quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

Conjecturas políticas



Apaziguadora de receios sobre a continuidade da União Europeia com a saída do Reino Unido, e a criação de projectos que retomam programas económicos antigos, segundo visão optimista de Salles da Fonseca. Mais assustadora a de Carlos Gaspar, trazendo à baila o espectro de uma nova potência alemã em união económica com a USA, causadora de estragos nessa União.
Que a “Bola de Cristal” de Salles da Fonseca seja mais certeira nos prognósticos, é o que se deseja, se, entretanto, um qualquer “corona vírus” irónico e sádico não trouxer achegas desfeiteadoras dos projectos humanos.
 HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 29.01.20
BREXIT
AT LAST BUT NOT THE END OF US
Hoje, 29 de Janeiro de 2020, formalizou-se a saída do Reino Unido da União Europeia.
E agora? -  perguntam os ansiosos.
A minha resposta divide-se em duas partes:
Liberto do processo do BREXIT, vai Boris Johnson finalmente começar a governar e nós vamos finalmente poder avaliá-lo como homem de Estado ou como
Muito provavelmente, o Reino Unido vai regressar à EFTA (Associação Europeia de Comércio Livre) cuja fundação ele próprio promoveu quando De Gaulle lhe vetou a entrada na então CEE sendo que a EFTA e a CEE/UE há muito que têm um acordo de comércio livre e, portanto, sob o ponto de vista comercial, tudo continuará a fluir sem barreiras aduaneiras naquilo que se chama o EEE – Espaço Económico Europeu.
Cá ficamos à espreita.
Henrique Salles da Fonseca
COMENTÁRIOS:
Helena Salazar Antunes Morais gosta disto
 Adriano Miranda Lima  29.01.2020 : Estou em inteira concordância.
 Francisco G. de Amorim  29.01.2020 : Tudo como dantes no quartel de Abrantes

II- ANÁLISE: Os usos da vertigem
Resignado, Peter Sloterdijk defende que “a mediocridade salvará a Europa”. Pelo contrário, só o bom uso da vertigem pode salvar a Europa.
PÚBLICO, 30 de Janeiro de 2020
No dia 8 de Novembro de 2016, o Embaixador da França em Washington, Gérard Araud, não resistiu a enviar um tweet que resume melhor do que qualquer despacho diplomático o significado dessa data fatídica: “Depois doexit’, depois de Trump, tudo é possível: um mundo está a desmoronar-se diante dos nossos olhos. Vertigem!”.
Com efeito, o referendo sobre a saída da Grã-Bretanha da União Europeia e a eleição do Presidente Donald Trump marcam uma viragem radical na política europeia e ocidental que torna obrigatória uma revisão das prioridades estratégicas de todos os Estados - pequenos ou grandes, atlânticos ou continentais - da NATO e da União Europeia.
Desde logo, a derrota de Hillary Clinton comprometeu a mediação norte-americana entre Londres e Bruxelas, indispensável para evitar a crise prolongada e os sucessivos bloqueios que dominaram as conversações entre o Reino Unido e a União Europeia. Pelo contrário, Donald Trump, o primeiro Presidente dos Estados Unidos que considera a União Europeia como um adversário hostil, defendeu um acordo alternativo entre Londres e Washington para dividir os aliados europeus num momento crítico.
Por outro lado, Trump quis pôr em causa a vinculação dos Estados Unidos à cláusula de defesa colectiva da NATO. Nesse contexto, pela primeira vez, os aliados europeus deixaram de poder contar incondicionalmente com a garantia estratégica norte-americana. Nesse quadro inédito de incerteza, que justifica a frase do Presidente Emmanuel Macron sobre a “morte cerebral” da NATO, as potências europeias têm de preparar um dissuasor alternativo que possa garantir a defesa da Europa.
Por último, a chanceler Angela Merkel, para lá de constatar que os aliados europeus já não podem contar com os Estados Unidos como no passado, escolheu o imobilismo como a melhor resposta à mudança dos equilíbrios na União Europeia e na NATO. A Alemanha está refém dos hábitos de dependência económica e militar dos Estados Unidos e não consegue ir mais longe do que a defesa retórica do status quo: a sua “Aliança para o Multilateralismo” é um sinal de impotência política.
O retraimento norte-americano, a saída britânica e a paralisia alemã criam um impasse perigoso para todos os Estados da NATO e da União Europeia, que reclama uma estratégia alternativa: a França e o Reino Unido são indispensáveis para a definir.
A convergência necessária entre França e o Reino Unido é ditada pelas novas circunstâncias. Em primeiro lugar, sem o Reino Unido, a Alemanha pode impor a sua hegemonia na Europa continental e subalternizar a França: em alternativa, Paris precisa de fortalecer os seus laços com Londres no quadro da NATO para contrabalançar Berlim na União Europeia. Em segundo lugar, se o Reino Unido não quiser passar a ser um “junior partner” dos Estados Unidos, precisa de uma segunda “relação especial” com a França para garantir a sua posição como uma potência relevante na política europeia. Em terceiro lugar, a França e o Reino Unido, as duas potências nucleares europeias, são as únicas que podem dar forma a um dissuasor europeu com um mínimo de credibilidade e, perante a incerteza sobre o futuro da política norte-americana, as suas capacidades estratégicas e militares tornam-se decisivas na política europeia. Em quarto lugar, a restauração da Entente Cordiale abre caminho a uma nova divisão do trabalho entre a França e a Alemanha, assente no reconhecimento de que, na ausência da garantia incondicional dos Estados Unidos, as responsabilidades de defesa são tão importantes como as responsabilidades económicas para a União Europeia.
Portugal antecipou essa mudança estratégica desde 2017, quando os responsáveis políticos passaram a defender a formação de um “partido atlântico” na política europeia, para responder à saída do Reino Unido - o mais velho aliado na mais antiga das alianças - e conter os perigos da “continentalização” da União Europeia - uma forma elegante de referir o peso excessivo da Alemanha. Bem entendido, para Portugal a dupla filiação na NATO e na União Europeia é essencial e a possibilidade de ser obrigado a escolher entre a dimensão atlântica e a dimensão europeia da sua política externa é um pesadelo.
O novo “partido atlântico” só pode existir se a França e o Reino Unido o quiserem formar, mas as duas grandes potências europeias precisam de aliados. Os seus melhores aliados são os outros Estados históricos europeus, que têm séculos de existência como Estados independentes e uma longa experiência da diplomacia e da política internacional, necessárias para reordenar o espaço atlântico, incluindo o Atlântico Sul, a África e a América Latina, e estruturar as novas parcerias com as potências asiáticas que podem alargar a aliança das democracias na defesa da ordem liberal.
Naturalmente, Portugal tem o seu lugar nessa coligação dos Estados históricos, ao lado da França e do Reino Unido, da Espanha, da Holanda ou da Suécia, unidos pela prudência e pelo interesse comum em preservar a comunidade transatlântica, enquadrar a potência central e consolidar a integração europeia e ocidental. Pelo contrário, Portugal não tem um lugar digno da sua história na periferia de um império federativo, numa União Europeia que quer ser uma “Grande Suíça” neutral e equidistante dos Estados Unidos, da China e da Rússia.
Resignado, Peter Sloterdijk defende que “a mediocridade salvará a Europa”. Pelo contrário, só o bom uso da vertigem pode salvar a Europa.
Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI-UNL)

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