segunda-feira, 17 de maio de 2021

Nada de beliscadelas


Ao status. Afinal, já a Inquisição tinha uma Mesa Censória, que impunha regras no reconto dos feitos, princípios que se diz que também foram seguidos nos tempos de Salazar, embora não tão peremptoriamente como hoje, mas não tenho a certeza. Havia uma política de trabalho, isso sim, e mais respeito, pelas obrigações respectivas, com trânsfugas, que mereceriam intervenção, segundo a exigência de quem impunha os dogmas. Hoje vivemos envoltos em escândalos financeiros, mas não são esses que contam nas novas regras de conservadorismo. Quem detém o poder, tudo fará para o conservar, neste quartel de Abrantes, afinal como dantes, mau grado as críticas ferrenhas a esse “dantes”. Por tal motivo, tudo o que hoje signifique crítica, segundo o ideal democrático de liberdade, será registado, ao que parece, como pura paródia. E como todos, no fundo, se entendem bem – na perspectiva do mesmo tacho que todos anseiam, todos os diversos partidos aceitam as regras da nova censura.

Já não se pode ser sério. Os sérios não passam de parodiantes, convém reduzi-los. Apesar da democracia. Helena Matos e alguns comentadores o demonstram, eu direi dramaticamente o discurso da D. Madalena do “Frei Luís de Sousa”, pouco tempo antes do “Ninguém” de D. João de Portugal, na sua figura de Romeiro: “Meu Deus, meu Deus! Que se não abre a terra debaixo dos meus pés… Que não caem estas paredes, que me sepultem já aqui?(Frei Luís de Sousa, III, Cena XIV). Mas é claro que acrescentarei “Lagarto! Lagarto!” Não, não vale a pena tanto sacrifício, tanta parede ruindo, pois nada resolve, para obviar a esses motivos da indignação de HM.

 

 

Os parodiantes de Portugal /premium

A paródia é um dos poucos exercícios que escapa à censura aprovada pelos deputados. Assim e em conformidade esta coluna deixa de ser de opinião e passa a paródia.

16     ai 2021

1.A paródia da desinformação. As notícias sobre a falência da Segurança Social são desinformação? As revelações sobre a muito provável origem do vírus do Covid num laboratório chinês ainda são desinformação ou desde que Biden sucedeu a Trump deixaram de ser? O Avante a garantir a felicidade dos povos na defunta URSS é desinformação?… Convém saber porque esta semana o PR promulgou uma lei que os deputados votaram favoravelmente em Abril a que pomposamente chamaram Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital. A coisa para não lhe chamar pior é sinistra: no seu artigo 6º pretende assegurar-nos um “Direito à protecção contra a desinformação” que põe nada mais nada menos que o Estado a proteger “a sociedade contra pessoas singulares ou colectivas, de jure ou de facto, que produzam, reproduzam ou difundam narrativa considerada desinformação”. E o que se entende por desinformação? Tudo o que belisque o poder ou seja “toda a narrativa (…) que seja susceptível de causar um prejuízo público, nomeadamente ameaça aos processos políticos democráticos, aos processos de elaboração de políticas públicas e a bens públicos.” Perante esta definição só resta perguntar: o que não corre o risco de ser classificado como desinformação? Todas as censuras em qualquer lugar do mundo apresentam-se assim: proteger a sociedade face à mentira. O tempo apenas muda os nomes do que se entende por desinformação.

Note-se que nenhum deputado votou contra esta monstruosidade. Repito, nenhum deputado votou contra: a referida carta foi aprovada com os votos do PS, PSD, BE, CDS, PAN, das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues. Abstiveram-se o PCP, PEV, Chega e a Iniciativa Liberal.

Escapam a este controlo as sátiras ou paródias. Pelo que como atrás ficou explicado, esta coluna de opinião passa muito adequadamente a coluna de paródia num país cujo regime é ele mesmo uma paródia da democracia que se propôs ser.

2.Os parodiantes a fazer pela vida. A informação chegou-nos naquele linguarejar em que a mentira é inverdade:  “O parlamento aprovou hoje em votação final global uma lei-quadro de criação, modificação e extinção de freguesias, que prevê um regime transitório para a correcção das agregações ocorridas em 2012/2013.Assim falam os paladinos do combate à desinformação: não se diz que podem vir a ser criadas centenas de novas freguesias anuncia-se “que se prevê um regime transitório para a correcção das agregações ocorridas em 2012/2013“. Percebido? Pessoalmente adoro este “correcção das agregações”! Os partidos precisam de colocar a sua gente e para tal não hesitam em acrescentar camadas e camadas à máquina estatal. As juntas de freguesias tornaram-se agências florescentes de emprego, de contratação de serviços e, não menos importante, de estímulo ao clientelismo. Para a paródia ser ainda mais paródia só falta acrescentar que o PSD votou a favor desta lei. Ou seja o PSD votou contra a reforma que enquanto esteve no governo levou a cabo em 2013. Obviamente o Prémio Parodiante do Ano segue sem desinformação alguma para Rui Rio.

3 A paródia da irresponsabilidade. Os socialistas são de tal forma amigos da paródia que resolveram exercer o poder sem assumir qualquer responsabilidade. Há lá coisa mais aborrecida que uma pessoa com a mania da responsabilidade? A festa do título do Sporting é o último exemplo dessa forma peculiar de paródia: a Câmara de Lisboa não autorizou mas talvez tenha autorizado e à cautela acusa a PSP; o secretário de Estado do Desporto, João Paulo Rebelo, tinha conhecimento de que havia algumas autoridades a tratar do assunto mas não ele que não tem nada a ver com isso; o ministro da Administração Interna pede uma investigação à actuação da PSP e a PSP desmente o MAI. Que isto é uma paródia não duvido: de cada vez que olho para o ministro Eduardo Cabrita tenho um irreprimível ataque de riso!

4 A paródia dos comissários. Esta semana a Comissão da Carteira de Jornalista (CCPJ) informou António Abreu que o seu pedido de carteira profissional de jornalista foi indeferido. O caso arrasta-se há dois anos. António Abreu desenvolveu o site Notícias Viriato mas a CCPJ recusa passar-lhe a carteira profissional alegando que maioria das publicações do Notícias Viriato “representam o oposto daquilo que o jornalismo defende”. O oposto de que jornalismo?

Jornalistas que trabalham em jornais ou televisões de clubes desportivos têm carteira profissional mas o redactor do Notícias Viriato não pode ter porque, segundo a CCPJ, as notícias desse site “representam o oposto daquilo que o jornalismo defende” e também porque o ISCTE “identifica o Notícias Viriato como um projecto de propaganda e desinformação, perfilhando uma visão ideológica que o afasta de poder ser um órgão de comunicação social tal como é entendido pela maioria dos profissionais jornalistas, académicos e público em geral”. Isto não é uma paródia, é uma verdadeira pândega! Sinistra, mas pândega!

O que está a acontecer a António Abreu perante a indiferença total da classe não é novo: em 1974, no meio de proclamações eufóricas sobre o fim da censura sucediam-se as multas e as suspensões de jornais e revistas mais ou menos marginais como eram o Bandarra, a Resistência, o Clarim,  Templário, A Voz de Fátima ou o João Semana cujos artigos são logo no Verão de 74 classificados como “propaganda estéril e negativa” pela Comissão Ad Hoc aos Orgãos de Imprensa. Também a publicações de extrema-esquerda como o Luta Popular começam a ser acusados de “ir contra o MFA”. Depois foi a vez da Gaiola Aberta ser suspensa por perturbação da ordem pública… Claro que ninguém se solidarizava com estas publicações. Até que um dia se acordou o jornal República ocupado. Usando a linguagem daqueles que então o ocuparam ou a de agora da CCPJ (a vida é uma paródia de coincidências!) o jornal República era um projecto de propaganda ( no caso do PS) sem notícias dignas desse nome. Mas nada disso legitimava a sua ocupação!

Mais cedo ou mais tarde alguém de esquerda ver-se-á apanhado nas garras destas comissões, entidades, observatórios… e então, sim, teremos caso. É o que se chama uma paródia com vários capítulos.

PS. Polícias cercados por grupos armados (Fréjus), ataques a comissariados (Essonne), um agente morto a tiro (Avignon) e outro ferido com gravidade numa emboscada (Loire): é este o balanço da violência urbana nos últimos dias em França. Como o francês continua a ser uma língua praticamente desconhecida neste planeta e a França um país mais desconhecido ainda sobre estas factos continua a cair um espesso silêncio.

LIBERDADE DE IMPRENSA  LIBERDADES   SOCIEDADE   POLÍTICA

COMENTÁRIOS:

Andrade QB: Costumo ler com agrado os artigos e Helena de matos, mas, este em particular, obrigou-me a uma segunda leitura. Talvez porque, tendo na juventude, por revolta contra o regime repressivo Marcelista, ter ajudado a que novos ditadores se viessem a instalar, dê especial atenção aos mecanismos a que os ditadores recorrem para esmagarem qualquer hipótese de sombra. Conheci-os por dentro. Não me surpreende, assim, a passagem da censura a Lei. O terreno começou a ser preparado por pontas de lança de que eu lembro dois, Daniel Oliveira e Pacheco Pereira. Não tendo sido únicos foram dos primeiros a berrar contra o que eles chamam de esgoto dos comentários, tendo como alvo os comentários que em espaços como este surgem relativamente ao que eles dizem e escrevem. Acontece que com a política dos jornais que ainda permitem esses comentários, em que existe um crivo relativamente a comentários mais disparatados ou insultuosos, quem pode afirmar que na sua generalidade têm maior ou menor suporte na verdade do que o que Daniel Oliveira ou Pacheco Pereira escrevem? Ninguém, trata-se de um exercício da liberdade que seria suposto ser um valor inegociável do regime que Daniel Oliveira e Pacheco Pereira dizem defender. Só que não, não é isso, os ditadores não gostam da democracia, nem da liberdade de opinião e de expressão, usam essa liberdade para impor a ditadura que defendem. Algumas vezes ganham, outra perdem, mas mesmo quando ganham, que não durmam descansados porque existem sempre outros ditadores à espreita.         Manuel Ferreira21: Voltou a censura do Estado Novo, vergonha! O que estão a fazer ao jornalista do "Viriato" é criminoso e terrorista. Sobre isto não fala o Marcelo, que perora por tudo e um par de botas.          Joaquim Almeida: Sobre as condições de exercício de um direito constitucional fundamental da democracia temos, na Ass. da Rep., uma catrefa de idiotas - uns não têm opinião e abstêm-se ; outros, mais abestalhados ideologicamente, votam pela censura e, quase ipsis verbis, nos termos de uma lei de 1933 (sim do EstadoNovo). Lindo espectáculo! O Marcelo que tantos elegeram, o inteligente não deu por nada.             VICTORIA ARRENEGA: A propósito dos direitos humanos na era digital: ainda estão guardadas as caixas de papelão com as golas antifogo? Podiam servir como mordaça desde que, bem entendido, ninguém se lembre de acender um fósforo num raio de cem metros.         Zé da Esquina: Estamos percorrendo um bom caminho... E o que me espanta é ver o maior partido da oposição anestesiado. Não dá mesmo para entender! Depois admiram-se de ver o que está a acontecer em França, com Marine Le Pen prestes a chegar ao poder.            António Sennfelt Redigida na mais insidiosa novilíngua - tão insidiosa que nem um único deputado se atreveu a votar contra! - a "Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital" representa a institucionalização da censura através da imposição do pensamento dito politicamente correcto como única forma de expressão legalmente permitida!           Manuel Magalhães: Este país “governado” por esta gente começa a provocar náuseas a quem se respeite, mas o pior é que a “nossa” gente que os põe lá nem sequer consegue perceber o que se passa e pelos vistos os próprios partidos... até ao dia em que acordem!      Graciete Madeira: Mais um excelente artigo de H. Matos.         Lúcia Henriques: Mais um artigo excelente. Irrita saber que nenhum deputado votou contra. E o presidente que promulgou a lei, que parece que vai contra 2 artigos da Constituição? E a comunicação social já reagiu? Foi o N. Viriato quem levantou a lebre, daí não ser um jornalista como os outros.           Américo Silva: A França é um verdadeiro laboratório social. Mas não gritem por responsabilidades alheias de socialistas, gauchistas, de gauchismo, não de gaúcho, feministas, frentistas, laicistas, ou pró imigrantes ilegais. A responsabilidade tem sido de todos, desde os que perdem a cabeça em sentido literal, aos que resgatam e adubam os invasores do norte de áfrica e médio oriente. Tal como o controle de informação é permitido por todos, e um verdadeiro desiderato do capitalismo. Veja-se a confusão informativa em torno das vacinas Covid. O jornalismo está absolutamente contaminado. A CNN é um canal de propaganda. Em frança um fotógrafo jornalista residente ilegal foi premiado pela fotografia de um polícia a arder. A opinião pública concentrou-se nos méritos da fotografia, e não quis saber do polícia que sofreu queimaduras do terceiro grau na face, no pescoço, e nas mãos, por ter sido atingido com um cocktail Molotov em Paris. A CGT qualificou o polícia de frango grelhado. Será que o povo merece mais? Entretanto, na confusão social, este ano, a mesma CGT foi atacada no primeiro de Maio sofrendo 21 feridos, quatro graves, por grupos black blocs, que os apelidavam de fascistas. Estamos em plena desconstrução social no ocidente, e talvez no mundo.               Carlos Chaves: Caríssima Helena, obrigado por mais este ”abre olhos” uma vez que de paródia fala. Do princípio ao fim do seu artigo mostra que nada aprendemos com os sombrios tempos passados. Permita-me destacar os deploráveis casos de nenhum partido/deputados representados no parlamento, terem votado contra a dita e inaceitável “carta”, e a revogação da lei “das freguesias” com o apoio do PSD de Rui Rio, o mesmo PSD de Passos Coelho que criou e implementou essa mesma (acertada) lei! Como é possível tudo isto se estar a passar sem um verdadeiro “levantamento” nacional de indignação e rejeição deste voltar ao passado.          Andrade QB: Para quem lamentava não saber o que era o "Sistema", talvez que estes casos o ajudem a perceber. Há sempre uma altura em que os regimes iníquos começam a ter necessidade de se manter à custa da manipulação e há sempre uma fase posterior em que da manipulação passam à repressão, às polícias políticas e aos presos políticos. É o caminho a que se está a assistir em Portugal por parte do lobby Costa, Rio, Catarina e o mainstream jornalístico. Putin, com os seus assassinatos e prisão de quem discorda dele, vai uns passos adiante, mas este lobby nacional está a ganhar terreno rapidamente.           Marcelo Teixeira: "Estado a proteger “a sociedade contra pessoas singulares ou colectivas" Ou seja, o Estado, por meio dos seus agentes, não produz desinformação... Basta ser primeiro-ministro, ministro, secretário de estado ou um boy qualquer, para ser parodiante.         Tristeza Pakivai: Talvez bastasse que não fosse permitido a titulares (e a candidatos a titulares) de cargos políticos, públicos e de governação usarem redes sociais e caixas de comentários para comunicarem, nem a título individual, nem enquanto representantes dos mesmos. Se depois há população que gosta de se banhar no esgoto da desinformação e do baixo nível, isso é lá com a população.           Adriano Marques > Tristeza Pakivai: O que vale é que só tu estás bem informado... Ainda bem! Assim já nos podes guiar a nós todos que andámos aqui perdidos nas caixas de comentários!             Pedro Belo: Vivemos numa sociedade cada vez mais estúpida e stressada, que tem como resultado o Estado assumir o papel de "big brother", seja no controlo da informação seja na dependência de subsídios e pensões. Alegremente vamos caminhando para o abismo... é continuar a votar PS ou, melhor ainda, não votar de todo           Carlos Quartel: Não é de estranhar, seria mesmo algo previsível, mais tarde ou mais cedo. Numa sociedade pouco exigente, pouco informada, onde a liberdade individual não é sentida como uma necessidade essencial. o abuso não tardaria a aparecer. Por ironia, há que reconhecer que o PS, quando fora do poder, foi um razoável zelador das liberdades, contra Cunhal , primeiro e contra alguns abusos da era PSD, depois. Quando se apanhou no poder a tentação de controle instalou-se e , com a geringonça, agravou-se. Com o inconveniente de , agora, não termos uma oposição forte, que faça esse papel.


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