O CDS foi magia, em tempo próprio, dos
que se sentiam sem arrimo, inesperadamente chutados de espaços e convicções que
jamais sairão da memória. Hoje, o CDS já nem tem razão de ser, bem evocado por Rui Ramos e comentado com pertinência por alguns
leitores. Desde o momento que se demarcaram do PSD, abandonando Passos Coelho à sua sorte, nem CDS nem PSD merecem
mais do que piedade. E tristeza. Mas esta, todos os partidos a merecem, mau
grado a saliência de alguns. Merecemo-la todos, de resto.
Sim, altura de reler Camões:
Alegres campos, verdes arvoredos,
claras e frescas águas de
cristal,
que em vós os debuxais ao
natural,
discorrendo da altura dos
rochedos;
Silvestres montes, ásperos
penedos,
compostos em concerto desigual,
sabei que, sem licença de meu
mal,
Já não podeis fazer meus olhos
ledos.
E pois me já não vedes como
vistes,
Não me alegrem verduras
deleitosas,
Nem águas que correndo alegres
vêm.
Semearei em vós lembranças
tristes,
Regando-vos com lágrimas
saudosas,
E nascerão saudades de meu bem.
O
partido que não sabe o que lhe aconteceu /premium
O CDS fixou-se em André Ventura como se
a concorrência do Chega tivesse sido a razão do seu descalabro eleitoral. Não
foi, e o CDS precisa de um líder que lhe faça esquecer Ventura.
RUI RAMOS, Colunista do
Observador
OBSERVADOR, 24 jan 2020
Para
os dirigentes do CDS, os resultados eleitorais do ano passado continuam a ser
um enigma. Não os esperavam, apesar das sondagens, e ainda não os perceberam,
apesar de todos os debates. Como é hábito da classe política portuguesa, só
lhes ocorre, para dar conta do colapso, questões de procedimento e de
comunicação (não se souberam explicar, ou os seus eleitores não os
compreenderam, etc.).
De
facto, o problema da direcção do CDS foi ter tentado, nos últimos cinco anos,
fazer tudo bem – de acordo com o que, no regime, se achava bem. Em 2015,
quando a geringonça tomou o poder, a oligarquia recomendou aos antigos partidos
do governo que se distanciassem de Passos Coelho e “virassem a página”, e o CDS
fez isso com muita aplicação. Em 2017, o sucesso autárquico em Lisboa e a saída
de Passos levaram-no por outro caminho: afinal, ia ser o grande partido da
direita, e o mais agressivo interlocutor de António Costa.
Tudo,
de acordo com a sabedoria média do regime, estava certo. Tal como estavam
certas as passadeiras pintadas em arco-íris em Arroios, para provar que era
moderno, ou o apoio parlamentar a Mário Nogueira, para demonstrar que era
“social”. O que não estava talvez certo era a soma de tudo isso: o
oportunismo era demasiado evidente. E até agora, nada mudou: os
candidatos continuam a tentar ser tudo, como quem pudesse comprar todos os
bilhetes para garantir que ganha a lotaria: todos falam de “direita”, mas todos
querem “dialogar” com o PS; todos se propõem ser muito definidos, mas todos
desejam integrar as mais variadas correntes; etc.
Nada
disto é novo, e talvez não seja evitável. O CDS foi sempre assim desde o
primeiro dia. Que podia fazer o mais pequeno, o mais recente e o mais
perseguido dos grandes partidos do regime, a não ser tentar agarrar-se a tudo o
que lhe parecia flutuar? Logo em 1976, Jorge Gaspar e Nuno Vitorino, na sua
análise das eleições para a Assembleia Constituinte de 1975, diagnosticaram-lhe
um problema: ao contrário do PCP em relação ao PS, a votação do CDS
funcionava num sistema de vasos comunicantes com o PSD. Nenhum partido conheceu
tantos altos e baixos. Já muitas vezes pareceu que estava para acabar (o que
deve animar os militantes de hoje). Por isso, o CDS experimentou todas as
estratégias e ideologias: governou com o PS e com o PSD, foi democrata cristão
com Adriano Moreira e liberal com Lucas Pires, europeísta com Freitas do Amaral
e nacionalista com Manuel Monteiro, etc. As suas convicções consistiram,
frequentemente, numa tentativa de adivinhar para onde soprava o vento.
É provável que a relevância do CDS passe
sobretudo pela possibilidade de uma maioria de direita. Não depende, por essa
razão, só de si próprio, uma vez que é o PSD que tem sido o motor dessas
maiorias. No entanto, não é isso que o parece inquietar. O CDS fixou-se em
André Ventura como se a concorrência do Chega tivesse sido a razão do seu
descalabro eleitoral. Em Outubro, porém, o CDS perdeu 13 deputados, e o Chega
só elegeu um: não foi o Chega que herdou os deputados do CDS. Mas o CDS fala de
Ventura como se tivesse sido assim. É talvez a sua maneira de racionalizar o
que lhe aconteceu.
Ao tomar o Chega como referência, para
imitar ou para se demarcar, o CDS corre um risco, que é o de fazer de Ventura o
líder de facto do CDS, e parecer finalmente irrelevante e incompreensível. Por
isso, antes de mais, o CDS precisa de um líder que sossegue o partido. João
Almeida representa a continuidade e não conseguirá, por essa razão, dissipar o
presente nervosismo. Francisco Rodrigues
dos Santos, através da renovação do pessoal dirigente (é fundamentalmente isso,
aliás, que está em causa), parece o mais capaz de fazer esquecer Ventura e dar
ao CDS tempo para respirar.
COMENTÁRIOS:
Geraldo Sem Pavor: Julgo que RR não está correto na análise que faz no seu artigo. Não pela
descrição histórica dos acontecimentos, que são de facto corretos, mas pela
análise dos mesmos. O assalto aos ativos pela nova classe dirigente não foi de
facto diferente do que aconteceu noutros países africanos após a independência,
e é similar ao registado no médio Oriente, onde "sheiks" familiarmente
ligados aos líderes que lutaram pela independência dos respetivos territórios
acabaram por se apoderar das riquezas dos seus países. Convém lembrar que a
Europa passou por algo parecido na idade média (rei e senhores feudais) e que
ainda hoje num país como Portugal, onde os sistemas do seu regime democrático
são ainda frágeis, o capital dos cidadãos e espoliado com impostos pelo PS
(MPLA português) e alguns sobas como Sócrates e Salgado continuam as suas
vidinhas normais. Por tudo isto, não julgo que o tema esteja relacionado com
descolonização mas apenas com a "apropriação primitiva de capital"
para citar um sujeito barbudo.
Maria Emília Ranhada Santos: O CDS apareceu a concorrer às eleições vazio de
conteúdo político específico de partido de Centro ou direita. Foi isso que o
fez deslizar tanto! As democracias para o serem tem de ter partidos de direita
e de esquerda, ou não o são! Os portugueses da direita, não acharam que o CDS
estivesse realmente empenhado em defender as suas questões e os seus problema,
politico-sociais, mais urgentes. Perderam a confiança na liderança! O Ventura
está a somar votos, porque ele não tem "vergonha" de ser de direita.
Ventura aparece-nos a nós portugueses que não o conhecíamos, como alguém
carismático, que não gagueja a intervir quando é preciso, que não é
politicamente correto, que se apresenta com transparência, e mais, que é capaz
de ser humilde suficiente para aceitar os seus erros! E ele vai ganhar muito
mais, porque é deste tipo de pessoas que os portugueses esperavam.
José Gaspar: O problema do CDS é o mesmo do PPD, PS e de todos os restantes partidos, os
eleitores já não acreditam nem confiam em nenhum, todos eles fogem de dizer aos
eleitores o que tem de ser feito para que Portugal comece a criar riqueza que
pague o que deve e dar bem-estar ao povo, querem saber que propostas e como as
vão aplicar e aí é que porca torce o rabo nenhum tem ideia do que fazer
por isso passam a campanha a atacarem-se uns aos outros, os partidos precisam
de se renovar e dizer aos eleitores o que tem de ser feito, mas como dizia o
João Almeida do CDS se dissermos a verdade não ganhamos eleições.
Felipe Azyral: A Coligação Ventura Destra formada pelo Chega, Liberal, Aliança, CDS, pode
ir acima dos Vinte por Cento se tiver a Coragem de se Formar.....!!!!!
Manuel Magalhães: O problema do CDS foi durante os 40 anos de democracia nunca se soube
afirmar com clareza como um partido de direita e ter andado sempre aos zigue
zangues entre o centro e o centro direita deixando a direita real e democrática
completamente órfã e na sua maioria sem votar, ora toda essa gente neste
momento vê uma esperança nos novos partidos IL e Chega, a culpa foi apenas do
CDS...
Utilizador removido: Concordo e defendi que o descalabro eleitoral do CDS não se deveu ao
Chega. É porém certo que o Chega, em grande medida, tornará o CDS, enquanto
coisa que quiz ser tudo e não é nada, e que quando no poder adoptou como
política efectiva o socialismo, o homossexualismo e o globalismo, uma
excentricidade e uma irrelevância. Os actuais situacionistas do CDS, como o
Almeida e o Ávila, devem abraçar, no PS ou na IL, a sua condição genética de
meros progressistas-socialistas, tolerantes do mercado. O papel útil à nação
que gente não socialista, actualmente no CDS, pode desempenhar, resume-se a
concorrer para o fortalecimento, ao nível de infraestrutura e de quadros, de um
verdadeiro espaço de direita em Portugal. O CDS está morto. Deveremos ser-lhe
para sempre gratos por ter funcionado como porto de abrigo temporário à resistência
possível ao totalitarismo socialista-marxista.
Carlitos Sousa: O CDS fixou-se em André Ventura É
verdade, o eleitorado do CDS, PSD, muitos abstencionistas, e até socialistas
desagradados com as geringonças. André
Ventura pode ser a colher que vai dar volta à sopa azeda. Partidos como o CDS e PSD, que já estiveram
algumas vezes no poder, e nunca aplicaram ( com desculpas diversas... ) a
ideologia de direita: REDUÇÃO DRÁSTICA de impostos, REDUÇÃO DRÁSTICA do
Estado confinando-o às funções de soberania. Defesa das Liberdades
Individuais e da Iniciativa Privada.
O CDS/PSD sempre fizeram uma política
ligeiramente idêntica à dos socialistas. Nenhum destes partidos se coloca à
direita, sendo um de CENTRO (CDS) e outro com Rui Rio a afirmar-se de Centro
Esquerda.
Carlitos Sousa >Paulo Guerra: O Estado de Salazar não serve de referência pois não
passava de uma ditadura com protecção de grupos económicos. Mesmo assim, após o 25/abril
assistiu-se às nacionalizações apressadas, ao desmantelamento do tecido
empresarial nacional, e à entrada do Estado em sectores financeiros,
empresariais, e até de pequeno comércio! O Estado tornou-se “um monstro”
em Despesa, em entidades, em funcionários, que precisa de uma Receita enorme de
Impostos para ser mantido. Custa caro, presta maus serviços ( como se vê na saúde
e educação ), e os portugueses continuam a pagar em dobro. Pagam os impostos para o Estado
e quando estão doentes vão à saúde privada. Quer comparar, compare por
exemplo com a Irlanda.
Paulo Guerra > Carlitos Sousa: O país não tem problema nenhum
com o Estado. Nem ficou todo a masturbar-se com a tanga da TINA e da
bancarrota como aqui no OBS. Então o empréstimo foi todo direitinho para os
bancos e o Estado é que levou o país à bancarrota? O que levou ao empréstimo
foi a divida privada e a especulação dos mercados.
Maria Múrias: Óptimo, Rui Ramos virou-se para o CDS. Quer dizer que o CDS vai recuperar
estrondosamente .
Pedro Dragone: "O partido que não sabe o que
lhe aconteceu" Não é apenas o
CDS que não sabe o que lhe aconteceu. É toda uma direita Passista, onde se
inclui o Rui Ramos, que não sabe o que lhe aconteceu!!! E o que aconteceu ao
CDS foi o mesmo que aconteceu ao PSD (embora neste caso em menor grau graças a
Rui Rio): foram centenas de milhar de votantes destes dois partidos que fugiram
para a esquerda, para a abstenção e para os novos partidos da direita em resultado dos exageros austeritários que
praticaram durante o governo da Troika. E depois disso, se houve partido
que fez uma oposição dura (e com estilo trauliteiro!) ao Governo da Geringonça,
um estilo que era defendido pelo Montenegro no PSD e pela alt-right do
Observador, foi precisamente o CDS!
Compreende agora o Rui Ramos o que aconteceu ao CDS e
à direita em geral? Compreende ou ainda precisa que lhe façam um desenho?
Francis Ferrer: Tem razão o articulista. Essa preocupação com o Chega, é estar a descer a
um nível muito baixo. Mas os elogios da imprensa de direita às prestações do
Chega, assim empurram aquelas pobres cabeças…
“O partido que não sabe o que lhe aconteceu”?
Pois, com conselheiros como o Rui Ramos, é natural que ainda andem à procura do
rabo, enquanto ao lado Rui Rio faz o caminho, caminhando, apesar dos ataques
dos comentaristas de direita localizados na capital do império. Ainda não
perceberem que foram vítimas da herança do Passismo, que encostou os partidos
da PAF à direita, onde não há grande espaço em Portugal . Insistir na
movimentação em direcção ao gueto de direita, faz muito bem às descargas
biliares dos comentadores de direita, mas só leva ao abstencionismo dos
eleitores moderados do centro-direita, que são quem pode eventualmente vir a
dar uma vitória a uma coligação de direita .
Ana Ferreira: Ao contrário do que RR pretende, aplicando psicologia invertida, o CDS sabe
que o seu eleitorado fugiu do estilo regateiro de Cristas de "cão que
ladra não morde", para o de pitbull que antes de ladrar morde. Faz bem
João Almeida em demarcar-se de um e de outro, na demanda de um partido
conservador de Direita digno desse nome!
José Broa: Mais um exemplo de que RR, vive num mundo paralelo (Provavelmente em 1960). O CDS está moribundo e só tem uma de duas
hipóteses: Ou se levanta, ou se extingue (sendo esta a hipótese mais provável).
O CDS só se reerguerá, quando abdicar do "Portismo, da beatice, dos betos
e assumir uma linha política clara de direita, sem esqueletos no armário.
Olhando para os candidatos ... não me cheira. João Almeida é mais do mesmo, o
Chicão é a betice, o estereotipo do menino do "papá", que ganhará
algum (pouco), público ... do costume. A solução, não é combater o Chega, mas
encostarem-se ao IL, no que ao posicionamento politica e comunicação diz respeito.
De mim (qualquer um deles) não terá nenhum voto, mas será um caminho.
Luis Jorge: O problema do CDS é o mesmo que o do PSD, embora em medidas diferentes:
foram atrás do PS (cada vez mais à esquerda) e perderam o apoio dos seus
eleitores. Quem vota (à esquerda, centro ou à direita), vota no original e não
em cópias baratas. Agora estão descredibilizados, e quem procurou alternativas,
só voltará a votar no CDS se lhe for reconquistada a confiança. E pelo andar da
carruagem, só o conseguirão se os novos partidos no parlamento se espalharem ao
comprido.
Carlos Quartel: A queda tem razão de ser. Vítima da manobra de Costa, em vez de cimentar a
unidade com Passos, denunciando a burla ao eleitor e insistindo na narrativa da
indecência e falta de escrúpulos do PS, passou rapidamente ao oportunismo de
pensar ter dimensão para substituir o PSD, como maior partido da área não
socialista. A candidatura de Cristas
a Lisboa foi a declaração de guerra e o início do descalabro. A ilusão dos 15%
levou a altas pensamentos, mas houve milhares que não lhe perdoaram. Foi-se a
credibilidade, ficou o manobrismo e o oportunismo.
E, no entanto, é o partido da família política mais definida, com larga
experiência de governação na Europa, onde os seus parentes estão no poder. Saber se está morto ou se tem ainda sopro, é a
questão.
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