E aí vamos nós viajando, mesmo em tempos
de Covid 19, com os riscos inerentes, respirando ares históricos, geográficos,
sociais e toponímicos, com a simplicidade e o espírito crítico de sempre, de Salles da Fonseca.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 21.03.20
O
melhor edifício de Colón parece ser o hotel em que ficámos, o Sand
Diamond, que anteriormente era o Sheraton. Arquitectura notável, tudo o mais com grandes
deficiências a denotar escassez de tesouraria ou processo de degradação
financeira algo mais avançado – minibares vazios com a desculpa de que eram
geridos por outra empresa, frascos de shampoo e sabão líquido vazios, o
restaurante concessionado a um libanês que nos serviu doses para
halterofilistas e um vinho da sua terra com alguma qualidade mas quase ao preço
de compra da própria vinha… fiquei na dúvida sobre quem servia os relativamente
bons pequenos almoços. Pareceu-me absurdo o preço que me pediram por um
café expresso. Não sou forreta mas passei perfeitamente sem esse concentrado de
cafeína. Contudo, as camas eram boas e dormimos confortavelmente. Os
lençóis que me couberam em sorte estavam bons mas essa condição não mereceu a
unanimidade no nosso grupo. As «sandes» encomendadas ao room servisse devem ter
sido comidas por algum gato – mas também não no-las debitaram. Não faltaria
mais nada! Wi Fi gratuito e sem limite de tempo. Para fechar este tema do
hotel, sugiro aos meus leitores que, se lá forem, se munam de farnel para não
ficarem tempos infindos à espera duma «sandes» e duma cola que alguém se
esqueça de lhe entregar.
Globalmente,
a cidade pareceu-me insignificante, o que não quer dizer pobre pois tem o porto
marítimo e uma zona franca (absurdamente aberta para não dizer mesmo
desbragada) que são o suporte de alguma sustentação. Não se vê mendicidade nem
alardes de novo-riquismo.
Com
tempo suficiente antes de embarcarmos no cruzeiro, fomos visitar o Canal. No caminho, enquanto nos arredores de Colón, fiquei
sem saber se a estrada estava esburacada ou se os saltos que a carrinha dava
eram o resultado de erupções pedregosas que por ali havia no esmerado piso.
Chegados à estrada para além da cidade, tudo normal. Conclusão: administração
autárquica algo “pedregosa”.
Inaugurada
em Agosto de 2019, a Puente Atlântico liga
a região de Colón ao território mais isolado do país e que urge desenvolver sob
pena de cobiça externa. Trata-se da terceira travessia do Canal e é uma bela
obra de engenharia sob a qual passam folgadamente os navios da classe neo-panamax, ou seja, os que por ali podem passar desde que o
Canal foi alargado.
Há
muito boa gente que não acredita no princípio dos vasos comunicantes e teima em
dizer que os Oceanos Atlântico e Pacífico têm alturas diferentes. Nunca perdi o meu tempo a corrigir tamanho disparate
pois sempre tive a certeza de que as eclusas servem, também
aqui, apenas para ultrapassar desníveis orográficos e nada têm a ver com a
altitude zero a que as águas dos dois Oceanos funcionam. Se assim não fosse, imagine-se o que
seria o pandemónio no Estreito de Magalhães e o infernal encontro dos Oceanos
no Cabo Hornus. Estive no
extremo pacífico do Estreito de Magalhães e dobrei o Cabo Hornus com águas
planas e sem «degraus» absurdos. Mas não precisaria de lá ter ido para saber
que era assim, apenas lá fui passear e não em missão científica para pôr o
princípio dos vazos comunicantes em causa. Admito que haja densidades
diferentes nas águas dos dois Oceanos do mesmo modo que se pode verificar no
Cabo da Boa Esperança onde também não há degraus aquáticos[i]. Aqui, no Canal do Panamá, o
desnível é de 17 ou 18 metros (dependendo das marés em cada extremo) e não de
80 metros como eu julgava nem de 8 como diziam os nossos companheiros de viagem
– nem 8 nem 80.
O
posto turístico de observação do funcionamento das eclusas do lado atlântico (acabámos
por não ir ao outro extremo por culpa do corona) é muito interessante e bem
organizado. Para além de vermos os barcos em movimento, um alto-falante vai
explicando o que se passa à nossa frente. Recomendam também que se assista a um
filme sobre a história do Canal.
Depois
de várias tentativas goradas –
nomeadamente por Ferdinand de Lesseps, o homem do Canal de Suez – o Canal do Panamá
foi inaugurado em 1914 depois de os EUA terem assumido o projecto, a obra e o
respectivo funcionamento. Definido o espaço envolvente do Canal como fazendo parte
da exploração do mesmo, ficaram os EUA a administrar tudo até 31 de Dezembro de
1999. O Panamá recebia as verbas que os EUA
lhe queriam dar e não havia discussões que vingassem sobre a «compra de
vontades» de alguns políticos locais. Esta presença americana no Panamá foi
excessivamente longa e provocou um certo azedume nas populações contra os gringos.
Bom seria que não fossem necessários mais 85 anos para adoçar o azedume.
(continua)
Março de 2020
Henrique Salles da Fonseca
[i] - Interessante também o que acontece quando os rios Negro
e Solimões se juntam frente a Manaus para formarem o Amazonas com as águas de
cada um dos rios, com acidezes, densidades e materiais em suspensão diferentes,
correm em paralelo durante quilómetros antes de se misturarem.
COMENTÁRIO:
Henrique Salles da Fonseca 21.03.2020: Sempre um prazer a leitura das tuas narrativas. Espero
que estejam bem. Um abraço José Montalvão
NOTAS
da INTERNET:
1 - Colón (Panamá)
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Colón é uma cidade
do Panamá,
na extremidade do Caribe
no canal do Panamá. É a segunda maior cidade no
Panamá. Foi fundada no término da ferrovia do Panamá, em 1850. O assentamento foi primeiramente nomeado de
Aspinwall, em homenagem a William Aspinwall, um dos
fundadores da ferrovia do Panamá. Em 1890, governo do Panamá renomeou a cidade para Colón, a forma hispanizada de Colombo. Colón é um porto importante, um centro comercial, e um
destino para turistas. Foi feito a uma zona do comércio livre em 1953 e é o porto
"duty-free" o um dos maiores do mundo (a atração principal dos
turistas).
2 - Cabo Horn
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
O cabo
Horn é o ponto mais meridional da América
do Sul, excluídas as Ilhas Geórgia do Sul e Sandwich
do Sul e as Ilhas Diego Ramírez. Encontra-se na Ilha
de Hornos, no arquipélago da Terra
do Fogo, na porção pertencente ao Chile. Dos grandes
cabos, é o que se encontra mais ao sul e compõe a parte norte do estreito
de Drake. Até a abertura do canal do Panamá, era passagem obrigatória da rota
dos navios que viajavam ao redor do globo, indo para a costa oeste dos Estados
Unidos, China,
Índia e toda
a Ásia. cabo
Hornier é o nome que é dado ao marinheiro e à embarcação que passa o Cabo
Horn.
As
condições de navegação ao redor do cabo costumam ser particularmente severas,
com fortes ventos, constituindo um marco para navegantes de todos os tipos, até
nos dias actuais. Várias regatas de veleiros de oceano, como a Volvo
Ocean Race, antiga Whitbread Round the World Race, velejam ao redor do
globo passando pelo Cabo Horn.
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