Que nos lavam a alma, na simplicidade cristalina
de uma escrita percuciente e sem volteios. Infelizmente, no seu significado
doloroso, traduzindo borrasca.
OPINIÃO
Diário
VASCO PULIDO VALENTE
PÚBLICO, 3 de Agosto de 2019
Por
causa de um protesto, certamente justo, contra uma trapalhada eleitoral, Putin meteu
na cadeia mais de mil russos. Putin é um ditador com frequência
deplorado pelo “politicamente correcto”. O que o “politicamente correcto”
não diz é que a Rússia não é uma federação – é um império. E nunca
nenhum império pôde ser governado em democracia. A oposição de São
Petersburgo e de Moscovo vem de uma pequena parte da classe média, que tem um
vago contacto com a Europa e gostava que o império fosse governado como a
Holanda ou a França. Antigamente chamavam a estes pobres visionários
“ocidentalizantes”. Mas, para a Rússia, a tarefa de se “ocidentalizar” sempre
foi impossível. Quem nasce torto, tarde ou nunca se endireita.
28 de Julho: As televisões têm dedicado grande parte do seu tempo
a discutir o mercado de transferências. O futebol português precisa, para
subsistir, de vender jogadores, o que é uma bela metáfora do país. Hoje
vendemos jogadores; amanhã venderemos físicos, biólogos, economistas ou
engenheiros de sistemas. A nossa pobreza já nos levava a vender tudo: as praias
e a cozinha. Era inevitável que acabássemos a vender pessoas.
29 de Julho: O posto de “adjunto do secretário de Estado”
não está previsto pela legislação em vigor, ou seja, não existe. O indivíduo
para o qual a imprensa inventou esta designação é, segundo dizem, o chefe de
gabinete do dr. Neves, seu compadre político e presidente da concelhia de
Arouca. Não tendo nenhuma espécie de autoridade independente ou
delegada, o “adjunto” não pode ter nenhuma espécie de
responsabilidade. Não percebo por que razão se discute uma coisa tão
clara e tão simples.
30 de Julho: A questão das golas não é principalmente uma
questão de relações públicas do ministro Eduardo Cabrita, é a verificação do
modo de vida do PS: a pequena influência, o pequeno favor, um jeitinho para um
parente, um amigalhaço - esse pequeno comércio que envenena a vida política,
mas que vai promovendo socialmente os apparatchiks do governo. É uma
tendência muito triste, que chegou para ficar e que não há maneira de impedir.
Teremos de nos habituar a este mau cheiro. O salazarismo também o aguentou e
nem por isso caiu.
31 de Julho: A lei das incompatibilidades é inconstitucional,
inaplicável e absurda. Mas desde 1995 que ela existe e só agora
o PS deu por isso. E convém compreender que ela não pode servir de guarda-chuva
à gente que não a respeitou e que, certa da sua impunidade, tratou da vidinha.
Basta ler a lista dos familiares que, discretamente, têm contratos com o Estado
para perceber que parte é aleatória e que parte assentou no uso impróprio do
poder político.
A
insistência no tema da corrupção deixa de fora o ponto mais sensível de toda
esta polémica: o Estado e a política são ou não são o elevador social por
excelência? Na larguíssima medida em que o são, coisas como a lei das
incompatibilidades hão-de ser sempre uma irrelevância.
1 de Agosto: O meu amigo e antigo controleiro João Cravinho emergiu
esta semana reclamando a regionalização. E, para isso, quer:
abolir o referendo de 1998, porque não gosta do resultado; fazer um novo
referendo (ou vários referendos) para chegar ao resultado conveniente; fazer
uma revisão constitucional muito pequenina, “cirúrgica” como ele diz, para
acomodar esta e outras manobras necessárias ao elevado fim que ele persegue.
A
esquerda não consegue viver em democracia.
2 de Agosto: O ministro Centeno, candidato a presidente do FMI,
deixou de publicar os resultados das auditorias às empresas públicas do Estado
central e dos municípios. Agora, graças a Deus, anda tudo por aí à solta a
fazer o que lhe apetece. Se houver azar, o dr. Centeno arranja um empréstimo do
FMI.
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