente discurso de
Biden e excelente discurso de Zelensky ontem em Washington. As palavras certas
e inequívocas. É o que mais importa. Dependemos dos Estados Unidos – já o
sabíamos – e da Ucrânia – sabemo-lo agora – para vivermos livremente.
ANTÓNIO COSTA POLÍTICA LÍNGUA CULTURA
COMENTÁRIOS (de 26)
Maria Nunes: Brilhante artigo. Tenho vergonha do PM do meu país. Rosa
Teixeira: Este primeiro ministro consegue
a infame arte de enganar a população para atender os interesses próprios.
Desprezo-o. João
Eduardo Gata: António
Costa é um Pateta Ignorante, um Nulo, um Demagogo Vendedor de Banha da Cobra. Maria Clotilde
Osório: Brilhante. Espero que quem leia
este artigo, finalmente entenda a diferença entre "estrutura" e
"conjuntura". Entre reforma estrutural e reforma conjuntural. Em
Portugal há muito que não se fazem reformas na estrutura. Por isso a sensação
que mudam as moscas mas .... Carlos
Chaves: Caríssimo Paulo Tunhas,
obrigado por mais uma excelente crónica sobre a nossa vidinha interna,
governada por um estratega de uma inteligência superior que certamente nos
ultrapassa. Permita-me destacar o seu post scriptum como uma verdade
irrefutável, e onde até nisto, este senhor das revoluções estruturais nunca foi
claro no apoio à Ucrânia, e no que ela e a brava resistência do seu povo
representam para todos nós. Não são uns Kamov em sucata que nos ilibam de tão
fraco apoio, certamente esta figura está com medo de ficar no fundo da fila
para ir levantar os “cheques”.
Jorge
Cardoso > Carlos
Quartel: Desculpe, mas razão em quê? Em permitir que se chegue à
situação de "fecharem as Maternidades" em Lisboa? Qual foi o PM
ou Rei que permitiu que se chegasse a esta situação? Que se chegasse ao ponto
de sermos o décimo país com o ordenado médio mais baixo dos países da UE
(Grécia e dez países que, segundo alguns estupidamente, se libertaram da
"maravilha" da URSS) ? Joaquim Lopes: Realmente
estrutural a questão do abandono escolar, (saber como foram feitas as
percentagens com as alterações demográficas de haver cada vez menos crianças,
mesmo que assim seja, são fábricas de imbecis); A Lei de Bases da Saúde tem de
estrutural a comparação com os prédios desenhados por Sócrates, a criação de
estruturas (ULSs) a sobrepor-se aos ACES e às USFs modelo B que são
as que restam e que se mantêm por motivos e por elementos que só lá estão pelos
partidos a que pertencem, sem avaliações sérias, com dados aldrabados, má
formação de internos o que é um problema muito sério e grave, o resto é cada
vez mais gente sem médico de família que por uma questão estrutural e política
as esquerdas não querem aceitar, continuando o desastre; o fecho das centrais a
carvão uma reforma estrutural aí sim é o a anedota final, ficando Portugal numa
situação de grave segurança nacional, dependente de Espanha como no caso do Rio
Tejo. Este indivíduo Costa é boçal, mal formado e mal educado e ignorante,
apenas esperto e manhoso decerto deve ter esquecido a
educação dos pais, como a maioria do povo que nele vota porque dependem dos
subsídios a que a maioria não deveria ter direito e não culpem Salazar a coisa
tem pelo menos mais de 62 anos, antes disso já havia Previdência Social, sim,
antes de 60, no tempo de Salazar, mas era preciso descontar. Vamos ver como
corre o Inverno que já entrou, vamos ver desaparecendo a chuva, sem vaga de
frio que escaparam á vaga de 2019/2020, sem Covid. Não precisamos de eutanásia
aprovada por este estado da Geringonça 2, já é feita pelo Estado Socialista /comunista,
no SNS a cair aos bocados, assim se acertam as contas da SS, na miséria daquilo
que os parceiros do PS, BE e toda a Geringonça 2 dizem, ao afirmar que 2
000€ é suficiente para se ser um rico, deveriam ler Dostoievski mas isso é
areia demais para aquelas cabeças que sem o lerem conhecem bem a natureza
humana, no seu pior estado, entranhada nas suas cabeças ocas. João Floriano: Excelente
a análise daquela ridícula entrevista onde nada se safa, desde o entrevistado,
aos entrevistadores e sobretudo a foto à frente da cortina vermelha.
Pergunto-me quem foi que teve a ideia de expor ao público as coxas roliças do
primeiro ministro. A entrevista foi tão má que recebeu críticas de todos
os lados e houve motivo para pedir desculpas. Igualmente excelente a referência
final à visita de Zelenski a Biden e à paz justa em oposição à paz podre que
muitos advogam por essa Europa fora.
AL MA:
Excelente artigo, um retrato fiel do personagem que nos empobrece, e enriquece
os seus Cisca Impllit: Bom remate deste artigo. Deus nos livre dos exemplares pai e
mãe de Ant Costa que tão malcriado e inepto filho espertalhaço
deram ao mundo!!
Pedro Ferreira: Triste sina a nossa!
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