O de António Barreto. É evidente que o racismo existe, hoje como em todo o
sempre e em toda a parte. “Qui se
ressemble s’assemble”, eu sempre ouvi dizer, mas os amigos escolhem-se por
afinidades específicas, geralmente culturais, éticas, sociais, o que não
significa que não se respeitem uns aos outros, nas suas divergências, se forem
dados ao respeito. Mas o racismo sempre existiu, devido a todas essas
estranhezas rácicas, que uma educação mais baseada no respeito pela diferença
poderia minimizar. É claro que os descobrimentos acentuaram os segregacionismos,
com os aproveitamentos da mão-de-obra providencial para a construção dos seus impérios,
tal como em todo o sempre das civilizações, mas não podemos esquecer o papel de
missionários difundindo, simultaneamente, pelo mundo, valores mais apoiados em
fraternidade, e difundindo as luzes do saber. São banalidades, estas, mas o que
o texto põe em foco é a demasiada presteza de uma esquerda, que, aparentemente,
pretende uma espécie de nivelamento social que sabe não existir, mas, com nova
sanha e para ficar bem na foto da igualdade, generaliza o grave defeito
segregacionista exclusivamente a uma direita burguesa e preconceituosa, que o
fenómeno migratório, é certo, de par com os nacionalismos que defendem os seus
espaços culturais, faz exacerbar, ultimamente, pretexto para o aqui d’el-rei
frenético dessa esquerda hábil no alardear virtuoso concomitante com o frenesim
atacante do tal que não pertence à seita. Porque é de seita que se trata.
Mas a crónica de António Barreto é bem explícita do fenómeno, com a
elevação de sempre.
OPINIÃO
Nós e eles
A democracia portuguesa está assim tão
frágil que não permite que haja unvirtuoso.s tantos tolos racistas e umas
dúzias de xenófobos?
ANTÓNIO BARRETO
PÚBLICO, 10 de
Maio de 2020,
A pressão ilegal de emigrantes e
refugiados tem deixado a Europa em transe. Há Europeus apavorados. Outros em
fúria e com ganas de esfolar. Outros ainda com vontade
de fechar fronteiras. E outros paralisados.
A
pressão, muitas vezes racista, de grupos anti-racistas, sobretudo brancos e
africanos, tem contribuído para provocar reacções xenófobas.
O comportamento irresponsável de
certas esquerdas, na tentativa de exacerbar a luta entre etnias, faz o que pode
para abrir uma questão racial.
Para
completar o quadro, a pandemia despertou todos os imagináveis sentimentos
xenófobos, na convicção de que as fronteiras fechadas são os melhores antídotos contra a proliferação do
vírus.
Por
enquanto, em Portugal, o clima não é ameaçador. Alguns grupos de esquerda, em
luta contra o sistema democrático, fazem-se mal ouvir. Umas
tantas associações anti-racistas esforçam-se, por enquanto sem grande êxito,
por azedar o espaço público. Outros grupos, à direita, provocam as minorias
numa tentativa, por enquanto frustre, de glorificar o nacionalismo.
É
verdade que há vozes que incomodam, mas não parece haver perigo iminente. Por
isso são de admirar as reacções às opiniões do deputado
André Ventura. A importância destas é inversamente proporcional
ao alarido que provocam. O senhor disse umas tolices sobre ciganos e o mundo
político caiu-lhe em cima. Que vem aí o fascismo. Que é necessário reagir e mobilizar (antigamente dizia-se “avisar a malta”), antes que
sejam milhões a dizer o mesmo.
É
tão estranho! A democracia portuguesa está assim tão frágil que não permite que
haja uns tantos tolos racistas e umas dúzias de xenófobos? É outra vez a
história de um prurido provocar a maré-cheia? Estará assim Portugal tão
fraco que uma palpitação irracional ameaça as liberdades e a decência? É
que… se assim for, estamos mesmo mal!
Necessitamos
de políticas sobre as migrações, os refugiados, os negreiros da hotelaria, o narcotráfico e a violência contra as mulheres… Mas não necessitamos de políticas dirigidas aos
ciganos, aos muçulmanos, aos africanos ou aos chineses… Uma das manifestações mais odiosas do racismo é a que
identifica defeitos com grupos étnicos. É
nesse momento que, em vez de lutar contra o crime, se passa a lutar contra um
grupo. É tão criminoso lutar, em
Portugal, contra o “banditismo cigano” como contra o “racismo branco”. Contra a
“corrupção angolana” como contra o “nepotismo português”. Contra o “terrorismo
árabe” como contra a “máfia ucraniana”.
Mas contra qualquer daqueles crimes, sem designação de etnia, sim, com certeza.
Há
ciganos que recusam a integração, não pagam impostos e roubam? Há. Como brancos
europeus. E árabes também. Todos merecem o mesmo tratamento. Há brasileiros que vivem do proxenetismo e do
lenocínio? Negros também. Ciganos, brancos, espanhóis e portugueses também. Todos
merecem o mesmo tratamento. O racismo russo ou indiano não é melhor nem pior do
que o americano ou francês. E o de direita não é mais perigoso do que o de
esquerda.
Como é evidente, existem problemas,
não com todos, mas com alguns ciganos, por causa de comportamentos peculiares. Como existem com alguns muçulmanos, indianos,
chineses, brasileiros, cabo-verdianos e muitos portugueses (até porque há
mais…). Existem problemas quando grupos cultivam crenças e têm costumes
contrários aos que as leis permitem, como por exemplo bater nas mulheres,
nos velhos e nas crianças, praticar a excisão e a fibulação, vender crianças
para casamento e outras variedades conhecidas. Existem ainda problemas com
alguns portugueses, mas também com angolanos, russos, chineses, paquistaneses e
espanhóis envolvidos em negócios menos claros, em actos de favoritismo,
corrupção, desvios de dinheiros e fuga ao fisco. Todos estes comportamentos
exigem acção das polícias, da Justiça e de outras entidades defensoras dos
direitos humanos, mas não exigem tratamento étnico especializado, que é o traço
do racismo e do preconceito. Que é o que
o deputado André Ventura gosta de
fazer, no Parlamento e na televisão, com a notável experiência que adquiriu num
das áreas humanas mais favoráveis ao preconceito, à corrupção e à violência: o
futebol!
O
preconceito, a xenofobia e o racismo: eis alguns dos defeitos mais baixos da
humanidade. As suas
manifestações voltam com enorme facilidade. São da autoria de muita gente. São
reacções de pessoas fracas de espírito. É gente que usa um dispositivo odioso,
o da generalização. Culpa sempre os outros por qualquer coisa. Atribui aos outros
as responsabilidades por tudo quanto corre mal. Considera que eliminar,
proibir, calar e expulsar os outros são soluções para os seus problemas.
O diabo está nas generalizações. De
género conhecido: os portugueses são racistas. Os judeus são usurários, os
negros preguiçosos, os árabes ladrões, os muçulmanos terroristas, os ingleses
piratas, os holandeses maricas, os ciganos vendedores de droga e os alemães
nazis. E poderia continuar até ao infinito: os indianos desconfiados, os
romenos vigaristas, os chineses canibais, os americanos atrasados mentais.
Quanto aos espanhóis… estamos conversados…
Muito curiosa é a reacção de gente
oportunista de alto calibre. Já há quem faça apelos contra o fascismo, quem
estabeleça paralelos com a pior escumalha deste mundo. Mas sempre com um fito:
aproveitar politicamente. Lutar contra a direita, que culpam de fascista e de
nazi. Lutar contra os brancos, os europeus, os cristãos, os democratas… Como se o racismo e a xenofobia fossem
necessariamente de direita. Recordo o que dizia Jorge Almeida
Fernandes há mais de vinte anos: “Um
anti-semita não é necessariamente um nazi”! É exactamente o que se pode
dizer hoje de qualquer forma de racismo, de preconceito religioso e de
xenofobia: há disso nas direitas e nas esquerdas, entre ricos e pobres, no meio
dos brancos e dos negros e em círculos cristãos ou muçulmanos.
É
verdade que há hoje factores de sobra que convidam ao irracional. A democracia
está em crise. A Europa também. A política não tem muito boa reputação. A
corrupção vinga. As crises das migrações e dos falsos refugiados ameaçam a
estabilidade europeia. Os europeus e os democratas têm dificuldade em assumir
uma posição simultaneamente liberal e de firmeza, isto é, que aceite o
princípio da legalidade e do controlo das migrações. A pandemia em curso veio agravar tudo: para muitos, fechar as fronteiras foi a solução. O
preconceito não é a melhor resposta. Não é sequer uma resposta.
Sociólogo
TÓPICOS
COMENTÁRIOS:
Manuel
Pessoa INICIANTE: Não posso deixar de saudar a mensagem que me parece
essencial neste artigo de AB: devemos lutar contra banditismo, racismo,
corrupção, nepotismo, terrorismo, máfia (e outros) e tudo fazer para que
conduzam a condenações. Se limitarmos a condenação destes crimes quando
forem praticados por determinadas etnias erramos tanto ou mais do que quando
associamos a qualquer etnia propensão para a sua prática. Jose MODERADOR: Caro Manuel
Pessoa Preste atenção ao texto do autor nesta parte, por exemplo: "O
preconceito, a xenofobia e o racismo: eis alguns dos defeitos mais baixos da
humanidade. As suas manifestações voltam com enorme facilidade. São da autoria
de muita gente. São reacções de pessoas fracas de espírito. É gente que usa um
dispositivo odioso, o da generalização. Culpa sempre os outros por qualquer
coisa. Atribui aos outros as responsabilidades por tudo quanto corre mal.
Considera que eliminar, proibir, calar e expulsar os outros são soluções para
os seus problemas." O autor condena a obsessão dos que querem eliminar,
proibir, calar e expulsar os outros...
TML INICIANTE: Em
geral, apesar de ser um pouco injusto com os anti-racistas e enfiá-los todos no
mesmo saco, posso dizer que concordo com a tese. Agora, parece-me que o AB
desvaloriza bastante as semelhanças do discurso do André Ventura com um
discurso fascista. Não se pode dizer que o é inteiramente, mas também não se
pode dizer que não o seja de todo. E vemo-nos neste impasse, em que temos um
tipo protofascista, e nos exigem que assobiemos para o lado porque se não só
estamos a contribuir para ele crescer...
Fowler
Fowler INICIANTE: Não, não vamos assobiar para o lado. Como o sr.
Barreto professa de forma marialva e panfletária o individualismo e o
liberalismo, ele, por princípio, não pode se deixar afectar publicamente pelo
palavreado de racistas e xenófobos no uso das suas liberdades. Apenas o
incomoda a reacção e o activismo ético das esquerdas e de outros que,
conhecendo as lições da História, não podem deixar de reagir assertivamente. Margarida
Paredes, defensora do Serviço Nacional de Saúde MODERADOR: Quem
diria que o António Barreto chegava ao ponto de ter uma agenda política contra
os anti-racistas, contra a Esquerda que combate o racismo e a xenofobia? Pelo
meio desvaloriza os racistas e xenófobos como meia dúzia de tolos, como se
esses tolos não tivessem chegado ao poder nos EUA, Brasil, Polónia e Hungria
entre outros. Essa sua viragem à direita populista é resultado do
envelhecimento?
IZANAGI01 INICIANTE: Compartilho
consigo a opinião de que "Democracia é quando eu mando em você. Ditadura é
quando você manda em mim" E o que se verifica nos países a que faz
referência. Ainda que a maioria dos eleitores tenha escolhido aqueles
governantes, não são democratas porque não escolhem como eu escolheria.
rafael.guerra EXPERIENTE: Racismo ou
rejeição de certas culturas? Hoje a tendência é de privilegiar os direitos
individuais acima dos da nação, e os líderes muçulmanos na Europa abusam dessa
concepção. É sempre em nome desses direitos que avançam na islamização da
sociedade: velar miúdas
nas escolas, usar burkas e burkinis, orar na rua, comer halal no trabalho, ser
tratado por médicos do mesmo sexo, até à tentativa de privatizar praias. Tudo
isso, acompanhado duma grande habilidade retórica, levou a uma islamização,
comunitarização e guetização da sociedade francesa, com bairros onde só muçulmanos
vivem entre si, onde raparigas de saias são insultadas e onde mulheres são
excluídas dos bares. Quem pôde, fugiu dessa violência cultural. Citando Engels:
a partir dum certo número, a quantidade torna-se uma qualidade.
Mario
Coimbra EXPERIENTE: Excelente. O Racismo, a Xenofobia não são de esquerda
ou direita. Qualquer pessoa com dois dedos de testa sabe disto e não devia
entrar em facilitismos de os catalogar com fascista ou comunista. André Ventura
quer palco. O melhor maneira de o tirar é os partidos se comportarem com
escrúpulos e decência que por vezes faltam. PS agora no poder, PSD, PCP, BE,
CDS. Todos têm telhados de vidro e não são campeões de nada a não ser muitas
vezes da falta de vergonha.
Fowler Fowler INICIANTE: Discurso
salazarista! Caladinhos fazemos melhor figura e ainda passamos por
inteligentes, não é Coimbra? João
Rodrigues INICIANTE: Só vê meia dúzia? Sabe como são as pulgas... Mas muito
tolo também foi iniciar o texto com a alusão a certas esquerdas... Quando a
ameaça são as pulgas de direita. E sabemos ambos o que se passa por essa Europa
fora quanto à infestação reaccionária, são mesmo apenas dúzia e meia de agentes
infecciosos. Há que actuar imediatamente.
Magritte EXPERIENTE: Quem está feliz com o status quo, que razão tem para o
mudar? Os negros
portugueses são as nossas empregadas domésticas, trolhas e jardineiros.
Racismo? É como se fossem cá da casa! A população negra, como a cigana, é
desproporcionalmente mais pobre, tem menos acesso à educação e é frequentemente
tratada como inferior pelos poderes públicos e olhada de lado pela
"maioria". E depois, pergunta Barreto? Porque querem alguns deles e
da esquerda debater estes problemas, se não o são? Barreto sabe de há muito
que é da política colocar assuntos na agenda. Mas para ele, esta não é uma
questão de agenda. Prefere atacar os perigosos esquerdistas/anti-racistas e não
os racistas/extremistas, e culpa-los do racismo dos outros. É no fundo a táctica
do "se não queria ser violada, não vestia mini-saia."
Mario Coimbra EXPERIENTE: Caro Magritte, colocar na agenda política não tem que
ser do ponto de vista racista. Mas sim como apoiar populações menos
favorecidas. Negros, Brancos do interior do país, e muitos mais. Não tem a ver
com cor. Melhor, não devia ter de ser acerca da cor mas sim como apoiar. Falar
em anti racismo é pôr a ênfase no racismo. Percebe??? Macuti EXPERIENTE: Os portugueses
em França também são “empregados domésticos, trolhas e jardineiros” Racismo?
Não! Não confundir desigualdade social , que existe em todas as sociedades, com
racismo.
IZANAGI01 INICIANTE: Também
concordo consigo. A generalização do André Ventura é incorrecta, diria mesmo
fascista: a sua (os negros portugueses são as..) é adequada e muito
democrática. Pois é, Democracia é quando eu mando em você. Ditadura é quando
você manda em mim.. Não podia estar mais de acordo.
Magritte EXPERIENTE: Eu nunca generalizei: nunca disse que os portugueses
eram racistas. Há os racistas e outros que não o são. O meu ponto é que há
problemas sociais com base em diferenças raciais que são reproduzidas por
estruturas sociais.
ana cristina MODERADOR: Pois
claro. Os partidos “decentes” estão à espera de quê para lançar campanhas
contra os males de que fala o António Barreto? Contra a corrupção, o
banditismo, o racismo, o nepotismo? De cada vez que sai uma notícia sobre uma
compra de milhões por ajuste directo a um candidato autárquico do PS é mais um
fã do Ventura que aparece.
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