Por mim, aproveito para fazer limpezas
nos armários, e mudanças no dispositivo de alguns móveis, com vista ao futuro, avessa
à reflexão acerca do presente sardónico, lendo as boas crónicas dos bons
cronistas nos intervalos, como estas irredutíveis, de Alberto Gonçalves, vox clamantis in deserto. E espreitando
as notícias sobre os óbitos e as recuperações, e lavando as mãos com sabão, depois
de despejar os lixos, nada contra a nação, que parece que não parou de receber também
o lixo alheio, em demonstração da nossa qualidade de desenvolvimento económico,
de aproveitadores das excrescências dos povos produtores de economia, o que nos
dá algum rendimento a céu aberto.
O povo não é sereno: é submisso /premium
António Costa decretou uma série de
regras para cumprirmos até se descobrir, segundo ele, uma cura ou uma vacina. É
então possível que tenhamos de viver nesta agradável distopia até 2039 ou
assim.
OBSERVADOR, 02 mai
2020
Dia 40 do estado de sítio
É
impressionante a preocupação dos “media” nacionais com as vítimas americanas do
covid. A Bélgica lidera o “ranking” internacional de mortes/milhão? Os “media”
não querem saber dos belgas. A Espanha e a Itália vêm logo a seguir? Que se
lixem espanhóis e italianos. E os franceses? Deixá-los esticar o pernil à
vontade. Mesmo os portugueses, por acaso conterrâneos dos jornalistas em
questão, são assaz desprezados. A aflição do nosso jornalismo está quase toda
concentrada nos pacientes dos EUA, pelos vistos encarados como seres humanos
superiores, cujo falecimento é um golpe na humanidade e merece notícias e
comentários intermináveis. Escrevo “quase” porque os “media” nacionais também
se compadecem um bocadinho com as vítimas britânicas e brasileiras. É uma selecção engraçada. Não é uma selecção natural.
Mas seria engraçado observar o que a selecção natural faria a esta espécie de
“jornalismo”.
Dia 41
O
“milagre português” também passa pela doçura com que engolimos dogmas. Vejam
um: temos o melhor SNS do mundo. O melhor SNS do mundo, que tem a menor quantidade
de camas para cuidados intensivos da Europa (Roménia e Bulgária incluídas),
entra em pânico ante a perspectiva de uma epidemia terrível. A epidemia revela-se relativamente branda, com
apenas uma ou duas centenas de pessoas em simultâneo a necessitarem das UCI.
Ainda assim, o melhor SNS do mundo suspende tudo para se concentrar no covid. A
quantidade “excedente” de vítimas mortais de doenças “tradicionais” é cinco
vezes superior às vítimas mortais do covid. Graças ao PS, que o criou em tempos
e demoliu entretanto, o melhor SNS do mundo soma mais um sucesso.
Dia 42
A
5 de Março, o ministro da Economia jurava que o impacto do vírus no sector que
“tutela” seria “bastante reduzido”, excepto em áreas insignificantes como os
“transportes, as viagens e a hotelaria”. O homem
sabe do que fala. À entrada de Maio e, após 15 dias de Estado de Desnorte, 45
de Estado de Emergência e uma quantidade ainda indefinida de Estado de
Calamidade, é garantido que não chegaremos ao Estado de Austeridade. É verdade que há por aí alguns
recém-desempregados (meia dúzia), algumas empresas que teimam em reabrir para
conseguir facturar (três ou quatro) e alguns empresários (talvez dois) que
preenchem erradamente os escassos setecentos requisitos que o Simplex exige à
reabertura. Fora isso, tudo impecável. Quando atingirmos o Estado da
Bem-aventurança, leia-se quando, à semelhança dos venezuelanos, disputarmos
gatinhos para o guisado, poderemos sempre culpar o covid. E a Holanda, não
esquecer a Holanda.
Dia 43
Nas
opiniões isentas do Presidente da República, de certos governantes e do
ocasional artigo encomendado na imprensa estrangeira, o mundo deslumbra-se ante
o “milagre português”. Ei-lo: proporcionalmente, somos o 11º país
do mundo com mais mortos. Ou seja, só há uns 180 países melhor do que nós nessa
matéria. É, de
facto, extraordinário. Como se conseguiu tamanha proeza? Um secretário de
Estado da Saúde, aquele sujeito grisalho que nas conferências diárias ouve as
perguntas dos repórteres sem responder a nenhuma, foi explicar a um jornal
britânico: Portugal preparou-se para o vírus desde Janeiro. Então
não? Em
Janeiro, a senhora da DGS negava que o vírus fosse contagioso. Em Fevereiro, a
senhora da DGS duvidava que chegasse a Portugal. Em Março, a senhora da DGS
recomendava as visitas aos “lares” da terceira idade. Em Abril, a senhora da
DGS continuava no cargo, outro milagre português.
Dia 44
Como é costume nas nações “populares”
e “democráticas”, o poder deseja colocar o “povo” a “mandar” em tudo o que é penduricalho. No caso, e a curioso pretexto do vírus, pretende-se
que o contribuinte patrocine ainda mais a TAP, graças à visão de um sonhador
notabilizado por viver à custa de um pai que vive à custa do PS que vive à
custa do Estado. Não acho mal. É verdade que há alternativas mais baratas e
mais eficazes à TAP. Mas o prazer de viajar em aviões com a bandeirinha de
Afonso Costa e o nome de uma qualquer “personalidade” nativa não tem preço. Ou
tem: agora serão centenas de milhões. Entretanto, se a ideia é nacionalizar
prodígios onerosos que o mercado não quer, era interessante nacionalizar o
ministro Pedro Nãoseiquê Santos. Diz ele que “a música agora é outra”, e é:
chama-se “A Internacional”.
Dia 45
Ordens e Progresso. António
– “O mundo mudou em 360º” – Costa, que além
de culto é democrata, lá arranjou maneira de se livrar da dependência do PR e
da AR, esses opositores ferozes, para mandar sozinho, conforme manda a
decência. Vai daí,
decretou uma série de regras para cumprirmos até se descobrir, segundo ele, uma
cura ou uma vacina. É então possível que tenhamos de viver nesta agradável
distopia até 2039 ou assim. Excepto,
claro, se formos estalinis…, perdão, sindicalistas ou sindicalizados. Estes
podem juntar-se aos magotes, em paz e com regras diluídas porque defendem os
direitos dos trabalhadores. Os trabalhadores a sério é que não têm a vida
tão facilitada. Na medida em que os trabalhadores a sério aceitaram o 1º de
Maio e outros enxovalhos sem um resmungo, é bem feita! De
brinde, a CGTP rejeita ajudas da UE e o próprio euro, os últimos obstáculos a
separar-nos da gloriosa Caracas.
Dia 46
Gosto
muito das pessoas jovens ou de meia-idade que se enclausuraram há dois meses e
não saem à rua nem que a cozinha irrompa em chamas. Fiquem em casa, dizem elas.
Confrontadas com os inconscientes que se passeiam lá fora, insultam-nos aos
gritos ou em pensamento. Confrontadas
com as medidas do “desconfinamento” (palavra linda), opinam, trémulas de pavor,
que ainda é cedo, que falta chegar ao pico, que devíamos permanecer fechados na
dispensa por mais dois meses ou dois anos, enquanto não se vencer a “guerra”
(juro) ao vírus. Esses guerreiros do sofá e da Netflix, obedientes e
mansos, são dignos da minha maior admiração. Por isso, eu nunca aproveitaria o
fim-de-semana para violar as normas sagradas do recolher obrigatório, nem para
percorrer 800 quilómetros, nem para entrar e sair de uma resma de concelhos,
nem para tomar café sentado à mesa de uma pastelaria, nem para fingir que
habito um lugar vagamente civilizado e não um parque de diversões socialista. E
se o fizesse, não o diria aqui.
CORONAVÍRUS CRÓNICA
SAÚDE PÚBLICA SAÚDE OBSERVADOR
COMENTÁRIO:
Cristina Maya: Perfeito, como sempre. Espero que sirva
de lição quando daqui a pouco tempo reunirem todos os dados e todas as
informações e todos descobrirmos o resultado patético que foi confinar
(realmente o termo é perfeito, parecemos gado) a população mundial como um mero
rato parido pela montanha, Eventualmente,
as máscaras teriam feito sentido no início da quase inofensiva pandemia, mas a
mentira prevaleceu. Agora não nos querem
deixar ir à praia que é a melhor fonte natural de Vitamina D e nos dá a
imunidade necessária para que o nosso sistema imunitário combata naturalmente
qualquer vírus. Eu moro no centro de Lisboa e saio todos os dias durante uma
hora para caminhar e apanhar o precioso sol, e vejo que na Baixa parece que
entramos na África profunda, só se vêem negros (que a polícia tenta dissipar
sem sucesso), que sabem muito bem que devido ao seu tom de pele precisam de
muito mais tempo de sol do que nós, fazem eles muito bem! Espero que desta vez,
como é hábito quando sou a primeira pessoa a comentar, o meu comentário não vá
para moderação e desapareça do mapa.
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