Já o disse Álvaro
de Campos em “Tabacaria”. Um bom refúgio para quem se enerva.
Ano novo na república
das bananas /premium
Os actos valem mais do que discursos. Pouco importa que, agora, Marcelo
saúde a diáspora e os que “sentem que nem sempre são lembrados”. Nas
legislativas, nem ele nem ninguém esperou pelos seus votos.
ALEXANDRE HOMEM CRISTO
OBSERVADOR02 jan 2020
A notícia surgiu no dia 26, logo a seguir ao Natal: chegaram só a 5 de Dezembro
os boletins eleitorais enviados aos Portugueses emigrantes no México. São mais de dois meses de atraso, visto que
as eleições legislativas tiveram lugar a 6 de Outubro e, para permitir o voto
dos cidadãos portugueses a residir naquele país, era necessário que os boletins
tivessem chegado ainda alguns dias antes. Imagine-se o que seria se, por
exemplo, os cidadãos residentes na cidade de Portalegre fossem impedidos de
votar por falta de boletins eleitorais – seria uma indignidade tão grande que
não se concebe as autoridades públicas ignorarem tal incompetência castradora
de cidadania democrática. Mas, tendo sido no México e mesmo não se
apresentando como caso único (também tudo se atrasou na África do Sul e, por
exemplo, houve movimentos cidadãos no Reino Unido a denunciar falhas), a
única coisa que se ouviu foi silêncio. A menos que me tenha escapado, nestes
últimos dias nenhum partido político emitiu uma comunicação a condenar o
sucedido, a pedir explicações ou a exigir responsabilidades políticas. Já
ninguém quer saber.
Sim, eu sei que estou a fazer chover no molhado. As semanas que
sucederam às eleições de 6 de Outubro haviam sido esclarecedoras sobre a
indiferença com que o regime desconsidera o voto dos portugueses emigrantes e,
muito em particular, as próprias regras institucionais. Recorde-se que, no
período pós-eleitoral, os procedimentos para a tomada de posse do novo governo
foram iniciados sem se ter esperado pelos votos dos portugueses no estrangeiro.
O Presidente da República ouviu todos os partidos com deputados eleitos
(excluindo por sua iniciativa a possibilidade teórica de o partido Aliança
eleger um deputado nos círculos da diáspora) e indigitou António Costa para
formar governo antes (sublinhe-se: antes!) de todos os votos estarem contados
(votaram 157 mil emigrantes) e de os 4 deputados da diáspora estarem eleitos.
Isto, por si só, é completamente inaceitável. Como escrevi então:
“se isto fosse futebol, seria como entregar a taça antes de soar o apito final
— por mais golos de vantagem que se tenha, os jogos só acabam ao minuto 90. Ora,
como isto é ainda menos sério do que futebol, o mínimo a reconhecer está na
mensagem subjacente: para o regime, há votos que contam menos do que outros — o
que equivale a dizer que há portugueses de primeira e portugueses de segunda”.
Passaram três meses desde as eleições legislativas e os relatos de
uma incompetência incrível continuam a chegar. Mas não houve qualquer censura
política da sociedade civil aos seus representantes: todos, a começar por
Presidência da República e Governo, pisaram os trâmites formais de uma
república sem gerar contestação proporcional. E também não houve apuramento de
responsabilidades. A culpa, dizem-nos, foi dos correios dos outros países,
como se os direitos de cidadania dependessem do carteiro e não, por exemplo, de
embaixadas e consulados de porta aberta no dia eleitoral, para votos
presenciais – no México, quem lá se deslocou bateu com o nariz numa porta
fechada. Entretanto, o relato de insuficiências e incompetências é tão longo
que custa aceitar que, no governo ou nas autoridades públicas que gerem
logisticamente o acto eleitoral, nenhuma cabeça tenha rolado. Correu mal e
milhares de portugueses não puderam votar? Paciência – ninguém no regime
chorará por eles e, de resto, em Portugal, raras são as vezes em que, sem ruído
político envolvido, alguém assume responsabilidades por algo que falhe.
Foi assim que acabou 2019. E os actos valem mais do que os discursos. Por isso, pouco importa
que, para iniciar 2020, o Presidente da República saúde com particular
emoção a diáspora portuguesa, “os que mais estão longe de nós” e que “sentem
que nem sempre são lembrados”. Há meros três meses, não o foram pelo Estado, que foi incompetente na
salvaguarda do seu direito eleitoral, nem pelo próprio Marcelo, que não esperou
pela contagem dos 157 mil votos da diáspora para indigitar o primeiro-ministro.
Tal como não importa que Marcelo aponte para 2020 como o ano para corresponder
às “expectativas dos portugueses”, porque essas expectativas só
podem estar cada vez mais baixas. A começar pelos que “mais estão longe” e que
só pedem o mínimo: que os seus votos contem, que as autoridades públicas tratem
os portugueses por igual, que cumpram os procedimentos formais de uma república
e que respeitem a cidadania e as instituições democráticas. Parece que, mesmo
sendo o mínimo, ainda é pedir muito.
COMENTÁRIOS
Joao Mar: Por trás das selfies, beijinhos, populismo,
sabedoria encenada e do apoio massivo da comunicação social que o leva em
ombros está um presidente que não cumpre a função presidencial. Um PR que deu
cobertura e colo a um governo que atirou com Portugal para os últimos lugares
da Europa a nivel de progresso e sustentabilidade económica.
Miguel Fonseca: Sinto, por este episódio denunciado pelo AHdeC e
tantos outros causados pelos xuxas nos últimos "tempos" uma enorme
vergonha de ser Português. Votei há muitos anos atrás nos xuxas e passados
alguns meses senti uma grande revolta e vergonha. Não votei mais, não voto nem
votarei jamais neles de novo... Mas votar noutro partido, em que nenhum (e
muito menos o Martelo presidente) denunciou uma vergonha destas, só se for para
utilizar um voto de penalização para afastar de vez os xuxas da m...d...a....
que têm feito ao País e que nos levarão á miséria...
António Patrício
Ferreira: Vergonhoso... Embora o
PS e o presidente da Assembleia da República considerem esta palavra
proibida.....
Maria Augusta Martins: Só devia votar quem está cá! quem estiver fora
"racha lenha"!
Jack Martin: Não é bem assim como AHC diz. Se fosse um governo de
direita a fazer o que estes fizeram ao voto dos emigrantes, ainda hoje
estávamos a ouvir a quase totalidade da nossa comunicação social, histérica e
aos berros nas TVs, a criticarem o governo. Enfim...
Joaquim Moreira: O que isto prova, sobretudo, é a incompetência do
“governo” e do ministro Dono Disto Tudo. O tal, que dos empresários disse mal.
Mas prova também, que se estão nas tintas para os votos, quando já não são
precisos ou até já não lhes convém. Como é caso dos votos da abstenção, cuja
maioria poderia alterar qualquer votação. Assim, quantos menos votarem melhor.
Até porque os que votam, eles sabem bem quem são. São a maioria, que eles
servem no dia a dia. São os votos que lhes interessam ter para manterem poder.
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