A questão dos hematomas. Mas o certo é
que ela voltará, a questão, com outros actores, como refrão glosando os nossos
casos frequentes. Mas desta vez, os adeptos de JMT foram em maior número, apesar
da má vontade tantas vezes manifesta, contra ele e as suas franquezas nem
sempre em moda. Sinal de exaspero?
OPINIÃO
Diferenças entre um polícia e um criminoso
Em
casos como este, um polícia e um cidadão infractor não estão em patamares
equivalentes. A relação não é igualitária.
JOÃO
MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 25 de Janeiro de 2020
Vamos
cá ver se a gente se entende: no dia em que me apanharem numa conversa de
Benfica-Sporting em torno da violência policial,
mergulhem-me em alcatrão, decorem-me com penas e expulsem-me da cidade. É
para mim absolutamente inconcebível que a discussão sobre os acontecimentos da
Amadora se resuma a esta lógica de pré-escolar: quem costuma votar em partidos
de direita tem de ser a favor da polícia, independentemente daquilo que a
polícia faça; quem costuma votar em partidos de esquerda tem de ser a favor de
pessoas de pele negra, independentemente daquilo que a pessoa faça.
Em
bom rigor, eu não sou de direita, nem de esquerda – sou liberal. E sabem o
que é que os liberais mais apreciam? Indivíduos. Seres únicos dotados de
personalidade, liberdade e responsabilidade sobre os seus actos. Não há cá
manadas. Não há cá claques. Não há cá grupos identitários. Há gente singular,
que independentemente da sua cor de pele ou profissão, umas vezes comporta-se
de forma exemplar, outras vezes faz asneira. Fico sempre abismado com a
facilidade com que se fazem generalizações sobre os mais variados assuntos sem
perder um segundo a olhar para o caso particular. Como se fosse impossível, e
contra a lei da gravitação universal, que um dia um polícia possa bater num
cidadão de forma completamente justificada – e ser aplaudido por isso –, e que noutro
dia o faça de forma completamente injustificada – e ser criticado por isso.
Lamento
muito se o meu último texto desiludiu quem habitualmente concorda comigo, mas
deixem-me desiludir mais um pouco. É por isso que a profissão de
polícia é difícil. O polícia tem o monopólio da violência e o direito O argumento dee que o polícia talvez tenha exagerado
um bocadinho, mas que a culpa é da senhora, que desrespeitou a
autoridade e deu dentadas, pressupõe uma reciprocidade de direitos e deveres
que não existe. Em casos como este, um polícia e um cidadão infractor não estão
em patamares equivalentes. A relação não é igualitária. A lógica
não é a de olho por olho, dente por dente, dentada por hematoma. É por isso que
a profissão de polícia é difícil. O polícia tem o monopólio da violência e o
direito de a exercer em nome do Estado. Não é coisa pouca. Com esse direito,
vem a necessidade de utilizar o bom-senso e a força mínima no cumprimento do
seu dever. Olhando para a cara da mulher da Amadora,
custa acreditar que tenha sido isso que sucedeu.
Ao
escrever isto, já sei que muita gente vai mostrar-me o currículo da senhora,
que não é flor que se cheire, que tem um passado de violência, e que, segundo
li no Correio da Manhã, até o marido já se terá queixado em tempos à
polícia de ter sido por ela ameaçado com uma faca. Tudo isto pode perfeitamente
ser verdade. Ela pode ter insultado o motorista no autocarro, mordido o polícia
na rua e chinado o marido em casa. Não importa. Se a senhora foi esmurrada já
depois de algemada, dentro do carro da
polícia, o seu cadastro interessa zero, e a duração dos murros também. Pode até
ser pedófila e potencial homicida do Papa Francisco – quem
acredita num Estado de Direito não pode aceitar que a violência policial seja
exercida sobre quem está preso. Ponto.
Deixem-me regressar ao início: não transformemos isto num combate de
claques, onde em vez de pararmos para analisar o que se passou com os
instrumentos da lógica elementar, cavamos trincheiras para proteger “os
nossos”. Não há “nossos”. Há pessoas concretas, que devem ser responsabilizadas
pelos seus actos. Nada aqui tem a ver com opções políticas. É uma mera questão
de decoro e de civilidade.
Jornalista
COMENTÁRIOS:
viana, 26.01.2020: Já venho tarde
aqui comentar, mas não quero deixar de apoiar a 100 por cento este texto do
JMT, com quem muitas vezes discordo. Como muito bem diz JMT, um liberal genuíno
é alguém que desconfia "por defeito" do exercício da autoridade de
Estado e por isso defende a necessidade de "contrapesos" entre as
instituições de Estado. Indo mais longe ainda temos os libertários, ou
anarquistas, para quem o Estado nunca poderá ser um instrumento utilizado em
prol do bem comum, porque sempre capturado por interesses particulares.
Portanto, nunca um liberal acreditaria na palavra dum polícia, agente de um dos
principais braços da autoridade do Estado, porque sim.
Darktin,26.01.2020: Contudo, andamos
todos pela rama e não temos a coragem de sermos honestos. E se fosse uma mãe
branca, a sofrer o "mata leão" à frente da sua filha 8 anos por causa
de uma situação onde ainda a parte da confusão inicial não está definida? O
passe gratuito esquecido é assim tão importante para merecer a atenção de um
polícia? Para mim só o início já era mal. Depois aparece a história que o chão
foi o responsável pelos hematomas desta mãe. Alguém aqui acredita que foi o
chão a fazer aqueles hematomas? Se foi o chão, porque depois as fotos das
mordidelas enviadas por aquele gajo que faltou ao trabalho por 83 dias? Enfim,
de facto há muito ainda por saber, mas não somos lorpas.
PdellaF, 26.01.2020: O problema não é
se a senhora tem direitos ou não como qualquer outro cidadão ou se a polícia
deve ter contenção e critério no uso da força. O problema é fazer um juízo
sobre o assunto baseado na pouca e deficiente informação disponível e daí
condenar uns ou outros. Desde o início que este assunto me pareceu mal contado.
Não me fiei nem na narrativa da senhora, nem na dos polícias. Hoje, no DN, há
uma notícia de jornalistas que fizeram o seu trabalho e parece que as versões
têm contradições gritantes. Há material vídeo e outros elementos em
investigação.
Novo Humbo: 26.01.2020: Ninguém está a dizer que é igualitária, a discussão. O
que dizemos alguns (...eu, pelo menos...) é que, em termos de avanço cívico, o
tratar imperioso da inadmissível brutalidade policial não é, nem deve ser,
impeditivo do referenciar atitudes inapropriadas, do responsabilizar das outras
partes por comportamentos anti-sociais. Se um filho seu atravessar uma rua fora
da passadeira e for atropelado por um bêbedo, a justa necessidade que terá de
ver o prevaricador punido irá impedi-lo de lhe chamar a atenção para a
inconsciência cometida, uma vez feita a recuperação e passado o susto? O nunca
dizer que não se deve insultar polícias ou apedrejar os seus carros é sempre
pura cobardia, simples populismo ou mera manipulação jornalística.
Darktin, 26.01.2020: Para mim o
problema denotado numa acção, é que é sempre desculpado por um conjunto de
critérios de corporativistas. Por esta ordem pensamento, nunca haverá erros ou
culpados. Há sempre uma atenuante para os abusos cometidos. Nem que tenha sido
noutro bairro e feito por outra pessoa. Portanto, é justiça ou revanche?
Novo Humbo, 26.01.2020 : Na essência e no que diz respeito ao
impedimento de progressão positiva cívica e social, o corporativismo é um
cancro tão grave como a acefalia ideológica bem-pensante. O dirigente sindical
que deslocadamente defende um associado seu claramente prevaricador é tão
pernicioso como a jornalista militante que remete para racismo um caso de
incivilidade, violência e abuso simplesmente para alimentar a sua agenda.
Aqueles que queremos uma sociedade verdadeiramente mais justa, integrante e que
prospere em paz devemos oferecer igual combate a primeiros e a segundos. Na
ausência desse combate, o dirigente fomenta a comprovada agenda do assalto das
forças de segurança pela extrema direito e a jornalista alimenta a espiral de
ódio da qual houve um exemplo subsequente a este episódio.
Nuno Silva, 25.01.2020: "Desde que não
batam na minha filha, irmã ou mãe (na avó até eu batia), por mim tudo
bem.", Venturas bolsonareiros deste mundo...
Manuel 25.01.2020: Caro JMT, repare bem nas suas expressões
em crônicas consecutivas: "fico sempre abismado com a facilidade com que
se fazem generalizações (...) sem perder um segundo a analisar o caso
particular ". Agora: "a polícia está para certos cidadãos (...)
tendem a cair à sua aproximação ". Respeito muito a sua lucidez e
capacidade de interpretar a sociedade, mas discordo de si num ponto fundamental:
a polícia, num estado democrático e de liberdade, só conseguirá assegurar a
ordem pública se forem residuais os casos de delinquência, crimalidade. Os cidadãos
não tem o poder da polícia, mas tem do seu lado o número. Têm deveres, de
cumprir as regras, sob pena de entrarmos no caos. Se 50% dos cidadãos
resolverem usar o transporte público sem passe, e nada for feito, os outros 50%
vão fazer o mesmo
viana, 26.01.2020: Já venho tarde aqui comentar, mas não quero deixar de
apoiar a 100 por cento este texto do JMT, com quem muitas vezes discordo. Como
muito bem diz JMT, um liberal genuíno é alguém que desconfia "por
defeito" do exercício da autoridade de Estado e por isso defende a
necessidade de "contrapesos" entre as instituições de Estado. Indo
mais longe ainda temos os libertários, ou anarquistas, para quem o Estado nunca
poderá ser um instrumento utilizado em prol do bem comum, porque sempre
capturado por interesses particulares. Portanto, nunca um liberal acreditaria
na palavra dum polícia, agente de um dos principais braços da autoridade do
Estado, porque sim.
Darktin 26.01.2020: Contudo, andamos
todos pela rama e não temos a coragem de ser sermos honesto. E se fosse uma mãe
branca, a sofrer o "mata leão" a frente da sua filha 8 anos por causa
de uma situação onde ainda a parte da confusão inicial não está definida? O
passe gratuito esquecido é assim tão importante para merecer a atenção de um
polícia? Para mim só o início já era mal. Depois aparece a historia que o chão
foi o responsável pelos hematomas desta mãe. Alguém aqui acredita que foi o
chão a fazer aqueles hematomas? Se foi o chão, porque depois as fotos das
mordidelas enviadas por aquele gajo que faltou ao trabalho por 83 dias? Enfim,
de facto há muito ainda por saber, mas não somos lorpas.
PdellaF, 26.01.2020 : O problema não é se a senhora tem
direitos ou não como qualquer outro cidadão ou se a polícia deve ter contenção
e critério no uso da força. O problema é fazer um juízo sobre o assunto baseado
na pouca e deficiente informação disponível e daí condenar uns ou outros. Desde
o início que este assunto me pareceu mal contado. Não me fiei nem na narrativa
da senhora, nem na dos polícias. Hoje, no DN, há uma notícia de jornalistas que
fizeram o seu trabalho e parece que as versões têm contradições gritantes. Há
material vídeo e outros elementos em investigação.
Novo Humbo, 26.01.2020: Ninguém está a dizer que é igualitária, a discussão. O
que dizemos alguns (...eu, pelo menos...) é que, em termos de avanço cívico, o
tratar imperioso da inadmissível brutalidade policial não é, nem deve ser,
impeditivo do referenciar atitudes inapropriadas, do responsabilizar das outras
partes por comportamentos anti-sociais. Se um filho seu atravessar uma rua fora
da passadeira e for atropelado por um bêbedo, a justa necessidade que terá de
ver o prevaricador punido irá impedi-lo de lhe chamar a atenção para a
inconsciência cometida, uma vez feita a recuperação e passado o susto? O nunca
dizer que não se deve insultar polícias ou apedrejar os seus carros é sempre
pura cobardia, simples populismo ou mera manipulação jornalística.
Darktin, 26.01.2020: Para mim o
problema denotado numa acção, é que é sempre desculpado por um conjunto de
critérios de corporativistas. Por esta ordem pensamento, nunca haverá erros ou
culpados. Há sempre uma atenuante para os abusos cometidos. Nem que tenha sido
noutro bairro e feito por outra pessoa. Portanto, é justiça ou revanche?
Novo Humbo, 26.01.2020: Na essência e no que diz respeito ao impedimento de
progressão positiva cívica e social, o corporativismo é um cancro tão grave
como a acefalia ideológica bem-pensante. O dirigente sindical que
deslocadamente defende um associado seu claramente prevaricador é tão
pernicioso como a jornalista militante que remete para racismo um caso de
incivilidade, violência e abuso simplesmente para alimentar a sua agenda.
Aqueles que queremos uma sociedade verdadeiramente mais justa, integrante e que
prospere em paz devemos oferecer igual combate a primeiros e a segundos. Na
ausência desse combate, o dirigente fomenta a comprovada agenda do assalto das
forças de segurança pela extrema direito e a jornalista alimenta a espiral de
ódio da qual houve um exemplo subsequente a este episódio.
Mario Coimbra, 25.01.2020 :Muito bem JMT. Na
íntegra. Perfeito
Nuno Silva, 25.01.2020 : "Desde que não
batam na minha filha, irmã ou mãe (na avó até eu batia), por mim tudo
bem.", Venturas bolsonareiros deste mundo...
Manuel, 25.01.2020 15:50: Caro JMT, repare
bem nas suas expressões em crónicas consecutivas: "fico sempre abismado
com a facilidade com que se fazem generalizações (...) sem perder um segundo a
analisar o caso particular ". Agora: "a polícia está para certos
cidadãos (...) tendem a cair à sua aproximação ". Respeito muito a sua
lucidez e capacidade de interpretar a sociedade, mas discordo de si num ponto
fundamental: a polícia, num estado democrático e de liberdade, só conseguirá
assegurar a ordem pública se forem residuais os casos de delinquência,
crimalidade. Os cidadãos não tem o poder da policia, mas tem do seu lado o
número. Têm deveres, de cumprir as regras, sob pena de entrarmos no caos.Se 50%
dos cidadãos resolverem usar o transporte público sem passe, e nada for feito,
os putros 50% vão fazer o mesmo
JORGE COSTA, 25.01.2020: Obrigado JMT por
mais um artigo lúcido, objectivo e directo ao tema em questão. A partidarite
ainda impera e a Esquerda sempre se quis apoderar do "decoro
Nacional". Tudo isto é mau, tudo isto é péssimo. Vergonha.
AM, 25.01.2020: Portanto a esquerda tem é que estar caladinha e deixar
que seja a direita (e, sobretudo a extrema mais vocal) a definir os contornos do "decoro
Nacional"... ainda bem que existe um JMT, auto-rotulado de direita
(liberal), para dar conforto moral ao Jorge Costa. Assim sim.
Umaizum, 25.01.2020: Aqui está uma crónica clara e certeira. Infelizmente,
custa a muita gente entender qual o papel da polícia na sociedade e a diferença
entre uma agressão feita por um cidadão e por um polícia.
ana cristina, 25.01.2020: Exactamente. É
incrível o que isso demonstra sobre a nossa falta de maturidade em termos de
cidadania!!!!
AM, 25.01.2020: Um longo caminho a percorrer, com vítimas pelo meio.
Há pouco tempo, conversando com um polícia trintão acerca de direitos de
cidadania, dizia-lhe que um polícia não pode pedir a identificação a um cidadão
sem uma razão justificativa relevante . Resposta do polícia: ai isso é que
pode, quem é que o impede? Estou a falar de um polícia "acessível",
de bom trato, com quem se pode conversar... o ensino e a aprendizagem da
cidadania tem falhado em toda a linha, Escola da Polícia incluída (ou sobretudo
aí).
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