Teresa de Sousa séria e ponderada que é, faz o ponto da situação a
respeito do colaboracionismo aparente entre esquerda e direita na questão, não
direi tanto dos professores, mas de Mário
Nogueira que tem que justificar o vencimento de que aufere com a sua lista
de realizações, entre as quais a de Presidente da “Secção de Patinagem”da Associação
Académica de Coimbra, durante 17 anos,
segundo leio na Internet, o que me leva a concluir sobre o alcance do cargo
para o seu gosto participativo de longa data, na ajuda à derrapagem do país.
OPINIÃO: Alguém tirou o tapete a Rui Rio
e não foi o Governo
Como foi possível, em primeiro lugar, ao
PSD dar um monumental tiro no pé? Como foi possível, em segundo lugar, à
esquerda radical pôr em causa uma eventual continuação da geringonça depois das
legislativas?
TERESA DE SOUSA PÚBLICO, 5 de Maio de 2019
1. A
questão não é apenas o espanto: como foi possível? É também porque é que foi
possível. Como foi possível, em primeiro lugar, ao PSD dar um monumental
tiro no pé? Como foi possível, em segundo lugar, à esquerda radical pôr em
causa uma eventual continuação da “geringonça” depois das legislativas? Aparentemente
nada disto tem lógica, sobretudo perante uma reivindicação encabeçada pela
figura que vence por longevidade e demagogia o concurso da irresponsabilidade
sindical (e política) nacional — Mário Nogueira. Não se tratava de
uma exigência social de primeira necessidade (os professores em Portugal, e em
ppc, estão na média dos vencimentos da União Europeia, ainda que, infelizmente,
não estejam na média dos resultados obtidos pelos alunos), nem de colmatar uma
profunda injustiça social — que as há. Eleitoralmente, pode parecer tentador
agradar aos professores, que são muitos, mesmo que desagradando aos outros
funcionários públicos. Mas é só a primeira impressão, porque, na sua maioria, o
mais provável é que não mudem o seu voto nas legislativas por causa desta
súbita “generosidade” que tocou o coração da direita e da esquerda radical.
2. As
razões do PCP e do Bloco não são difíceis de explicar. Os dois
partidos que assinaram por baixo três orçamentos cujo objectivo foi reduzir o
défice até ao equilíbrio, sentiram-se livres para regressar aos velhos hábitos
e às velhas convicções. Mudaram as condições políticas que os levaram a aceitar
a “geringonça”? Dificilmente, quanto ao essencial. Foi uma questão de
sobrevivência que levou o PCP a romper com uma estratégia de 40 anos que elegeu
o Partido Socialista como “inimigo principal”. Mudou, porque tinha de mostrar
aos seus eleitores que podia ter influência sobre as suas vidas, influenciando
a governação. A própria CGTP começava a
ver a sua capacidade de mobilização muito limitada — reduzida quase só ao
sector público e empresarial do Estado, em que os empregos não estavam em causa
e era possível a defesa dos chamados “direitos adquiridos”. Com o desemprego a
cair acentuadamente no sector privado e com a devolução dos rendimentos, não
sabe exactamente o que fazer, nem sequer perante a emergência de um novo tipo
de sindicalismo “antipolítico”, que lhe foge ao controlo. Ontem, Jerónimo
só conseguiu recorrer ao velho chavão: “O nosso compromisso é apenas com os
trabalhadores e o povo.” Depois de ter votado três orçamentos para reduzir o
défice, disse não aceitar a necessidade dessa redução. O destino do PCP ainda
não está traçado, mas o regresso à radicalização não parece a opção mais
sensata.
3. O Bloco é
outra história. Atribuiu-se
a si próprio a missão de mudar o PS por dentro ou por fora, mesmo que essa
missão já tenha sido tentada por outros e nunca conseguida. Tem a ambição de
vir a incluir um governo liderado pelo PS. Fez, porventura, uma avaliação
errada da “relação de forças”: com o PS afastado da possibilidade de uma
maioria absoluta, acreditou que passava a dispor do estatuto de “king maker” —
uma aposta de desfecho muito incerto, sobretudo em tempos de grande incerteza.
Em véspera de eleições, achou que podia radicalizar à vontade sem qualquer
custo político. Quando ouvimos
Catarina Martins dizer que, se há dinheiro
para salvar bancos, também tem de haver para salvar os professores, percebe-se
que talvez não tenha apostado no cavalo certo. Os professores não gozam de uma
grande simpatia nacional, para dizer o mínimo. O Bloco não aprendeu nada com
Alexis Tsipras ou com o Podemos. Como se viu nas eleições em Espanha,
os extremos combatem-se com a moderação. Dificilmente a sua chantagem sobre o
PS colherá frutos.
4. Também
não há, propriamente, uma surpresa no comportamento
do CDS-PP. O partido
de Cristas perdeu qualquer referência ideológica em favor de uma espécie
bastarda de populismo. Já tinha entrado em total desorientação: numa
semana, conseguiu declarar a sua afinidade com o Vox (extrema-direita espanhola)
e defender passadeiras de peões das cores do arco-íris na Almirante Reis para
agradar aos LGBTI. Cristas, a “defensora do povo” e de todos os oprimidos,
sejam eles os professores, os enfermeiros, os estivadores, os motoristas, os
pensionistas, os doentes, não está a colar. Cristas, a “verdadeira
oposição” a um Governo conspurcado pelos comunistas também não, como provam as
sondagens. Cristas, a “radical” também não — o seu eleitorado não aprecia.
Resta-lhe esbracejar até às eleições. Mas, atenção, Nuno Melo não disse o que
disse sobre o Vox por acaso. São evidentes os sinais de que o PP está
disponível para enveredar pela via do nacionalismo (já tentada noutras alturas,
ainda que sem êxito), como fica demonstrado na campanha das europeias. Basta
estar atento.
4. Falta a verdadeira surpresa,
que está na origem desta crise política. O que levou o PSD a juntar-se à esquerda radical para
aprovar uma medida insensata e injusta, ainda por cima quando a vida lhe
parecia estar a correr um pouco melhor?
Quando
foi eleito, Rui Rio prometeu um novo tipo de liderança, mais rigoroso e mais
coerente, que não correria a foguetes, nem embarcaria em radicalismos de
superfície. O que o levou a cortar de uma penada com esta imagem, que, durante
algum tempo, ainda preservou? Há talvez várias razões. A primeira terá sido a
chuva de críticas de boa parte da comunicação social, acusando-o de não fazer
oposição. Ou seja, de não gritar o suficiente, nestes tempos perigosos, em que
a linha de demarcação entre o jornalismo e a voragens das redes sociais tende a
esbater-se. Rio esqueceu-se de que, para além do discurso mediático-político
que funciona em bolha, a sua atitude agradava a muito boa gente, especialmente
ao centro. E também que os resultados fracos das sondagens teriam menos que ver
com decibéis e mais com o razoável êxito do Governo em várias frentes —
e, em democracia, são quase sempre os governos, não os programas das oposições,
o factor determinante das escolhas dos eleitores.
A segunda razão talvez tenha sido a
sensação de embriaguez momentânea, provocada pela lógica que Paulo Rangel
imprimiu à campanha das europeias — justamente, a do “vale tudo” — e os bons
resultados que as sondagens aparentemente traduziam. Talvez se
tenha esquecido que as eleições europeias obedecem a motivações muito
diferentes das legislativas. Nas primeiras, os eleitores sabem que podem
penalizar o Governo sem consequências — o voto útil conta pouco, o voto
de protesto e o voto ideológico contam mais. Nas legislativas, a lógica é a
oposta.
Mas, pior do que estes eventuais
cálculos políticos, foi a forma como o PSD “matou” qualquer credibilidade das
suas propostas políticas, anulando ao mesmo tempo o legado do Governo de Passos
Coelho, na sua versão “salvar o país do regabofe socialista”. Há outra de
que Rio não gosta tanto: aplicar um programa político neoliberal, que nenhum
partido se atreveria a pôr em prática em Portugal a não ser a coberto da troika.
À falta de melhor argumento, a resistência às boas contas do Governo oscilava
entre a tentação de invocar o diabo (como fez o deputado do PSD na cerimónia do
25 de Abril) e um exercício de medição da austeridade, numa escala de 1 a 10,
aplicada pelo Governo, tentando provar o oposto: que o Governo praticava mais austeridade do que a que
anunciava ou que Centeno dizia uma coisa cá dentro e outra lá fora. Compreendem-se as dificuldades do PSD perante um
governo que equilibrou as contas públicas e devolveu rendimentos. Poderia tê-lo
criticado, por exemplo, por ter devolvido rendimentos demasiado depressa (Passos considerava que os cortes eram irrevogáveis
para garantir a competitividade da economia),
em vez de dar prioridade ao
investimento ou à redução da carga fiscal sobre as empresas. Tudo isto faria
sentido. Alinhar
com o Bloco, o PCP e o PP para oferecer aos professores um benefício injusto e
injustificado não passaria pela cabeça de ninguém. Alguém lhe tirou o tapete?
Candidatos não faltarão. E nem vale a pena acusar António Costa de se
aproveitado da situação. O que é que esperavam? Palmadinhas nas costas?
5. Só o Presidente ainda pode tentar enfraquecer o
Governo, forçando-o a ficar a queimar em lume brando até Outubro. Para Marcelo
também se trata de uma estreia: lidar com uma situação em que não é ele o
protagonista.
COMENTÁRIOS
Vasconcelos Vasconcelos, 05.05.2019 21:45: Mais tarde ou
mais cedo políticos e opinativos perceberão o tiro que de facto estão todos a
dar nos pés. Esta bolina a dar tareia em professores, enfermeiros, médicos,
juízes, polícias, etc. criará brevemente a turbulência Sul Americana. Talvez
assim ainda se garanta que pelo menos a cultura Luso Hispânica se aguente por
estes cantos. A não ser assim, receio bem concluir que Futre seja um grande
profeta… e eu terei de emigrar para que os meus filhos e netos tenham
professores, enfermeiros, médicos, polícias Lusos. Este País já não é para
nós...
MOGOFORES
(Anadia)05.05.2019: È uma das
decanas do nosso jornalismo a sra Drª Teresa de Sousa. Mesmo que não o
soubéssemos, bastaria ler esta crónica para saber que não foi escrita por um
qualquer jornalista. É só triste o tema que teve de abordar, para chamar à
razão esta gente política tresmalhada.
jafundo, 05.05.2019: Esquerda
radical? A sério? Ainda vai aí e acha que faz sentido escrever em jornais? São
só conjecturas mais ou menos aleatórias sobre um golpe de teatro que não
sabemos bem como vai acabar. Uma certeza: estes textos de opinião são parte
desse golpe de teatro.
Coimbra 05.05.2019: Cara Teresa de
Sousa: - é a 2ª vez nestas últimas semanas que comento e aplaudo um seu texto
de opinião. E faço-o com imensa satisfação! Como referi no anterior comentário
ao seu outro texto, também este devia ser distribuído na Redacção do PÚBLICO, e
colado ao lado dos monitores dos pcs de alguns/algumas jornalistas, a começar
pelo do Manuel Carvalho. Os seus 2 últimos textos são um assomo de ponderação e
"independência" de que o PÚBLICO já me tinha desabituado ao longo dos
últimos anos! Bem haja! NB - E não se preocupe com os comentários
"enviesados" de alguns comentadores-leitores! Dizem sempre mais do
mesmo e, suponho, por razões que não se recomendam!
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