Um requiem comovente. Sem a conhecer
pessoalmente, fixei, nos carros onde a captavam as lentes dos fotógrafos, esse
sorriso bondoso e etéreo que nos é descrito por Paula Teixeira da Cruz, sorriso que nunca pretendeu ultrapassar os vidros do
carro que a conduzia, talvez por doença, talvez por indiferença pelas vãs
glórias do mundo. Oxalá que longe continue a proteger o seu marido, figura
especial de um tempo político especial, feito de verdade e não de astúcia.
Obrigada a Paula Teixeira da Cruz por tão
bonito retrato de uma tão bonita mulher, a lembrar aquela outra Laura que Petrarca imortalizou, em tema que Camões
retomou no seu “Alma minha”. O
retrato “A Laura” feito por Paula
Teixeira de Cruz tem uma extraordinária força anímica que causa
admiração e saudade.
OPINIÃO
A Laura
Por tudo o que nos deste, em particular
nos momentos mais difíceis, obrigada, Laura. Continuaremos a ver o teu sorriso
nas estrelas do céu e no mais pequeno grão de areia.
PAULA TEIXEIRA DA CRUZ
PÚBLICO; 4 de Março de 2020
Há
seres humanos que só por existirem nos fazem bem e nos inspiram confiança na
Humanidade, constituindo um contraponto à maldade, à inveja, ao deslumbramento,
à indiferença, que predominam na nossa sociedade.
1.Conheci
Laura
Ferreira há muitos
anos, num casamento. Confesso que a sua simplicidade e o seu sorriso eram espantosos, em anos em que o exibir era tudo,
coisa que ainda não passou.
Mas
Laura e Pedro eram muito especiais.
Vim
a reencontrá-la noutras ocasiões e, sobretudo, em dias de Política difícil e
sofrida. Foram anos de chumbo, de sacrifício e de dificuldades
de toda a espécie.
Enquanto
Pedro foi primeiro-ministro, Laura não mudou um milímetro, pese a relevância e
projecção das funções exercidas por seu marido. Laura mantinha a sua
simplicidade. Haverá algo mais difícil do que a simplicidade, sobretudo num
país de “pavões”?
Ambos
eram autênticos na sua forma de ser e de estar e nada sensíveis às vãs glórias
do Mundo. Levavam a vida que sempre levaram.
2. Passei
a referir-me a Laura por: “Bom Dia Alegria”.
Não dizia olá Laura, dizia exactamente “Bom Dia Alegria”, mesmo entre amigos
comuns, quando a ela me referia.
A
verdade é que, mesmo já doente, havia sempre um riso – aquele riso que era só e
só dela.
Por
muitas que fossem as dificuldades, nunca a vi de outra forma que não a iluminar
qualquer local onde estivesse.
3. “Bom Dia Alegria” era um pilar e uma força que se estendia ao que lhe
fosse possível fazer e a todos a quem pudesse ajudar: das questões mais
complicadas às mais simples. Laura gostava da vida e fazia com que muitos que a
lamentavam suavizassem a sua visão do mundo. Sei bem do que falo.
4. Laura
era independente no seu dia-a-dia, recatada na sua profissão, revelando uma
filosofia diferente de tantas mulheres de políticos que se lhes colavam (e
colam) à pele e que, em função deles e do seu estatuto, ganharam ou tentaram ganhar
visibilidade e dela muito usufruíram.
Mas não, isso não era para a
nossa “Bom Dia Alegria”.
5. Perdemos
um exemplo de resistência, de força e de solidariedade. Perdemos um exemplo de
estoicismo alegre e da simplicidade que nos devia guiar, a todos, mas
infelizmente, neste Mundo, o “Deus das pequenas coisas” não é lá muito
apreciado.
Por tudo o que nos deste, em particular
nos momentos mais difíceis, obrigada, Laura.
Continuaremos
a ver o teu sorriso nas estrelas do céu e no mais pequeno grão de areia.
Até já, “Bom Dia Alegria”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário