sexta-feira, 2 de agosto de 2019

Expectativa



A opinião de MST é apenas uma, racional, parece-me, mas naturalmente simplista, desconhecedora das malhas que se vão tecendo num mundo tão absurdamente imprevisível, de um íman magnético que aparentemente se descomandou, sem norte à vista, nos homens, no clima, nos medos, nas incógnitas. E o torvelinho vai seguir, no meio do sangue, do suor e das lágrimas que arrastam o mundo, mau grado os Boris, ou também por causa deles.

OPINIÃO
Boris Johnson e o poder da palavra
Ninguém sabe que raio vai fazer Boris Johnson, mas toda a gente está especada a ver. A política também é isso.
PÚBLICO, 27 de Julho de 2019
Na última semana, o meu mural de Facebook encheu-se de cartoons e de montagens fotográficas de Boris Johnson e Donald Trump, como se eles fossem gémeos na aparência e na alma, e como se o trumpismo tivesse finalmente conseguido aquilo que o nazismo nunca conseguiu: invadir a Grã-Bretanha. Sinceramente, não sei bem o que diga disto, tal a indigência da comparação (embora – admito – dê óptimos cartoons), mas quero ao menos deixar este alerta aos chamados “progressistas”: continuem a tratar tudo por igual, e um dia destes não vão conseguir distinguir uma mosca de um elefante.
Tirando o penteado bizarro, a cor excêntrica do cabelo e – vá lá – um certo talento para utilizar as contradições como instrumento de acção política, Boris Johnson não tem nada a ver com Donald Trump, nem no percurso de vida, nem na experiência governativa, nem na solidez intelectual, nem no sentido de humor. E também não tem nada a ver num outro aspecto que me é particularmente caro, até por ser tão pouco valorizado na democracia portuguesa: o talento no uso público da palavra. Johnson partilha essa qualidade com o seu admirado Churchill, e eu partilho com ambos a convicção de que bons discursos e a atitude política certa podem fazer maravilhas na mobilização de um país, e na forma como conseguem abrir janelas onde toda a gente só está a ver paredes.
Chama-se a isto “carisma”, e, como todos os grandes poderes, tanto pode ser usado para o bem, como para o mal. Sim, é possível que Boris Johnson se venha a revelar um imenso flop, e não me perguntem onde está a saída feliz para o “Brexit”, uma ideia que acho absurda desde o primeiro dia. Mas devo dizer que compreendo perfeitamente a escolha dos conservadores britânicos – nesta altura do campeonato, mais vale ir buscar o único tipo carismático que acredita que possa existir uma solução decente para um problema que parece não ter solução alguma. A Grã-Bretanha precisa de um milagre, e Boris Johnson é a coisa mais parecida com um feiticeiro que se encontra por ali.
Sei que falar em milagres e feitiçaria no que à política diz respeito não é o tipo de argumento que colha bem entre pessoas bem-pensantes – e, em certos contextos, seria pura estupidez. Neste contexto, talvez não. Perguntemo-nos: de que vale a frase, que ele proclamou no discurso à frente do número 10 de Downing Street, de que “as pessoas que estão a apostar contra a Grã-Bretanha vão perder a sua camisa”? Que efeito pode ter o desafio àqueles que chamou “the doubters, the doomsters and the gloomsters”, de que será capaz de liderar o país para fora da União Europeia sem afundar a sua economia? Diria que o efeito é bastante óbvio: conseguir recuperar as energias de uma nação esgotada por três anos de indecisões (das quais, diga-se, o senhor Johnson tem boa dose de culpa).
Mesmo discordando eu das ideias de Boris Johnson sobre o “Brexit”, é isso que tenho gostado de ver nos últimos dias – um político que chegou à sua cadeira de sonho, que remodelou o governo de cima a baixo numa noite, e que parece acreditar nalguma coisa. Quando se olha para a esforçada Theresa May, para o calculista David Cameron ou para o apagadíssimo Gordon Brown – os três primeiros-ministros britânicos do século XXI –, compreende-se melhor que o país necessite de um badocha de carne e osso que seja algo mais do que um burocrata empenhado. Ninguém sabe que raio vai fazer Boris Johnson, mas toda a gente está especada a ver. A política também é isso
COMENTÁRIOS:
Célio Carreira, 28.07.2019: É para mim incompreensível que, num dos países com a democracia mais consolidada e com mais tradição de maturidade política, um tipo chegue ao poder sem ter sido eleito. É certo que, no Partido Conservador, estava na calha para suceder à resignada Theresa May, mas custa-me perceber por que razão os ingleses não foram consultados para se saber se aceitavam como chefe de governo esta cara vermelhusca com um tufo de palha seca na cabeça. É verdade que o aspecto físico não é o que mais conta, podem até achar que não tive graça nenhuma. Mas a verdade é que às características descritas se junta também uma postura exótica e aparentemente truculenta, radical e errática. Será que os ingleses se revêem nesta personagem? Vamos ver no futuro, para sabermos se podemos tirar uma conclusão acerca do padrão dos dirigentes políticos em funções, que tem em D. Trump, Jair Bolsonaro, Salvini e Victor Orban exemplos intrigantes das tendências actuais nas escolhas dos eleitores dos respectivos países
Raquel Azulay: 27.07.2019 Posso estar enganada, mas acho que BoJo vai surpreender tudo e todos. PS: O poder da palavra e o poder da City, JMT. Convém não esquecer que não são poucas as companhias continentais que administram os seus fundos na City.
rafael.guerra.www www 27.07.2019:  Boris Johnson surpreende sempre tudo e todos, incluindo os seus velhos amigos e as suas amadas da semana. Como quando parte a solo e incógnito para as festas "exóticas" no castelo de Lebedev na Itália. Sendo Lebedev um magnata da imprensa e filho dum oligarca russo, antigo agente do KGB, aparentemente ele não teme ser irradiado com plutónio quando a nu nas orgias em Perugia.
Raquel Azulay, 29.07.2019: Estou em crer que Bojo surpreenderá o todo-poderoso.
agany, Setúbal 27.07.2019: Não se esqueçam que em BoJo corre sangue Otomano.
Luis Morgado, Lisboa 27.07.2019: Concordo que a política se dá bem com os habilidosos. O Reino Unido tem sido um espectáculo pelas piores razões e agora com Boris Johnson a mentira e a palavra fácil vão imperar. Discordo que ele pareça acreditar em alguma coisa. Tem sentido de humor, tem piada, mas falta-lhe aquilo que é importante num líder: valores e rectidão. Quem é que vai acreditar nele depois das mentiras que já disse??? Ninguém, a não ser o eleitorado sensível ao populismo e ele próprio. Entretanto a raposa Putin esfrega as mãos com a decadência da Europa e do Reino Unido.
Raquel Azulay, 27.07.2019: Decadência da Europa e do Reino Unido?? Não se precipite. A saída da GB da UE não é o fim do mundo.
Luis Morgado, Lisboa 28.07.2019: Pois não, mas é decerto o contributo para o fim de "um mundo".
EuQuixote, Olhão 27.07.2019: Concordo com a análise nas diferenças! Peca por não ter aprofundado nas semelhanças e principalmente no perigo de a receita ser poderosa e potenciadora de cópias adaptadas às realidades locais. São ambos exemplos do político do raiar do Sec XXI, demagogos a roçar no mentiroso, não olhando a meios para alcançarem os fins, enrolam as massas na superficialidade, alienando-os dos reais problemas que afectam e fazem perigar a civilização. Homens (Mulheres) do momento e não do futuro. Acho que pessoas como o JMT têm a obrigação de ir mais longe na análise, alertando aqueles de nós que encaram a vida de forma mais ligeira. (peço desde já desculpa pela presunção)


Nenhum comentário: