Nos casos de corrupção, que o
Covid-19 fez boicotar. E no Acordo Ortográfico que deixou
de ter relevância e que também é caso de corrupção. E tantas outras disparidades e terrores pelo mundo, de
que já se não fala, fixados de repente num só ponto estratégico da agonia
geral. Oremus.
Os idosos, os reactivos e o benévolo
António Costa /premium
Os portugueses e as empresas não ficaram à espera e
andaram (por uma vez) sempre à frente do Estado na gestão desta crise. O que
diz muito da reacção benevolente do Governo de António Costa.
LUÍS ROSA Redactor Principal
e colunista do Observador
OBSERVADOR, 23 mar 2020
1.Um
organismo governamental sueco chamado Agência de Contingências Civis (MSB) decidiu
há dois anos fazer algo muito estranho para qualquer português (ou outro
latino): distribuiu 4,7 milhões de panfletos por toda a Suécia (um país
praticamente com a mesma população que Portugal) a aconselhar os cidadãos como
deveriam lidar com uma guerra com um país vizinho, um ciber ataque que
paralisasse as infra-estruturas essenciais do país ou um desastre natural.
De
acordo com o Financial Times, não estava prevista uma pandemia naquele
panfleto mas os suecos são educados pela MSB a ser autónomos em qualquer
espécie de crise, tentando ter na sua dispensa produtos alimentares essenciais
da sua dieta para vários dias de isolamento e até conselhos práticos sobre as
melhores fontes informativas para combater a desinformação. Conselhos que têm
sido muito úteis na forma como a Suécia está a encarar a crise da
Covid-19 com 1.931 casos infectados e 21 mortes, estando precisamente uma posição
à frente de Portugal no ranking global.
Analisando
a forma como o Governo de António Costa encarou
a crise de coronavírus desde que o surto surgiu em Wuhan (China) em
Dezembro de 2019 (e tomou proporções de calamidade em janeiro de 2020) só posso
concluir que, uma vez mais, estamos nos antípodas da Suécia. Apesar de isso não
acontecer por acaso — o atraso económico e social de Portugal face aos suecos
vem de há muito e não é facilmente recuperável —, não é admissível a forma reactiva
e até trapalhona com que o Executivo continua a reagir a uma crise que era possível
antecipar, repito, desde Dezembro ou Janeiro.
A prova de que não houve a diligência
devida é que os médicos e enfermeiros queixam-se de que faltam
fatos de protecção de individual — e de máscaras — quando já haverá cerca
de 50 médicos infectados. Que os lares de terceira idade e as misericórdias digam
que não há máscaras, luvas e gel desinfectante. E que os clínicos da
Linha de Atendimento Médico já se queixavam no dia 18 de Março de que o
sistema estava à beira do colapso quando apenas tínhamos 642 infectados
confirmados.
Estará
o sul da Europa, mais concretamente Portugal, condenado à tradicional
desorganização de apenas agir quando os desastres ocorrem?
2. Veja-se outro exemplo, os testes clínicos à Covid-19. Desde
o dia 16 de Março que a ordem da Organização Mundial de Saúde (OMS) se traduz
em três palavras: “Testem, testem, testem.”Disse
Tedros Adhanom Ghebreyesus, director-geral
da OMS, que “não podemos parar a pandemia se não soubermos quem
está infectado.” Países
como os Estados Unidos e a Alemanha têm seguido essa estratégia, razão pela
qual têm tido uma subida diária muito significativa do número de infectados. Só
os alemães estão a fazer mais de 160 mil testes semanais.
E Portugal? Segundo a directora-geral Graça Freitas, a estratégia tem sido a oposta. Testando apenas os
casos em que há sintomas. Isto é, entre uma capacidade instalada para fazer
9.000 testes no Serviço Nacional de Saúde (a que se soma o número de 17 mil
testes no sector privado que podem ser requisitados pelo Estado), o Governo
preferiu fazer, em média, 1.400 testes por dia. Um
número que Graça Freitas já admitiu alargar, tal como também assumiu que poderá mudar a estratégia.
O
problema, contudo, é que a actual estratégia pode fazer com que o número
de infectados em Portugal (1.600
contabilizados à data 22 de março)
esteja claramente subestimado. Por outro
lado, a estratégia seguida pelos alemães demonstra claramente que é possível
detectar de forma precoce mais casos de infectados, de forma a isolá-los mais
rapidamente e de forma mais eficiente.
Essa não é a única razão mas certamente
que é uma razão de peso, como é assumido pelos especialistas, para a taxa de mortalidade na Alemanha ser de
apenas 0,37% à data de 22 de Março, enquanto que
Portugal tem para a mesma taxa um valor que equivale ao dobro: 0,875%. Ainda
assim, um valor baixo quando comparamos com os casos mais graves de Espanha
(10,8%) e Itália (9,2%).
Também aqui é muito importante que
não sejamos reactivos mas, pelo contrário, estejamos à frente dos
acontecimentos para conseguirmos manter uma taxa de mortalidade baixa,
independentemente do número de casos infectados.
3. Com um vírus que tem a faixa etária acima dos 70
anos com o grupo de maior risco (conjuntamente com os pacientes com
doenças respiratórias ou outras patologias), os lares de
idosos deveriam ter sido alvo de uma protecção especial por parte das
autoridades. Em Espanha, por exemplo, já
tinham morrido mais de 70 idosos em lares até ao dia 20 de março, sendo
provável que esse número tenha aumentado desde aí.
Os problemas dos lares espanhóis não
são diferentes dos portugueses.
Além das mesmas queixas de falta de material de protecção individual para os
funcionários, aquelas instituições passaram a ter problemas graves de falta de
cuidadores — ou porque deixaram de aparecer com o medo de serem infectados ou,
mais comum, por ficarem mesmo infectados ou de quarentena. Como
aconteceu com um lar em Famalicão,
que ficou
com praticamente todos os funcionários em quarentena, e só ao final desta
noite de domingo é que os utentes idosos foram
socorridos e transferidos para o Hospital Militar do Porto.
Não
vou discutir se faz sentido o ralhete público que a ministra Marta Temido e a
directora-geral Graça Freitas deram aos responsáveis do lar em Famalicão. Mesmo
sabendo que há uma praga de lares de terceira idade ilegais que florescem pelo
país, vale a pena perceber por que razão o Ministério da Segurança Social nada
fez antecipadamente para fiscalizar se os lares estavam devidamente preparados
para esta crise?
Uma vez mais, percebe-se que não houve qualquer preparação ou
antecipação do problema — e logo com o grupo de maior risco nesta pandemia.
4. António
Costa faz bem em chamar à atenção que é preciso que a economia continue, na
medida do possível, a trabalhar. Com o mundo fechado em casa, proibido de
ter contacto social, são poucos, contudo, os sectores que conseguem continuar a
laborar. Seja em Portugal, seja em qualquer outro país da União Europeia afectado
pelo coronavírus.
Independentemente
da queda do PIB português em 2020 alcançar os 8,5%, como adiantou o Expresso,
ou cerca de 5%, como
prevê o economista Abel Mateus, uma coisa
é certa: esta crise será pior
do que a de 2008/2009. E aqui entra o
pacote económico apresentado esta semana pelos ministros Mário Centeno e Pedro Siza Vieira que complementa as medidas que já tinham sido
apresentadas pela ministra da Segurança Social. São mais
de 9,2 mil milhões de
euros que contemplam o diferimento do pagamento de impostos
(que terão sempre de ser pagos), garantias públicas para a obtenção de
empréstimos e linhas de crédito, entre outras coisas.
Tudo sabe a pouco. Não é só uma
questão do pacote anunciado pelo Governo português valer cerca de 5% do PIB —
contra 15% da riqueza do Reino Unido e da Alemanha, 12% da França e 2% do de
Itália —, é também uma questão de não contemplar uma única ajuda directa do
Estado nem aos trabalhadores nem às empresas.
Basta recordar que o Governo de Boris
Johnson anunciou que pagaria até 80% do salário de qualquer trabalhador até
2.500 libras por mês (no que foi seguido por outros países como a Holanda) e
abdicou da receita fiscal do IVA. Já Executivo de Hong Kong, por seu lado,
decidiu distribuir 10 mil dólares locais (cerca de 1.200 euros) por cada
cidadão financeiramente afectado pela crise do coronavírus. Singapura fez o
mesmo e os Estados Unidos estão a ponderar seguir o mesmo.
Compreendo
que António Costa queira esperar pela União Europeia para decidir apoios directos
à economia. Como diz
Tadeusz Koscinski, ministro das Finanças polaco: “ou a Europa financia o
pagamento de uma parte dos salários ou financia o pagamento da segurança
social” dos trabalhadores para manter os empregos. Independentemente
das opções da União Europeia, esse caminho — do Estado abdicar de uma parte da
receita fiscal para financiar directamente os trabalhadores e as empresa —
parece-me inevitável.
5. Os apoios económicos serão uma das poucas áreas que
resta a António Costa para rectificar a forma benevolente como tem gerido esta
crise desde início. Do ponto de vista prático, o Executivo tem andado sempre a
reboque dos cidadãos e das empresas.
Primeiro,
foram as famílias a decidir não enviar os seus filhos para as escolas,
pressionando o Governo a fechar as escolas — o que aconteceu a 12 de Março
quando Portugal contabilizava 78 casos de infecção. Depois foram as grandes
empresas a mandarem para casa, em regime de teletrabalho, os seus funcionários.
Até o pequeno comércio não alimentar começou a fechar as portas mais cedo que o
Governo propôs. E, finalmente, ainda antes da rábula do Estado de Emergência
anunciado com 48 horas de antecedência — e que apenas entrou em vigor este
domingo (uma semana depois de ter sido anunciado) depois de uma pequena divisão
entre o Presidente e o primeiro-ministro —, já uma boa parte dos portugueses
tinha recolhido aos seus domicílios.
Os elogios de António Costa ao
comportamento cívico exemplar dos portugueses não esconde outro facto: o sector
privado andou sempre um pé à frente do Estado, tentando antecipar os
acontecimentos em vez de reagir aos mesmos. Por isso, era bom que o
primeiro-ministro acertasse o passo.
COMENTÁRIOS:
Filipe Paes: Ainda se está para perceber se a questão dos Testes não
será mais uma habilidade do habilidoso.
Esperemos
sinceramente que não. Esperemos sinceramente que o PM tenha em mente que a
saúde e a VIDA dos Portugueses não se presta a habilidades.
Antonio Fonseca: Governo? Uma colecção de cromos
sem caderneta que nos saiu na rifa.
Durante dois longos meses não tomaram uma única medida
concreta para uma crise que se anunciava. Não providenciaram nada para que o
SNS (ao menos esse) tivesse luvas, máscaras e desinfectante em quantidade. Quando
disseram para as escolas fecharem, já estas tinham começado a fechar. A inenarrável
Graça Freiras num dia critica o fecho da escola das netas para no dia seguinte
anunciar o fecho das escolas, mas só na semana seguinte (mais lhe valia ter
deixado a tarefa para outra pessoa. É que assim ninguém os leva a sério) E
mesmo assim ainda queriam os professores nas escolas. Alguns iluminados directores
até convocaram reuniões gerais de professores. Quando mandaram fechar as
empresas estas já tinham começado a fechar Quando mandaram fechar cafés e
restaurantes já muitos tinham fechado. E quando puseram o país de quarentena
parte já lá estava,
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