segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

Para acabar



A questão dos hematomas. Mas o certo é que ela voltará, a questão, com outros actores, como refrão glosando os nossos casos frequentes. Mas desta vez, os adeptos de JMT foram em maior número, apesar da má vontade tantas vezes manifesta, contra ele e as suas franquezas nem sempre em moda. Sinal de exaspero?
OPINIÃO
Diferenças entre um polícia e um criminoso
Em casos como este, um polícia e um cidadão infractor não estão em patamares equivalentes. A relação não é igualitária.
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 25 de Janeiro de 2020
Vamos cá ver se a gente se entende: no dia em que me apanharem numa conversa de Benfica-Sporting em torno da violência policial, mergulhem-me em alcatrão, decorem-me com penas e expulsem-me da cidade. É para mim absolutamente inconcebível que a discussão sobre os acontecimentos da Amadora se resuma a esta lógica de pré-escolar: quem costuma votar em partidos de direita tem de ser a favor da polícia, independentemente daquilo que a polícia faça; quem costuma votar em partidos de esquerda tem de ser a favor de pessoas de pele negra, independentemente daquilo que a pessoa faça.
Em bom rigor, eu não sou de direita, nem de esquerda – sou liberal. E sabem o que é que os liberais mais apreciam? Indivíduos. Seres únicos dotados de personalidade, liberdade e responsabilidade sobre os seus actos. Não há cá manadas. Não há cá claques. Não há cá grupos identitários. Há gente singular, que independentemente da sua cor de pele ou profissão, umas vezes comporta-se de forma exemplar, outras vezes faz asneira. Fico sempre abismado com a facilidade com que se fazem generalizações sobre os mais variados assuntos sem perder um segundo a olhar para o caso particular. Como se fosse impossível, e contra a lei da gravitação universal, que um dia um polícia possa bater num cidadão de forma completamente justificada – e ser aplaudido por isso –, e que noutro dia o faça de forma completamente injustificada – e ser criticado por isso.
Lamento muito se o meu último texto desiludiu quem habitualmente concorda comigo, mas deixem-me desiludir mais um pouco.  É por isso que a profissão de polícia é difícil. O polícia tem o monopólio da violência e o direito O argumento dee que o polícia talvez tenha exagerado um bocadinho, mas que a culpa é da senhora, que desrespeitou a autoridade e deu dentadas, pressupõe uma reciprocidade de direitos e deveres que não existe. Em casos como este, um polícia e um cidadão infractor não estão em patamares equivalentes. A relação não é igualitária.  A lógica não é a de olho por olho, dente por dente, dentada por hematoma. É por isso que a profissão de polícia é difícil. O polícia tem o monopólio da violência e o direito de a exercer em nome do Estado. Não é coisa pouca. Com esse direito, vem a necessidade de utilizar o bom-senso e a força mínima no cumprimento do seu dever. Olhando para a cara da mulher da Amadora, custa acreditar que tenha sido isso que sucedeu.
Ao escrever isto, já sei que muita gente vai mostrar-me o currículo da senhora, que não é flor que se cheire, que tem um passado de violência, e que, segundo li no Correio da Manhã, até o marido já se terá queixado em tempos à polícia de ter sido por ela ameaçado com uma faca. Tudo isto pode perfeitamente ser verdade. Ela pode ter insultado o motorista no autocarro, mordido o polícia na rua e chinado o marido em casa. Não importa. Se a senhora foi esmurrada já depois de algemada, dentro do carro da polícia, o seu cadastro interessa zero, e a duração dos murros também. Pode até ser pedófila e potencial homicida do Papa Francisco – quem acredita num Estado de Direito não pode aceitar que a violência policial seja exercida sobre quem está preso. Ponto.
Deixem-me regressar ao início: não transformemos isto num combate de claques, onde em vez de pararmos para analisar o que se passou com os instrumentos da lógica elementar, cavamos trincheiras para proteger “os nossos”. Não há “nossos”. Há pessoas concretas, que devem ser responsabilizadas pelos seus actos. Nada aqui tem a ver com opções políticas. É uma mera questão de decoro e de civilidade.
Jornalista
COMENTÁRIOS:
viana, 26.01.2020: Já venho tarde aqui comentar, mas não quero deixar de apoiar a 100 por cento este texto do JMT, com quem muitas vezes discordo. Como muito bem diz JMT, um liberal genuíno é alguém que desconfia "por defeito" do exercício da autoridade de Estado e por isso defende a necessidade de "contrapesos" entre as instituições de Estado. Indo mais longe ainda temos os libertários, ou anarquistas, para quem o Estado nunca poderá ser um instrumento utilizado em prol do bem comum, porque sempre capturado por interesses particulares. Portanto, nunca um liberal acreditaria na palavra dum polícia, agente de um dos principais braços da autoridade do Estado, porque sim.
Darktin,26.01.2020: Contudo, andamos todos pela rama e não temos a coragem de sermos honestos. E se fosse uma mãe branca, a sofrer o "mata leão" à frente da sua filha 8 anos por causa de uma situação onde ainda a parte da confusão inicial não está definida? O passe gratuito esquecido é assim tão importante para merecer a atenção de um polícia? Para mim só o início já era mal. Depois aparece a história que o chão foi o responsável pelos hematomas desta mãe. Alguém aqui acredita que foi o chão a fazer aqueles hematomas? Se foi o chão, porque depois as fotos das mordidelas enviadas por aquele gajo que faltou ao trabalho por 83 dias? Enfim, de facto há muito ainda por saber, mas não somos lorpas.
PdellaF, 26.01.2020: O problema não é se a senhora tem direitos ou não como qualquer outro cidadão ou se a polícia deve ter contenção e critério no uso da força. O problema é fazer um juízo sobre o assunto baseado na pouca e deficiente informação disponível e daí condenar uns ou outros. Desde o início que este assunto me pareceu mal contado. Não me fiei nem na narrativa da senhora, nem na dos polícias. Hoje, no DN, há uma notícia de jornalistas que fizeram o seu trabalho e parece que as versões têm contradições gritantes. Há material vídeo e outros elementos em investigação.
Novo Humbo:  26.01.2020:  Ninguém está a dizer que é igualitária, a discussão. O que dizemos alguns (...eu, pelo menos...) é que, em termos de avanço cívico, o tratar imperioso da inadmissível brutalidade policial não é, nem deve ser, impeditivo do referenciar atitudes inapropriadas, do responsabilizar das outras partes por comportamentos anti-sociais. Se um filho seu atravessar uma rua fora da passadeira e for atropelado por um bêbedo, a justa necessidade que terá de ver o prevaricador punido irá impedi-lo de lhe chamar a atenção para a inconsciência cometida, uma vez feita a recuperação e passado o susto? O nunca dizer que não se deve insultar polícias ou apedrejar os seus carros é sempre pura cobardia, simples populismo ou mera manipulação jornalística.
Darktin,  26.01.2020: Para mim o problema denotado numa acção, é que é sempre desculpado por um conjunto de critérios de corporativistas. Por esta ordem pensamento, nunca haverá erros ou culpados. Há sempre uma atenuante para os abusos cometidos. Nem que tenha sido noutro bairro e feito por outra pessoa. Portanto, é justiça ou revanche?
Novo Humbo, 26.01.2020 :  Na essência e no que diz respeito ao impedimento de progressão positiva cívica e social, o corporativismo é um cancro tão grave como a acefalia ideológica bem-pensante. O dirigente sindical que deslocadamente defende um associado seu claramente prevaricador é tão pernicioso como a jornalista militante que remete para racismo um caso de incivilidade, violência e abuso simplesmente para alimentar a sua agenda. Aqueles que queremos uma sociedade verdadeiramente mais justa, integrante e que prospere em paz devemos oferecer igual combate a primeiros e a segundos. Na ausência desse combate, o dirigente fomenta a comprovada agenda do assalto das forças de segurança pela extrema direito e a jornalista alimenta a espiral de ódio da qual houve um exemplo subsequente a este episódio.
Mario Coimbra, 25.01.2020: Muito bem JMT. Na integra. Perfeito
Carlos Soares 25.01.2020 : Muito bem JMT. E gostei muito da definição de liberal.
Nuno Silva, 25.01.2020: "Desde que não batam na minha filha, irmã ou mãe (na avó até eu batia), por mim tudo bem.", Venturas bolsonareiros deste mundo...
Manuel 25.01.2020:  Caro JMT, repare bem nas suas expressões em crônicas consecutivas: "fico sempre abismado com a facilidade com que se fazem generalizações (...) sem perder um segundo a analisar o caso particular ". Agora: "a polícia está para certos cidadãos (...) tendem a cair à sua aproximação ". Respeito muito a sua lucidez e capacidade de interpretar a sociedade, mas discordo de si num ponto fundamental: a polícia, num estado democrático e de liberdade, só conseguirá assegurar a ordem pública se forem residuais os casos de delinquência, crimalidade. Os cidadãos não tem o poder da polícia, mas tem do seu lado o número. Têm deveres, de cumprir as regras, sob pena de entrarmos no caos. Se 50% dos cidadãos resolverem usar o transporte público sem passe, e nada for feito, os outros 50% vão fazer o mesmo
viana,  26.01.2020:  Já venho tarde aqui comentar, mas não quero deixar de apoiar a 100 por cento este texto do JMT, com quem muitas vezes discordo. Como muito bem diz JMT, um liberal genuíno é alguém que desconfia "por defeito" do exercício da autoridade de Estado e por isso defende a necessidade de "contrapesos" entre as instituições de Estado. Indo mais longe ainda temos os libertários, ou anarquistas, para quem o Estado nunca poderá ser um instrumento utilizado em prol do bem comum, porque sempre capturado por interesses particulares. Portanto, nunca um liberal acreditaria na palavra dum polícia, agente de um dos principais braços da autoridade do Estado, porque sim.
Darktin 26.01.2020: Contudo, andamos todos pela rama e não temos a coragem de ser sermos honesto. E se fosse uma mãe branca, a sofrer o "mata leão" a frente da sua filha 8 anos por causa de uma situação onde ainda a parte da confusão inicial não está definida? O passe gratuito esquecido é assim tão importante para merecer a atenção de um polícia? Para mim só o início já era mal. Depois aparece a historia que o chão foi o responsável pelos hematomas desta mãe. Alguém aqui acredita que foi o chão a fazer aqueles hematomas? Se foi o chão, porque depois as fotos das mordidelas enviadas por aquele gajo que faltou ao trabalho por 83 dias? Enfim, de facto há muito ainda por saber, mas não somos lorpas.
PdellaF, 26.01.2020 :  O problema não é se a senhora tem direitos ou não como qualquer outro cidadão ou se a polícia deve ter contenção e critério no uso da força. O problema é fazer um juízo sobre o assunto baseado na pouca e deficiente informação disponível e daí condenar uns ou outros. Desde o início que este assunto me pareceu mal contado. Não me fiei nem na narrativa da senhora, nem na dos polícias. Hoje, no DN, há uma notícia de jornalistas que fizeram o seu trabalho e parece que as versões têm contradições gritantes. Há material vídeo e outros elementos em investigação.
Novo Humbo, 26.01.2020:  Ninguém está a dizer que é igualitária, a discussão. O que dizemos alguns (...eu, pelo menos...) é que, em termos de avanço cívico, o tratar imperioso da inadmissível brutalidade policial não é, nem deve ser, impeditivo do referenciar atitudes inapropriadas, do responsabilizar das outras partes por comportamentos anti-sociais. Se um filho seu atravessar uma rua fora da passadeira e for atropelado por um bêbedo, a justa necessidade que terá de ver o prevaricador punido irá impedi-lo de lhe chamar a atenção para a inconsciência cometida, uma vez feita a recuperação e passado o susto? O nunca dizer que não se deve insultar polícias ou apedrejar os seus carros é sempre pura cobardia, simples populismo ou mera manipulação jornalística.
Darktin, 26.01.2020: Para mim o problema denotado numa acção, é que é sempre desculpado por um conjunto de critérios de corporativistas. Por esta ordem pensamento, nunca haverá erros ou culpados. Há sempre uma atenuante para os abusos cometidos. Nem que tenha sido noutro bairro e feito por outra pessoa. Portanto, é justiça ou revanche?
Novo Humbo, 26.01.2020:  Na essência e no que diz respeito ao impedimento de progressão positiva cívica e social, o corporativismo é um cancro tão grave como a acefalia ideológica bem-pensante. O dirigente sindical que deslocadamente defende um associado seu claramente prevaricador é tão pernicioso como a jornalista militante que remete para racismo um caso de incivilidade, violência e abuso simplesmente para alimentar a sua agenda. Aqueles que queremos uma sociedade verdadeiramente mais justa, integrante e que prospere em paz devemos oferecer igual combate a primeiros e a segundos. Na ausência desse combate, o dirigente fomenta a comprovada agenda do assalto das forças de segurança pela extrema direito e a jornalista alimenta a espiral de ódio da qual houve um exemplo subsequente a este episódio.
Mario Coimbra,  25.01.2020 :Muito bem JMT. Na íntegra. Perfeito
Carlos Soares, 25.01.2020:  Muito bem JMT. E gostei muito da definição de liberal.
Nuno Silva, 25.01.2020 : "Desde que não batam na minha filha, irmã ou mãe (na avó até eu batia), por mim tudo bem.", Venturas bolsonareiros deste mundo...
Manuel, 25.01.2020 15:50: Caro JMT, repare bem nas suas expressões em crónicas consecutivas: "fico sempre abismado com a facilidade com que se fazem generalizações (...) sem perder um segundo a analisar o caso particular ". Agora: "a polícia está para certos cidadãos (...) tendem a cair à sua aproximação ". Respeito muito a sua lucidez e capacidade de interpretar a sociedade, mas discordo de si num ponto fundamental: a polícia, num estado democrático e de liberdade, só conseguirá assegurar a ordem pública se forem residuais os casos de delinquência, crimalidade. Os cidadãos não tem o poder da policia, mas tem do seu lado o número. Têm deveres, de cumprir as regras, sob pena de entrarmos no caos.Se 50% dos cidadãos resolverem usar o transporte público sem passe, e nada for feito, os putros 50% vão fazer o mesmo
Rui Ribeiro,  25.01.2020:  Claro e fácil de compreender. Mais uma vez de acordo!
JORGE COSTA, 25.01.2020: Obrigado JMT por mais um artigo lúcido, objectivo e directo ao tema em questão. A partidarite ainda impera e a Esquerda sempre se quis apoderar do "decoro Nacional". Tudo isto é mau, tudo isto é péssimo. Vergonha.
AM, 25.01.2020:  Portanto a esquerda tem é que estar caladinha e deixar que seja a direita (e, sobretudo a extrema mais  vocal) a definir os contornos do "decoro Nacional"... ainda bem que existe um JMT, auto-rotulado de direita (liberal), para dar conforto moral ao Jorge Costa. Assim sim.
Umaizum, 25.01.2020:  Aqui está uma crónica clara e certeira. Infelizmente, custa a muita gente entender qual o papel da polícia na sociedade e a diferença entre uma agressão feita por um cidadão e por um polícia.
ana cristina, 25.01.2020: Exactamente. É incrível o que isso demonstra sobre a nossa falta de maturidade em termos de cidadania!!!!
AM, 25.01.2020:  Um longo caminho a percorrer, com vítimas pelo meio. Há pouco tempo, conversando com um polícia trintão acerca de direitos de cidadania, dizia-lhe que um polícia não pode pedir a identificação a um cidadão sem uma razão justificativa relevante . Resposta do polícia: ai isso é que pode, quem é que o impede? Estou a falar de um polícia "acessível", de bom trato, com quem se pode conversar... o ensino e a aprendizagem da cidadania tem falhado em toda a linha, Escola da Polícia incluída (ou sobretudo aí).
Abel A. Barreiro:  


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