Mais uma vez me sirvo de uma expressão
do “Agildo”, do seu programa em reposição “Isto
é o Agildo”, desta vez para comentar o esclarecimento que nos vem dar o Primeiro
Ministro António Costa, a respeito dos SNS e interferência das PPP. Agildo
falha nos seus compromissos para com os vários intervenientes da engrenagem representada
e vai justificando os sucessivos erros do seu percurso de enviado para um
qualquer recado gorado, com um “posso esclarecer?” velhaco, seguido do “Então esclarecerei”, responsável e
delicado mas sucessivamente mais embrulhado, atestando, todavia, a
impecabilidade da sua inocência e velhacaria. Não é o mesmo caso, contudo, o PM
não está a esclarecer, sobre algo a que atribui mérito – o SNS e as PPP
reservadas estas para o caso em que aqueles falhem, julgo. Os comentadores
esclarecem melhor a questão.
Quanto ao PM, ele anda em campanha em
causa própria, daí o seu aparecimento em crónica, para esclarecimento das
nossas incompreensões, pois diz-se que os SNS não cumprem capazmente, por falta
de verba. Trata-se, pois, em meu entender, de um trunfo oportunista justificativo,
este seu artigo saído no Público, facilitador
da sua vitória eleitoral.
OPINIÃO
Não perder a oportunidade de avançar
O Governo defende e privilegia a regra
da gestão pública, assumindo que apenas pode recorrer à gestão privada em
circunstâncias excepcionais e devidamente fundamentadas, supletiva e
temporariamente.
ANTÓNIO COSTA
PÚBLICO, 1 DE MAIO DE 2019,
Comemoram-se
este ano os 40 anos do SNS.
A aprovação da Lei n.º 56/1979 concretizou o direito constitucional à saúde
através da criação de um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito.
Ao
longo destes 40 anos, o SNS afirmou-se como uma das principais conquistas
sociais de abril, cobrindo progressivamente mais território e mais serviços.
Nestes 40 anos o SNS resistiu à tentativa de revogação pelo Governo da AD, que
o Tribunal Constitucional inviabilizou, e à tentativa de descaracterização que
a Lei de Bases da Saúde (LBS) em vigor prossegue ao considerar o apoio do
Estado ao “desenvolvimento do sector privado da saúde (…) em concorrência com o
sector público” (Base II, n.º 1, al. f) da Lei de Bases da Saúde de 1990).
Não
se confunda o essencial com o acessório.
O principal objectivo de celebrar os 40 anos do SNS com a aprovação de uma nova
Lei de Bases é precisamente o de pôr termo a esta descaracterização, afirmando
claramente que o recurso à contratualização com o sector privado e social da
prestação de cuidados de saúde estão “condicionados à avaliação da sua
necessidade”.
Na
proposta de Lei de Bases da Saúde que o Governo apresentou na Assembleia da
República assumem-se três prioridades:
Em primeiro lugar, aprovar uma Lei de Bases da Saúde para o século XXI,
capaz de enfrentar os novos desafios da transversalidade da política de saúde,
que reafirme o princípio da saúde em todas as políticas, que aposte na
prevenção da doença e na inovação tecnológica, centrando-se nas pessoas e na
sua participação.
Em segundo lugar, é uma proposta de lei que fortalece, inova e
moderniza o SNS, promovendo a inovação e os níveis de autonomia, apostando na
maior responsabilização da gestão e criando condições para uma crescente
dedicação plena ao exercício de funções públicas.
Mas
é, principalmente, uma Lei que reforça o papel do Estado e clarifica as
relações deste com os sectores privado e social, afirmando a responsabilidade
do Estado no garante e na promoção da protecção da saúde através do SNS e
assumindo que a contratação de entidades terceiras é condicionada à avaliação
da necessidade. Com esta
clarificação, afastamo-nos dos princípios da concorrência entre público e
privado que a direita fez aprovar em 1990 e que diluíram nos últimos anos os
princípios estabelecidos na Constituição.
Depois
de meses de trabalho sobre a nova LBS e a poucos dias de se iniciar a discussão
das propostas dos partidos em sede de Comissão Parlamentar da Saúde, toda a
controvérsia parece agora reconduzida a um único tema: o da admissibilidade
das parcerias público-privadas (PPP) na gestão clínica dos estabelecimentos
prestadores de cuidados de saúde do SNS. Mas a redução de todo o debate
a este tema é errada por três motivos fundamentais:
Em primeiro lugar, porque diminui a importância do caminho que foi
possível fazer durante este processo e dos compromissos a que havíamos chegado
em temas fundamentais como “responsabilidade do Estado”, “descentralização
de competências”, “taxas moderadoras”, “apoio ao cuidador informal”.
Em segundo lugar, é fundamental ter a noção da dimensão do tema
que aqui estamos a debater. Num universo de 49 centros hospitalares e hospitais
do SNS, quatro são geridos em regime de PPP (o contrato do Hospital de Braga
termina no futuro 31 de agosto). Estes hospitais representaram, em 2018,
menos de 5% do total da despesa em saúde. É efectivamente uma pequena parte
do que todos os dias o SNS representa, mesmo na relação com o sector privado,
onde as convenções atingem os 11.,6%.
Por fim, porque também neste tema da gestão pública, há
compromissos alcançados que não podem ser desperdiçados. A proposta do Governo
já era clara ao estabelecer que o “a gestão dos estabelecimentos prestadores
de cuidados de saúde é pública”, apenas prevendo que ela pudesse ser supletiva
e temporariamente assegurada por contrato com entidades privadas ou do sector
social. Ou seja, o Governo defende e privilegia a regra da gestão
pública, assumindo que apenas pode recorrer à gestão privada em circunstâncias
excepcionais e devidamente fundamentadas, supletiva e temporariamente.
Esta
é aliás a posição coerente com o que se estabelece no programa de
Governo. Foi assim que o Governo não criou - nem pretende criar- novas
PPPs e das actuais 4 e únicas o ponto de situação é o seguinte:
A PPP de Braga terá gestão pública a partir de 1 de setembro; a PPP de
Cascais teve o seu
contrato prorrogado em janeiro de 2019 e está em desenvolvimento o concurso
para uma nova parceria; as PPP de Vila Franca de Xira e de Loures estão
em avaliação, no que toca ao desempenho do parceiro privado, e o Estado terá
que tomar uma decisão sobre a sua manutenção, respectivamente em maio de 2019 e
em janeiro de 2020.
Estão
em causa situações em que não seja possível garantir a gestão pública,
por exemplo, no caso em que não seja possível responder à internalização
simultânea dos quatro contratos de gestão actualmente existentes. Porque para
o Governo há um elemento que se sobrepõe a todos os outros: a decisão
de não renovar os actuais contratos de gestão em regime de PPP depende da
capacidade que o SNS tenha de, em cada momento concreto, gerir um determinado
hospital em condições pelo menos iguais, senão superiores, às que foram
asseguradas pelo parceiro privado. O direito dos cidadãos à saúde deve ser a
nossa prioridade.
Entretanto,
o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, em proposta de alteração,
procurou ainda densificar o sentido da proposta de lei, defendendo: a gestão
dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde é pública, podendo ser
supletiva e temporariamente assegurada por contrato de direito público, quando
devidamente fundamentada.
Os
processos negociais são de aproximação e de afastamento. E só estão concluídos
quando estão concluídos. Não sendo impossível uma redacção ainda mais clara
quanto à natureza pública da gestão.
Os
compromissos que já alcançámos no âmbito da Lei de Bases contribuem para um SNS
mais forte e resiliente, e essa seria a melhor forma de assinalar o seu 40.º
aniversário, com medidas como a da exclusão do pagamento de taxas moderadoras
nas prestações prescritas por profissional de saúde do SNS ou a criação de
mecanismos de dedicação plena ao exercício de funções públicas. Com uma lei progressista,
centrada nas pessoas e no seu acesso a cuidados de saúde de qualidade. Ninguém
nos perdoará se perdermos esta oportunidade, mantendo em vigor a lei que
PSD/CDS aprovaram em 1990.
Primeiro-ministro
COMENTÁRIOS
AndradeQB, Porto 01.05.2019:
Se eu tiver um pneumotórax, prefiro ter um hospital que
me atenda, do que uma promessa de garantia virtual. Atendendo ao argumento do
neocomunismo (a caminho do comunismo, mas só quando o Estado tiver condições de
correr com todos os privados da face da terra) do primeiro-ministro, o que me
vai esperar é a garantia no papel e a ausência de resposta na prática. Segundo
esse princípio neocomunista, já aplicado ao ensino, e agora à saúde, os
privados investem em infraestruturas e admitem trabalhadores para fazer de
backup ao Estado. No intervalo da requisição do Estado nas alturas que este
precisa, vai tudo para o congelador. Quando o Estado deixar de precisar
definitivamente, desliga-se a corrente das arcas, mas com as portas fechadas,
de maneira a acabar com essa subespécie de gente.
Fernando Costa, Lisboa 01.05.2019: Deve ser por isso que o primeiro ministro
que criou o SNS (Mario Soares) nunca utilizou os serviços do SNS, e sempre que foi
internado fê-lo nos hospitais “dos grandes grupos que fazem da saúde um
negócio”. Também era um coerente defensor do ensino público contra o privado,
mas fez fortuna com o elitista e privadíssimo Colégio Moderno, propriedade da
sua família. E a esquerda caladinha.....
Fernando Costa, Lisboa 01.05.2019
Que
eu saiba, a gestão “pública” é feita por indivíduos afectos ao PS
(hipoteticamente, alguns do PCP e BE), que são tudo entidades privadas. Pior:
são entidades privadas que não pagam impostos e legislam em causa própria.
A. Luís Fernandes Edmonton AB Canada 01.05.2019
: Fala do SNS, “forte e resiliente” mas
irresponsável. O A. Costa não nos diz que as nossas PPP, mal definidas e
geridas, são uma espécie de capitalismo sem risco pagas pelos impostos de todos,
tenham elas bons ou maus resultados! Infelizmente os “maus” têm sido a norma!
Assim, o nosso malabarista-mor embrulha-nos dizendo que o lado mau das PPP é da
culpa do PSD e o lado bom do PS, que quer reformar sem realmente nos dizer
como! E, à semelhança da burocracia irresponsável estatal, sem instituir
mecanismos independentes avaliadores das mesmas! Entretanto na sua função
principal e despercebida o seu governo comporta-se qual cavalo de Tróia da
China vendendo infra-estruturas, recursos, e o futuro de Portugal aos novos
patrões do mundo: o capitalismo do estado chinês!
mzeabranches,
01.05.2019 15:38: «Não perder a
oportunidade de avançar»... Efectivamente Portugal não 'perde a oportunidade de
avançar' rumo ao abismo, no que toca à sua língua! Insensível aos pareceres dos
especialistas, ao sentir dos cidadãos e ao desleixo notório em que se encontra
a nossa língua, este Governo mantém a imposição do AO90, sem inquietações, sem
experimentar a menor dúvida (na linha de Cavaco Silva), seguindo acriticamente
as opções de José Sócrates e de Passos Coelho! Devemos ser o único povo que
despreza a própria língua! 'Quousque tandem, abutere patientia nostra?'
Nuno Silva, 01.05.2019 12:51: As PPPs da saúde são como as outras PPPs, ou seja, são
buracos negros a prazo (e mais uma armadilha da direita, para acusar a esquerda
de despesista no futuro). Se houver alguns ganhos de eficiência e poupança
ocasionais na gestão privada, esta deve-se ao exclusivo cumprimento do
contrato, mandando os doentes problemáticos e caros para os hospitais públicos.
Além das regras de contratação promíscuas e de outros negócios por trás da
cortina. Por isso não estamos a falar de ideologia nas PPPs, mas sim de astronomia
(buracos negros).
Fernando Costa, Lisboa 01.05.2019: Então mas o cumprimento das contratualizações é a
base das USF, unidades de saúde familiar, criadas pelo PS, apoiadas pelo PCP e
BE, e até pelos outros partidos, altamente elogiadas e promovidas por toda a
esquerda como sendo o maior avanço nos cuidados de saúde primários, desde o
inicio do SNS. Se for ver a uma USF, SÓ se atendem os utentes contratualizados
em lista e SÓ no número de consultas contratualizadas para cada horário. Era
bom que falasse de assuntos que conheça.
Jorge Manuel da Rocha Barreira, V.N.Gaia01.05.2019:
Quando se pergunta a um cidadão a sua
opinião sobre este tema, a resposta que invariavelmente recebe é a de que
" o que eu quero é ter serviços de saúde capazes e na hora" O SNS
foi, de facto, uma das maiores conquistas de abril, mas ele tem que ser ajustado
em cada momento, à real situação do país. Quero com isto dizer que terá de ser
melhorado e complementado quando e com quem isso for possível. Agora quanto às
PPP acho que são espúrias neste âmbito.
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