quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Não admira



Estamos na época dos contentores, deve ser isso o que pensa o ministro da Educação – se é que ele pensa - com a conivência do ministro Costa, de igual capacidade pensante, dada a permissividade (entre outras, graves, citadas) na questão da docência, em que qualquer um pode dar uma qualquer disciplina, sobretudo de português, decididamente desvalorizado desde o atropelamento da língua pelo AO, para além do facto de as escolas servirem acima de tudo como lugares de manutenção dos filhos dos trabalhadores, e os professores tipo pastores de rebanhos, embora menos ordeiros, estes rebanhos, do que os das serras, aliás, em vias de extinção, esses. E ninguém se perturba, fazendo os cidadãos no activo também parte dos rebanhos que o governo comanda. Os professores de 60 anos irão para a prateleira dos “outros trabalhos”, sabendo ardilosamente, o ministro, quanto, aos sessenta anos, os professores ainda estão de posse das suas competências docentes, impedindo-os abusivamente, de continuarem nas suas funções específicas. Tudo isto repugna e se permite. Estamos na época dos contentores, e não me refiro aos da reciclagem, mas aos da vala comum. É claro que não há quaisquer perspectivas para um tal “sítio” assim. Apenas para os que dele se aproveitam com descaro.

OPINIÃO
Assim vamos
Eis a ideologia grunha para a Educação do século XXI: que todos passem sabendo o que souberem, desde que a escola os guarde a tempo inteiro, para que os pais trabalhem cada vez mais, ganhando cada vez menos.
SANTANA CASTILHO
PÚBLICO, 22 de Janeiro de 2020
1.O ministro da Educação esteve mais de cinco horas no Parlamento, qual louvaminhas de vacuidades, a defender “o mais robusto” orçamento que já apresentou. Em síntese, diz o Governo que vai rever o modelo de recrutamento de professores, estudar a hipótese de substituir aulas por outras actividades para os que tenham mais de 60 anos, considerar a criação de incentivos para determinados grupos de recrutamento, alargar ao 2.º ciclo do ensino básico a malfadada “escola a tempo inteiro”, rever a portaria de rácios funcionários/alunos e promover uma nova geração de “contratos locais de segurança”.
O que se pode dizer sobre o orçamento para a Educação varia segundo o que tomarmos por comparação. O seu valor tem aumentado ano após ano do governo PS, depois de uma década em que foi reduzido em 12%? Sim, mas ainda está aquém da expressão que tinha antes da troika e, por referência ao PIB, os três últimos orçamentos são os piores desde que aderimos ao euro. Admitiram-se cerca de 5500 novos funcionários? Sim! Mas esses devem ser comparados com os 24.000 que saíram de 2011 a 2015.
Da lista vasta de promessas não cumpridas pelo governo do PS, este orçamento retoma a universalização da educação pré-escolar a partir dos três anos. Porém, pelo andar das negociações, não me surpreenderá que medidas protectoras de cães e gatos se sobreponham a medidas protectoras de crianças que teimam em não nascer.
2. Agora, aulas de português podem ser dadas por professores de inglês, francês, alemão ou espanhol, de geografia por professores de história e de informática não importa por quem, desde que tenha frequentado uma qualquer acção de formação sobre a matéria. Ora o problema não se resolve com uma “nota” manifestamente ilegal e desqualificante da classe e da escola pública. Em vez de criarem condições para que profissionais com habilitação (que os há) aceitem os lugares vagos, os responsáveis puxaram pela cabeça e actuaram segundo a ideologia grunha para a Educação do século XXI (que todos passem sabendo o que souberem, desde que a escola os guarde a tempo inteiro, para que os pais trabalhem cada vez mais, ganhando cada vez menos).
3. A imprensa afanou-se a noticiar que 45.000 docentes foram promovidos em 2019 e que mais de 6000 atingiram o topo da carreira, graças ao milagre do descongelamento e recuperação de tempo de serviço. Providencial ênfase dada a promoções que, tivesse a lei vigente sido aplicada, se deveriam ter verificado em 2011, mas servem agora para branquear a provocação de uma proposta de aumentos de 0,3%, para salários estagnados há dez anos.
4. António Lacerda, secretário de Estado da Saúde, receitou chá e bolos para combater os agressores dos médicos. Do entender meloso do governante depreende-se mesmo que se as paredes das salas de espera dos hospitais forem pintadas de rosa, talvez se diluam os níveis de tensão. Razão tem o governante para reflectir com tamanha profundidade, porque professores, médicos, enfermeiros e assistentes operacionais viraram sacos de pancada de agressores que ficam livres, com simples termo de identidade e residência. Entretanto, a mulher que agrediu uma procuradora e uma juíza foi imediatamente presa e assim continuará até ser julgada. Será que este exemplo passará a servir de modelo para situações similares de outros exercícios profissionais? Será que a mão pesada que se ergueu para proteger a integridade física de juízes e procuradores passará a proteger o ventre das professoras grávidas agredidas no seu local de trabalho?
5. Na reabertura da oficina da Comboios de Portugal, António Costa disse ter o sonho de passarmos a fazer parte do clube dos produtores de comboios e que, para tal, o país tem de ser “persistente e não voltar a cometer erros que no passado foram cometidos”. Ao sonho, o primeiro-ministro parece ter acrescentado o remorso, que poderia ter explicitado melhor. É que a Sorefame foi totalmente extinta em 2001, era António Costa ministro no Governo de António Guterres. Para os mais novos, recordo que a Sorefame foi uma das maiores empresas portuguesas que, há mais de 40 anos, nos fez entrar no clube dos construtores de comboios.
Professor do ensino superior
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