A opinião de MST é apenas uma, racional,
parece-me, mas naturalmente simplista, desconhecedora das malhas que se vão
tecendo num mundo tão absurdamente imprevisível, de um íman magnético que aparentemente
se descomandou, sem norte à vista, nos homens, no clima, nos medos, nas incógnitas.
E o torvelinho vai seguir, no meio do sangue, do suor e das lágrimas que
arrastam o mundo, mau grado os Boris, ou também por causa deles.
OPINIÃO
Boris Johnson e o poder da palavra
Ninguém sabe que raio vai fazer Boris
Johnson, mas toda a gente está especada a ver. A política também é isso.
PÚBLICO, 27 de Julho de 2019
Na
última semana, o meu mural de Facebook encheu-se de cartoons e de
montagens fotográficas de Boris Johnson e Donald Trump, como se eles fossem
gémeos na aparência e na alma, e como se o trumpismo tivesse finalmente
conseguido aquilo que o nazismo nunca conseguiu: invadir a Grã-Bretanha.
Sinceramente, não sei bem o que diga disto, tal a indigência da comparação
(embora – admito – dê óptimos cartoons), mas quero ao menos deixar este alerta
aos chamados “progressistas”: continuem a tratar tudo por igual, e um dia
destes não vão conseguir distinguir uma mosca de um elefante.
Tirando
o penteado bizarro, a cor excêntrica do cabelo e – vá lá – um certo talento
para utilizar as contradições como instrumento de acção política, Boris Johnson
não tem nada a ver com Donald Trump, nem no percurso de vida, nem na
experiência governativa, nem na solidez intelectual, nem no sentido de humor. E
também não tem nada a ver num outro aspecto que me é particularmente caro, até
por ser tão pouco valorizado na democracia portuguesa: o talento no uso
público da palavra. Johnson partilha essa qualidade com o seu admirado
Churchill, e eu partilho com ambos a convicção de que bons discursos e a
atitude política certa podem fazer maravilhas na mobilização de um país, e na
forma como conseguem abrir janelas onde toda a gente só está a ver paredes.
Chama-se
a isto “carisma”, e, como todos os grandes poderes, tanto pode ser usado para o
bem, como para o mal. Sim, é possível que Boris Johnson se venha a revelar um
imenso flop, e não me perguntem onde está a
saída feliz para o “Brexit”, uma ideia que acho absurda desde o primeiro
dia. Mas devo dizer que compreendo perfeitamente a escolha dos conservadores
britânicos – nesta altura do campeonato, mais vale ir buscar o único tipo
carismático que acredita que possa existir uma solução decente para um problema
que parece não ter solução alguma. A Grã-Bretanha precisa de um milagre, e
Boris Johnson é a coisa mais parecida com um feiticeiro que se encontra por ali.
Sei
que falar em milagres e feitiçaria no que à política diz respeito não é o tipo
de argumento que colha bem entre pessoas bem-pensantes – e, em certos
contextos, seria pura estupidez. Neste contexto, talvez não. Perguntemo-nos: de
que vale a frase, que ele proclamou no discurso à frente do número 10 de
Downing Street, de que “as pessoas que estão a apostar contra a Grã-Bretanha
vão perder a sua camisa”? Que efeito pode ter o desafio àqueles que chamou
“the doubters, the doomsters and the gloomsters”, de que será capaz de
liderar o país para fora da União Europeia sem afundar a sua economia?
Diria que o efeito é bastante óbvio: conseguir recuperar as energias de uma
nação esgotada por três anos de indecisões (das quais, diga-se, o senhor
Johnson tem boa dose de culpa).
Mesmo
discordando eu das ideias de Boris Johnson sobre o “Brexit”, é isso que tenho
gostado de ver nos últimos dias – um político que chegou à sua cadeira de
sonho, que remodelou o governo de cima a baixo numa noite,
e que parece acreditar nalguma coisa. Quando se olha para a esforçada
Theresa May, para o calculista David Cameron ou para o apagadíssimo Gordon
Brown – os três primeiros-ministros britânicos do século XXI –, compreende-se
melhor que o país necessite de um badocha de carne e osso que seja algo mais do
que um burocrata empenhado. Ninguém sabe que raio vai fazer Boris Johnson, mas
toda a gente está especada a ver. A política também é isso
COMENTÁRIOS:
Célio Carreira, 28.07.2019: É
para mim incompreensível que, num dos países com a democracia mais consolidada
e com mais tradição de maturidade política, um tipo chegue ao poder sem ter
sido eleito. É certo que, no Partido Conservador, estava na calha para suceder
à resignada Theresa May, mas custa-me perceber por que razão os ingleses não
foram consultados para se saber se aceitavam como chefe de governo esta cara
vermelhusca com um tufo de palha seca na cabeça. É verdade que o aspecto físico
não é o que mais conta, podem até achar que não tive graça nenhuma. Mas a
verdade é que às características descritas se junta também uma postura exótica
e aparentemente truculenta, radical e errática. Será que os ingleses se revêem
nesta personagem? Vamos ver no futuro, para sabermos se podemos tirar uma
conclusão acerca do padrão dos dirigentes políticos em funções, que tem em D.
Trump, Jair Bolsonaro, Salvini e Victor Orban exemplos intrigantes das
tendências actuais nas escolhas dos eleitores dos respectivos países
Raquel Azulay: 27.07.2019 Posso estar
enganada, mas acho que BoJo vai surpreender tudo e todos. PS: O poder da
palavra e o poder da City, JMT. Convém não esquecer que não são poucas as
companhias continentais que administram os seus fundos na City.
rafael.guerra.www www 27.07.2019: Boris Johnson
surpreende sempre tudo e todos, incluindo os seus velhos amigos e as suas
amadas da semana. Como quando parte a solo e incógnito para as festas
"exóticas" no castelo de Lebedev na Itália. Sendo Lebedev um magnata
da imprensa e filho dum oligarca russo, antigo agente do KGB, aparentemente ele
não teme ser irradiado com plutónio quando a nu nas orgias em Perugia.
Raquel Azulay, 29.07.2019: Estou em crer que
Bojo surpreenderá o todo-poderoso.
Luis Morgado, Lisboa 27.07.2019: Concordo que a
política se dá bem com os habilidosos. O Reino Unido tem sido um espectáculo
pelas piores razões e agora com Boris Johnson a mentira e a palavra fácil vão
imperar. Discordo que ele pareça acreditar em alguma coisa. Tem sentido de
humor, tem piada, mas falta-lhe aquilo que é importante num líder: valores e
rectidão. Quem é que vai acreditar nele depois das mentiras que já disse???
Ninguém, a não ser o eleitorado sensível ao populismo e ele próprio. Entretanto
a raposa Putin esfrega as mãos com a decadência da Europa e do Reino Unido.
Raquel Azulay, 27.07.2019: Decadência da
Europa e do Reino Unido?? Não se precipite. A saída da GB da UE não é o fim do
mundo.
Luis Morgado, Lisboa 28.07.2019: Pois não, mas é
decerto o contributo para o fim de "um mundo".
EuQuixote, Olhão 27.07.2019: Concordo com a
análise nas diferenças! Peca por não ter aprofundado nas semelhanças e principalmente
no perigo de a receita ser poderosa e potenciadora de cópias adaptadas às
realidades locais. São ambos exemplos do político do raiar do Sec XXI,
demagogos a roçar no mentiroso, não olhando a meios para alcançarem os fins,
enrolam as massas na superficialidade, alienando-os dos reais problemas que afectam
e fazem perigar a civilização. Homens (Mulheres) do momento e não do futuro.
Acho que pessoas como o JMT têm a obrigação de ir mais longe na análise,
alertando aqueles de nós que encaram a vida de forma mais ligeira. (peço desde
já desculpa pela presunção)
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