domingo, 15 de março de 2020

Conclui-se que Terra e Homem são um só



Há partículas dispersas nos espaços, concretas ou abstractas que, à medida que o Homem as desvenda ou que ele próprio vai criando, em companheirismo terráqueo, multiplicando com cada vez maior velocidade os universos de um saber logo transferido para as máquinas, hoje de uma misteriosa cibernética que o elege a um poder quase supremo, a tentar o milagre da rapidez de informação que nos deixa estupidificados, uma Terra e um Espaço assim gradualmente devassados, parece que se vingam do “bicho da Terra tão pequeno” e afinal de um cérebro tão capaz e esfuziante de energia criadora. E a Natureza, assim atraiçoada e invadida, vinga-se desse Homem com tanto maior poder, quanto maior é a inteligência humana que vai imparavelmente desbravando o infinito do conhecimento e provavelmente largando os poluentes concretos ou abstractos de tão extraordinários feitos. Daí a dimensão de uma epidemia à escala global hoje, de pura vingança animista. Amanhã, quem sabe? – será mais devastadora ainda.
Será tolice esta interpretação dos factos, na ignorância completa dos porquês de tão inédita e aterradora situação que faz travar a vida na Terra, e o melhor mesmo é ler a opinião esclarecida de José Pacheco Pereira, que os comentadores admiram, como eu própria.
Ou então, voltemos à velha teoria “'No creo en brujas, pero que las hay, las hay»…, mais fantasista e lembrando histórias encantadas de outros tempos, em que os maus eram castigados e os bons premiados, como de justiça, …


OPINIÃO CORONAVÍRUS
Estragos no corpo e na cabeça
Justifica-se tão grande mudança, para uma doença que, para a maioria, é razoavelmente benigna? Justifique-se ou não, vai-se saber depois, porque o que se vive hoje é um ponto sem retorno.
JOSÉ PACHECO PEREIRA
OPINIÃO, 14 de Março de 2020
Há muito pouco tempo escrevi sobre o “ruído do mundo” e a imprevisibilidade da história. Nem vale a pena lembrar como, em meia dúzia de dias, o “ruído do mundo” cresceu tanto que estamos na verdade “noutro mundo”, diferente daquele que tínhamos nessa altura. Para os filósofos, para todas as ciências que devem a Darwin o seu cânone, para os que sabem como funcionam as mutações e percebem o DNA e a contínua chuva de partículas que nos atravessa, a nós e aos vírus, para os ateus e agnósticos que não tem uma visão teleológica do mundo e do devir, para os matemáticos, que lidam com o acaso, nada disto é surpresa.
A humanidade tem uma longa história de defrontar epidemias e pandemias. O mundo contemporâneo, com muito pouca memória, tem menos experiência. E quando me refiro ao mundo contemporâneo, refiro-me à globalização, ao tecido social e demográfico que está muito para além do imediato passado do século XX. Em 1918, havia ainda a guerra, as trincheiras, as más condições de vida nas retaguardas, a escassez de cuidados médicos, a falta de higiene generalizada, nenhuns canais de comunicação de massas, e foi nessa ecologia que a gripe pneumónica fez os estragos que fez. Mas, pouco do que se passou na altura, há mais de cem anos serve para hoje, embora haja algum adquirido cientifico da pandemia, que tem vindo sistematicamente a ser estudada.
O mundo mudou muito, cidades, campo, transportes, condições de vida, alimentação, padrões de vida e de consumo, saúde pública e medicina, sociedade, comunicações, são muito diferentes de há cem anos. As imagens de cidades e ruas vazias que pareciam apenas existir em filmes de ficção científica, mostram a diferença pela estranheza. E é nesse mundo que a pandemia da covid-19 se desenvolve e, se não fosse trágico, poder-se-ia dizer que a natureza nos ofereceu um laboratório sobre as doenças, mas também, e sobretudo, sobre os comportamentos humanos, sem paralelo. O problema é que não é in vitro.
Um dos principais aspectos da actual crise pandémica é a absoluta, contínua, maciça dose de informação, comunicação, desinformação que todos estão a receber, sem sequer poderem parar para pensar. É mesmo a “massagem” de McLuhan. Não sei se é bom, se é mau, ver-se-á depois. Por um lado, as pessoas estão melhor informadas, e presume-se que mais conscientes dos riscos que correm, por si e pelos outros; por outro lado, há a possibilidade de reacções de pânico e comportamentos irracionais, como a corrida a determinados bens de consumo que nada indica estarem em ruptura, ou excessos de distanciação, ou o olhar para tudo à nossa volta como um mar de vírus que nos toca mesmo com luvas e máscara ou a dez metros de distância. Mas há também o lado da desinformação, nalguns países suscitadas pelas agendas políticas do poder e dos seus aliados na comunicação, como é o caso exemplar dos EUA, entre um  Trump displicente e desleixado, minimizando o que acontece, e a Fox News a dar-lhe cobertura. E depois, genericamente, nas chamadas “redes sociais, onde proliferam falsas notícias, teorias conspirativas, pseudociência, boatos, tribalismo e populismo. Hoje, não há maneira de impedir que este bas-fond suba miasmático para a atmosfera e envenene o ar.
Outro aspecto é o de encontrar na sociedade um contraste entre a solidão de muitos - em particular o alvo preferencial da covid-19, os mais velhos - e um gregarismo muito comercializado entre os mais novos, bares, concertos, vagabundagem colectiva dos jovens adultos e circulação pelos novos espaços urbanos dos centros comerciais, e a tentação da praia, como se não se soubesse viver sem isso. Todos estes movimentos ou paragens suportam uma nova perturbação que é o encerramento das escolas, atirando para a casa e para horas que ainda são para muita gente de trabalho, mesmo na situação actual, com centenas de milhares de crianças. Acrescem a estas perturbações, os diferentes graus de quarentena ou isolamento obrigatório ou voluntário de muitos milhares de pessoas, muitas das quais dependentes de terceiros para obterem o que necessitam. A única coisa que mitiga esta perturbação no espaço e no tempo individual e colectivo é a esperança de que não dure muito.
Justifica-se tão grande mudança, para uma doença que, para a maioria, é razoavelmente benigna? Justifique-se ou não, vai-se saber depois, porque o que se vive hoje é um ponto sem retorno. Claro que entre a prudência e o medo, o medo é mais poderoso, e o medo moderno, comunicacional, urbano, entre o telemóvel e a Rede, é tão inesperado e tão pouco experienciado nas sociedades sem guerra, que leva à paranóia.
Deixo de lado, os efeitos económicos sobre os quais muito se tem escrito e que será provavelmente o rastro mais durável da pandemia: mas se for apenas este o efeito, mais a médio prazo do que se está a passar, volta-se ao sítio com algumas perdas, desigualmente distribuídas como é costume. Porém, evita-se a componente social do medo que o desconhecido gera, muito mais fundo do que as falências, os despedimentos, a crise, que são coisas que conhecemos e que são muito perturbadoras para a vida de indivíduos e famílias, mas menos perturbantes para a cabeça. Para quem não está na primeira linha de risco, é na cabeça que os estragos vão ser maiores. Amen.
Colunista
COMENTÁRIOS:
manuel.m2 INICIANTE: E se a insanidade vem de cima? Ou se o que vem de cima é muito pior que a insanidade, uma espécie de experiencia em Eugenia? No meu país , o RU , o meu Governo finalmente esclarece por que razão não adopta as medidas radicais em vigor no resto da Europa: Trata-se, não de impedir a progressão do vírus, mas sim de permitir que este atinja 60% dos 66.5 milhões de Britânicos criando imunidade "na manada",(Herd immunity), o que daria protecção no futuro. A geração dos mais velhos seria dizimada com evidente poupança nos custos sociais. Resta dizer que não é sabido ainda se, e por quanto tempo, o novo vírus produz imunidade, essa, sim, garantida por uma vacina possível num futuro não muito distante.
Jose MODERADOR: As guerras feitas premeditadamente matam mais que o covid-19. Estão em curso com falanges de apoio na comunicação social e nas redes sociais. As motivações das guerras são a cobiça do que é de outros para garantir o sustento da vida de sobrevivência que é ainda a da humanidade. A luta contra o coronavírus tem outras motivações. Trata-se de os Estados fazerem prova da sua capacidade de proteger os seus povos de um vírus novo para o qual não há vacina e não há medicação para os infectados com covid-19. O uso do medo existe para manter o mundo a funcionar e neste caso para parar o mundo. É também o medo usado para justificar as guerras em nome da liberdade, da democracia, da honra dos povos... Diz isso quem ataca e quem defende. É o estado da técnica da acção política. Não sabemos agir melhor.
Caetano Brandão INFLUENTE: Espectacular, bem haja PP, porque eu pensava que a insanidade mental se tinha instalado neste país e tal como diz, o vírus atinge preferencialmente os miolos das pessoas e felizmente verifico que ainda há alguém que pára para pensar com a cabeça e não com os cotovelos. Eu subscrevo totalmente o que diz e não há dúvida que a raiz da solução para todos os problemas neste mundo está no conhecimento e na sensatez, as quais advêm de muita leitura, curiosidade, educação e não de instagrams e youtubes ou facebooks. 14.03.2020
José Cruz Magalhaes MODERADOR: Ainda bem que a quarentena não abrange o pensamento, nem a pandemia afecta a exposição da opinião e do comentário. 14.03.2020


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