terça-feira, 14 de maio de 2019

Educação? O que é?



Ainda bem que José Pacheco Pereira pegou no tema das pornografias e das porcarias a céu aberto. Talvez há uns anos ele não se atrevesse a mostrar-se assim tão reaccionário, não porque alguma vez alinhasse com o despautério, intelectual sério que é, mas porque, como afirma uma sua comentadora, o programa era então mais submisso aos princípios de Abril e só realmente se salientava na banca intelectual – isso, praticamente não mudou – quem alinhasse na viragem. Sei disso bem. De um livro que publiquei em 81 – “Cravos Roxos” – expressivo do meu repúdio “eterno” de tais princípios, embora com a dose de ironia que julgo de bom tónus e que o tornou apreciado particularmente, na cobardia da timidez silenciosa, foi-me pedido que enviasse seis exemplares para um concurso literário, creio que desse ano. Apressei-me a enviá-los, mas naturalmente que o livro foi ignorado, o que não aconteceu nunca, certamente, aos livros de JPP, que até de Álvaro  Cunhal se ocupou, bem integrado no tempo e no oportunismo do struggle for life universal.
Eu gostei do artigo de JPP, quem dera que chegasse aos olhos de uma sociedade a envilecer, e que esta meditasse e fizesse marcha atrás no desregramento da bestialidade. Mas não há controlo disso, nem da parte do governo nem das instituições, nem sequer de uma universidade sem regras, embora pudesse ser chamada de esteio superior de educação.

OPINIÃO
Um festival de “jabardices” e hipocrisia na Queima das Fitas
Querem beber e exibir-se, para outros ganharem dinheiro, muito bem. Mas façam-no longe dos locais públicos e sem dinheiro público, e não obriguem os contribuintes a pagar os custos dos excessos.
PÚBLICO, 11 de Maio de 2019
JOSÉ PACHECO PEREIRA
Vale a pena ir ao Jornal de Notícias e ao PÚBLICO para ver em detalhe o festival de “jabardices” que são as festas das Queimas das Fitas. Neste caso é a do Porto, mas todas as outras, em particular a de Coimbra, são iguais. A Queima das Fitas é um evento da praxe, está associado à mesma cultura estudantil das “jabardices” da praxe.
Em vários casos ligados à praxe, nos últimos anos, houve de tudo, violações, vandalismo, todos os abusos do catálogo, feridos e mortos. Não é um exclusivo português. Casos muito semelhantes aos que agora geraram mais este escândalo sazonal são comuns, por exemplo, nas “fraternidades” americanas.
No escândalo deste ano encontram-se os ingredientes habituais: bebida, droga, sexo e vídeos. Há um outro ingrediente que devia ser colocado a par destes: negócio. Na verdade circula muito dinheiro na praxe e na Queima, e dirigentes académicos e os seus amigos ganham bastante nestes dias. Há nepotismo, colaboração com empresas de bebidas, venda de publicidade, há mil e um negócios que nunca foram escrutinados. Já para não falar dos negócios ilegais como tráfico de droga que também tem aqui muitos fornecedores e muitos clientes.
Negócio, bebida, droga, sexo e vídeos como pano de fundo das “jabardices” naturais numa cultura do vazio e voyeurismo, que vai muito para além dos estudantes. Tudo isto conta com uma enorme complacência da sociedade, que só tem paralelo com a violência organizada das claques de futebol, trazidas por uma operação militar-policial para os estádios como um bando de mastins que precisam de açaimo. A sociedade, a começar pelos paizinhos e mãezinhas dos meninos e das meninas, fecha os olhos para este festival de abusos da praxe, que faz explodir qualquer lista de causas “politicamente correctas”.
O que é interessante é ver o habitual cortejo de intelectuais que explicam as claques, os carnavais e as saturnálias como uma natural catarse social, mas ao mesmo tempo se preocupam muito com a violência de género, com o racismo, com o sexismo, etc. Meus caros amigos, tirem daí o sentido: não há futebol sem violência, não há Queima nem praxe sem sexismo nem violência de género. Está inscrito no ADN da coisa. Se querem acabar com um têm que acabar com o outro. E convém não esquecer que ambos são um bom negócio.
Mas há pior e mais socialmente perverso. O pior é a hipocrisia gigantesca que acompanha os eventos dos escândalos: este ano, a circulação de uns vídeos na rede de raparigas alcoolizadas ou não a exibirem-se sexualmente para ganhar uns shots numas barracas. As barracas estão lá desde o início, as tabelas de actos por shot também, e duvido que, se não fossem os vídeos – tão inevitáveis hoje como a lei da gravidade –,​ não haveria escândalo. Houve por isso, diz pomposa a Federação Académica do Porto (FAP), que não sabe que estas coisas acontecem no seu quintal, “atentados à dignidade da pessoa humana”.
O comunicado da FAP e alguns comentários de especialistas são exemplos desta gigantesca hipocrisia. Diz a FAP que encerrou “temporariamente” três barracas por promoverem condutas que não são “os valores que estão imputados à Queima das Fitas do Porto”. Deixem-me rir. A FAP depois resvala, está aliás mais preocupada com os vídeos que lhe estragaram a festa do que com os actos: “Depois de observar a captação de imagens de comportamentos indevidos (na sua grande maioria até mesmo indignos)”, a FAP decidiu ainda “proibir que tais situações continuem a acontecer” e decidiu que “todas as barraquinhas que o fizerem serão devidamente sancionadas”.
E fez um acordo para haver um Ponto Lilás onde vão estar pessoas de diferentes organizações, prontas a “prevenir situações de violência sexual”, gerido por um conjunto de organizações muito típicas da galáxia “politicamente correcta”: Kosmicare, o Sexism Free Night, Uni+, Eir Porto e Associação Plano i. Isto chama-se fazer o mal e depois a caramunha, ou seja, dar para os dois peditórios antagónicos ao mesmo tempo.
Se os actos do escândalo sazonal deste ano fossem individuais – cada um faz o que quer desde que não incomode os outros –, não vou rasgar as vestes da moral. Querem beber, f... e exibir-se, para outros ganharem dinheiro, muito bem. Mas façam-no longe dos locais públicos e sem dinheiro público, e não obriguem os contribuintes a pagar os custos dos excessos.
Agora não me venham com a propaganda do “valor” deste tipo de actividades colectivas, porque sendo colectivas são uma questão social, económica, cultural e política. E aqui não está em causa qualquer moralismo, mas a defesa de alguma sanidade pública que as democracias e a liberdade precisam.
Colunista

COMENTÁRIOS
amora.bruegas, Tomar 12.05.2019 : Boa exposição..., reveladora de que o autor está ganhando juízo. Há uns 10-20 anos, se alguém dissesse o que ele diz, seria apelidada de reaccionária, fascista, retrógrada..., enfim, aqueles mimos com que a malta da sinistra (PS-BE), defensora do marxismo-cultural gosta de mimar quem é contra um ambiente de Sodoma e Gomorra.
João Carvalho, Coimbra 11.05.2019: Não há quem aguente os arruaceiros em que se tornaram os estudantes universitários. A cidade torna-se ainda mais insuportável nestas alturas. É a gritaria constante até às duas da manhã. É a festa no apartamento de cima que nunca mais termina. É o lixo na rua de manhã, com garrafas de plástico e copos espalhados pelo passeio. Mesmo para quem vive um pouco mais afastado dos recintos da queima é esta a realidade. Durante boa parte do ano, sobretudo durante a semana da queima...
Ricardo, Lisboa11.05.2019: Tradução: façam mas onde eu não vos veja e não me custem um cêntimo. Presumo que o Pacheco Pereira também se indigna quando os adeptos de um clube de futebol vão festejar para o Marquês ou Aliados com os contribuintes a suportar os custos da polícia e limpeza.


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