segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Um texto polémico


Que não discuto, no prazer de ler os prós e os contras, e admirando de preferência os discursos da razão.

Maria e o feminismo

Numa sociedade secularizada, pode parecer irrelevante a Imaculada Conceição de Maria, mas não assim o seu significado em relação à dignidade e liberdade da mulher.

P. GONÇALO PORTOCARRERO DE ALMADA: COLUNISTA

OBSERVADOR, 10 dez. 2022, 24:1725

A solenidade de Nossa Senhora da Conceição, festejada no dia 8 de Dezembro, é uma das principais festas marianas do calendário nacional, por ser Maria nossa Rainha e Padroeira. Esta devoção está tão enraizada no nosso país que é difícil encontrar uma terra onde não haja uma igreja, capela ou ermida, dedicada a Nossa Senhora.

A celebração litúrgica do dia 8 de Dezembro evoca o dogma da Imaculada Conceição da Mãe de Jesus. José Rodrigues dos Santos, por ocasião da publicação de um seu romance, disse que, como os Evangelhos afirmam que Jesus Cristo teve vários irmãos, a sua mãe teve … várias imaculadas conceições!!!

O jornalista, cujos conhecimentos teológicos são, pelos vistos, muito limitados, ignora que o termo irmão era, na altura, também extensivo aos primos direitos ou, como também se diz, coirmãos. Que Maria não teve, para além de Jesus, outros filhos, prova-se pelo facto de este, na hora da sua morte, a ter entregue ao discípulo João, que não era seu parente, precisamente porque não tinha irmãos a quem pudesse confiar a Mãe.

O romancista também desconhece que a Imaculada Conceição não se refere ao facto de Nossa Senhora ter sido mãe, nem à sua perpétua virgindade, mas ao momento em que ela própria foi concebida por seus pais, Santa Ana e São Joaquim. Embora a concepção de Maria tenha sido natural, foi preservada da mancha do pecado original, atendendo à sua futura condição de Mãe de Deus e, por isso, é imaculada. Como esta prerrogativa mariana parecia colidir com outras verdades de fé, nomeadamente a universalidade da redenção de Cristo e a necessidade do Baptismo para alcançar a salvação, a sua formulação teológica foi tardia: só aconteceu em 1854, para grande júbilo de toda a cristandade. Quatro anos depois, este dogma mariano foi confirmado em Lourdes, onde Maria, ao dizer que é a Imaculada Conceição, confirmou não só a sua concepção sem pecado original, mas também que nunca pecou na sua vida terrena.

Portugal foi precursor nesta devoção mariana: o instituto religioso do Imaculado Conceição de Maria, ou Concepcionistas, foi fundado pela nossa Santa Beatriz da Silva. Também na Universidade de Coimbra se prestava culto à Imaculada Conceição: as autoridades docentes obrigavam, como condição prévia à obtenção de um grau académico, o compromisso de defender que Maria foi preservada do pecado original, muito antes de que tal fosse exigido, pela suprema autoridade eclesial, a todos os cristãos.

Numa sociedade secularizada como a nossa, talvez pareça irrelevante a Imaculada Conceição de Maria, mas não assim o seu significado em relação à dignidade e liberdade da mulher cristã. Nestes tempos de decadência civilizacional, o feminismo radical diz querer libertar a mulher de tudo, até da sua condição feminina e da sua mais bela expressão, que é a maternidade, outorgando-lhe o ‘direito’ de mudar de sexo e de ser, pelo aborto, assassina do seu próprio filho. Nos regimes totalitários opostos, a mulher é reduzida a uma condição inferior, como em alguns países islâmicos, onde não se lhe reconhece sequer a liberdade de estudar, ou de trajar como melhor entender.

É significativo que, há dois mil anos, uma jovem rapariga de Nazaré tenha sido contactada pelo Anjo Gabriel, que lhe propôs ser mãe do Messias. É muito surpreendente que uma criatura possa dar à luz o seu próprio Criador, gerando no seu seio a natureza humana que, em Jesus de Nazaré, se uniu à natureza divina: por esta sua dupla condição Cristo é, simultaneamente, verdadeiro Deus e homem verdadeiro. Mas não é menos relevante que, para este efeito, Deus tenha considerado que aquela jovem de Nazaré era suficiente para decidir a questão de que dependia a salvação da humanidade. De facto, sendo ainda muito nova, seria razoável que o consentimento não fosse pedido a ela, mas ao seu pai, pois as filhas menores, ou ainda na dependência paterna, não podiam, segundo os usos e costumes da época, tomar por si próprias decisões de grande responsabilidade.

Mesmo que Deus entendesse que não tinha por que pedir licença ao pai de Maria, teria sido exigível, de acordo com as leis e praxes de então, que tivesse solicitado o consentimento de José, seu marido, com quem já estava oficialmente casada, embora ainda não vivessem juntos. Segundo a tradição de então, a mulher passava da dependência paterna para a do marido, estando sempre sob a autoridade e poder de algum varão.

Ora Deus, ao considerar que aquela jovem donzela de Nazaré, não obstante a sua juventude e condição de casada, era a sua bastante interlocutora em relação a uma decisão tão transcendente, deu um exemplo absolutamente revolucionário do que é a dignidade feminina. Ao contrário do que então era costume e o foi durante séculos, sendo-o ainda agora em alguns países e religiões, Deus acredita verdadeiramente, segundo a fé cristã, na igual natureza e dignidade das duas variantes do ser humano – homem e mulher – e, por isso, não aceita que a mulher seja inferior ao homem, seja ele pai ou marido. A mulher cristã é, pois, a única dona e senhora do seu destino e, como tal, é a ela que compete decidir a sua vida, sem interferências masculinas.

À mulher deve ser reconhecida esta liberdade, que não é um fim, mas um meio para a realização pessoal. Com efeito, não fomos feitos para sermos livres, mas fomos feitos livres para sermos felizes, através de um livre compromisso de amor. Por isso, a independente e autónoma Maria, que a ninguém consulta, nem pede licença, para aceitar uma tão transcendente proposta divina, é a mesma mulher que aceita a autoridade de José, quando este, advertido da perseguição de Herodes ao recém-nascido Rei dos Judeus, decide partir para o exílio no Egipto.

Esta sua obediência não é, ao contrário do que uma visão superficial poderia levar a crer, um acto submisso a uma autoritária decisão machista, mas um exercício da liberdade do amor, porque, quando se obedece a quem se ama, é-se verdadeiramente livre. Desta liberdade, que é independência e autonomia, mas também obediência e entrega, é exemplo o próprio Cristo: “Se o Pai me ama, é porque dou a minha vida para outra vez a assumir. Ninguém ma tira, mas eu por mim mesmo a dou, porque tenho poder de a dar e tenho poder de a reassumir” (Jo 10, 17-18).

Nenhuma criatura humana se compara a Maria, a Imaculada Conceição, e só às mulheres foi dada a incrível possibilidade da maternidade, tanto física, gerando filhos para o mundo, como espiritual, pela consagração a Deus no serviço aos irmãos, que é também uma autêntica maternidade. Não é em vão que Santa Teresa de Calcutá era Madre, ou seja, mãe, assumindo, em relação aos mais pobres dos pobres, uma condição análoga à que Maria adquiriu, para toda a humanidade, aos pés da Cruz de Jesus.

Como Deus é justo, depois de ter exaltado tanto a sua Mãe e, nela, todas as mulheres, aparentemente entendeu compensar a manifesta inferioridade masculina, reservando para os homens o sacerdócio ministerial, não por discriminação machista, mas tão-só como prémio de consolação.

COMENTÁRIOS (de 25):

LÚCIO MONTEIRO:  Como Deus é justo, depois de ter exaltado tanto a sua Mãe e, nela, todas as mulheres, aparentemente entendeu compensar a manifesta inferioridade masculina, reservando para os homens o sacerdócio ministerial, não por discriminação machista, mas tão-só como prémio de consolação” (padre Gonçalo Portocarrero de Almada)

1.     Esse padre Gonçalo é um génio chapado e um colosso intelectual! A partir de agora, a inacessibilidade da mulher católica ao sacerdócio já tem uma “justificação", que nem o altíssimo QI de Einstein seria capaz de lobrigar. Assim, as mulheres católicas, a partir de 11 de dezembro de 2022,  já podem dormir descansadas e sentirem-se “redimidas”, porque já ficaram a conhecer a “razão” pela qual lhes está interdito, pela Igreja Católica, o exercício do magistério sacerdotal: é pelo facto de, na interpretação do “sobredotado” padre Gonçalo Portocarrero, Deus considerar o homem "inferior” à mulher. E, para que aquele não se sinta abalado por qualquer “complexo de inferioridade” em relação à mulher, concedeu-lhe a prerrogativa do exercício sacerdotal. Magistral raciocínio, sim senhor!

2.     A Imaculada Conceição da Virgem Maria foi solenemente definida como dogma pelo Papa Pio IX em sua bula Ineffabilis Deus, em 8 de dezembro de 1854. Assim, durante cerca de dezanove séculos da história da Igreja Católica, nenhum crente era obrigado a crer na conceção imaculada de Maria, pela simples razão de não haver um dogma que a isso os obrigasse. Mas, a partir de 8 de dezembro de 1854, a situação alterou-se radicalmente, ou seja, quem ousasse afirmar o contrário, tinha a Igreja “à perna”.

3.     Como ficou registado num outro texto de minha autoria, para que um Deus – a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade – encarnasse e se tornasse homem, seria mister que não só nascesse ele próprio sem pecado, como fosse de uma mulher – Maria –, também ela, sem pecado. Assim, ficou tudo “imaculado”, sem sombra de pecado. Tudo muito limpinho, sem o mínimo contacto sexual. Tudo assepsiado.

4.     Sexo! É precisamente aqui que reside o busílis da questão. Desde os seus primórdios, a Igreja nunca soube lidar com a questão sexual. À guisa de parêntesis, existe uma interpretação, entre muitas outras, acerca do significado do pecado original, que o conota com a prática sexual. Assim, segundo essa interpretação, o pecado original resultou de um ato sexual, sem a devida "licença" de Deus, praticado entre Adão e Eva, a “tentadora”.

Nesse sentido, o sexo sempre foi considerado pecaminoso pela Igreja Católica. É apenas tolerado porque é necessário para a procriação. Nada mais. Deve estar dissociado de todo o prazer. Para a Igreja, prazer sexual significa prazer pecaminoso. Já por isso, os seus ministros estão obrigados a cumprir a lei do celibato. Não vá o diabo tecê-las. Mesmo assim, o diabo, vai fazendo das “suas”, o que conduz a que alguns dos "ministros" só consigam ser celibatários em "part-time". 

A este propósito, e segundo o meu entendimento, 99% dos 8 mil milhões de seres humanos do planeta Terra, o prazer sexual é tido como a “mãe” de todos os prazeres. Já para os bichinhos, essa percentagem chega aos 100%. E isso acontece, porque os bichinhos não são preconceituosos e não ligam peva à moral judaico-cristã.
5.     O caso de Jesus Cristo apresenta-se deveras complexo, já que levanta a seguinte questão: ao ser concebido, foi ou não foi fertilizado? Se foi, de quem recebeu os 23 cromossomas paternos? Se não foi, então ocorreu através da Partenogénese? (do grego παρθενος, "virgem", + γενεσις, "nascimento"; uma alusão à deusa grega Atena, cujo templo era denominado Partenon) refere-se ao crescimento e desenvolvimento de um embrião sem fertilização. São fêmeas que procriam sem precisar de machos que as fecundem).

Mas se a conceção de Jesus ocorreu na sequência da partenogénese, então, isso acontece com os  zangões, - entre outros  insetos e alguns vertebrados) que se originam de óvulos não fecundados. E como nascem de óvulos não fecundados, herdam todos os genes que possuem da “mãe”(Rainha), uma vez que não têm “pai”.

Será que Jesus Cristo nasceu apenas com os genes de Maria, graças ao processo da partenogénese?  

Mapril Oliveira > LÚCIO MONTEIRO: Não tinha lido essa do "Como Deus é justo", francamente já não tenho paciência para ler as barbaridades que o homem escreve. Às vezes o nonsense até tem alguma piada, mas é inútil vir aqui ensaiar qualquer espécie de raciocínio lógico, o leitor típico destas colunas foi formatado desde o berço para acreditar na religião e já não consegue pensar pela sua cabeça. Mas já agora, lanço aqui mais um pensamento: Diz o padre que Maria foi concebida sem pecado, para poder gerar o filho de Deus, e a seguir diz que Deus perguntou à moça se concordava. Agora pergunto: se a rapariga tivesse dito que não, isto é, se se negasse à violação do seu corpo, o que lhe aconteceria? Eu conheço o suficiente do Velho Testamento para saber que Deus era um ser cruel e vingativo para aqueles que não o seguiam ou que se lhe opunham - é claro que a moça, se se negasse aos avanços divinos, estaria condenada! Estudiosos da Bíblia, digam, estou certo ou estou errado?

Coronavirus corona >Mapril Oliveira: Mapril, quando eu tinha 15, 16 anos o mecânico que arranjava os carros ao meu pai era um homem cheio de si. Não tinha escolaridade (o que não é mal nenhum) mas tinha muitas certezas. Tinha certezas em tudo e dizia amiúde que ele pensava pela cabeça dele. Lembro-me dele dizer muitas vezes que as leis não eram claras (ou seja, passíveis de interpretação pelos tribunais) porque os "governantes" (referia-se ao legislador) faziam as leis confusas propositadamente para dar trabalho a juízes, advogados e por aí fora. Se quisessem faziam as leis claras como água para não haver confusão. Mas todos tínhamos de ganhar dinheiro e a sociedade estava assim feita.  Aquilo fazia-me confusão. Por um lado fazia sentido: se quem faz a lei dissesse logo como é e como não é, era mais fácil. Mas por outro lado era angustiante a ideia de vivermos todos numa enorme mentira, numa burla gigante. Fazia-me confusão como é que pessoas passavam todas as suas vidas numa actividade que era inútil, sabendo dessa inutilidade. Às vezes dizia-lhe que se calhar alguma razão haveria mas ele, naquele estilo de homem cheio de maturidade, responda-me, debaixo de um sorriso condescendente, que eu ainda era muito novo. Eu pensava: se é assim nas leis, é assim em tudo. Que coisa triste se assim for. Só que não é. É apenas a mostra que a ignorância é atrevida. Acabei por me dedicar às ciências jurídicas e por perceber o porquê das leis não serem, muitas vezes, claras. O legislador não consegue abarcar toda a complexidade de uma sociedade, todos os aspectos da interação humana. A lei é necessariamente passível de ser interpretada. Não, não se trata de uma gigantesca conspiração. Tratava-se apenas de falta de humildade, de desconhecimento e, conjugados estes dois ingredientes, de teorias conspirativas.  O tema da religião sofre do mesmo mal. Poucas pessoas dedicam verdadeiro tempo a estudar a história da igreja, a doutrina da igreja. Como isso dá trabalho e frases-feitas dão uma ilusão de certeza, há pessoas que tendem logo a decifrar o mistério da vida, da morte e da Criação. Condensam a teologia milenar, construída por milhares de homens que lhe dedicaram as suas vidas e todo o seu saber, numa explicação muito arrumadinha: oh, isso são gajos para defender uma ideia. Devem ter medo de morrer e vai daí dedicam as suas vidas a estudar um assunto que se sabe ser falso.  Claro que meia dose de humildade bastava para que a pessoa pelo menos colocasse a hipótese do assunto ser sério, racional, importante mas apenas estar fora da esfera do seu conhecimento. Mas por vezes o restaurante tem o prato esgotado e nem meia dose existe.          Mapril Oliveira: A respeito de Deus não aceitar que a mulher seja inferior ao homem, lembrei-me do episódio bíblico, Génesis capítulo 19: Deus decidiu destruir Sodoma e todos os seus habitantes por serem grandes pecadores (os homens tinham o péssimo hábito de fazerem sexo uns com os outros). Na cidade vivia Lot, e ele era o único homem justo entre todos os habitantes. Deus resolveu salvá-lo e para isso enviou dois anjos a avisá-lo que saísse da cidade. Os anjos tinham a forma de homens, e deviam ser uns belos mancebos, porque deixaram os sodomitas em brasa, e em grande número vieram cercar a casa de Lot, exigindo-lhe que lhes entregassem os homens. Então Lot saiu à porta, e disse-lhes (Sic, parágrafos 7 e 8): 7 E disse: Meus irmãos, rogo-vos que não façais mal. 8 Eis aqui, duas filhas tenho, que ainda não conheceram homem; deixai-me, rogo-vos, trazê-las para fora, e fareis delas como for bom aos vossos olhos; somente nada façais a estes homens, porque por isso vieram à sombra do meu telhado. Ou seja, Lot, o único homem bom aos olhos de Deus, queria entregar as suas filhas à multidão para uma violação colectiva. Mas temos que ser compreensivos: aos olhos de Lot não se tratava de violação porque as mulheres valiam pouco mais que gado - gado não é violável, não é? Do mesmo modo pensaria Deus, porque no fim Lot e as filhas foram salvos – já todos os outros habitantes, incluindo homens, mulheres e crianças e até a mulher de Lot foram mortos pelo fogo enviado por Deus. Este é apenas um episódio entre tantos onde se demonstra que Deus trata as mulheres como seres inferiores – O padre diz o contrário, o que é, obviamente, uma falsidade.

Coronavirus corona > Mapril Oliveira Questão: "Se a doutrina sagrada deve usar de metáforas"

Resposta: "(...) É conveniente à Sagrada Escritura transmitir as coisas divinas e espirituais por comparações metafóricas com as corpóreas. Pois, provendo Deus a todos, segundo a natureza de cada um, e sendo natural ao homem chegar, pelos sensíveis, aos inteligíveis — pois todo o nosso conhecimento começa pelos sentidos — convenientemente, a Sagrada Escritura nos transmite as coisas espirituais por comparações metafóricas com as corpóreas. E é isto o que diz Dionísio: É impossível alumiar-nos o raio divino sem ser circumvelado pela variedade dos véus sagrados."

(São Tomás de Aquino, Suma Teológica, Prima Pars, Questão 1, art. 9)

 Questão: "Se na Sagrada Escritura uma mesma letra tem vários sentidos: o histórico ou literal, o alegórico, o antropológico ou moral e o anagógico"

 Resposta: (...) quando as coisas da lei antiga significam as da nova, o sentido é alegórico; quando as realizadas em Cristo, ou nos que o que significam, são sinais das que devemos fazer, o sentido é moral; e quando significam as coisas da glória eterna, o sentido é anagógico.

Mas como o sentido literal é o que o autor tem em vista, e o autor da Sagrada Escritura é Deus, cuja inteligência tudo compreende simultaneamente, não há inconveniente, como diz Agostinho, se, mesmo no sentido literal, uma expressão da Sagrada Escritura tem vários sentidos."

(São Tomás de Aquino, Suma Teológica, Prima Pars, Questão 1, art. 10)

Não Mapril, nada disso. Eu sei que tem na cabeça que antigamente a igreja interpretava a Bíblia de forma literal e só nos últimos anos blablablá. Mas é mais uma das falsidades. 

Quanto a Lot, entregou as filhas para que fizessem o que fosse bom aos olhos. Violar nunca foi bom aos olhos. Não, nada disso. É treta que as mulheres eram como gado. O primeiro código - Código de Hamurabi - condenava severamente as violações. É verdade que as mulheres não tinham os mesmos direitos. Mas o que pode apontar aos textos bíblicos é uma grande inovação neste aspecto: "não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, pois todos vós sois um em Cristo Jesus" (Epístola de São Paulo aos Gálatas, 3:28). As mulheres são iguais aos homens e os livres iguais aos escravos no que toca à dignidade. Somos todos o corpo místico de Cristo (os cachorros, talvez por descuido de Nosso Senhor, ficaram de fora). 

LÚCIO MONTEIRO:  “Embora a concepção de Maria tenha sido natural, foi preservada da mancha do pecado original, atendendo à sua futura condição de Mãe de Deus e, por isso, é imaculada” (padre Gonçalo Portocarrero de Almada).  

Quando a fantasia humana “perde o pé”, – ou melhor, quando a fantasia de alguns teólogos “iluminados” fica sem “travões" – o resultado é quase sempre mirabolante e absurdo.

É óbvio que os tais teólogos “iluminados” montaram um verdadeiro “puzzle” para que Jesus “nascesse” sem pecado. Sendo considerado Deus, identificado como a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade – outra bizarria dos tais teólogos “iluminados” – nunca poderia ter nascido de uma “pecadora”. Por isso, a mãe, Maria, assim como o filho, Jesus, que haveria de conceber, tinham, “necessariamente”, de nascer sem pecado, graças aos “joguinhos mentais” dos tais teólogos “iluminados”. Tudo isso é fantasmagórico. Mas o que é mais inacreditável é que haja crentes que “engulam” toda essa “produção” teológica.

Às vezes, interrogo-me: “Por que razão há pessoas que acreditam nessas patranhas?” Depois de muito reflectir, cheguei à conclusão que a explicação está no facto de haver um grande número de crentes católicos *, que, por serem tão numerosos, reforçam, entre si, a crença na mesma realidade subjectiva.

Uma realidade subjectiva, como é sabido, - como por exemplo a crença na Imaculada Conceição, a Santíssima Trindade, o pecado original, o mito do criacionismo, entre milhentos de outros exemplos - não tem existência objectiva.

Contrariamente, uma realidade objectiva – como por exemplo a Lei Gravitacional, entre milhentos de outros exemplos – existe, prova-se que existe, independentemente de uma mente que nela acredite.

Se todos os seres humanos desaparecessem da face da Terra, a Lei Gravitacional continuaria a existir na mesma. Mas o que subsistiria da “Imaculada Conceição”, da "Santíssima Trindade", do pecado original, de Adão e Eva, do mito do criacionismo, etc., sem que houvesse mentes subjectivas que acreditassem nessas realidades subjetivas? 

* Conforme os dados mais recentes do Anuário Pontifício, na sua edição 2022, e do Annuarium Statisticum Ecclesiae, referente ao ano de 2020, o número de católicos no mundo era de 1.36 mil milhões. 

Mapril Oliveira > LÚCIO MONTEIRO: Os humanos são seres racionais mas, muitas vezes, nós preferimos bloquear a racionalidade, porque esse é o caminho mais fácil. A religião tem resposta para todas as dúvidas, medos anseios dos que acreditam - como é bom desligar, acreditar e simplesmente seguir o rebanho. 

PS: eles até chamam os crentes de o seu "rebanho". E são mesmo!

Coronavirus corona > Mapril Oliveira: Quando Aristóteles escreveu os livros "Metafísica" e "Da Alma" era por medos e anseios? Quando São Tomás de Aquino escreveu a sua Suma Teológica, citando fartamente Aristóteles, Platão, inúmeros filosofia árabes, foi por medos e anseios? Ele, coitadinho, na sua ignorância, escreveu para defender a igreja? Estude estes homens, as suas obras, e depois veja o quão pequenina se sente. E a vergonha que irá ter por ter achado que a religião se resume a uma resposta ao medo. Isso é blablablá barato de quem nunca ocupou grande tempo da sua vida a estudar filosofia, história ou o que quer que seja. 

Não dói resposta sequer ao Lúcio, tendo em conta o nível de fanatismo, arrogância e soberba em cima daqueles sapatinhos que tem calçados, mas o catolicismo não se defende entre si e dentro de si. É fundamentado nas Escrituras, na Tradição e no Magistério. As obras de Santo Agostinho ou de São Tomás de Aquino São alicerçadas nas Sagradas Escrituras mas também na filosofia grega e em todo o saber milenar acumulado. Incluindo (para seu espanto) os livros apócrifos 

Carminda Damiao: Muito claro e esclarecedor este artigo.

Zé das Esquinas o Lisboeta: Como o comentarista é padre e acredita no que diz por fé e não por conhecimento e raciocínio, é inútil contrapor seja o que for. A fé é cega, no verdadeiro sentido: não deixa raciocinar. Agora continua a fazer-me 'cócegas' é ler palermices como Deus foi pedir aos pais autorização... E como foi fazer esse pedido, foi a pé, bateu à porta? E se a resposta fosse negativa, castigava-os? As histórias da carochinha também começam com o "era uma vez..."

Mas mesmo os que não crêem tiveram direito ao feriado. E isto num país em que o Estado que se diz leigo. Olha se não fosse! Agora duma coisa tenho a certeza é que os portugueses, mesmos os não católicos, não estão pelos ajustes se 

Madalena Sa : Grande artigo! Maria é o maior exemplo que Deus deu ao mundo! Nestes tempos medonhos em que se vive seria muito importante que todos soubéssemos estudar e aprender os ensinamentos de Deus!

Américo Silva: Surreal. O cristianismo é feminista e propagou-se pelas mulheres, porque dava um marido à mulher com a responsabilidade de a sustentar por toda a vida, e ainda a tornava sua herdeira, o homem tornava-se assim animal de rendimento, ocorria entretanto um desvio do que o pai devia aos filhos, para um dever para com a esposa, que ainda hoje se mantém: para a mulher o modo de ficar rica é por herança, por divórcio, ou por viuvez.

Coronavirus corona > Américo Silva: não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, pois todos vós sois um em Cristo Jesus

(Epístola de São Paulo aos Gálatas, 3:28)

Sabe o que significa?

1) Que todos os seres humanos têm dignidade.

2) Que essa dignidade é igual, independentemente de quem quer que seja.

 

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