Carta de azeiteiro, crónica de
João Miguel Tavares. A primeira,
dirigida a Ricardo de Araújo
Pereira, sublinhando a arrogância irrespeitosa e atrevida daquele, em artigo
contra um estadista que, em tempos de penúria desenfreada, lançara mãos a uma
tarefa de erguer o seu país, com rigor é certo, consciente de que só desse modo
poderia travar o desastre nas finanças públicas, de modo a obstar a tanta
desordem e dissipação trazidas da primeira República e, de resto, já da
monarquia que a antecedera. Todos têm consciência do valor desse homem escrupuloso
que, segundo a minha irmã, confessara à sua fiel empregada, que ela conheceu, que,
quando morresse, só se lhe encontraria cotão nos bolsos. Compará-lo a Hitler,
de facto, é daquelas enormidades que só gente moralmente pouco escrupulosa, ou
brincalhona, pode permitir a alguém moralmente pouco escrupuloso, que as mais
das vezes usa a troça soez e grosseira, embora rebuscada, como estandarte de
realização, mau grado a inteligência que se lhe atribui na execução das suas
piadas mistificatórias, em que se supõe mestre e que, tantas vezes, não passam
de ataques directos e malcriados a figuras a quem pretende pôr soberanamente a
ridículo, munido da sua altivez de clown rico e arrogante. E só um povo habituado
à anedota grosseira de tasca não se confrange com tal vileza. A carta de azeiteiro é suficientemente explícita para que
requeira outra justificação. Assim o é, igualmente, a crónica de João Miguel Tavares, sobre o
domínio discursivo futebolístico como prenda “intelectual” dominante –
obcecante - entre os nossos programas televisivos de análise cultural, imagem
de um povo brincalhão habituado a discussões de tasca, impostos ardilosamente e
fraternalmente nos diversos canais televisivos pelos seus programadores em cata
de audiência.
I - Senhor Ricardo Pereira,
Li
ontem, com toda a atenção, o artigo que escreveu na última edição da
"Visão".Versa o excelso artigo produzido sobre o tema que
agora está na moda: - Quais os Portugueses que mais se evidenciaram ao longo
da nossa história.
Ensaia
V. Exa. ao longo do mesmo artigo um conjunto de afirmações sobre Oliveira
Salazar. Quem lhe pagou e encomendou o
artigo?:
Começa
por afirmar a sua admiração pela sua inclusão na famosa "Lista",
compara-o a Adolfo Hitler e termina, afirmando, que se Salazar ganhasse o
concurso seria a primeira vez que teria ganho umas eleições democraticamente.
Perante o estilo leviano do artigo e a piadinha fácil, não me surpreende a comparação
com A. Hitler. Surpreende-me, isso sim, que se tenha esquecido do óbvio.
O
tal Adolfo foi eleito democraticamente na Alemanha. E democraticamente eleito
conquistou quase toda a Europa e democraticamente eleito ordenou o holocausto. Numa
guerra onde morreram milhões e milhões de Europeus.
Conclusão
óbvia: - As eleições, mesmo as "democráticas" valem o que
valem. Nesta 2ª Guerra Mundial não morreram Portugueses em combate. Sabe o
Exmo. Senhor a quem deve tal feito: - Pois é! Ao tal que não foi democraticamente
eleito.
Sabe
o Exmo. Senhor os esforços diplomáticos que foram feitos para evitar a entrada
de Portugal na Guerra? · Sabe quem gizou diariamente a estratégia? Sabe os
riscos que corremos? As pressões que sofremos? Estimará quantos mortos
morreriam se tivéssemos entrado briosamente no conflito? Muitos de nós hoje não
estaríamos cá, pois os nossos pais ou avós teriam certamente tombado em
combate! Sabe o estado em que Salazar herdou o país após a
espantosa 1ª República, que estávamos mais endividados que hoje? Sabe a que
estado de miséria chegou o povo que em 1928 abominava os partidos políticos, os
quais considerava como os criminosos responsáveis pelo estado de ruína a que o
país se encontrava, e que hoje estamos igualmente em idêntico estado de ruína
por causa dos partidos que tanto gosta e defende! Sabe quem delineou, pela primeira vez, a viragem para
a actual U.E.? Pois é: - O tal que não foi democraticamente eleito. Vá
verificar, caro amigo. Leia. Sabe quem nunca fez obra? O que mandou
construir a Ponte sobre o Tejo, a barragem de Castelo de Bode, o Aeroporto da
Portela, e muito mais com dinheiro que nunca pediu emprestado como agora a estação
de tv onde manda bacoradas o pede para lhe pagar. Sabe quem nunca abandonou 1
milhão de Portugueses nas ex-colónias à sua sorte/morte? Pois é, pois é.
Fácil foi fazer como se fez a seguir
ao 25 de Abril. Fugir é sempre fácil. Além de ser próprio dos fracos e
dos cobardes que também o é, se assim
não fosse não se colocava do lado deles.
Sabe
quem morreu na miséria, tendo servido a causa pública sem receber uma atenção,
uma recompensa, um prémio, uma benesse, uma jóia, um diamante, que não se
reformou após dez anos a
roubar,
sim, este nem sequer roubou, trabalhou uma vida inteira, os que agora defende
roubam durante dez e reformam-se depois, não com uma mas duas ou três! Sabe
quem foi íntegro no exercício do poder? Pois é, pois é. Se V. Exa. tem dúvida
que Salazar ganharia todas as eleições durante o período que esteve no poder, está
muitíssimo mal informado. Leia. Estude sobre a época. Que era alérgico a elas.
Sem dúvida. E com razão, a meu ver.
Estude a 1ª República. Os governos
que se sucederam. O desgoverno que se atingiu. Vem daí a alergia. E quanto à
censura: - Pois. E a informação que temos hoje? Eu prefiro a censura do
passado, evitaria ter de ler, por
exemplo, o que tão infantilmente escreveu.
Numa
palavra: Não escreva sobre o que não sabe. E ainda tem uma surpresa. Num país
infestado pela corrupção, pela mediocridade e pela ambição desmedida pelo poder
na busca da corrupção, eu, contrariado, votaria Salazar. E não seria o único, e
ganhava, Garanto-lhe.
Leia
e informe-se, a ignorância neste país é desmedida. Não fuja, pois, à regra. Cumprimentos
azeiteiro.
II – OPINIÃO: O futebol português é Portugal em 90
minutos
Tem imensa graça ver clubes portugueses a falar em
contratar Jorge Jesus, José Mourinho ou Nuno Espírito Santo – como se eles
quisessem regressar à parvónia futebolística. É mesmo não ter a menor noção da
mediocridade do nosso futebol.
JOÃO MIGUEL
TAVARES
PÚBLICO, 5 de Março de 2020
O
futebol português é cada vez mais a cara chapada do regime. É Portugal concentrado, um microcosmos dos nossos
piores defeitos em resumos de 90 minutos, que explica de forma bastante eficaz porque
é que este país tem tanta dificuldade em passar da cepa torta, e porque é que
continuamos gloriosamente a marcar passo na cauda da Europa.
Uma
semana atrás, todas as equipas portuguesas ficaram de fora dos oitavos de final
das taças europeias de futebol. Segundo li, tal fenómeno já não acontecia desde a longínqua temporada de 1978/79, há mais de quatro décadas, estávamos nós a tentar
recuperar dos desvarios do PREC. Ou muito me engano, ou vai acontecer mais
vezes. Não se trata de azar. Trata-se de uma queda constante da
competitividade dos clubes no plano internacional. Há dez anos, era um
escândalo não haver clubes portugueses nos oitavos da Liga dos Campeões. Agora,
já nem na Taça UEFA o futebol nacional consegue ser relevante. Já éramos
demasiado fracos para competir na liga dos primeiros; começamos a ser demasiado
fracos até para competir na liga dos segundos. Benfiquistas, portistas e
sportinguistas estão cada vez mais condenados a festejar as vitórias da paróquia, porque fora de Portugal são incapazes de ganhar a
ucranianos ou a turcos. Quase todos são mais profissionais, mais bem
organizados, mais dedicados ao jogo e com maior força mental.
Os
resultados estão à vista: o máximo que Portugal pode ambicionar é ser capoeira
de talentos locais. Os
futebolistas estrangeiros mais promissores não querem vir para cá, a capacidade
para reter talento é nula (João
Félix foi seis meses titular no Benfica) e qualquer treinador prefere estar
a lutar para não descer no campeonato inglês do que a lutar pela vitória no
campeonato português. Tem imensa graça ver clubes portugueses a falar em
contratar Jorge Jesus, José Mourinho ou Nuno Espírito Santo – como se eles
quisessem regressar à parvónia futebolística. É mesmo não ter a menor noção da
mediocridade do nosso futebol.
Pergunta:
então como é que se explica que tenhamos sido campeões da Europa? Explica-se muito facilmente. O problema não está no
talento dos jogadores portugueses, nem dos seus treinadores, onde o país é
excepcional. Nuno Espírito Santo está a fazer uma campanha extraordinária em
Inglaterra com jogadores portugueses que em tempos foram de segunda linha. O
problema, como sempre, está na qualidade das instituições. A começar nos
desgraçados clubes de futebol que temos, nos seus presidentes e na sua cultura
de corrupção. Os estatutos que blindam os clubes à
entrada de capital exterior são apresentados como uma garantia de que eles
nunca deixarão de ser dos sócios, mas aquilo que na prática têm feito é
agravar a falta de competitividade desportiva e cultivar presidentes incapazes,
que se eternizam nos lugares, misturam negócios pessoais com negócios do clube,
e escondem com berraria e queixas dos árbitros a sua profunda incompetência.
Isto não se passa apenas no futebol. Passa-se igualmente no país,
que todos os anos perde competitividade para países europeus de dimensão
semelhante. Estamos a ser ultrapassados por todos, tanto no PIB como na bola, e
o porquê está à nossa frente em concentrados de 90 minutos. Tanto
talento, tanto potencial atirado pela janela, só porque não há forma de o país
meter na cabeça que a seriedade e as boas práticas empresariais são aquilo que
nos torna mais competitivos. Não são os berros, nem o fanatismo, nem a
demagogia.
Jornalista
COMENTÁRIOS
Francis INICIANTE: Para se emitir uma opinião, não se pode ir na ilusão
da espuma dos últimos acontecimentos. Há que ter um mínimo de perspectiva. O
conjunto dos clubes portugueses estão classificados objectivamente na UEFA em
6º lugar, depois dos clubes dos grandes países do futebol, e à frente de
“pequenos” países como a Rússia , Ucrânia, Turquia, Polónia, Holanda …Mesmo na
época desastrosa de 2019/20, Portugal está em 5º lugar , imagine-se só!... Este
estado de espírito do JMT, é típico dos benfiquistas que descobriram que,
afinal, e ao contrário do que lhes diziam, o Benfica desde sempre foi o clube
que mais recorreu à corrupção. Vai daí , parece que chegou o armagedão ao
futebol… Um jornalista corrompido por esta falta de objectividade, ficaria em
último no ranking europeu ... 05.03.2020
jmtavares EXPERIENTE: Meu caro, eu
estou a falar de uma tendência, e não de rankings absolutos, porque os rankings
absolutos são dificílimos de estabelecer. Isso implicaria analisar qual a
importância dada ao futebol em cada país. Em Portugal, infelizmente, ela é
quase absoluta. Nos últimos Jogos Olímpicos, nós ganhámos 1 medalha. A Holanda
ganhou 19 nos Jogos Olímpicos de Verão e 20 medalhas nos Jogos Olímpicos de
Inverno. Não me parece que os holandeses só pensem em bola, como nós. 06.03.2020
asvenancio INICIANTE: Muito bem observada a analogia expressa
no artigo, com a qual estou totalmente de acordo. E muito bem escrito. 05.03.2020
rafael.guerra EXPERIENTE: Com 1 ou 2
jogadores lusos perdidos em cada uma das nossas equipas eliminadas, chamar
"futebol português" àquilo é como dizer que uma coisa com 14% de
cacau é chocolate... 05.03.2020
Pedro
Paulino INICIANTE: Uma boa parte da culpa de Portugal ser como é não virá
deste gosto e prazer meio masoquista em dizer mal, mandar abaixo, criticar tudo
e mais alguma coisa? Mesmo quando não se percebe nada do assunto? Taça UEFA não
existe há bastantes anos que eu saiba, chama-se liga Europa. E o futebol deixou
de ser um desporto há muito tempo. É um negócio (longe de ser corrupto só em
Portugal... Ucrânia e Turquia são exemplos de isenção e rigor??? Serve tudo
para dizer mal, realmente), e Portugal não é propriamente um país grande e
rico. É mais que natural não podermos competir com países muito maiores que
nós. Mas dizer mal parece estar acima de todos os critérios... 05.03.2020
AA...Para a
mentira ser segura ... tem que ter qualquer coisa de verdade EXPERIENTE: O grande
responsável por esta situação tem um nome: o povo português. Os inconformados
emigram. Mas a larga maioria resigna-se a este estado de coisas. É incapaz de
esboçar um grito de indignação ou incomodidade. Portugal é bom para comer,
beber e fazer praia. No resto, não é um lugar de gente séria. É a vida.
05.03.2020
José Cruz Magalhaes MODERADOR: Falta entender, se quiser, que os "ilustres"
do futebol definem o espectáculo como indústria, o que é um paralelo
interessante, para conferir credibilidade a um "mercado" pouco
transparente, sempre inflaccionado, mas à beira da falência, tal como muitas
empresas.
05.03.2020
londonlad INICIANTE: Faltou dizer que sendo "a cara
chapada do regime" está a abarrotar de brasileiros e outros!
05.03.2020
Jorge Manuel
Gonçalves INICIANTE: Estou longe do
campo ideológico de JMT mas estou (muito) próximo do diagnóstico traçado. Quer
queiramos ou não, não é o deslumbramento tecnológico ou os milionários
financiamentos comunitários que nos irão desmontar o lastro cultural que nos
prende a um secular atavismo. 05.03.2020
Caetano
Brandão INFLUENTE: Muito bem escrito
como de costume, e com muitas verdades doa a quem doer: a mediocridade é a
regra neste país os que se destacam sempre que podem fogem e vão para onde
sabem reconhecer o seu valor. O nível dum país é transversal a todas as áreas e
esta nossa mania de achar que há coisas em que nós somos o máximo, tipo serviço
nacional de saúde o melhor do mundo, é uma palermice sem qualquer tradução
real. 05.03.2020
Nuno Silva EXPERIENTE; Longe de mim
gostar do jogo da bola, e dos negócios corruptos e comentadores malcriados e de
estalada, a verdade é que estamos em 6º no ranking da FIFA, enquanto que o
jornalismo português está em 342º no ranking (é que nem uma orelha do Pulitzer
para amostra)... 05.03.2020
Carlos Diogo MODERADOR: Isso é a nível de
selecções, a nível de clubes (UEFA) estamos em 7 da Europa e temos vindo a
cair. 05.03.2020
João
Rodrigues INICIANTE: Muito bom !
Realmente o futebol em Portugal sendo genericamente paroquial lá vai produzindo
umas coisitas, mas o jornalismo...
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