Com o desinteresse por leituras, com a alienação
mediática, com as dissoluções familiares, com a permissividade da indisciplina
escolar …. Fora o que por aí vai de mau exemplo no procedimento adulto… Mas nem
tudo é mal. E o programa dos Got
Talent Portugal, incluindo os seus jurados, dá-nos orgulho de nós.
Venha o crescimento dos talentos, e mais condições para que eles se manifestem!
Um texto de Andreia
Sanches sobre o des/interesse dos adolescentes pela escola e
outros problemas de comportamento e alimentação.
Portugal entre os piores. Aos 15 anos,
só 10% dos alunos gostam muito da escola
Grande estudo sobre a adolescência,
que se repete a cada quatro anos, destaca Portugal pelo “fraco gosto” pela
escola e pelo pouco exercício físico dos alunos. A nível internacional, a OMS
alerta também para o agravamento de alguns sintomas relacionados com a saúde
mental.
PÚBLICO, 18 de Maio de 2020
Uma queda a pique. Em 1998,
quando se perguntava aos adolescentes portugueses de 15 anos se gostavam muito
da escola, 29% respondiam que sim, o que nos colocava no top dos mais
satisfeitos em 28 países (2.º lugar, depois da Letónia). Repetiu-se o exercício nos anos seguintes. Foi sempre a piorar. E chegados a 2018, só 9,5% dos alunos
responderam o mesmo. Em 45 países
avaliados na última edição do Health Behaviour in School-aged
Children (HBSC), em colaboração com a Organização Mundial da Saúde
(OMS), estamos em 38.º lugar. Só há
sete, incluindo a Grécia e a Itália, onde o desamor pela escola é ainda maior
do que por cá.
dados
divulgados às 23h01 desta segunda-feita (hora portuguesa) mostram que a relação
dos jovens com os sistemas de ensino se tem
tornado mais complicada. É assim em Portugal – onde, nas palavras da coordenadora nacional desta avaliação,
Margarida Gaspar de Matos,
há um “fraco gosto pela escola, fraco em si mesmo e fraco na comparação com
os restantes países” –, mas não só em Portugal.
Nos
45 países onde o inquérito foi aplicado, com a mesma metodologia (“gostar muito
da escola” tem sido sempre, nos últimos 20 anos, o indicador usado no HBSC
para aferir a satisfação que ela
proporciona aos alunos) apenas 21% dos adolescentes de 15 anos se dizem muito
satisfeitos com a escola (menos dois pontos percentuais do que
em 2014.
O HBSC é feito de quatro em quatro anos, com amostras representativas
de alunos de 11, 13 e 15 anos e sempre com um conjunto de perguntas que se
repetem nas diferentes edições, para permitir traçar tendências. O último
inquérito, aplicado em 2018, envolveu 227.441 adolescentes da Europa e Canadá. Em
Portugal, que participa desde 1998, foram inquiridos 6997 estudantes e
considerados na análise final 5839.
“Há alguma evidência de que a pressão na escola está a aumentar,
sobretudo entre os adolescentes mais velhos, numa altura em que a percepção é a
de que o apoio que têm da família e dos professores está a diminuir”,
conclui-se no relatório final, que sublinha que “alunos que gostam mais da
escola apresentam níveis mais altos de satisfação com a vida, menor risco de
uso de substâncias e melhores indicadores de saúde mental”.
Sob pressão
A
pressão na escola é medida com uma pergunta que se pode resumir assim: quão
pressionado te sentes com os trabalhos de casa? “Sobretudo os mais velhos e as
raparigas, põem Portugal nos piores lugares, o que acontece desde 1998”, sublinha
Gaspar de Matos. Números: seis em cada dez alunos portugueses de 15 anos (49%
dos rapazes e 73% das raparigas) dizem sentir-se pressionados ou muito
pressionados com os trabalhos académicos. Estamos, neste ranking dos teenagers
sob pressão, em 10.º lugar. Mas a média de 45 países analisados também subiu
nos últimos anos, está nos 44%.
O “declínio
significativo na satisfação escolar e o aumento da pressão exige atenção”,
alerta a OMS.
“A
escola está realmente a ser ‘menos amada’ por toda a Europa. Tenho a secreta
suspeita que é muito difícil ‘ganhar às TIC’ e esse é um debate que temos de
encarar muito a sério”, diz Gaspar de Matos. “Depois, pela Europa inteira há
empregos mais incertos e fica mais indefinido o papel da escola nesses ‘bons
empregos’. Os alunos desinteressam-se (ou stressam pelas classificações), a
concorrência é grande, o que aprendem depois até parece que ‘não serve para
nada’ e quando conseguem arranjar um emprego parece que têm sempre ‘poucas
competências’ e vão fazer cursos de preparação. Acontece um pouco por todo o
lado.”
Para
além disso, quando revelou os primeiros dados nacionais, em Dezembro de 2018,
ainda antes de eles seguirem para a equipa internacional que depois os analisa
e faz as comparações entre países, Gaspar de Matos sublinhava: os alunos
portugueses queixavam-se do excesso de matéria nas aulas, do
aborrecimento que sentiam na escola. Faltam mudanças de fundo, há
muito tempo, acredita. É preciso uma “acção urgente na escola, na comunidade e
na família”.
Mais apoio dos colegas
As boas notícias para Portugal,
neste capítulo, são que os portugueses referem um apoio social por parte dos
colegas da escola superior à média (70% dos rapazes e 60% das raparigas de 15
anos sentem-se muito apoiados pelos colegas contra uma média de 60% e 51% a
nível internacional). Mais: na sua esmagadora maioria (80%), sentem-se seguros
na escola e envolvem-se menos em lutas do que os de outros países.
Outra boa notícia: a forma como
avaliam a sua satisfação com a vida. Esta melhorou desde 2014 e, numa escala de
zero a 10, os jovens de 15 anos dão uma nota de 7,4 à vida que têm, idêntica
à média dos 45 países.
Ainda
assim, a OMS alerta para a deterioração da saúde mental
dos adolescentes em vários países, medida
pelos sintomas de nervosismo, irritação e tristeza que “os adultos de amanhã”
relatam: um em cada quatro adolescentes diz que pelo menos uma vez por semana
se sente nervoso, irritado ou tem dificuldades em dormir.
Falta de exercício físico
Outra
preocupação é “a prática da actividade física”. Em Portugal, ela é “fraca em si
(poucos adolescentes cumprem o recomendado), e fraca em comparação à média”,
como sublinha a equipa portuguesa. “Os resultados são maus desde 1998.”
Em
Portugal, as raparigas destacam-se: aos 15 anos, 47% dizem sentir-se nervosas
frequentemente (contra 37% das raparigas dos outros países) e 30% dizem ter
dificuldades em dormir (contra 29%).
Aos
11 anos, por exemplo, 48% dos rapazes e 30% das raparigas relatam ter pelo
menos duas horas por semana, fora da escola, de actividade física vigorosa. A
média internacional é 54% e 43% respectivamente. Aos 15, as coisas pioram: 37%
dos rapazes e 16% das raparigas portuguesas fazem duas horas de actividade
física extra-escola (a média internacional é de 45% e 28%).
No capítulo do excesso de peso e obesidade, Portugal aparece no
7.º lugar quando se
fala dos adolescentes de 11 anos: quase 30% dos adolescentes
portugueses sofrem de excesso de peso ou obesidade. Aos 15 são 22%. A média
internacional é, respectivamente, de 23% e de 18%.
Margarida Gaspar de Matos nota,
contudo, que o excesso de peso e a obesidade estão estacionários em Portugal
desde 2002. E que as
práticas alimentares “estão a melhorar”. E prossegue com cautela: “A
ingestão calórica e o gasto calórico têm de ser equacionados em conjunto, e com
muita tranquilidade e ressonância cultural e afectiva, para não gerarmos
stressadinhos e stressadinhas, sempre a contar passos e a contar calorias (faz
mal à saúde mental, pode tornar-se uma obsessão, uma doença alimentar ou uma
dependência do exercício…).”
É
preciso que as crianças aprendam cedo o que devem comer, que desenvolvam o
hábito de cozinhar e, também, que a qualidade e apresentação das refeições nas
cantinas, alvo de tantas críticas, melhorem.
Mais consumo de álcool
Neste
retrato do que interfere com a saúde na adolescência, os consumos são outra das
dimensões avaliadas. O consumo de tabaco está a descer desde 2002 por toda a
Europa e muito especialmente em Portugal. Um em cada dez (11%) dos alunos
portugueses de 15 anos reportaram ter fumado nos 30 dias anteriores ao
inquérito. A média internacional é de 15%.
“A
descida do tabaco é um dossier bem consolidado e de sucesso, mas na verdade as
políticas públicas nos últimos anos andam a ‘esquecê-lo’ e, claro, o negócio
dos produtores é a sua promoção e eles continuam a tentar. Temos agora, por
exemplo, outras formas de consumo de tabaco (os diversos vapers) e temos de
estar atentos”, acrescenta a investigadora.
Também o consumo de
cannabis continua a diminuir: 5% dos
rapazes de 15 anos e 3% das raparigas relatam ter consumido nos 30 dias
anteriores ao inquérito (a média internacional é 8% e 5%). “Mas
tal como acontece com o tabaco, os produtores têm um ‘negócio’ que não vão
deixar ruir. Temos também de estar atentos.”
Já no caso do consumo álcool, a tendência é de subida em Portugal,
tanto aos 13 como aos 15 anos, ao arrepio da tendência internacional. Apenas um dos dados recolhidos: 38% dos jovens
portugueses de 15 anos reportaram consumo nos 30 dias anteriores ao inquérito.
Em 2014 tinham dito o mesmo 30%. A nível internacional a média dos que declaram
consumos recentes passou de 39% em 2014 para 37% em 2018.
Sexo desprotegido
“Ficamos
sempre preocupados com o consumo de álcool na adolescência. Facilita os
acidentes de viação que é uma das maiores causas de morte nestas idades, e
facilita o sexo desprotegido, e em geral o sexo não ‘planeado’. Associa-se
às lesões, à violência… faz mal a tudo, fígado, estômago e mesmo ao adequado
desenvolvimento do cérebro. Pelo menos até aos 18 anos tem efeitos
desastrosos”, nota Gaspar de Matos.
Há, por isso, que ficar atento ainda que, para já, não seja caso para alarme.
Outra
nota do relatório HBSC prende-se,
precisamente, com as relações sexuais desprotegidas. Um em cada quatro
adolescentes não usou nem um preservativo nem pílula na sua última relação. O
valor é semelhante ao registado em Portugal (24%). Este valor, diz a OMS,
“continua a ser uma preocupação”.
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