E aqui vamos nós, já em pleno
Coronavírus, a acompanhar o périplo desenfastiante do Dr. Salles, e obedecendo
em parte às suas propostas de pesquisa histórica.
POR
TORDESILHAS ALÉM… - 5 : Drake e Dominicanos
HENRIQUE SALLES DA FONSECA A
BEM DA NAÇÃO, 24.03.20
Atracámos
a Cartagena de las Índias um pouco
antes da aurora. Quando acordámos, deparou-se-nos uma cidade clara,
prazenteira.
Teríamos
apenas um dia para ver tudo, havia que acelerar o passo e isso não seria
compatível com a nossa condição serena. A decisão foi tomada antes de desembarcarmos:
tomaríamos um autocarro op on-op off cujo trajecto suspenderíamos junto da
cidade amuralhada, faríamos uma excursão guiada a pé e retomaríamos o autocarro
depois do almoço.
De
um modo muito geral, a cidade actual compõe-se de três partes distintas: o
centro histórico – a
cidade amuralhada – que
funcionou em exclusivo entre os primórdios dos séculos XVI e os do XIX, a
cidade que se desenvolveu para fora das muralhas durante os séculos XIX e XX e a cidade mais moderna, praticamente toda
residencial e luxuosa, já neste séc. XXI.
Estudando
um pouco, fiquei a saber que as principais actividades económicas deste
conjunto são os complexos marítimos, pesqueiros, petroquímicos e o turístico.
Do
moderno para o antigo, achei a parte moderna com edifícios de grande
qualidade mas com urbanismo bastante mauzote a denotar o jeitinho do «chega
p’ra lá que ainda aqui consigo construir um arranha-céus». Contudo, o conjunto
é notável e não me importaria de lá passar uma temporada num daqueles
edifícios da primeira linha na praia virada para o mar aberto. Sim, também
há os outros edifícios (igualmente bons) nas traseiras dos anteriores que
quase circundam a baía interior. Aparentemente, poluição zero.
A parte
mediana, a que saiu das muralhas, é tipicamente conservadora na sua arquitectura
dos séculos XIX e XX, exibindo algum conforto de quem por ali vive. Claramente,
os pais e os avós dos que vivem virados para o mar ou para a baía.
A cidade
amuralhada é um concentrado de História
inultrapassável para quem queira saber alguma coisa sobre a Colômbia
se não mesmo sobre o Império Espanhol naquelas
paragens do mundo. Basta saber que era ali que residiam os Vice-Reis e
referir que Cartagena de las Índias era o único porto autorizado pelo Rei de
Espanha a comercializar escravos nas suas Américas.
No
circuito a pé que fizemos com auriculares para ouvirmos as gravações deu-nos
uma ideia muito vasta de cada ponto por que passávamos. Se a tudo isso
juntarmos as informações que o guia nos ia dando verbalmente, deve ter sido
mais o que me escapou do que o que retive. Mas, mesmo assim, acho que ainda
consigo repetir algumas coisas. Não muitas, para não ser enfadonho.
Assim,
a cidade devolveu os Vice-Reis à origem e declarou-se independente às 11
horas da manhã do dia 11 de Novembro de 1811 e declarou que doravante se
regeria por uma Constituição feita à imagem e semelhança da americana. É
claro que não funcionou às mil maravilhas e as trabuzanadas terão sido frequentes. Esta
proclamação terá ocorrido frente à «porta do perdão», local com tradição
histórica.
Ainda
nos tempos coloniais e com a Inquisição no activo, um residente inglês
recusou-se a apostatar a sua fé anglicana e foi alvo de um auto de fé em que
foi queimado vivo. Essa
barbaridade tão ao estilo dos dominicanos, foi realizada junto da porta lateral
da catedral que, a partir de então e muito ironicamente, se passou a chamar «a
porta do perdão». Fiquei sem resposta clara à pergunta do porquê da
realização do auto de fé junto da catedral e não frente ao palácio da
Inquisição nem no Largo de São Domingos onde se localiza o convento dominicano.
Será que já então a Ordem dos Pregadores começava a sofrer fracturas
internas pela promoção de práticas tão bárbaras?
Mudando
de tema, que cidade seria aquela que deu direito de residência ao grande
corsário Sir Francis Drake?
Terá sido um acto de vingança política contra o colonizador anterior? Mais uma
pergunta que ficou sem resposta. Almoçámos
bem numa esplanada no Largo de São Domingos, frente ao «virginal»
convento dos «donos» da Inquisição.
Finalmente,
dirigimo-nos à porta da muralha que nos conduziria ao op on-op off, ao resto do
circuito pela cidade e, daí, ao cais. Mas, antes de passarmos a porta da
muralha, parei dois minutos no centro do largo a que chegavam os escravos,
senti a brasa solar e imaginei o sofrimento dos escravos desembarcados de
condições algo diferentes das que nós tínhamos no «Monarch», do futuro que os esperava…
(continua) Março de 2020 Henrique Salles da Fonseca
Para saber mais, ver por exemplo em https://pt.wikipedia.org/wiki/Cartagena_das_%C3%8Dndias
COMENTÁRIO:
Anónimo 24.03.2020: Entre tudo o que o relato contempla, sublinho a denúncia a duas manchas
inapagáveis na memória da civilização ocidental e cristã: a Inquisição e a
escravatura. Continue, Dr. Salles.
Algumas NOTAS da Wikipédia, a enciclopédia livre
https://pt.wikipedia.org/wiki/Cartagena_das_%C3%8Dndias
Cartagena
das Índias
Cartagena das Índias ou Cartagena é a capital do departamento de Bolívar, na Colômbia. É a quinta maior cidade do país, e a segunda
maior da região, depois de Barranquilha; e sua região metropolitana é a quinta maior
concentração urbana da Colômbia. Suas mais significantes atividades
econômicas são os complexos marítimos, pesqueiros, petroquímicos e o turístico.
A cidade foi fundada em 1 de junho de 1533, e foi batizada
em homenagem a Cartagena, naEspanha. No
entanto, o assentamento de vários povos indígenas na região da
Baía de Cartagena data de 4000 a.C. Durante o
período colonial, a cidade teve um papel fundamental na administração e na
expansão do Império Espanhol nas Américas,
sendo sede de governo e moradia dos vice-reis espanhóis. O centro histórico de Cartagena, conhecido como a
cidade fortificada, foi declarado Patrimônio Nacional da Colômbia, em 1959, e
posteriormente Patrimônio Mundial pela Unesco, em 1984.
Em 2007, suas fortificações e planejamento arquitetônico militar foram
declarados como a quarta maravilha da Colômbia.
Cartagena foi
um dos mais importantes portos comerciais durante o período colonial espanhol nas Américas.
Era especialmente utilizado para escoar ouro e prata aos
portos da Espanha de Cartagena, Cádiz e Sevilha para
a Coroa Espanhola [17].[18].
O ouro e a prata, extraídos de minas, principalmente, em Nova Granada e no Peru eram transportados até Cartagena,
e embarcados nos galeões espanhóis, passando pelo porto de Havana, Cuba com destino
aos portos da Espanha. Veio a se tornar, ao longo do período colonial, um
dos maiores centros do comércio de escravizadoss oriundos
da África (juntamente
com Veracruz, México; era a
única cidade oficialmente autorizada, pela Coroa
Espanhola, a realizar o comércio de escravizados nas Américas). Os
primeiros escravizados africanos que chegaram em Cartagena foram
transportados por Pedro de Heredia e usados, como mão-de-obra, como cortadores
de cana, em abrir estradas, construir prédios e fortalezas e, também, para
destruir tumbas da população aborígene do Sinú[19].
Os agentes das portuguesas Companhia de Cacheu, Rios e Comércio da Guiné e,
mais tarde, da Companhia de Cacheu e Cabo Verde venderam
escravizados para Cartagena, os quais seriam usados para trabalhar em minas
na Venezuela,
nas Antilhas Espanholas, na Nova Granada e no Peru.
O
primeiro espanhol a chegar no que hoje é Cartagena das Índias foi Rodrigo de Bastidas, que havia participado da
segunda viagem de Cristóvão Colombo à América.
Inicialmente, a área foi batizada pelo navegador como "Golfo de
Barú". No entanto, em
1503, o cosmógrafo
cântabro
Juan
de la Cosa, mais tarde, pediu à Rainha Isabel, a Católica que trocasse o nome da
região para "Baía de Cartagena", devido a semelhança com a baía de
Cartagena de Levante na Espanha.
A
cidade foi fundada em 1 de junho de 1533, pelo comandante
espanhol Pedro de Heredia, onde antigamente se encontrava uma vila da tribo
indígena Calamarí. Rapidamente,
Heredia prosseguiu em nomear o Cabildo e traçar as linhas da cidade. Em 1538, a Coroa
autorizou a divisão dos índios entre os vizinhos, e taxou os tributos.
Cartagena se converteria, nessa época, em uma sociedade colonial de encomenderos.
O porto da cidade foi ganhando importância graças a sua baía protegida pelos
militares espanhóis, à construção de fortes e muralhas e à sua proximidade com
a Cidade do Panamá, outro porto espanhol importante.
Nos anos seguintes, Heredia seria preso por crimes contra o povo Sinú e,
mais tarde, condenado a morte. Ao contrário do que se pensa, a Coroa velava
pelos direitos humanos segundo as "Leis das Índias". Apesar
de ter escapado para a Espanha, Heredia morreria durante o naufrágio de seu
navio.
Em
5
de fevereiro de 1610,
foi estabelecido o Tribunal do Santo Ofício da Inquisição, em
Cartagena, através de
um decreto emitido pelo rei Filipe II. O Palácio da Inquisição,
de arquitetura colonial, concluído em 1770, ainda preserva sua fachada
original. Quando Cartagena declarou sua independência da Espanha, em 11
de novembro de 1811,
os inquisidores foram intimados a deixar a cidade. A Inquisição voltaria,
depois da Reconquista, em 1815, mas acabaria por desaparecer completamente, seis anos
depois, após a derrota espanhola, forçada por tropas lideradas por Simón Bolívar.
Com
a fama de esbanjar grande riqueza e prosperidade, transformou-se em um local de
pilhagem atraente para piratas e corsários.
Por isso, o Rei Filipe II encomendou ao marechal de campo Luis de Tejada e ao engenheiro
militar italiano Bautista Antonelli onze
quilômetros de muralhas e fortes que serviriam de defesa para a cidade entre os
séculos
XVII e XVIII. A
fortificação é considerada a mais completa da América
do Sul e foi terminada em 1796 pelo engenheiro espanhol Antonio de Arévalo. Este
projeto incluía, dentre outros, a construção do Castelo de San Felipe de Barajas,
nomeado em homenagem ao rei espanhol Felipe IV……
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