Estamos na época dos contentores, deve
ser isso o que pensa o ministro da Educação – se é que ele pensa - com a
conivência do ministro Costa, de igual capacidade pensante, dada a
permissividade (entre outras, graves, citadas) na questão da docência, em que qualquer um pode dar uma qualquer
disciplina, sobretudo de português, decididamente desvalorizado desde o
atropelamento da língua pelo AO, para além do facto de as escolas servirem acima de tudo
como lugares de manutenção dos filhos dos trabalhadores, e os professores tipo
pastores de rebanhos, embora menos ordeiros, estes rebanhos, do que os das
serras, aliás, em vias de extinção, esses. E ninguém se perturba, fazendo os
cidadãos no activo também parte dos rebanhos que o governo comanda. Os
professores de 60 anos irão para a prateleira dos “outros trabalhos”, sabendo ardilosamente,
o ministro, quanto, aos sessenta anos, os professores ainda estão de posse das
suas competências docentes, impedindo-os abusivamente, de continuarem nas suas
funções específicas. Tudo isto repugna e se permite. Estamos na época dos
contentores, e não me refiro aos da reciclagem, mas aos da vala comum. É claro
que não há quaisquer perspectivas para um tal “sítio” assim. Apenas para os que
dele se aproveitam com descaro.
OPINIÃO
Assim vamos
Eis a ideologia grunha para a Educação
do século XXI: que todos passem sabendo o que souberem, desde que a escola os
guarde a tempo inteiro, para que os pais trabalhem cada vez mais, ganhando cada
vez menos.
SANTANA CASTILHO
PÚBLICO, 22 de Janeiro de 2020
1.O ministro da Educação esteve mais de cinco horas no Parlamento,
qual louvaminhas de vacuidades, a defender “o mais robusto” orçamento que já
apresentou. Em síntese, diz o Governo que vai rever o modelo de recrutamento de
professores, estudar a hipótese de substituir aulas por
outras actividades para os que tenham mais de 60 anos,
considerar a criação de incentivos para determinados grupos de recrutamento,
alargar ao 2.º ciclo do ensino básico a malfadada “escola a tempo inteiro”, rever
a portaria de rácios funcionários/alunos e promover uma nova geração de “contratos locais de segurança”.
O
que se pode dizer sobre o orçamento para a Educação varia segundo o que
tomarmos por comparação. O seu valor tem aumentado ano após ano do governo PS,
depois de uma década em que foi reduzido em 12%? Sim, mas ainda está aquém
da expressão que tinha antes da troika e, por referência ao PIB, os
três últimos orçamentos são os piores desde que aderimos ao euro. Admitiram-se
cerca de 5500 novos funcionários? Sim! Mas esses devem ser comparados com os 24.000
que saíram de 2011 a 2015.
Da
lista vasta de promessas não cumpridas pelo governo do PS, este orçamento
retoma a universalização da educação pré-escolar a partir dos
três anos. Porém, pelo andar das negociações, não me
surpreenderá que medidas protectoras de cães e gatos se sobreponham a medidas
protectoras de crianças que teimam em não nascer.
2. Agora,
aulas de português podem ser dadas por professores de inglês, francês,
alemão ou espanhol, de geografia por professores de história e de
informática não importa por quem, desde que tenha frequentado uma qualquer
acção de formação sobre a matéria. Ora
o problema não se resolve com uma “nota” manifestamente ilegal e
desqualificante da classe e da escola pública. Em vez de criarem condições para
que profissionais com habilitação (que os há) aceitem os lugares vagos, os
responsáveis puxaram pela cabeça e actuaram segundo a ideologia grunha para a
Educação do século XXI (que todos passem sabendo o que souberem, desde que a
escola os guarde a tempo inteiro, para que os pais trabalhem cada vez mais,
ganhando cada vez menos).
3. A
imprensa afanou-se a noticiar que 45.000 docentes foram promovidos em
2019 e que mais de 6000 atingiram o topo da carreira,
graças ao milagre do descongelamento e recuperação de tempo de serviço.
Providencial ênfase dada a promoções que, tivesse a lei vigente sido aplicada,
se deveriam ter verificado em 2011, mas servem agora para branquear a
provocação de uma proposta de aumentos de 0,3%, para salários estagnados há dez
anos.
4. António
Lacerda, secretário de Estado da Saúde, receitou chá e bolos para combater os
agressores dos médicos. Do entender meloso do governante depreende-se mesmo que
se as paredes das salas de espera dos hospitais forem pintadas de rosa, talvez
se diluam os níveis de tensão. Razão tem o governante para reflectir com
tamanha profundidade, porque professores, médicos, enfermeiros e assistentes
operacionais viraram sacos de pancada de agressores que ficam livres, com
simples termo de identidade e residência. Entretanto, a mulher que agrediu uma procuradora e uma juíza foi
imediatamente presa e assim continuará até ser julgada. Será que este exemplo
passará a servir de modelo para situações similares de outros exercícios
profissionais? Será que a mão pesada que se ergueu para proteger a integridade
física de juízes e procuradores passará a proteger o ventre das professoras
grávidas agredidas no seu local de trabalho?
5. Na reabertura
da oficina da Comboios de Portugal, António Costa disse ter o sonho
de passarmos a fazer parte do clube dos produtores de comboios e que, para tal,
o país tem de ser “persistente e não voltar a cometer erros que no passado
foram cometidos”. Ao sonho, o primeiro-ministro parece ter acrescentado o
remorso, que poderia ter explicitado melhor. É que a
Sorefame foi totalmente extinta em 2001, era António Costa ministro no Governo
de António Guterres. Para os
mais novos, recordo que a Sorefame foi uma das maiores empresas portuguesas
que, há mais de 40 anos, nos fez entrar no clube dos construtores de comboios.
Professor
do ensino superior
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