Isso dos livros, que pouco contam na
questão. Trata-se antes de seguidismo do preceito
bíblico da dádiva cristã por interesse próprio na conquista do Céu, de antemão
conhecendo, a esquerda virtuosa, que empresta a Deus quem dá aos pobres. Pese embora
a excelente análise que disso faz Rui Ramos, pérolas perdidas no nosso contexto cultural, esse sim, a regredir, tirando
os que se esforçam em fazer progredir, coitados, (falo dos professores), ou
mesmo em progredir, valentes, (falo dos alunos)…
Dar a
ricos para não dar a pobres
Ao discriminar
os alunos em função da tipologia pública ou privada da escola, o governo
oferece manuais escolares a ricos (da rede pública) e rejeita-os a pobres (da
rede privada). A ideologia é assim
RUI RAMOS
OBSERVADOR, 08
dez. 2022
A gratuitidade dos manuais escolares está consagrada
para os alunos da rede pública. O seu alargamento aos alunos do ensino privado foi
proposto na Assembleia da República (por iniciativas
de PSD, IL e CH) e foi chumbado com os votos contra
dos partidos à esquerda (PS, PCP, BE, Livre). Não sendo surpresa, a circunstância é exemplar acerca
de dois vícios do debate político, que vale a pena destacar e que talvez ajudem
a explicar o nosso atraso. Por um lado, a cegueira ideológica com que
se olha para o sistema educativo, escolhendo o ângulo morto que coloca a oferta
pública e a oferta privada num braço-de-ferro. Por
outro lado, a ignorância de quem imagina as ofertas pública e privada
segmentadas por classe social — acreditando mesmo que o privado está recheado
de meninos ricos. O que têm em
comum a cegueira ideológica e a ignorância? Não conhecem ou percebem a
realidade.
Primeiro: a regra que vigora sobre os manuais escolares
contém um erro de princípio. Porquê? Porque a gratuitidade
exclusiva para quem frequenta escolas da rede pública rompe com o modelo
vigente de apoios na Educação. Tendo em
conta a relação entre contexto social e probabilidade de sucesso escolar, os
apoios do Estado na Educação estão por definição associados ao perfil
socioeconómico do aluno, destinando-se obviamente aos mais carenciados e
podendo ser alargados a partir deste critério. Se for essa a opção
política, os apoios do Estado podem ser alargados até se tornarem universais e
chegarem a todos os alunos. Contudo,
o que vigora é uma terceira via: a
opção de definir apoios em função da natureza institucional da escola. Ora, isto
corresponde a seguir um critério incoerente, de raiz ideológica e com efeitos
perversos, pois deixa famílias carenciadas sem acesso a este apoio, só porque
os filhos não frequentam uma escola da rede pública — como, em 2020, a Provedora de Justiça alertou.
Segundo: a ideia de que as escolas privadas são para alunos
ricos é uma fantasia. Por um lado, é evidente que os alunos da Acção Social
Escolar estão esmagadoramente a frequentar escolas da rede pública — apenas 1% da dotação orçamental da Acção Social Escolar se
destina a alunos da rede privada. Por outro lado, em 2021, 21% dos
alunos (pré-escolar ao ensino secundário) frequentou a rede privada. Se olharmos apenas para o ensino secundário,
constatamos que 1 em cada 4 alunos (24%) estava matriculado na rede privada (já
agora, uma percentagem superior ao ano 2019). Ora, Portugal não é um país rico. E, por isso, a menos que se acredite numa
espécie de milagre que enriqueceu um quarto dos agregados familiares com
filhos, fica-se perante a evidência de que inúmeras famílias portuguesas fazem
um enorme esforço económico para ter os seus filhos na rede privada — umas
vezes por opção educativa, outras vezes por necessidades de natureza pessoal ou
profissional (horários, serviços extra-escolares, proximidade geográfica,
apoios a necessidades educativas especiais).
Terceiro: a composição social das escolas da rede pública é
muito diversa. Em 2022, 358 mil alunos foram beneficiários da
Acção Social Escolar, o
que (simplificando) corresponde a cerca de um terço dos alunos matriculados na
rede pública do básico e secundário. Dito ao contrário, tal significa que dois
terços dos alunos não estão sinalizados por carências sociais e económicas. Ninguém achará que, por isso, estas são todas
famílias de contextos favorecidos ou mesmo ricas. Mas algumas até o são. E
frequentam escolas da rede pública que mais parecem colégios.
Acha que não? Olhe que sim.
Devido às regras das matrículas, a composição social das escolas da rede
pública espelha a segregação residencial existente, o que significa que, nos
bairros onde a habitação é mais cara, as escolas da rede pública assemelham-se
aos colégios privados mais elitistas — quase sem alunos de contextos
desfavorecidos. E vice-versa: nos bairros mais desfavorecidos, a população
escolar está quase toda na Acção Social Escolar (ASE). Ilustro com exemplos, a partir deste estudo da DGEEC. No
distrito de Setúbal, há uma escola com 83% de alunos com apoio ASE e outra
escola com apenas 17% de alunos nessa condição. No concelho de Lisboa, há uma
escola com 8% de alunos com apoio ASE e outra com 78%. No concelho do Porto,
mesma coisa: escolas com 16% e escolas com 87%. A rede
pública única e homogénea que aparece nas caricaturas dos discursos
parlamentares não existe: no seu lugar, há uma rede amplamente diversa, que
também toca nos extremos — dos mais pobres aos mais ricos.
Resultado: ao discriminar os alunos em função da tipologia
pública ou privada da escola que frequentam, o governo (com o apoio de toda a esquerda)
aceitou o ónus de oferecer manuais escolares a ricos (da rede pública) e de os
rejeitar a pobres (da rede privada). A ideologia é assim: pinta realidades
complexas em tons estupidificantes de preto e branco. O preço maior
será pago por alguns — aquelas famílias que se desdobram e contam os cêntimos
para manter os filhos na rede privada. Mas o
cinismo da esquerda parlamentar, tão disponível para sacrificar os mais
desfavorecidos que não encaixam nos seus ideais, esse fica mesmo à vista de
todos.
COMENTÁRIOS (de 23):
Alexandre Barreira: Pois. Ter
"figos" sem figueira. Não é
fácil ! Mapns Santos: Não é só cegueira ideológica, é
mesmo fanatismo irracional. Carlos Chaves: Caríssimo Alexandre Homem Cristo, enquanto
continuarmos a achar que isto é ideologia, cegueira, ignorância, incompetência
etc… esta esquerda destruidora vai fazendo o seu caminho. Tudo isto é
estratégico e tem que ser tratado como tal. Isto são crimes contra o nosso
Estado de Direito, as nossas liberdades individuais a justiça social e o
direito a uma educação despolitizada. Neste caso visa o sistema educativo, mas
esta estratégia está em marcha há sete anos! A esquerda “moderna” já não faz
revoluções para controlar e se manter no poder, toma-o de assalto por dentro.
Que melhor área do que a educação, para garantirem novos afiliados, e já agora,
acríticos e “burrinhos” para não questionarem os futuros lideres? Temos que
estar com mais atenção ao que se passa aqui ao lado em Espanha e com os
correligionários do Costa, pode ser que aprendamos alguma coisa! Isto são
movimentos muito perigosos, e se estamos à espera que a “Europa” nos salve e
nos proteja de novas ditaduras pode ser que nos saia o tiro pela culatra.
Carlos
Almeida: Bem visto. Boa análise. Afonso Soares: Porque é que as famílias que se sentem
pesadas não recorrem para o tribunal constitucional? PORQUE é que os partidos
que votaram contra esta lei não recorrem para o constitucional? A constituição
não é igual para todos independentemente da condição financeira? Antonio Alvim: Na Saúde é igual. Só se tem acesso a meios
complementares de diagnóstico comparticipados pelo SNS se for a uma consulta no
SNS. Se for pobre e for a uma consulta privada (até porque o Estado não tem
como lha fornecer -existem 1 450 000 utentes sem Médico de Família) tem que
pagar do seu bolso. Madalena Sa: Muito boa análise! É triste mas os
Portugueses não percebem! Ficaram completamente estupidificados depois do 25 de
Abril! Em vez de evoluírem estupidificaram! É isto o socialismo! Lápis Afiado: Isto sim é discriminação e racismo económico
......uma das maravilhas da esquerda.
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