Uma panorâmica perfeita das
excentricidades pedantes deste nosso mundo fraudulento que não se coíbe de escarrar,
do fausto das suas empreitadas de custos vultuosos, figurinhas da nossa ternura
inócua, endeusando-as, como meios de alerta previdentes, quais pitonisas avisadoras,
dos destinos da humanidade, para a nossa parolice dengosa e cega ante o
paradoxo. Tal é o artigo de Alberto Gonçalves, de uma causticidade sem peias,
na sua troça impagável, que muitos comentadores admiram – troça que merecemos,
mas sem resultados práticos, laracheiros que somos, para mais hoje, tempo de
selfies…
A pequena Greta e os seus minúsculos
devotos /premium
ALBERTO GONÇALVES
OBSERVADOR, 31/8/19
A
pequena Greta mostrou aos brutos que atentam contra a natureza a maneira
correcta de se viajar: em veleiros que pertencem a príncipes e custam milhões.
Após
enfrentar a fúria dos mares e as más-línguas que a dizem patrocinada por
lobbies políticos e empresas de energias “verdes”, Greta Thunberg chegou enfim à costa americana. Em
Nova Iorque, foi recebida por 200 pessoas, ou cerca de 0,002% da população
local. Melhor ainda, recebeu uma mensagem do eng. Guterres, sujeito com
olho para identificar causas nobres e descobrir novos talentos. O eng.
Guterres elogia a “determinação e a perseverança” da pequena Greta durante
a epopeia marítima (entrou num barco e ficou nele até atracar). O elogio é merecido. Desde logo, a pequena Greta
mostrou aos brutos que atentam contra a natureza a maneira correcta de se
viajar: em veleiros que pertencem a príncipes e custam
milhões. Se você,
pobre de espírito, não desencantar um veleiro semelhante para se deslocar ao
Algarve ou a Torremolinos, resta-lhe permanecer em casa, e investir os mil e
duzentos euros das férias a emoldurar retratos da pequena
Greta, a santinha que faz jus à época.
Entretanto em Manhattan, a pequena
Greta regressou ao activo, ou ao “activismo”,
que é o trabalho dos que não trabalham em profissões chatas e mal
remuneradas. Segundo o “Público”, a missão da pequena Greta começará com
uma “greve pelo clima” em frente à sede das Nações Unidas. O “Público” não
explica a que é que a pequena Greta faz greve. A um emprego nas minas
de Skellefteå? À escola? A um workshop de rendas de bilros? Certo
é que a pequena Greta saberá educar os americanos sem educação (um
pleonasmo) nas matérias ambientais. É curioso ter sido necessário uma
criança de 16 anos – diagnosticada com autismo ligeiro e à espera de um
diagnóstico de presunção terminal –
para alertar a humanidade sobre os perigos que a ameaçam. E é curiosíssimo
que a criança nem sequer precise de dizer nada de especial. E não diz. No
meio da ignorância própria da idade e do deslumbramento, a pequena Greta, que
pede ao sr. Trump que “ouça a ciência”, limita-se a repetir os clichés da
ortodoxia e, quando estes não parecem suficientemente assustadores, a inventar
versões distorcidas dos clichés. No fundo, a pequena Greta traduz o típico
alarmismo do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) para
uma linguagem mais alarmista, mais simples e mais adequada a cabecinhas como a
do eng. Guterres e dos eleitores do PAN.
Exemplos?
Há três ou quatro meses, um relatório do IPCC avisava “ser provável que o
aquecimento global atinja 1,5ºC entre 2030 (ou daqui a 11 anos) e 2052 se
continuar a aumentar à taxa actual”. No dialecto da pequena Greta, a frase
transformou-se em “De acordo com o relatório do IPCC, estamos a 11 anos de
se iniciar uma reacção em cadeia humanamente incontrolável”. É a mesma
coisa? Não é a mesma coisa: é mais alarmista, mais simples e mais mentirosa.
E é o estilo de primarismo notável e demagogia pedagógica que convém aos
tempos que correm, tempos que não deixam os meros factos atravessarem-se no
caminho de um bom pânico generalizado. Se a salvação da Terra implica
reduzir a respectiva população a níveis medievais de crendice e fanatismo,
força. O importante é legar um planeta imaculado aos nossos filhos. Na
condição, claro, de os nossos filhos serem tão conscienciosos quanto a pequena
Greta. Se não forem, os fedelhos e o planeta que se lixem.
O
que vale é que há esperança, e pequenas Gretas em abundância.
Passei a semana anterior com amigos numa casa de praia na Catalunha, região em
que jurara nunca pôr os pés (salvo pela temperatura do mar, evidentemente resultado
das perturbações meteorológicas, não valeu a pena quebrar a jura). Os amigos
têm prole, uma garota de 5 anos e duas adolescentes. Todas reproduzem o que
aprendem na escola. Na escola, aparentemente, a petizada não aprende português,
matemática ou a discernir que “funk” brasileiro não é música. Em compensação,
absorve farrapos soltos de informação inútil ou discutível. Ou seja, os meninos
e as meninas partilham os palpites da pequena Greta e do semi-alfabetizado
médio. “A separação do lixo é fundamental” (concedo que o lixo
unido é difícil de aturar). “O homem está a destruir tudo” (não
identificaram o homem em questão, pelo que não pude apresentar queixa nas
autoridades). “A Amazónia é o pulmão do mundo” (e o parque de
Monsanto, um joanete?). Etc.
Significa
isto que a reciclagem não é importante? Depende. E que a intervenção humana não
é influente? Depende. E que a Amazónia não é o pulmão do mundo? Depende. No que
toca à ecologia, tudo depende imenso, e por depender assim é que evito
convicções firmes nesses domínios do conhecimento. Veja-se o caso da exacta Amazónia, que ardeu numa
escala incomparável nos idos de 2004, 2005, 2006 e 2007. Alguém elevou o tema a
manchete angustiada? Alguém organizou petições internacionais? Alguém convocou
milhares de criaturas a fim de protestarem nas capitais? Alguém pediu a
intervenção de chefes de Estado e milagreiros diversos? Alguém, em suma, se
maçou? Ninguém. Porquê? Porque na altura o presidente do Brasil era o sr. Lula
e não dava jeito criticar um amigalhaço dos pobres, dos oprimidos, da cachaça e
de uns trocos por fora. Hoje, que o presidente é o sr. Bolsonaro, ai Jesus que
a Amazónia está em chamas. Ai Jesus, vírgula: as aflições versam apenas a parte
da Amazónia que pertence ao Brasil. A da Bolívia, governada por outro camarada
com consciência social, pode desaparecer à vontade. Aliás à imagem das
florestas de Angola e do Congo, em processo de combustão acelerada e ignorada.
O ambiente é um assunto complicado, tão complicado que só uma criança o
entende. Uma, ou milhões delas.
COMENTÁRIOS
Pedro Reis: Tempos
medievais aproximam-se. Antigamente era a falta de informação, agora é o
excesso de dela. A informação e desinformação é tanta que andam que nem baratas
tontas, ao sabor de modas e de novos credos. Como que à espera de encontrar um
caminho, esperou-se por um homem providência, hoje dá-se crédito a uma Greta
endeusada.
Antonio Fonseca: "
Há três ou quatro meses, um relatório do IPCC avisava “ser provável que o
aquecimento global atinja 1,5ºC entre 2030 " Estas previsões são uma forma
de terrorismo. Quando o ZERObama foi presidente dos USA encomendou um estudo
ECOTERRORISTA onde se concluía que partes dos USA iriam ficar submersas. Entre
elas Martha's Vineyard. Agora o mesmo ZERObama vai comprar uma mansão em
Martha's Vineyard por 15 milhões. É ver como levam a sério essas previsões.
Manuel Marques 1. Após 2001,
2018 foi o ano recordista do menor número de fogos, em 2019 cresceram uns 60%
mas mesmo assim é um dos anos com menos fogos florestais no Brasil. https://forbes.uol.com.br/wp-content/uploads/2019/08/gra%CC%81fico_ince%CC%82ndios_florestais_26.jpg
2.O luxo
industrial de um veleiro que permite retornar à Europa cavalgando um único
sistema frontal https://www.youtube.com/watch?v=diM1h4WTSgc Qual a pegada humana envolvida na construção
deste iate hi-tech?
Eu sou dos que gosto imenso desta pipi das meias altas
(não reparei no tamanho, mas concedo) e, solidário com ela, também quero ir a
NY protestar, fazer greve ou atirar tomates ao Trump. Pouco importa, sou a
favor do ambiente e tudo o mais. Como não tenho dinheiro nem um príncipe com um
barquito de € 34.000.000 (número que li algures como sendo o custo do dito)
fico por cá, a lamentar Pedrógão, Monchique, etc., que não queimou nada de
relevo e, no entretanto, aproveitei ver um programazito no canal Odisseia
intitulado, salvo erro, "Como o clima mudou a História", o qual foi
um pouco mais elucidativo que as tretas da pipi acima referida e concluiu, como
é óbvio, que a única permanência ao longo dos milénios a nível do clima é que
está sempre a mudar (eu já desconfiava disso, pois quando uma vez estive na
cidade de Óstia, em Itália, só assim se percebia porque é que aquele imenso e antigo
porto romano de mar do século I da nossa era estava tão longe... do mar. É que,
como é óbvio, o clima entretanto foi mudando e o porto... secou!)
:
José Ramos A pequena
Greta, e os miúdos da sua idade, devido à sua pouca idade e nenhuma
experiência, estão sujeitos ao tipo de doutrinação em voga em cada época
ministrada por gente crescida, responsável e com interesses enormes, geralmente
camuflados. A diferença entre os miúdos de hoje e, por exemplo, os dos anos de
1960 - garanto que houve tipos encharcados em ervas de proveniências diversas,
ácido lisérgico e outras substâncias, que acreditaram conseguir fazer levitar o
Pentágono através da concentração das suas alucinadas mentes - é que os de hoje
são levados a sério por uma sociedade cada vez mais infantilizada e acrítica, A
mundivisão e os desejos da pequena Greta não andam longe dos disparates e discursos
feitos por outras Gretas de décadas passadas, ligeiramente mais crescidas que
esta e geralmente candidatas ao título de Miss Universo ou algo parecido. Hoje,
como essas coisas são consideradas "incorrectas" por censoras
puritanas de carregar pela boca e, geralmente, com o prazo de validade
ultrapassadíssimo há lustros, as Gretas metem-se no veleiro fino e rumam às NU.
Antigamente, com um bocado de sorte, iam apanhar sol junto à piscina de Hugh
Hefner e talvez viessem a ser Miss July ou September.
Fernando Gomes da Costa Pelo
menos construímos um elo com a petizada. No nosso tempo, a Pipi das Meias
Altas. Agora a Pipi das Marés Altas...
Paulo Silva: Lido o artigo na íntegra apraz-me registar que as expectativas não foram
defraudadas. Caro AG, que a voz nunca lhe doa na denúncia da infantilização em
curso pelos educadores do ‘socialismo de cátedra’, nesta e em muitas outras
matérias...
Jorge Maria Soares Lopes de Carvalho: Gil Vicente:” RIDENDO CASTIGAT MORES” Absolutamente
Extra o ordinário habitual dos lacaios da comunicação canhestra. Obrigado A.
Gonçalves
Manuel Ferreira: Dois exagerados; a pequena Greta e o Sr. Alberto!
André Ondine: Gosto sempre de ler as crónicas de Alberto Gonçalves. Desta vez, tendo
gostado de ler, não concordo. Independentemente das contradições e do iate
milionário, se o percurso de Greta contribuir (e julgo que está a contribuir)
para uma tomada de consciência de novas gerações para um problema evidente e
urgente, e com uma consequente mudança de comportamentos, isso não é bom? Eu
penso que é. Claro que estas questões têm sido hipocritamente apropriadas por
cínicos como o BE, PAN e PS novo turco, mas não podemos ser cinicamente
Costistas em relação a tudo e todos.
Liberal Impenitente "Veja-se o caso da exacta Amazónia, que ardeu numa escala incomparável
nos idos de 2004, 2005, 2006 e 2007.": O
embaixador do Brasil em Paris disse isto mesmo. Seria importante que os
jornalistas averiguassem, mas confio em Alberto Gonçalves. Porquê? Porque não
tenho nenhum motivo para desconfiar.
Quanto ao artigo, é simplesmente delicioso.
Pedro Ferreira: Excelente artigo. Uma sociedade infantilizada e de consumidores de lixo
está extremamente vulnerável à manipulação, mas dá gosto ver o AG a
desmontar as torpes técnicas que usam.
Stra. Anabela Faísca: É um gosto ler as crónicas do Alberto Gonçalves. É um absurdo existir um
pobre de espírito chamado Guterres, um bando de malfeitores radicados na ONU a
querer controlar o mundo e a Greta, para miúda e ainda por cima com asperger
não se orienta nada mal. Terá um agente para tratar de patrocínios e contratos?
Tiago Queirós > Stra. Anabela Faísca: Alguns dos mais confessos e
ardentes defensores da Revolução Bolchevique foram ricos proprietários.
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